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outubro 19, 2009

Um capítulo-chave da arte mundial por Miguel Conde, O Globo

Um capítulo-chave da arte mundial

Matéria de Miguel Conde originalmente publicada no jornal O Globo em 18 de outubro de 2009.

Críticos e artistas dizem que importância do trabalho vai além do Brasil

O incêndio que destruiu o acervo de Hélio Oiticica transformou em cinzas um capítulo fundamental da arte mundial, disseram críticos e artistas.

— Perdemos um momento-chave da história da arte da segunda metade do século XX — afirmou o crítico Paulo Sérgio Duarte, autor de “Anos 60, transformações da arte no Brasil”. — Já no final dos 1950 e início dos 1960, Hélio Oiticica começa a pensar a arte como criação de ambientes, algo que não era apenas contemplado, mas vivenciado espacialmente, aquilo que mais tarde se chamaria de instalações. Fora isso, com os parangolés ele repensou a questão da escultura, que passou a ser maleável e incorporada ao corpo humano.

O artista plástico Ernesto Neto foi enfático:

— Ele era simplesmente o nome mais representativo da arte brasileira. Um revolucionário da arte mundial. É uma perda enorme, como se ele tivesse morrido duas vezes.

O poeta Ferreira Gullar, um dos criadores do movimento neoconcreto, integrado por Oiticica, diz que as propostas e trabalhos do grupo foram a primeira contribuição realmente original do Brasil à arte mundial. O artista Cildo Meireles concorda:

— Ele é um dos artistas que, a partir da década de 1950, começaram a instaurar uma singularidade que deu uma visibilidade internacional à produção artística no Brasil.

Nos últimos anos, o reconhecimento internacional do pioneirismo e da originalidade da obra de Hélio Oiticica fez com que seus trabalhos fossem integrados a coleções públicas e privadas no exterior. O MoMA, em Nova York, tem em seu acervo 13 criações do artista, doadas por Patricia Cisneros, e a Tate Modern, em Londres, tem nove. Cesar Aché, que por sete anos cuidou das negociações em nome do Projeto Hélio Oiticica, diz que muitos trabalhos do artista foram vendidos:

— Ironicamente, essas vendas, que foram criticadas por tirar os trabalhos do Brasil, acabaram garantindo a sobrevivência das obras.

Em 2007, uma grande mostra de Oiticica foi organizada pelo Museu de Belas Artes de Houston, que trabalhou com a família num projeto de restauração das obras e reuniu trabalhos em poder de colecionadores privados. O museu comprou do brasileiro Adolpho Leirner uma coleção de arte nacional que incluía duas obras de Oiticica. A coleção privada Daros-Latinamerica, em Zurique, tem em seu acervo um bólide (objeto escultural), um metaesquema (pintura abstrata) e um relevo espacial.

No Brasil, o Museu de Arte Moderna tem um bólide e três metaesquemas que fazem parte da coleção Gilberto Chateaubriand, e o Museu de Arte Contemporânea, em Niterói, tem uma pintura a óleo e alguns metaesquemas da coleção de João Sattamini. O Museu do Açude, no Alto da Boa Vista, tem um penetrável da série “Magic Square”, assim como o centro Inhotim, em Minas Gerais, que tem ainda “Cosmococa 5: Hendrix War”, parte de uma série de cinco projeções feita com o cineasta Neville de Almeida, e está construindo um espaço para receber as outras quatro partes.

O artista plástico Waltércio Caldas disse que o percentual da obra de Oiticica destruído pelo fogo lembra a falta de uma política nacional de aquisição e preservação de obras de arte:

— Se tivéssemos mais museus comprando obras para seu acervo, a perda seria menor.

Posted by Patricia Canetti at 2:59 AM