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Como atiçar a brasa

 


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setembro 30, 2010

Instituto Inhotim (MG) ganha novos pavilhões e obras por Mário Gióia, uol.com.br

Matéria de Mário Gióia originalmente publicada na seção Entretenimento do uol.com.br em 23 de setembro de 2010

A partir desta quinta-feira (23) o Instituto Inhotim, complexo museológico situado em Brumadinho (MG), ganha novos pavilhões e trabalhos criados especialmente para o local. A obra do fotógrafo Miguel Rio Branco, assim como cinco Cosmococas -- série de Hélio Oiticica (1937 - 1980) e Neville D´Almeida -- são novidades, ao lado de uma instalação da francesa Dominique Gonzalez-Foerster e do "Palm Pavillion" de Rirkrit Tiravanija, artista argentina residente em Nova York.

O pavilhão dedicado à obra de Miguel Rio Branco se destaca entre as novidades. O projeto do escritório mineiro Arquitetos Associados tira partido do terreno íngreme e cria bela estrutura feita em aço corten, o mesmo usado por Amilcar de Castro em suas esculturas, e tem uma estrutura labiríntica em seu interior. “Ele meio se esconde, meio que força sua visibilidade”, resume o alemão Jochen Volz, um dos curadores de Inhotim e cocurador da mais recente edição da Bienal de Veneza, transcorrida no ano passado.

Para Volz, o centro mineiro tem como objetivo criar projetos específicos para o diálogo entre o grande jardim botânico presente e a escala generosa de obras de arte contemporânea do acervo local. "Sempre pensamos: o que os outros não podem fazer?", afirma ele. "Temos de refletir bem sobre o contexto de arte e natureza tão próprio daqui, além de dar visibilidade e recortes a obras representativas dentro do nosso acervo, caso bem claro de Rio Branco."

O pavilhão dedicado ao artista nascido em Las Palmas e radicado no Rio coroa bom momento de sua trajetória. Ele tem exposição em cartaz atualmente no MIS (Museu da Imagem e do Som de São Paulo) e é um dos participantes da 29ª Bienal de São Paulo, com o filme "Nada Levarei Qundo Morrer Aqueles que Mim Deve Cobrarei no Inferno", realizado nos anos 70 no Pelourinho, Salvador, antes da reforma. O pavilhão privilegia filme e videoinstalações, como "Diálogos com Amaú", de 1983, e "Entre os Olhos", algumas delas menos conhecidas na carreira do artista.

Outro projeto dos Arquitetos Associados é o pavilhão dedicado às cinco Cosmococas, de Hélio Oiticica e Neville D´Almeida. Também labiríntica em seu interior, está planejada para ser um espaço tal qual os artistas imaginaram, onde o público pode entrar numa piscina e "participar" da obra de arte, descansar em redes e fazer outras atividades propostas pelos trabalhos ambientais.

A francesa Dominique Gonzalez-Foerster concebeu uma obra, "Desert Park", especificamente para Inhotim, onde fica localizada atrás do pavilhão de Adriana Varejão. Decorrência de experiências anteriores da artista na Documenta e em Münster, compila variados tipos de ponto de ônibus em uma grande área de areia branca. O ambiente quase lunar ajuda a compor uma paisagem de um certo modernismo, presente na arquitetura dos pontos, típico das áreas urbanas brasileiras. "Promenade", obra presente anteriormente em Inhotim, continua a ser exibido na galeria Mata, no centro do complexo. Rirkrit Tiravanija remonta próximo à "Beam Drop", obra de Chris Burden, seu "Palm Pavillion", peça que foi exibida na 27ª Bienal de São Paulo, em 2006.

Nas galerias, com exceção do cubano Diango Hernández, artistas brasileiros são os contemplados com obras novas em exibição. Alexandre da Cunha, Laura Vinci, Marcius Galan e Marcellvs L têm trabalhos expostos. O carioca Ernesto Neto também ganha espaço com um remontagem histórica de "Copulônia", de 1989, primeira peça na qual lida com materiais têxteis junto de outros mais rígidos, expandindo o conceito de escultura e criando uma tensão entre as diferenças do que foi construído. "Inhotim também tem a preocupação de exibir obras que foram pouco vistas ou montadas e que são importantes no desenvolvimento da arte contemporânea do país", diz Rodrigo Moura, um dos curadores do centro. "Copulônia" somente foi exposta no Espaço Macunaíma, no Rio, no ano de sua criação.

Acervo de ponta
A abertura das novas obras consolida Inhotim como um dos centros de arte contemporânea mais importantes do Brasil, ratificando o bom momento da arte brasileira em âmbito externo. Nomes prestigiados do circuito estiveram recentemente ou irão especialmente para o centro, como as curadoras das próximas edições da mostra alemã Documenta, Carolyn Christov-Bakargiev, e da Bienal de Veneza, Bice Curiger, entre outros.

Inaugurado em 2004, Inhotim é referência em arte contemporânea no Brasil por dar a chance de o público ver obras de nomes centrais na cena atual, como Steve McQueen, Matthew Barney, Doug Aitken, Janet Cardiff, Doris Salcedo e Olafur Eliasson, entre vários outros, lado a lado de artistas brasileiros de trajetória estabelecida, como Cildo Meireles, Tunga, Varejão e Valeska Soares.

O centro planeja novas expansões, como pavilhões e obras específicas de Pipilotti Rist, Cristina Iglesias e Eliasson, além de um grande edifício destinado a expor obras do acervo. "Vai ser quase como um museu. Precisamos de um espaço maior para exibir o que adquirimos, as galerias que temos já não dão conta disso", conta Volz.

Posted by Fábio Tremonte at 5:37 PM

"Meu sonho é poder ver no Rio uma favela inteira pintada" por Juliana Vaz, Folha de S. Paulo

Matéria de Juliana Vaz originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 30 de setembro de 2010

Artista holandês que coloriu as fachadas de comunidades cariocas participa hoje da Bienal

Em parceria com os próprios moradores das favelas, Dre Urhahn já pintou na Vila Cruzeiro e no morro Dona Marta

Embora não tenha sido escalado para participar da Bienal, o holandês Dre Urhahn é um artista que destoa entre os outros do pavilhão.

Primeiro porque, pintor, foi convidado para falar em uma mostra de arte que privilegia o vídeo e as instalações multimídia.

Segundo porque o seu suporte não são as telas, mas os tijolos das favelas cariocas.

Vindo de Amsterdã, ele desembarcou às pressas, anteontem, em São Paulo. Reclamou do "jet lag" e disse que foi chamado de última hora, para integrar, hoje, uma série de apresentações no Ibirapuera organizada pelo consulado da Holanda (leia programação ao lado).

Ele sabe apenas que o bate-papo deve girar em torno do "Favela Painting", um projeto "um pouco artístico, um pouco político e um pouco social", que vem remodelando as habitações pobres do Rio de Janeiro.

CHUVA E TIROS
Ao lado do conterrâneo Jeroen Koolhaas, 33 -que resolveu ficar em casa depois de quebrar o pé pintando um mural- Dre, 36, já jogou cor nas comunidades cariocas em três ocasiões.

A primeira vez foi em 2007, na Vila Cruzeiro, uma das favelas que integram o Complexo do Alemão (zona norte), onde morou por oito meses. "Nossas principais dificuldades foram a chuva e os tiros", lembra.

Depois de testemunhar três ações do Bope (Batalhão de Operações Policiais Especiais) e sete passagens do "caveirão", o duo deixou estampada sobre um muro a imagem de um garoto soltando pipa. Agradou aos moradores, enquanto os traficantes diziam que ali era "o lugar errado" para a arte.

Um ano mais tarde, na mesma Vila Cruzeiro onde se sentem "em casa", Dre e Jeroen deixaram sua marca em uma escadaria que leva ao topo do morro.

MORADORES
Mas o maior feito do duo, e certamente o mais visado por turistas, foi terminado neste ano, no morro Dona Marta, em Botafogo (zona sul).

Ali, os holandeses imprimiram listras coloridas a 34 casas da comunidade, que em 2008 recebeu a primeira UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) do Rio.

Além do patrocínio de uma marca de tintas, tiveram o apoio dos moradores da favela, que receberam instrução para pintar. "A carreira de pintor é um início", afirma Dre, que diz só haver sentido no projeto se acompanhado de melhorias sociais.

A dupla está agora levantando fundos para realizar sua obra-prima: "Eu quero ver uma favela inteira pintada, eu quero ver".

Posted by Fábio Tremonte at 4:26 PM

Urubus da Bienal passarão por perícia por Silas Martí, Folha de S. Paulo

Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 29 de setembro de 2010

Delegacia do Meio Ambiente pede laudo para verificar condições das aves e do viveiro expostos em instalação

Resultado deve sair num prazo de 30 dias; artista Nuno Ramos tem autorização do Ibama para expor os animais

Foi instaurado um inquérito para apurar se os três urubus mantidos na instalação de Nuno Ramos exposta na Bienal de São Paulo estão sofrendo maus tratos.

Embora o artista tenha autorização do Ibama para expor e manter as aves em cativeiro, a Delegacia do Meio Ambiente pediu ao Instituto de Criminalística que fizesse uma perícia dos animais e das condições do viveiro.

"Foi por meio de ONGs ambientalistas que soubemos da exposição", disse à Folha o delegado Roberto Carvalho Naves, da 1ª Delegacia do Meio Ambiente.

O exame do IC só deve emitir um laudo num prazo de 30 dias. Nada foi concluído do caso até agora.

O artista e um responsável pela mostra deverão ser ouvidos. "Recebi uma solicitação, mas não vou agora", disse Nuno Ramos. Segundo o artista, advogados da Bienal estão cuidando do caso.

"São absolutamente normais esses processos", disse o produtor-executivo da mostra no Ibirapuera, Emilio Kalil. "Tudo isso terá de ser explicado."

Posted by Fábio Tremonte at 3:07 PM

Ataques reacendem debate na Bienal por Silas Martí, Folha de S. Paulo

Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 29 de setembro de 2010

Pichador de "liberte os urubu" diz que é "indiferente rabiscar obra" e que ética da rua não é a mesma do pavilhão

Artistas defendem ideia dos curadores de convidar pichadores para a exposição, mas repudiam os ataques

Na rua, uma regra não escrita entre pichadores é que um não pode passar por cima do trabalho do outro, "atropelar", no jargão do asfalto.

Mas o comportamento mudou dentro do pavilhão da Bienal, onde um dos integrantes do grupo Pixação SP, que integra a mostra, pichou no último sábado a instalação do artista Nuno Ramos.

"Todo "pixo" é feito de forma ilegal, todo mundo se arrisca e por isso tem respeito", disse Djan Ivson, autor da ação. "Mas a gente não tem nada a ver com esses artistas, não tem relevância nenhuma o trabalho deles. Para nós, é indiferente rabiscar a obra."

Desde a abertura da exposição, ataques às peças de Ramos e da dupla Kboco e Roberto Loeb têm reacendido o debate em torno da pichação, levantando dúvidas sobre a tentativa de inclusão do estilo pelos curadores dessa 29ª edição da mostra.

Depois dos ataques à Bienal há dois anos, que resultaram na prisão de Caroline Pivetta, os curadores Moacir dos Anjos e Agnaldo Farias decidiram fazer um convite a representantes do gênero.

"São códigos diferentes, na rua eles estão entre eles e o respeito é mútuo ali", diz Dos Anjos. "Mas é essa diferença de regras que a gente está testando nessa Bienal, a gente assume o conflito."

Loeb, que teve seu trabalho pichado, vê no episódio um reflexo da desigualdade.

"Manifestações extremas desse tipo carregam a cor social do que está ocorrendo, a gente não está num país certinho", afirma. "Quem se alça a outros espaços é visto como um cara que diverge da comunidade, que saiu da turma, é uma briga de classes."

Sua análise parece valer tanto para pichadores quanto para seu parceiro na Bienal, o artista Kboco, que também começou na arte de rua. "Não faço arte para ganhar dinheiro", diz Kboco. "Já comprei briga com a elite."

Num gesto comedido, Nuno Ramos decidiu não prestar queixas contra Ivson, reforçando o que chama de "espaço para o diálogo" que deveria ser a Bienal. Ele também discorda da visão de luta de classes e de fricção entre os códigos de conduta.

"Não é possível fazer uma generalização, nem acho que isso tem a ver com a origem dele", afirma Ramos. "A classe alta também pode atacar."

Cildo Meireles, outro artista da Bienal, defendeu a atitude dos curadores, mas criticou os ataques. "Não compreenderam o espírito da coisa", diz o artista. "Isso é uma raiva mal resolvida, um ato de desespero que não podemos confundir com arte."

Há oito anos, uma obra de Lenora de Barros no Maria Antonia também foi pichada. Autores da ação mostraram até um projeto da intervenção à artista. Mas no caso da Bienal, ela diz não ver "nenhuma intenção artística".

"Eles vivem da transgressão", diz. "Mas ao mesmo tempo a situação acaba gerando figuras isoladas, que não respondem pelo grupo."

"Não acho que foi vacilo a Bienal ter chamado pichadores", opina a artista Adriana Varejão. "Mas a Bienal está virando uma plataforma de heróis da pichação, algo meio marqueiteiro. Estão querendo virar celebridade."

Posted by Fábio Tremonte at 3:02 PM

Artista reclama de abandono em instalação pichada por Camila Molina, Estadão.com

Matéria de Camila Molina originalmente publicada no Estadão.com em 28 de setembro de 2010

Kboco diz que falta segurança, iluminação e verba da Bienal para atividades no espaço, no qual diz ter investido R$ 100 mil

Instalada do lado de fora do prédio no qual ocorre a 29.ª Bienal de São Paulo, a obra do artista Kboco e do arquiteto Roberto Loeb ainda está com as pichações feitas no sábado à noite ou no domingo por um desconhecido e que trazem, por duas vezes, a inscrição "Invasor". "Para mim não tem diferença entre apagar ou não. Sou vítima não por causa da pichação, mas da produção do evento, que não deixa minha obra acontecer", diz o artista. "Quando fui convidado, esse seria um espaço com uma programação para o povo, com teatro, happening, música."

Kboco reclama da falta de segurança por parte da organização do evento, de iluminação e de verba para as atividades.

É o segundo caso de pichação da 29.ª Bienal, inaugurada no sábado. No dia da abertura, Djan Ivson invadiu a instalação Bandeira Branca de Nuno Ramos, e escreveu a frase "Liberte os urubu" (sic) numa das esculturas da obra. Djan afirma ser o autor da pichação de sábado e nega ser o da obra de Kboco. Ele faz parte do grupo que pichou o prédio da Bienal em 2008, na edição anterior do evento, e que desta vez está representado na mostra no segmento "Pixação SP", com fotografias e vídeos sobre a ação de pichadores.

Kboco, que é grafiteiro e usa a técnica em sua criação, diz ter comunicado no domingo aos curadores da Bienal sobre a pichação em sua obra e que até ontem não havia tido uma conversa com os responsáveis pelo evento. Sua obra, o "terreiro" da Bienal Dito, Não Dito, Interdito é um dos seis espaços criados por artistas e arquitetos e que vão abrigar, até 12 de dezembro, atividades diversas para o público da mostra. Segundo Kboco, gastou-se R$ 100 mil para a construção de seu trabalho com Loeb (o espaço, pelo projeto inicial, poderia ser um local para skatistas).

"A obra de Kboco não está abandonada", afirmou o curador da Bienal, Moacir dos Anjos. "Estamos estudando entre hoje e amanhã que forma o trabalho dele pode ser melhor integrado à exposição. Não existe uma programação tão intensa como outros terreiros, até por ser um espaço em lado externo."

"Lamentamos que sua obra tenha sido pichada e é uma decisão que vai caber ao artista se seu trabalho vai ser restaurado", disse o curador. Kboco afirma que sua posição é apagar as pichações de seu trabalho, mas que pretende esperar uma postura dos organizadores da 29.ª Bienal.


TRÊS PERGUNTAS PARA...

Djan Ivson, PICHADOR E PARTICIPANTE DA BIENAL

1. Por que fez a pichação na obra de Nuno Ramos?
Fiz o ataque por questão da liberdade, contra o aprisionamento dos bichos e pela liberdade de expressão. A frase (pichada na obra, "Liberte os urubu (sic)") não foi completa.

2. Qual seria?
Liberte os urubus e os pichadores de BH. Foi a questão da polêmica da obra e dos nossos amigos. Quis fazer uma reclamação sobre esses assuntos (segundo ele, "Os Piores de Belô" foram presos em agosto).

3. Sua pichação foi uma manifestação contra a forma de a Bienal expor o gênero, com fotos e vídeos?
Escolhemos expor a pichação na Bienal dessa forma. Não tinha nada a ver alguém dar uma parede para a gente pichar. [ ]

Posted by Fábio Tremonte at 2:54 PM

Bienal começa com obra pichada e tumulto, Estadão.com

Matéria originalmente publicada no Estadão.com em 26 de setembro de 2010

Um tumulto marcou a abertura, ontem, da 29.ª Bienal, no Parque do Ibirapuera, e provocou seu fechamento antes do horário previsto, às 19 horas. Por volta das 18h20, um rapaz invadiu a instalação Bandeira Branca, do artista Nuno Ramos, e pichou a frase "liberte os urubu (sic)". Houve confronto e troca de agressões entre os seguranças, grupos de defesa dos animais e pichadores. A polícia foi à Bienal.

No meio do tumulto, um casal foi levado para o 36.º DP, acusado da pichação. Eles negaram. O rapaz detido pela polícia entregou à reportagem do jornal O Estado de S.Paulo um cartão com a inscrição "Rafael Pixobomb", nome de integrante do grupo que fez pichações na Bienal de 2008. O casal não foi preso, segundo a polícia. Os dois e mais 10 integrantes de associações de defesa dos animais registraram boletim de ocorrência alegando ter sido agredidos pelos seguranças que, por sua vez, diziam ter sido as vítimas e agredidos. As pessoas que prestaram queixa diziam que o pichador Djan Ivson havia feito a inscrição na obra. Ele não foi localizado.

Nuno Ramos não quis dar queixa e não será aberto inquérito para investigar crime ambiental.Ontem, Nuno Ramos ainda decidiu que sua obra seria restaurada para, a partir de hoje, já ser vista sem a pichação.

"A palavra, para mim, é triste. Nesse lugar que é a Bienal, o outro aparece numa condição de agressão. Não estou chocado, não estou com raiva, vejo como algo atrasado", afirmou.

A confusão em torno da obra ocorreu durante manifestação ambientalista ao lado da polêmica instalação do artista, que abriga três urubus em seu interior.

Mas segundo alguns manifestantes durante o tumulto, a invasão ocorreu em protesto à seção "Pichação", que reúne vídeos e fotos de pichadores e seus trabalhos. Para eles, a Bienal quer "domesticar" o gênero. "Discordâncias devem ser expostas, mas dentro do respeito", afirmou o curador Moacir dos Anjos. "Foi o ato de uma pessoa do mesmo grupo que participa da 29.ª Bienal", disse ainda o curador. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.


Posted by Fábio Tremonte at 2:50 PM

A língua das ruas no templo da arte por Pablo Pereira, Estadão.com

Matéria de Pablo Pereira originalmente publicada no Estadão.com em 26 de setembro de 2010

Eles já foram perseguidos, acuados e presos, mas agora tiveram representantes convidados para uma presença "documental" em uma das mais importantes manifestações culturais do País, a Bienal de Artes de São Paulo. São os pichadores, jovens que usam tinta spray para deixar suas marcas em paredes, portas e janelas.

Uma rápida olhada na internet já revela diversos vídeos sobre a ação dessa tribo paulistana. Alguns deles admitem que o barato da coisa está na transgressão, no culto à ilegalidade. A prática é proibida por lei, mas pode ser avistada na paisagem de São Paulo há muitos anos. Em 2008, em caso rumoroso, uma ativista foi presa por ter pichado na 28.ª Bienal. Na versão deste ano, "colegas" da moça mostram sua escrita marginal oficialmente em espaços do pavilhão no Ibirapuera.

Essa gana por escrever nas paredes é registrada na cidade há bastante tempo. O estudo "As Marcas da Comunicação Urbana", de Alexandre Barbosa Pereira, mestre em Antropologia Social pela USP, do livro São Paulo, Metrópole em Mosaico (CIEE, 2010), lembra que as pichações eram vistas em São Paulo já nos anos 30, com protestos contra Getúlio Vargas. Eram as expressões que décadas depois virariam bordão de esquerda: "Abaixo a ditadura".

E foi essa palavra de ordem de protesto que a jovem pichadora tentou reproduzir na 28.ª Bienal e lhe rendeu uma cadeia de mais de 50 dias.

Pichador que se preze diz que a essência da ação está no desafio e não gosta de grafiteiro, um outro usuário de parede e muro alheios. O grafiteiro carrega uma certa tolerância social. É uma aceitação que o coloca mais próximo das artes plásticas, como aparece na ligação das Avenidas Paulista e Rebouças, que tem desenhos e cores. Mas, como mostra o documentário Pixo (2008), de João Wainer, há quem veja nessas pinturas mais uma ferramenta de combate aos pichadores - à medida que tenta atrair o pichador para o mundo da atitude legal.

Na pesquisa de Pereira, aparece um episódio curioso: uma pichação que intrigou paulistanos na década de 60. Lia-se: Cão Fila KM 26. Parecia ser uma enigmática mensagem, em pleno governo militar. Mas, conta Pereira, não passava de um criador de cachorros da raça querendo fazer negócios com filhotes numa chácara a 26 quilômetros da capital.


Posted by Fábio Tremonte at 2:36 PM

Polêmica é o chamariz na abertura por Camila Molina, Estadão.com

Matéria de Camila Molina originalmente publicada no Estadão.com em 26 de setembro de 2010

A polêmica rondava a 29.ª Bienal de São Paulo quando ela foi aberta ao público às 10 horas de ontem. O falatório em torno da obra do pernambucano Gil Vicente, que aparece em seus desenhos executando personalidades como o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, atiçava a curiosidade. "Quis ver as obras antes que corresse o risco de tirá-las", disse o médico Renato Barbosa, de 63 anos. Ao observá-las, afirmou que "infelizmente as obras retratam o dia a dia de São Paulo".

O que ninguém viu foram os retratos dos candidatos à Presidência Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB), criados pelo argentino Roberto Jacoby, que vão ficar encobertos até as eleições. Nos discursos do presidente da Bienal, Heitor Martins, e dos políticos houve menção de que esta edição marcaria a retomada da instituição no cenário cultural.

As primeiras atividades do dia foram apresentação do Balé da Cidade de São Paulo e a reencenação da obra Divisor, da artista Lygia Pape, na Marquise do Ibirapuera, que teve mais de 100 participantes. O dia acabou com a pichação. A mostra ficará em cartaz até 12 de dezembro.


Posted by Fábio Tremonte at 2:33 PM

Bienal por um inglês respeitado por Antonio Gonçalves Filho, Estadão.com

Matéria de Antonio Gonçalves Filho originalmente publicada no Estadão.com em 26 de setembro de 2010

O crítico Guy Brett, que promoveu a obra de Hélio Oiticica, fala da mostra

Em 1965, um ano e meio após o golpe militar, ele entrou na 8.ª Bienal de São Paulo e, depois de circular entre os maiores nomes do minimalismo americano, descobriu que existia vida inteligente também abaixo do Equador. Na sala vizinha ao nicho minimalista de Donald Judd e Frank Stella, um artista carioca ainda pouco conhecido, Hélio Oiticica exibia seus bólides que, a essa altura, isto é, durante a ditadura, já haviam evoluído de simples caixas cromáticas para caixas políticas, feitas em homenagem a marginais executados nas ruas pela polícia. O crítico, impressionado, levou consigo a imagem daquele bólide-manifesto para a Inglaterra, seu país natal, determinado a divulgar a obra de Oititica na Europa. No mesmo ano, incentivado pelo crítico brasileiro Mário Pedrosa, organizou uma exposição sua em Londres. Hoje, 45 anos depois, Guy Brett volta à mesma bienal para rever duas obras históricas de Hélio Oititica, a bandeira Seja Marginal, Seja Herói e um "Ninho", instalação que o artista mostrou pela primeira vez em 1970, no Museu de Arte Moderna de Nova York.

Brett tem sido, desde então, o grande embaixador da arte brasileira na Europa, apresentando ao continente artistas do porte de Lygia Clark, Sergio Camargo e outros, que ajudou a promover graças ao prestígio que goza junto à comunidade artística e diretores de museus. Prova desse respeito foi o convite feito pelo Museo Nacional Centro de Arte Reina Sofia, de Madri, para assinar a curadoria da retrospectiva do pintor, escultor e arquiteto belga Georges Vantongerloo (1886-1965), pioneiro da escultura abstrata e um dos integrantes do histórico grupo de abstracionistas De Stijl, ao qual pertenceu Mondrian. A mostra, encerrada em fevereiro, foi um dos grandes eventos desta temporada no Reina Sofia.

Na última quarta-feira, Brett fez uma palestra sobre o discípulo brasileiro de Vantongerloo, o escultor carioca Sergio Camargo (1930-1990), homenageado com uma retrospectiva no Instituto de Arte Contemporânea (IAC), onde o crítico inglês concedeu uma entrevista exclusiva ao Caderno 2, fazendo um primeiro balanço do que viu na 29.ª Bienal de São Paulo, aberta na terça para convidados e ontem ao público. Desta vez, Brett volta à Inglaterra desapontado com o que viu. Incomodou-o a "cacofonia" de sons amplificados das obras expostas, particularmente a instalação Bandeira Branca, do artista paulistano Nuno Ramos, formada por três esculturas de taipa de pilão em areia-preta e caixas de vidro sonoras. Demarcada por uma tela de proteção, a instalação confina três urubus ao som de canções populares como Carcará. Brett usou apenas uma palavra para definir a obra: "sinistra".

Brett admite não conhecer como deveria a obra de Nuno, mas só identifica um artista brasileiro presente na Bienal como herdeiro do espírito revolucionário de Oiticica, Cildo Meireles, cuja obra não estava montada quando o crítico visitou a mostra. Ele considera outra instalação de Cildo, Como Construir Catedrais (ou Missão/Missões, 1987), uma obra fundamental na história da arte contemporânea e que incorpora sem grandes danos o conceito desta edição da bienal - o amálgama política/arte.

Não é o caso do recifense Gil Vicente, segundo ele. Brett não se deixou impressionar pela polêmica provocada pela série de autorretratos do artista matando presidentes da República brasileira e a rainha da Inglaterra. Ele, que adora desenho, considerou o trabalho rudimentar. "Um pintor como o americano Leon Golub , morto há seis anos, já fez melhor, provando que estar sintonizado com o mundo real não significa condenar pessoas em particular."

Em sua rápida visita à mostra, Brett dedicou um pouco mais de tempo a um artista já septuagenário que trabalha em registro semelhante ao de Cildo, o norte-americano Jimmie Durham - ele se apropria de objetos banais e confere aos mesmos um caráter político. "A sala dele pode parecer pouco confortável ao público, mas sugiro que o espectador não se deixe levar pela primeira impressão, porque Durham é, de fato, um dos grandes da bienal."

Posted by Fábio Tremonte at 2:14 PM | Comentários (1)

setembro 29, 2010

A utopia silenciosa da arte na paralela 2010 por Camila Molina, Estadão.com

Matéria de Camila Molina originalmente publicada no Estadão.com em 23 de setembro de 2010

Desde 2004, as principais galerias paulistanas se reúnem para fazer uma mostra especial com seus artistas para coincidir com o período da Bienal de São Paulo - tanto que a exposição tem como título Paralela. Na edição que é inaugurada hoje para o público nos galpões do Liceu de Artes e Ofícios, estão reunidas obras (maioria, inéditas) de 82 criadores selecionados pelo curador Paulo Reis. Sob o título A Contemplação do Mundo, a Paralela 2010 dá bastante espaço para a produção jovem (muitos deles, curiosamente, só fazendo pintura) - "no elenco, interessava-me mostrar novos artistas", diz Reis - e ainda abertura para um olhar em que prevalece o silêncio.

aulo Reis, que atualmente é diretor do centro cultural Carpe Diem em Lisboa (Portugal) e co-editor da revista Dardo Magazine, acredita, por sua formação humanista, como diz, que é por meio de arte, de cultura, que "a juventude constroi um novo mundo". Tanto que um de seus pedidos quando convidado a fazer a curadoria da mostra foi de que não houvesse separação entre os galpões do Liceu e as salas de aula dos alunos que frequentam a instituição. A exclusão de fronteira entre a arte e o mundo está, assim, no cerne de seu projeto, que coloca obras já recebendo o público desde o lado externo dos galpões: a pintora Regina Parra instalou no teto da fachada do local letreiro que começa dizendo "Nada de mau se perdeu/nada de bom foi em vão...", citação à obra do cineasta russo Andrei Tarkovski; e Daniel Acosta criou a escultura Estação de Desintoxicação Urbana, um "espaço de convivência", para ser usado pelos visitantes.

Poético. De uma forma direta, é o signo da utopia que vai levando toda a exposição. "A arte foi das ciências sociais a menos abalada porque esteve sempre ligada à ética", defende Paulo Reis. A artista Sandra Cinto, que começou há alguns anos a fazer obras relacionadas aos mares e águas com barquinhos de papel, encerra esse ciclo na Paralela com uma impactante instalação que remete à proa de um barco ao ser formada por uma plataforma de toras de madeira, vidros com desenhos em preto, livros e cordas - um convite à deriva. Dialogando com esta obra está uma referência ao processo lento de transformações em A Rocky Mist, de Thiago Rocha Pitta, em que vidros com sal vão se cristalizando aos poucos e formando uma paisagem. É, este, o espaço que fala do sublime.

O tom mais rebaixado e poético continua depois nos núcleos seguintes da mostra pelos galpões do Liceu, incluindo ainda outros pontos como a referência à história da arte como base para os artistas; a questão da "economia da forma"; equilíbrio e desequilíbrio; o contraste opulência/decadência - há leveza no conjunto, o que não quer dizer que artistas falam de tantas questões nos interstícios de suas criações, como a obra Menos Uma, de Milton Marques, é direta e singela sobre o armamento ilegal . "Não queria discurso sociológico estreito", afirma Paulo Reis.

Posted by Fábio Tremonte at 5:46 PM

Espaços em crise por Nina Gazire, Istoé

Matéria de Nina Gazire originalmente publicada na Istoé em 10 de setembro de 2010

Desde os anos 70, as artes visuais se empenham em um movimento de expansão para fora do “cubo branco”, isto é, para além da neutralidade dos espaços dos museus e galerias. A arte contemporânea se conectou ao cotidiano e, em seu escape, ganhou diferentes termos para denotar essa sua relação revoltosa com o seu ambiente institucional. A land art, a arte urbana e o cinema expandido são algumas dessas modalidades. Se a “expansão” foi a principal força motriz neste processo de ocupação do cotidiano, pouco se pensou e questionou sobre as múltiplas subjetividades ali encontradas. O evento “Novas Espacialidades: Relações Contemporâneas”, que acontece em Belo Horizonte, apresenta trabalhos artísticos em diferentes suportes e reúne um time de especialistas brasileiros e estrangeiros que debatem o espaço ocupado pela arte e também sua posição de crise na atualidade.

Exemplo é o trabalho da série “Reação Natural”, de Pedro Motta (foto), que representa em uma imagem fotográfica “a noção de civilização e a noção de natureza como coisas opostas e que brigam por um mesmo espaço”, comenta o curador Eduardo de Jesus, que gerou o projeto a partir de um texto de Michel Foucault. Neste artigo de 1967, o autor francês afirma que a “era do tempo” já passou e que agora estamos vivendo a “era do espaço”, em que os territórios e as subjetividades estão sobrepostos. Segundo o curador, “a intenção do evento é pensar o espaço em múltiplos sentidos, como a questão das cidades e seus fluxos, a questão da cultura digital, as noções de território e como suas mudanças afetam a sociedade”.

Além da participação de artistas brasileiros como Detanico e Lain, Gaio Matos, Leandro Araújo, Roberto Andrés e Grupo Poro, a artista alemã Ulla von Brandenburg exibe sua instalação inédita no Brasil, “Singspiel”, destaque na última Bienal de Veneza, em 2009.

Posted by Fábio Tremonte at 5:42 PM

Arte revolucionária por Nina Gazire, Istoé

Matéria de Nina Gazire originalmente publicada na Istoé em 10 de setembro de 2010

Pela primeira vez para o público brasileiro, a obra pacifista de Joseph Beuys, artista que não separava arte, política e cotidiano

Muito se discute sobre a veracidade dos fatos que envolvem o acidente de avião sofrido pelo alemão Joseph Beuys – na época, piloto da Luftwaffe –, durante a Segunda Guerra Mundial. É verdade, porém, que o surgimento de um mito potencializa a realidade e, boato ou não, as histórias que cercam o episódio foram providenciais na formação de um dos maiores artistas do século XX. O avião caiu na região da Crimeia, próxima à Sibéria, em fevereiro de 1943. Beuys teria ficado soterrado na neve por dias e seria salvo por um pequeno grupo de origem mongol, os tártaros. Eles teriam cuidado dos ferimentos de sua perna com gordura animal e envolvido seu corpo com um tipo de feltro, que o teria mantido aquecido e protegido do rígido inverno. Beuys levaria estes elementos e o contato com esta etnia para o resto de sua vida, introduzindo-os em diversos trabalhos futuros. Mas o que pouca gente sabe é que a presença dos tártaros na obra do artista não é apenas mera referência plástica ou cultural, mas uma forma de protesto contra um dos maiores extermínios étnicos da história. Após o fim da Segunda Guerra, os tártaros foram acusados de traição e perseguidos pelo governo de Stalin. Segundo estimativas, cerca de 200 mil pessoas morreram durante o duro processo de exílio ao qual foram submetidas.

“A Revolução Somos Nós” apresenta, pela primeira vez ao público brasileiro, os ideais pacifistas de Beuys. Ao contrário de uma retrospectiva convencional, na qual se apresentaria um recorte cronológico da produção do artista, nesta exposição será possível conhecer o Beuys revolucionário, através da totalidade de sua produção panfletária, composta de cerca de 250 obras produzidas a partir de uma concepção de “arte antropológica”. “Beuys repensou o humanismo, mas para além do sentido das crenças e ideologias. A sua frase ‘todo homem é um artista’ ficou muito conhecida, mas nem sempre foi compreendida. Ele entendia a vida e o universo humano como uma ‘obra’ em que todos atuam e a função da arte é a de conscientizar-nos sobre esse processo”, diz Antonio D’Avossa, curador da exposição.

Em 1972, quando foi demitido da Universidade de Dusseldorf, Beuys fundou a Universidade Livre, uma iniciativa pedagógica que ia muito além do ensino da arte como disciplina isolada. Para o artista, não havia separação entre arte e cotidiano e isso implicava que política e arte também eram indissociáveis. “Os pôsteres, primeiros materiais de propaganda da Universidade Livre, nunca foram apresentados dessa maneira. Essa produção se dá em três níveis de conhecimento: a comunicação, a política e a ecologia”, diz o curador. Com os pôsteres, estão expostos os múltiplos, objetos em série, e 20 vídeos que apresentam suas performances. Mas, muito mais do que apresentar as obras, a exposição se dedica a intensas atividades educativase com isso se volta para aquilo que era mais importante a Beuys: o uso da arte como forma de transformação da realidade.

Posted by Fábio Tremonte at 5:38 PM

Tunga: a alquimia como arte por Nina Gazire, Istoé

Matéria de Nina Gazire originalmente publicada na Istoé em 17 de setembro de 2010

Tunga se autodeclara um velho leitor de textos sobre alquimia. Para ele, essa antiga tradição, na qual se encontram a ciência e a magia, também dá origem aos conhecimentos da arte. “Obviamente não pretendo achar o ouro no meio de meu trabalho. A alquimia é apenas uma metáfora”, diz o artista pernambucano, que este mês expõe concomitantemente em São Paulo e Salvador. A palavra “cooking” (cozinhar, em inglês) no título da exposição na Galeria Milan é uma de suas inúmeras referências ao forno – instrumento amplamente usado em laboratórios por alquimistas, em seus estratagemas para transformações. “Aliás, o olhar é uma espécie de cozinhar, onde digerimos aquilo que olhamos”, declara Tunga.

A exposição “Cooking Crystals Expanded” apresenta novos trabalhos em que a matéria do cristal aparece como referência conceitual à continuidade entre corpo humano e mundo exterior. As instalações estão arranjadas como emaranhados de cristais e frascos de urina suspensos por redes e fios. Como as tranças e os ímãs de ferro, o cristal e a urina são símbolos comuns ao seu trabalho e se integram ao que o artista chama de uma “estrutura cristalográfica” ou “nebulosa escatológica”.

“Tanto a terra quanto o nosso corpo produzem cristais, essa é uma constelação lógica, uma zona metabólica. A urina em nosso corpo também se apresenta como uma forma cristaloide”, diz ele. A alquimia, que torna possível transformar corpo em cristal e cristal em arte, é aquilo que mais interessou o artista ao longo de sua carreira. As duas instalações da mostra, “Cristalinos” e “Cooking Crystals”, exibida na 3ª Bienal de Arte Contemporânea de Moscou, em 2009, têm, portanto, um caráter de síntese de sua produção.

Outro vetor importante da obra de Tunga é a instalação “À Luz de Dois Mundos”, atualmente exposta no Palacete das Artes Rodin, em Salvador. Criada em 2005, a obra é inspirada nas pinturas de Frans Post, realizadas durante a sua viagem à América, no século XIX. Antes de ser exibida no Brasil, esteve exposta no museu do Louvre, para onde foi feita especialmente, e no espaço PS1, do MoMA de Nova York. Composta por crânios e esqueletos metálicos, tranças e redes, a instalação faz uma referência às possíveis dificuldades que o pintor teria encontrado ao lidar com uma luminosidade totalmente diferente no continente sul-americano. Tunga imaginou que este pintor tenha criado uma técnica de pintura diversa da que usava até então. “Fazer arte é fazer uma ficção deixando aparente o processo de fantasia”, explica.

Posted by Fábio Tremonte at 5:34 PM

Tempo instável por Paula Alzugaray, Istoé

Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada na Istoé em 17 de setembro de 2010

Exposição conta a história das relações entre arte e técnica no Brasil e situa a instabilidade como qualidade comum entre arte digital e interativa

Quando Julio Le Parc deixou as tintas para trabalhar fundamentalmente com a luz, o movimento e a participação do público, ele tinha uma preocupação em mente: a instabilidade da vida cotidiana. Membro do grupo de artistas sul-americanos que se estabeleceu em Paris na década de 1950 e desempenhou papel importante no lançamento da arte cinética na Europa, Le Parc esteve em São Paulo para a montagem da mostra “Téckne”. “Chamam minha obra de cinética, mas as definições limitam a obra de arte. A técnica nunca foi meu motor. A tecnologia que uso sempre foi muito elementar. Minha preocupação era criar uma obra instável e para isso fui buscar a luz”, diz o artista.
O duplo mérito dessa curadoria compartilhada entre Denise Mattar e Christine Mello é, por um lado, realizar um trabalho arqueológico, arquivístico e histórico – ela revisita as cinco principais mostras de arte e tecnologia realizadas pelo MAB-Faap entre 1964 e 1986 –, mas também atualizar as questões do passado em um significativo conjunto de obras contemporâneas. Trata-se, portanto, de seis mostras em uma.

“Lumière en Mouvement”, concebida por Le Parc em 1964 para a mostra “A Instabilidade”, funciona como um farol ou fio condutor da exposição. Remontada sob formas diversas nas últimas décadas, a instalação é a mais pura expressão do conceito da primeira mostra revisitada. A segunda a ser lembrada, “Arteônica”, de 1971, teve curadoria de Waldemar Cordeiro e é considerada uma das primeiras exposições de arte computacional de São Paulo. Logo vem “O Objeto na Arte – Brasil Anos 60”, de 1978. “A assimilação do objeto como nova categoria artística sinalizou uma abertura de caminho para as novas mídias que começaram a surgir”, explica Denise.

Essas novas mídias são o carimbo, o xerox, a arte postal e o vídeo, contemplados na mostra “Arte Novos Meios – Multimeios: Brasil 70/80”, de 1985, que empreendeu um primeiro esforço de historiografar a videoarte brasileira, apresentando desde o antológico vídeo “Passagens”, de Annabella Geiger, ao raro “Olinda”, de Regina Vater e Paulo Bruscky.

A segunda metade da mostra é formada por um expressivo núcleo contemporâneo, com obras de artistas como Ana Maria Tavares, Anaisa Franco, Lucas Bambozzi e a dupla Rejane Cantoni e Leonardo Crescenti. Seus trabalhos efetivamente se enquadram no grande conceito regente da mostra, criando situações tão instáveis, desconcertantes e radicais quanto uma tempestade meteorológica provocada por ondas sonoras, caso de “Tormenta Azul Brilhante”, de Luis Duva, e a desconstrução do eixo histórico e arquitetônico de Brasília, no vídeo “Eixo X”, de Alexandre Rangel e Rodrigo Paglieri.

Posted by Fábio Tremonte at 5:27 PM

Bienal sob nova luz por Paula Alzugaray, Istoé

Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada na Istoé em 29 de setembro de 2010

A 29ª Bienal de São Paulo é inaugurada com as contas saneadas, recupera o prestígio mundial e mobiliza a sociedade ao eleger a política como tema

Quarenta anos se passaram desde que Artur Barrio espalhou suas “Trouxas Ensanguentadas” em um rio de Belo Horizonte. Esse comentário cifrado sobre a vida controlada pelo regime militar foi a forma encontrada pelo artista para romper um silêncio imposto. Hoje os registros fotográficos dos atos de “terrorismo poético” de Barrio estão expostos na 29ª Bienal de São Paulo, ao lado de outras 850 obras que expressam diferentes maneiras de atuar politicamente por meio da arte. Com um orçamento três vezes maior que o da edição anterior, a Bienal renasce sob o signo do binômio “arte e política”. “Queremos mostrar como a arte nos ajuda a repensar as convenções que orientam nossas vidas”, diz o cocurador Moacir dos Anjos.

Ao abrir seus microfones para as vozes de 159 artistas, a Bienal apresenta discursos com variados graus de politização. Há desde o posicionamento explícito do pernambucano Gil Vicente, que na série de desenhos “Inimigos” se autorrepresenta como assassino de líderes políticos brasileiros e mundiais, até a explosão de luz e sons do “Inferninho”, de Luiz Zerbini, instalação de caráter dionisíaco que também expressa, em sua evocação à festa, um componente revolucionário. Zerbini convida o público à participação fazendo uso de um altíssimo volume de decibéis. Mas os desenhos de Gil Vicente também gritam. Antes mesmo da inauguração, evocaram a ira da Ordem dos Advogados do Brasil, que pediu a sua retirada da mostra. “É desalentador que a censura parta da OAB, instituição que se destacou pela liberdade de expressão”, diz o cocurador Agnaldo Farias, em posição respaldada pelo Ministério da Cultura. “A autonomia da obra de arte é um patrimônio fundamental. Não é preciso voltar a Magritte para entender o que é ‘Ceci N’est Pas une Pipe’”, afirma José Luiz Herência, secretário de políticas culturais do MinC, citando a tela do pintor surrealista René Magritte, que afirma a diferença entre a realidade e sua representação.

A atual direção do evento, ao negar a retirada das obras, assume uma posição substancialmente diferenciada de mostras anteriores, marcadas por casos de repressão e censura.
Na 27ª edição, a Fundação Bienal vetou a obra “Guaraná Power”, do coletivo dinamarquês Superflex, que fazia crítica ao monopólio do mercado do guaraná. Já a repressão assumida pela curadoria em relação à invasão de pichadores na edição passada é hoje questionada.
“Ao reduzir o que houve a um caso de polícia, a fundação perdeu uma oportunidade de reflexão”, afirma Moacir dos Anjos, que incluiu o grupo Pixação SP na atual mostra. “Não podería­mos desconsiderar a existência de um grupo que usa a cidade de São Paulo como um caderno em branco para manifestar um ponto de vista sobre o mundo.”

Pichadores ganham voz e o microfone é um símbolo reincidente nesta edição. Está presente no palanque performático que o argentino Roberto Jacoby montou a favor da campanha de Dilma para a Presidência e também na instalação sonora “Gabinete do Dr. Estranho”, de Livio Tragtenberg, que edita seu trabalho a partir de arquivos digitais de áudio e vídeo recebidos do público, convidando-o também a usar um microfone. Outro símbolo político evidente é a bandeira, descolorida e reduzida ao branco e ao preto em “Apolítico”, do cubano Wilfredo Prieto, e em “Bandeira Branca”, de Nuno Ramos, uma obra sonora monumental instalada no coração do Pavilhão que é também um viveiro de urubus. Luto, litania e redenção são alguns dos conceitos que se sobrepõem nesse trabalho que parece representar um retrato do Brasil contemporâneo.

Posted by Fábio Tremonte at 5:18 PM

setembro 28, 2010

"Toda arte flutua num mar de palavras" por Silas Martí, Folha de S. Paulo

Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 28 de setembro de 2010

Joseph Kosuth, norte-americano que inventou a arte conceitual, repudia forma e mercado em nome das ideias

Artista está na Bienal de São Paulo com painéis que ampliam definições dos pontos cardeais, trabalho feito em 1967

Joseph Kosuth tira uma caneta preta do bolso e pinta por cima de manchas brancas, falhas na impressão de seus quatro painéis expostos na Bienal de São Paulo. Um segurança corre para impedir, e Kosuth reage brandindo sua credencial de artista.

São dois lados da figura estranha que é Kosuth. Aquele homem que repudiou a forma, de rosto desconhecido mesmo para quem conhece sua obra, tentava ali corrigir justo a forma de seu trabalho.

No café do Museu de Arte Moderna, até os curadores da Bienal perguntavam quem era o senhor todo de preto, de chapéu, óculos e bolsa também negros, que olhava pela janela as esculturas no jardim do parque Ibirapuera.

Kosuth é o americano que no auge do expressionismo abstrato dos anos 50, aquele dos respingos alucinados de Jackson Pollock e campos de cor de Mark Rothko, rompeu com a pintura, a escultura e com tudo que veio antes.

Do nada, queria uma arte calcada na linguagem, na exploração semântica. Tentava rever a secura asfáltica da vida em forma de obra de arte.

Isso quer dizer que Kosuth opera no intervalo -também semântico- entre ver e olhar. "Arte se baseia em falácias", resume. "Sabemos que ver não é o mesmo que olhar, que alguém pode nunca olhar de verdade para algo que está vendo há dez anos."

Ou ouvindo. Seus primeiros trabalhos, que inventou quando pensava que tudo já tinha sido feito, eram ampliações de definições de palavras extraídas do dicionário em letreiros preto e branco.

Transformavam a palavra escrita e ouvida em objeto visual escancarado como revelação, enunciados com a pretensão de anular nuances e distorções dos significados.

"Acreditava que um artista devesse fugir à tradição", lembra. "Ser artista é fazer perguntas sobre o significado da arte e estar engajado na produção de significados, isso deve ser a tarefa sempre."

Kosuth então se desvencilhou da forma. Na busca por esses significados, consultou primeiro os dicionários, depois os livros de filosofia. Quase toda sua obra são palavras, em painéis monocromáticos, como os da Bienal, ou escritas em néon, mas nunca figura, paisagem, cor.

"Quando alguém faz um trabalho figurativo, arrisca ter a obra abraçada pelo público, acolhida demais", diz Kosuth. "Perde a potência, a capacidade de fazer perguntas, despreza o dever primordial de levantar questões."

Sem usar as próprias palavras, Kosuth avança sobre o discurso dos outros, de Nietzsche e Wittgenstein a Hitler e Kafka, para sublinhar também o trabalho dos outros, esculturas renascentistas, Picasso, Duchamp.

MAR DE PALAVRAS
"Toda a arte flutua num mar de palavras", afirma. "Artistas formais parecem não entender às vezes que mesmo a forma pura tem um significado, que não operam num vácuo, e por isso um trabalho formal acaba virando só decoração muito cara."

Nas palavras ácidas de Kosuth, é um "rabicho adiposo da modernidade achar que arte é esforço decorativo". E no encalço dessa gordura formal, ele viu surgir formas distintas de olhar para a arte.

"Emergiram histórias paralelas da arte, a história da arte tradicional e a história do mercado da arte", resume. "Damien Hirst e Jeff Koons são figuras emblemáticas dessa história do mercado, mas não contribuíram para um corpo de ideias."

Kosuth acredita que erraram a mão quando quiseram ser sexy demais, do mesmo jeito que Andy Warhol e Roy Liechtenstein, que começaram no preto e branco e então caíram na tentação da cor.

"Artistas não devem ser amados pelas formas, mas pela ideia por trás do trabalho", resmunga Kosuth, que ainda se veste todo de preto.

Posted by Fábio Tremonte at 4:02 PM | Comentários (1)

A construção do corpo coletivo: A dimensão política da obra de Lygia Clark por Carlos Alberto Dias, Panorama Crítico

Matéria de Carlos Alberto Dias originalmente publicada na Revista Panorama Crítico em agosto/setembro de 2010

A sensação é de incomodo. Incomodo pela impossibilidade de realizar um gesto tão simples como pegar uma bola de tênis. Gesto corriqueiro, o qual faríamos automaticamente se fossemos solicitados, torna-se um verdadeiro suplício quando tentamos realiza-lo vestindo a grossa luva de borracha forrada por grossa lona.

Minha mão não sente a bola, por isso não calcula corretamente o gesto. A bola escorrega da mão/luva. Mesmo quando, com dificuldade, consigo segurar a bola, é com se não a houvesse pegado, pois não a sinto em minhas mãos.

O que impede a realização deste simples e corriqueiro gesto cotidiano? A falta de tato, isto é falta de sensação. Vestir a luva gera a impossibilidade de sentir. Eis o paradoxo proposto pela artista: deixar de sentir, para ressentir. Ou melhor, ser impedido de sentir para recuperar a consciência do sentimento, da percepção, como forma de conhecimento do mundo, como perspectiva da razão. O bloqueio, e não a estimulação, da sensação torna-se a estratégia recorrente na obra de Ligia Clark a partir de 1966 quando a artista realiza as primeiras obras tendo o corpo como suporte (FABBRINI, 1994).

A sensação é de incomodo. Incomodo pela impossibilidade de realizar um gesto tão simples como pegar uma bola de tênis. Gesto corriqueiro, o qual faríamos automaticamente se fossemos solicitados, torna-se um verdadeiro suplício quando tentamos realiza-lo vestindo a grossa luva de borracha forrada por grossa lona.

Minha mão não sente a bola, por isso não calcula corretamente o gesto. A bola escorrega da mão/luva. Mesmo quando, com dificuldade, consigo segurar a bola, é com se não a houvesse pegado, pois não a sinto em minhas mãos.

O que impede a realização deste simples e corriqueiro gesto cotidiano? A falta de tato, isto é falta de sensação. Vestir a luva gera a impossibilidade de sentir. Eis o paradoxo proposto pela artista: deixar de sentir, para ressentir. Ou melhor, ser impedido de sentir para recuperar a consciência do sentimento, da percepção, como forma de conhecimento do mundo, como perspectiva da razão. O bloqueio, e não a estimulação, da sensação torna-se a estratégia recorrente na obra de Ligia Clark a partir de 1966 quando a artista realiza as primeiras obras tendo o corpo como suporte (FABBRINI, 1994).

Diante da perplexidade quase paralisante da Pop art perante o poder da imagem, Ligia Clark compreende que a produção imagética no mundo contemporâneo representa o principal meio ideológico de alienação do homem e faz desta compreensão estética e política da questão da imagem no mundo contemporâneo o programa de suas práticas artísticas. É como se Ligia Clark perguntasse aos seus contemporâneos: Qual o sentido de produzir mais sensações para um homem que, saturado de sensações, aliena-se cada vez mais de seu próprio corpo e por isso mesmo torna-se cada vez mais anti-social?

Instruída pelas teorias psicanalíticas, pelo existencialismo, mas sobretudo pela fenomenologia de Merleau-Ponty (FABBRINI, 1994), Ligia entende não só que a hiper-estimulação causada pelos meios produção e comunicação de massa, e sobretudo pelo discurso da propaganda, são os responsáveis políticos pela alienação do homem, mas entende perfeitamente os mecanismos estéticos pelas quais a alienação política se constrói. Ligia entende que a alienação de cada indivíduo se constituiu como alienação de seu ‘corpo próprio’ (Merleau-Ponty,1994) através do hiper-estímulo sensorial que constrói no indivíduo uma couraça de insensibilidade e apercepção do mundo e de si mesmo, que em última análise é a apercepção do outro e do espaço coletivo. Por esta razão, suas experiências, não se limitam ao estímulo sensorial de indivíduos, porque que isto redundaria inútil estímulo perdido entre todas as estimulações já recebidas pelo homem urbano.

Assim, na vivência das obras-experiências de Ligia Clark o homem urbano é impedido de sentir para recuperar a consciência da sua forma de sentir, para recuperar a consciência de suas formas de perceber o mundo e sobretudo para recuperar sua capacidade de partilhar suas percepções e sentimentos do mundo.

Se as obras de Ligia houvessem estacionado em propostas de ressensibilização de indivíduos, estariam plenamente corretas as interpretações que circunscreve suas obras no circulo do movimento hedonismo sensorialista dos anos sessenta que se tornou precursor do culto fascista ao corpo no qual vivemos hoje. Fascista por instigador de comportamentos anti-sociais.

A observação atenta do paradoxo no qual se move a produção artística de Ligia Clark a partir de 1966, nos leva a interpretação oposta: Ligia Clark busca a construção do corpo coletivo e tem plena consciência política das consequências de sua obra, isto é tem plena consciência que sua obra pretende a reconstrução do espaço coletivo da sociedade esfacelada pela hiper-individualização.

Diante da perplexidade quase paralisante da Pop art perante o poder da imagem, Ligia Clark compreende que a produção imagética no mundo contemporâneo representa o principal meio ideológico de alienação do homem e faz desta compreensão estética e política da questão da imagem no mundo contemporâneo o programa de suas práticas artísticas. É como se Ligia Clark perguntasse aos seus contemporâneos: Qual o sentido de produzir mais sensações para um homem que, saturado de sensações, aliena-se cada vez mais de seu próprio corpo e por isso mesmo torna-se cada vez mais anti-social?

Instruída pelas teorias psicanalíticas, pelo existencialismo, mas sobretudo pela fenomenologia de Merleau-Ponty (FABBRINI, 1994), Ligia entende não só que a hiper-estimulação causada pelos meios produção e comunicação de massa, e sobretudo pelo discurso da propaganda, são os responsáveis políticos pela alienação do homem, mas entende perfeitamente os mecanismos estéticos pelas quais a alienação política se constrói. Ligia entende que a alienação de cada indivíduo se constituiu como alienação de seu ‘corpo próprio’ (Merleau-Ponty,1994) através do hiper-estímulo sensorial que constrói no indivíduo uma couraça de insensibilidade e apercepção do mundo e de si mesmo, que em última análise é a apercepção do outro e do espaço coletivo. Por esta razão, suas experiências, não se limitam ao estímulo sensorial de indivíduos, porque que isto redundaria inútil estímulo perdido entre todas as estimulações já recebidas pelo homem urbano.

Assim, na vivência das obras-experiências de Ligia Clark o homem urbano é impedido de sentir para recuperar a consciência da sua forma de sentir, para recuperar a consciência de suas formas de perceber o mundo e sobretudo para recuperar sua capacidade de partilhar suas percepções e sentimentos do mundo.

Se as obras de Ligia houvessem estacionado em propostas de ressensibilização de indivíduos, estariam plenamente corretas as interpretações que circunscreve suas obras no circulo do movimento hedonismo sensorialista dos anos sessenta que se tornou precursor do culto fascista ao corpo no qual vivemos hoje. Fascista por instigador de comportamentos anti-sociais.

A observação atenta do paradoxo no qual se move a produção artística de Ligia Clark a partir de 1966, nos leva a interpretação oposta: Ligia Clark busca a construção do corpo coletivo e tem plena consciência política das consequências de sua obra, isto é tem plena consciência que sua obra pretende a reconstrução do espaço coletivo da sociedade esfacelada pela hiper-individualização.

Mesmo as primeiras obras focadas na ressensibilização individual, como é o caso da “Luva Sensorial” ou da “Máscara Sensorial” , obras realizadas em 1968, apontam na direção da construção de vivências sensoriais coletivas, pois o indivíduo é ressensibilizado para reaprender a viver coletivamente, isto é para reaprender a compartilhar coletivamente suas percepções e sentimentos do mundo. As obras realizadas na França entre 1970 e 1976 são denominadas significativamente de “Espaço do Corpo Coletivo” demonstra com eloqüência o movimento de suas obras em direção ao aprendizado coletivo das vivências coletivas.

“Seu corpo desbloqueado, diz Ligia Clark, funda um novo campo antropológico: o espaço da infância, do carnaval do rito, das inversões sociais, da terapia; subtraíndo-se à agressão infamante ou à adoração narcísica, revive com intensidade a riqueza de suas faculdades perceptivas. Lygia, com sua arqueologia (inclinada para o fetichismo das origens que reenvia a história à natureza), criou o espaço para a “realização” da “geografia das utopias” (FABBRINI, 1994).

Ao construir esta “geografia das utopias”, Ligia Clark construiu e legou para a cultura humana os meios concretos para uma ação política transformadora e conseqüente que visa mais do que a superação do círculo de fogo da individuação alienada para apontar na direção da construção do corpo coletivo como espaço e tempo da construção da liberdade individual e coletiva, superando assim o dilema político do século XX que nos colocou a obrigação da escolha entre a liberdade individual ou a paz coletiva.

Referências Bibliográficas
FABBRINNI, Ricardo Nascimento; O espaço de Lígia Clark: São Paulo, 1994; Editora Atlas.
MERLEAU-PONTY, Maurice; Fenomenologia da Percepção: São Paulo, 1994; Ed. Martins Fontes.
http://www.lygiaclark.org.br/associacaoPT.asp - acessado em março e maio 2010.

Posted by Fábio Tremonte at 3:07 PM

setembro 27, 2010

Artista tailandês abre pavilhão das palmeiras por Silas Martí, Folha de S. Paulo

Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 27 de setembro de 2010

Uma tempestade no Caribe forçou Rirkrit Tiravanija a se refugiar num hotel. Lá de dentro, gravou imagens das palmeiras arrasadas pela ventania.

"Via da janela essas árvores balançando", lembra o artista tailandês. "Pensei como essas plantas sobreviveram ao pior que há na humanidade."

No caso, a palmeira, símbolo tropical por excelência num mundo dominado pelo eurocentrismo, serve aqui de metonímia para toda uma situação de cartografias emergentes na era pós-colonial.

Tiravanija acaba de montar no Instituto Inhotim, em Brumadinho, arredores de Belo Horizonte, sua casa tropical, uma construção suspensa de alumínio, toda vazada.

"Palm Pavilion" é a obra que estava no pavilhão da Bienal há quatro anos, agora transplantada para o meio do verde que brota da terra roxa mineira.

"É a natureza testemunhando a ascensão e a derrocada da humanidade", diz Tiravanija. "A planta está no fundo de muitos momentos históricos."

Sua casa no meio da floresta remete, de fato, a outros tempos. É uma "cópia malfeita" da "Maison Tropicale", de Jean Prouvé, arquiteto francês que inventou construções pré-fabricadas para as colônias francesas na África.

Do mesmo jeito, seu pavilhão foi feito na Tailândia e pensado para estar no Brasil, transportado da Ásia para a América do Sul. Sublinha uma crítica à globalização e, ao mesmo tempo, à noção de modernidade que embalou Prouvé e outros arquitetos.

"Sempre nos adaptamos a algum tipo de modernismo em busca de algum tipo de progresso", diz o artista.
"Nesse sentido, até Niemeyer foi um pós-modernista, trabalhando fora do centro." Na visão de Tiravanija, só Lina Bo Bardi conseguiu aliar o moderno à experiência tropical. "Ela fez um modernismo com alma", resume. "Tinha uma alma livre do sentido de ordem, aberta e natural."

Longe disso, sua casa no meio do mato alude à coerção de movimentos imposta na globalização. "Não estamos livres para nos movimentar", diz Tiravanija. "Esse idealismo do movimento é importante para que as sociedades possam mudar."

Posted by Fábio Tremonte at 4:11 PM

Inhotim apresenta curadoria eficaz por Fábio Cypriano, Folha de S. Paulo

Matéria de Fábio Cypriano originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 27 de setembro de 2010

Com espaços para Miguel Rio Branco e Cosmococas, centro mostra arte brasileira de forma correta

Na última quinta, mais duas galerias abriram em Inhotim - Centro de Arte Contemporânea, do colecionador mineiro Bernardo Paz, ambas fora do núcleo inicial.

Os novos pavilhões foram projetados por Alexandre Brasil Garcia e Carlos Alberto Maciel, do escritório Arquitetos Associados, e configuram-se como inserções monumentais em meio à paisagem, mas distintos.
A galeria do artista Miguel Rio Branco é caracterizada pelo contraste: uma imensa caixa de aço em meio à floresta. O edifício, com dois pavimentos, reúne 12 obras do fotógrafo, de um extenso período: 1976 a 2004.

Polípticos (fotos apresentadas em conjuntos), instalações e filmes dão conta da complexidade de Rio Branco na criação de imagens.

Algumas obras são documentais, caso da radical "Nada Levarei Quando Morrer, Aqueles que Me Devem Cobrarei no Inferno" (1985), que também está em exibição na 29ª Bienal de São Paulo, enquanto outras são exercícios mais livres e poéticos, como "Entre os Olhos o Deserto" (1997), que mescla os gêneros retrato e paisagem.

Ao apresentar de forma extensiva a obra de Rio Branco, Inhotim, assim como fez com Cildo Meireles, cumpre um papel que instituições de arte brasileiras não conseguem dar conta: apresentar a produção nacional contemporânea de forma adequada.

Essa missão também é vista na outra galeria nova, com as cinco Cosmococas de Hélio Oiticica e Neville d'Almeida, de 1973. A construção elegante é coberta com uma pedra mineira escura, que mimetiza seu entorno. Por dentro, todas as obras convergem para um mesmo espaço, o que não hierarquiza a visita.

ESPAÇOS GENEROSOS
As Cosmococas, que foram vistas na Pinacoteca em 2003, são uma das obras fundamentais de Oiticica e parecia absurdo que elas podiam estar em mostras permanentes de museus estrangeiros e só temporariamente no país.

A apresentação de todas elas -Trashiscapes, Onobject, Maileryn, Nocagions e Hendrix-War- em espaços generosos reforça ainda mais o caráter de Inhotim como local único para se conhecer a produção nacional.
Outras duas obras foram ainda inauguradas em espaços abertos de Inhotim: "Desert Park", de Dominique Gonzalez-Foerster, e "Palm Pavilion", de Rirkrit Tiravanija. Ambos, com projeção internacional, apresentam trabalhos que lidam com questões brasileiras.

O primeiro insere na paisagem simulações de proteções em pontos de ônibus, em debate sobre o modernismo nacional, enquanto o segundo, presente na 27ª Bienal (2006), é outra simulação, agora das casas projetadas pelo arquiteto Jean Prouvé para as colônias francesas.

São ótimas escolhas curatoriais, pois atestam que Inhotim pode apresentar certa originalidade em relação aos demais centros internacionais de arte.

Posted by Fábio Tremonte at 4:03 PM

Urubu da Bienal está na lista de "vulneráveis", diz estudioso por Reinaldo José Lopes, Folha de S. Paulo

Matéria de Reinaldo José Lopes originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 27 de setembro de 2010

Animal faz parte de instalação de Nuno Ramos invadida no sábado

A estrela mais improvável da Bienal de 2010 integra a lista de animais ameaçados no Estado de São Paulo.
Os urubus-de-cabeça-amarela que fazem parte da instalação "Bandeira Branca", de Nuno Ramos, motivaram abaixo-assinado na internet e ato de vandalismo no último sábado, quando um pichador inscreveu na instalação "liberte os urubu" (sic).

O bicho é um soberbo localizador de carniça que nem sempre aproveita a presa. A culpa é das outras espécies de urubu, diz o ornitólogo Guilherme Renzo Rocha Brito, pós-doutorando do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio.

"Ele é o menor dos urubus, com olfato aguçado. Tende a voar baixo para localizar carcaças pelo cheiro. Por isso, chega primeiro ao alimento, mas come uma porção menor porque acaba enxotado por espécies maiores."

Fiel ao nome, o urubu-rei, com bico potente, acaba se banqueteando com vantagens em relação aos demais.

Em São Paulo, há poucos registros do bicho, em geral encontrado mais perto da fronteira com o Mato Grosso do Sul. Na lista de ameaçados do Estado, ocupa a categoria de "vulnerável", situação que inspira cuidados.

No resto do Brasil, a espécie só não está presente na Amazônia. O bicho prefere regiões alagadiças e não se dá tão bem em ambientes urbanos, "embora possa ser encontrado em lixões de cidades pequenas", diz Brito.

SEM CLIMA
A espécie não é tão gregária quanto seus primos. "Sabe-se pouco sobre os hábitos reprodutivos da espécie. Os ovos podem ser colocados em ocos de pau, embaixo de arbustos ou cavidades de pedra", diz o especialista.

Para Brito, é improvável que os bichos se arrisquem a constituir família em meio ao bafafá. "Numa situação estressante, é a última coisa na qual vão pensar", brinca.

Segundo o ornitólogo, é difícil mensurar impactos negativos do contexto artístico no comportamento das aves.

"Barulho e movimento de gente são estressantes, mas pode ser que estejam acostumados, já que nasceram em cativeiro. Também por isso, podem não estar acostumados a voar, então o confinamento não seria problema."

"O que talvez seria mais preocupante é o ciclo de luz. Seria importante saber se as luzes são apagadas quanto a Bienal fecha", diz Brito.

"Quanto à comida, provavelmente estão recebendo coisa melhor do que teriam na natureza", diz Brito em tom de brincadeira, lembrando que os urubus não têm rejeição à carne fresca.

URUBU BIENAL

Tudo o que você sempre quis saber sobre o urubu da Bienal

Nome da espécie:
urubu-de-cabeça-amarela (Cathartes burrovianus)

Tamanho: 60 cm de comprimento, envergadura de asa de 1,60 m. É o menor dos urubus nativos

Habitat natural:
em geral, gosta de ficar perto de áreas alagadas ou abertas mais secas, pode aparecer ocasionalmente em áreas urbanas
Vida social: aparece com mais frequência em grupos de poucos indivíduos

Comportamento:
graças ao bom faro, costuma voar baixo e chegar primeiro às carniças, alimentando-se rápido enquanto carniceiros maiores não aparecem

Reprodução:
pouco conhecida, mas sabe-se que há uma preferência por colocar ovos em ocos de pau

Distribuição geográfica:
em todo o Brasil; é bastante comum no Nordeste; em SP, faz parte da lista de animais ameaçados

O confinamento pode ser ruim para o animal?
Os principais problemas são o barulho e a falta de luz natural, que podem estressá-lo. Por outro lado, como são animais de cativeiro, já podem estar acostumados com isso.

Posted by Fábio Tremonte at 3:53 PM | Comentários (1)

"Uma Bienal precisa ser mais ousada" por Fábio Cypriano, Folha de S. Paulo

Matéria de Fábio Cypriano originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 27 de setembro de 2010

Curador espanhol Agustín Pérez Rubio e brasileira Solange Farkas elogiam, no entanto, a montagem e os terreiros

Dupla cita artistas como Cinthia Marcelle e Jonathas de Andrade como alguns dos mais interessantes da mostra

A retomada institucional da Bienal revela-se mais importante do que o próprio conteúdo da 29ª Bienal de São Paulo, segundo os curadores Solange Farkas, diretora do Videobrasil e do Museu de Arte Moderna da Bahia, e Agustín Pérez Rubio, diretor do Museu de Arte Contemporánea de Castilla y León.

Por quatro horas, no dia de abertura para convidados, na última terça-feira (portanto, antes da ação de pichador anteontem), os curadores visitaram a mostra acompanhados da reportagem da Folha e, ao final, fizeram um balanço.

A conclusão: essa é uma Bienal sem risco. "Uma Bienal precisa ser mais ousada, funcionar como laboratório de experimentação, e isso não se vê aqui", disse Rubio.

Farkas, mais contida, concorda que "risco a Bienal não tem", mas justifica no contexto histórico: "Entendo os curadores, pois trabalharam após o trauma da Bienal organizada pelo Ivo Mesquita", disse referindo-se à Bienal do Vazio, que teve projeto ousado, mas fracassado.

Ambos, no entanto, elogiaram a concretização da mostra: "Após as crises, essa Bienal é muito importante e nota-se que a estrutura da Fundação agora é forte e o circuito internacional está presente", disse Rubio.
O curador contou quantos dos 159 artistas da Bienal estiveram na Documenta 11, de 2002, e chegou ao número de 20: "Isso mostra que há pouca pesquisa".

Farkas contemporiza: "Os curadores tiveram menos de um ano para organizar a Bienal; está acima da média".

O eixo da exposição -a relação entre arte e política- também não foi consenso. "Eles o abordaram de forma mais poética, não tão literal. Há obras muito boas, apesar de eu não entender como alguns trabalhos estão aqui", diz Farkas.

"Os curadores abriram tanto esse espectro que ele se tornou um poço sem fundo. Como tema, essa Bienal não traz nenhuma nova contribuição", disse Rubio.

TERREIROS ELOGIADOS
Contudo, a dupla elogiou a montagem e os terreiros: "É a primeira vez que se tem uma expografia tão feliz, que consegue dialogar com a arquitetura de Niemeyer", afirma Farkas. Segundo ela, "os terreiros são onde de fato se cria uma questão política".

Para o espanhol, um dos principais problemas é a distinção da produção dos anos 1960 e 1970 e da atual.
Apesar das críticas, ele elogia alguns momentos da mostra: "Há eixos mais claros, como quando Sue Tompkins é vista próxima de Mira Schendel, ou Leonilson, próximo de Miguel Angel Rojas e Nan Goldin.

Essas contextualizações são importantes".

Se dependesse dos dois curadores, não haveria polêmicas na 29ª Bienal, pois tanto o trabalho do argentino Roberto Jacoby como o do pernambucano Gil Vicente, foram questionados: "São obras óbvias demais, não parecem políticas e nem bem realizadas", conclui Rubio.

Posted by Fábio Tremonte at 3:48 PM

Segundo dia da Bienal tem nova obra pichada por Silas Martí, Folha de S. Paulo

Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Folha.com em 27 de setembro de 2010

No dia seguinte ao ataque de um pichador à instalação do artista Nuno Ramos no sábado, a Bienal de São Paulo amanheceu, ontem, com outra obra pichada.

Do lado de fora do pavilhão, a estrutura construída pelo artista Kboco, feita em parceria com o arquiteto Roberto Loeb, teve duas faces vandalizadas.

A inscrição "invasor" apareceu pichada sobre a pintura de Kboco, artista que começou sua carreira como grafiteiro e depois migrou para as galerias e os museus.

"Não estou conseguindo assimilar o que aconteceu", disse o artista à Folha. "A Bienal é muita adrenalina."

Kboco reclamou que sua obra, que fica do lado de fora do pavilhão, não teve nenhum tipo de vigilância e que permaneceu isolada do resto da mostra até agora.

Ele ainda não decidiu se vai restaurar a obra ou se deixará visíveis as marcas da intervenção urbana.

"Se eu for arrumar, é algo rápido, mas não sei se vou querer arrumar. Não sei ainda quantificar os danos."

"Não deu para fazer uma avaliação exata", acrescentou um dos curadores-gerais da mostra, Agnaldo Farias, que visitou ontem o trabalho.

"A obra é mais vulnerável porque está do lado de fora, mas não contávamos com isso. Estávamos tão preocupados com o que aconteceu do lado de dentro que nos descuidamos do lado de fora."

TUMULTO NA ABERTURA

Na noite de sábado, dia em que a Bienal foi aberta ao público, houve protestos de ambientalistas e pancadaria entre seguranças, policiais e visitantes em torno da obra de Nuno Ramos, que mantém três urubus vivos no vão central do prédio.

A polícia invadiu o pavilhão para conter o tumulto.

Não se sabe se Djan Ivson, autor do ataque à instalação de Nuno Ramos, que pichou "libertem os urubu" numa das estruturas de areia socada da obra, é o mesmo que está por trás da ação que causou danos ao trabalho de Kboco e Roberto Loeb.

"Não entendi por que não puseram responsáveis para guardar a obra", disse Loeb. "Isso é responsabilidade da Bienal, não faz sentido deixar o trabalho isolado."

Um dos seis terreiros construídos por artistas e arquitetos na Bienal, chamado de "Dito, Não Dito, Interdito", fica do lado de fora do prédio, inacessível aos visitantes.

Ontem, na entrada da Bienal, houve revistas mais minuciosas dos visitantes. Mas, mesmo com os ataques, responsáveis pela segurança disseram não ter alterado procedimentos na entrada.

"Temos um detector de metais que está nas mãos das pessoas desde a abertura para convidados", afirmou Emilio Kalil, produtor-executivo da mostra. "É a mesma segurança desde o início."

Curadores e diretores da Bienal devem se reunir hoje, num encontro de emergência, para decidir o que fazer com relação à obra de Kboco.

Posted by Fábio Tremonte at 3:19 PM

Convite revela medo da Bienal, diz pichadora presa em 2008 por Diógenes Muniz, Folha de S. Paulo

Matéria de Diógenes Muniz originalmente publicada na Ilustríssima da Folha de S. Paulo em 17 de setembro de 2010

Para Caroline Pivetta, 25, presa em flagrante em 2008 por pintar com spray as paredes do pavilhão projetado por Oscar Niemeyer no parque Ibirapuera, a Bienal tem medo dos pichadores e por isso aceitou a participação do grupo nesta edição. "Mesmo porque a gente é muito mais forte do que eles", afirma.

Carol Susto's, como assinava seus autos de prisão, foi condenada por formação de quadrilha e destruição de bem protegido por lei. Recorre em liberdade. Desde agosto deste ano vive em Alvorada (periferia da Grande Porto Alegre) com a filha Virgínia, de menos de 1 ano.

O pai da criança morreu aos 22 anos, ao tentar pichar um prédio da av. Rebouças (zona sul de SP).

"Ele foi, mas foi feliz por ter representado a cena paulistana da pichação tão bem", diz a jovem. Caroline planeja ir ao vernissage da Bienal, que acontece na terça-feira (21). Se não fosse mãe, "chutaria o balde novamente" na abertura do evento, explica.

Procurado pela reportagem, o curador-chefe Moacir dos Anjos disse que o objetivo da Bienal não é "se redimir". "Seria muito pequeno da nossa e da parte dos pichadores, não é essa a questão. Foi um erro a Bienal de 2008 ter reduzido aquele episódio a um caso de polícia." O evento começa no dia 25 deste mês.

Leia abaixo trechos da entrevista de Caroline Pivetta à Folha por telefone.

Folha - Você vem para a Bienal?

Caroline - Não tenho certeza ainda. Minha situação financeira não está legal. Estou esperando a resposta dos meninos [pichadores]. O Djan [Ivson] diz que vai bancar minha passagem. Mas também estou esperando uma resposta de um serviço para trabalhar como atendente de telemarketing, não queria perder essa oportunidade. De qualquer forma, estamos vendo passagem para a próxima segunda-feira [20], um dia antes da vernissage.

Folha - Por que você não está nesse coletivo "Pixação SP" que vai integrar a Bienal deste ano?

Caroline - Eu pensei muitas vezes --em ir, em não ir-- e algo me diz que não é para eu estar lá dessa forma. Pode ser um pingo de mágoa, não sei explicar.

Folha - Quando você estava na cadeia, me disse o seguinte: "Tanto grafite, quanto pixo são underground, coisa do fundão. Não são feitos para exposição em galeria. A parada que eu faço é na rua, é para o povo olhar e não gostar. Uma agressão visual". Isso explica?

Caroline - Olha, nem tanto por essa parada de ser corrompido ou não. Hoje em dia eu já cheguei à conclusão de que não há nada de mal em um cara ganhar dinheiro com isso, se ele for um cara que representou, que teve uma caminhada legal e se ele puder levantar a voz a respeito, entende? Mesmo porque, por mais que ele vá para dentro de uma galeria e ganhe dinheiro com isso, não é todo mundo que vai aceitar, não tem como isso ser domesticado. Por mais que algumas pessoas aceitem, por mais que se ganhe dinheiro, por mais que seja legalizado, ainda vai incomodar. Tenho certeza que nunca vai ser domesticado.

Folha - Tem muito pichador que não compartilha dessa opinião sobre ganhar dinheiro com o "pixo".

Caroline - Sim, o pessoal da antiga. Não é que eles batem de frente com a gente, mas não concordam. Eles estão sempre fazendo críticas, não entenderam e não vão entender. Na época deles pichar era bem mais difícil também.

Folha - Voltando à Bienal, parece que nem pichadores, nem curadoria sabem bem o que vai acontecer e...

Caroline - E pode ser que tenha alguma surpresa no dia, né?

Folha - Sim, vários pichadores estão sendo convidados. Qual vai ser, na sua opinião, a reação deles neste retorno ao pavilhão do Ibirapuera?

Caroline - A gente não pode falar para eles faz ou não faz, entende? Quem vai tomar essa partida são eles mesmos. Só sei que, por tudo que passei... hoje em dia, se eu fosse eu sozinha, se eu não tivesse minha filha, talvez chutasse o balde novamente. Mas, hoje, eu tenho que pensar não só em mim, mas também na minha filha. Mesmo porque ela só tem eu, o pai dela morreu, então é complicado.

Folha - O que você acha da Bienal abrigar pichadores nesta edição, após o conflito que houve em 2008?

Caroline - Acho que eles tiveram um pouco de medo, sei lá, de receio, sabe? Do tipo, "vamos se juntar a eles, né". Mesmo porque eu acho que a gente [pichadores] é muito mais forte que eles [Bienal].

Folha - Você tem pichado?

Caroline - Não. Não tem como agora. Minha filha é muito pequena. Não vou sair varando a noite e deixar minha filha em casa para pichar. O mais importante para mim é ela. Antes, era a pichação. E neste mês fez um ano que eu não picho mais. Mas, mesmo assim, continuei colando nos "points" e frequentando as festas. Agora, eu tô parada, mas não posso dizer que larguei para sempre.

Depois bota lá no YouTube "Grilo 13 - Pixar É Humano" e ouve a letra da música. Ela diz exatamente o que é a pichação. É isso: a gente nunca vai ser valorizado, a gente faz porque a gente gosta. O pai da minha filha morreu fazendo o que gostava. E eu tenho certeza que ele foi, mas foi feliz por ter representado a cena paulistana da pichação tão bem.

Folha - Você colocou no seu fotolog imagens de pichações e disse que são dos "herdeiros". O que isso significa?

Caroline- Esses "pixos" são os nomes da minha filha e dos filhos de duas pessoas que faziam [pichação] comigo. Como forma de demonstrar amor por mim e pela minha filha eles jogam o nome dela também nos prédios.

Folha - Quando sua filha crescer, ela vai pichar também?

Caroline - Acho que a criação dela vai ser bem diferente da minha [Caroline não foi criada pelo pai]. Vou saber explicar melhor as coisas para ela.

Posted by Fábio Tremonte at 3:08 PM

Às portas da Bienal, "pixo" busca modelo de negócio no mercado de arte por Diógenes Muniz, Folha de S. Paulo

Matéria de Diógenes Muniz originalmente publicada na Ilustríssima da Folha de S. Paulo em 17 de setembro de 2010

Qual é o preço do "pixo"? Para quem tenta afastá-lo da fachada da sua empresa ou residência, a lata de verniz antirabisco sai por R$ 170. Para quem quer comprá-lo, há duas opções de formato, bem mais caras: as fotografias dos ataques a prédios ou as "tags" --folhas com signos idênticos aos que os pichadores espalham pela cidade, famosas entre quem pratica a modalidade, mas que não foram assimiladas por colecionadores de arte. Ainda.

Enquanto a sociedade debatia se pichadores são artistas marginalizados ou só criminosos em busca de atenção, ou ambos, um grupo em São Paulo entrou no circuito das artes.

Quem visitar a Bienal deste ano perceberá que aumentou o espaço da pichação no maior palco das artes visuais da América Latina. Em 2008, os invasores não tiveram tempo de rabiscar muito mais que um andar do pavilhão do Ibirapuera e quebrar uma vidraça do térreo para escapar da polícia.

Desta vez, os três andares da 29ª Bienal, que abre no fim do mês com o tema "arte e política", receberão materiais organizados pelo trio intitulado "Pixação SP" (composto pelo fotógrafo Adriano "Choque", 23, e pelos pichadores Djan Ivson, 26, e Rafael Guedes Augustaitiz, 26).

Augustaitiz e Ivson lideraram o ataque com spray ocorrido em 2008 ao Pavilhão Ciccillo Matarazzo, que terminou na prisão em flagrante de Caroline Pivetta, enquanto Choque registrava a performance com sua câmera Canon Rebel. Caroline ficou encarcerada na Penitenciária Feminina de Santana por 50 dias. Foi condenada a quatro anos de prisão, em regime semiaberto, por formação de quadrilha e destruição de bem protegido por lei --recorre em liberdade.

Oficialmente, a Bienal 2010 deve expor convites de festas, "tags", vídeos e fotos. Haverá também uma mesa de debates sobre o tema. Um dos nomes cogitados para mediação é o da filósofa Márcia Tiburi, para quem a pichação "é a única lírica que nos resta". CEUs (Centro Educacionais Unificados) pela cidade exibirão o DVD "100 Comédia 3", que mostra bastidores e estratégias de invasões a prédios e demarcações de parapeitos pela capital paulista (veja trailer).

A organização do evento descarta a possibilidade de pichação no pavilhão, alegando que isso "esvaziaria" a potência do que é visto nas ruas. "A pichação ocorre lá fora", diz Moacir dos Anjos, co-curador da Bienal. A questão é tratada com ambiguidade e certa provocação pelos pichadores.

"Vamos convidar o movimento e eu não tenho domínio sobre nenhum pichador. Não posso garantir nada. Se alguém vai pichar ou não, se algum quadro vai ser riscado ou não, isso aí a gente só vai saber no dia. E aí vamos ver mesmo se eles [Bienal] estão prezando mesmo pela pichação. A gente não precisa do aval de ninguém para fazer [pichar]. Se a gente quiser pichar lá tudo, desde o chão até uma obra de Antonio Dias, a gente vai, picha e foda-se", diz Ivson.

Segundo ele, a Bienal arcou com os custos da montagem do que será exposto pelo grupo (R$ 20 mil) e não houve cachê. A curadoria não comenta valores, mas afirma que pichadores receberam as mesmas condições dos outros artistas. Informa ainda que não haverá esquema especial de segurança por conta da presença de pichadores.

Elite do "pixo"

Famoso no circuito do "pixo" pelos serviços prestados entre os anos de 1996 e 2004, quando esteve no auge (literalmente) dos rabiscos em prédios de São Paulo, Ivson se define como "general" do movimento. Hoje, seu empenho é de militante.

"Estou me dedicando mais a divulgar a pichação em outras esferas. Por tudo que já fiz, para mim [a pichação comum] já deu, já tá bom. O que eu quero agora é revolução", diz.

Ivson ganha a vida como ajudante de pintor de prédios residenciais e é pai de duas crianças. "Minha carteira de trabalho é limpa, nunca fui registrado." No ano passado, viajou para a França a convite da Fundação Cartier, um pretigioso centro de arte ao sul de Paris. O cachê? Três mil euros para uma mostra retrospectiva sobre arte de rua. Atualmente, ele estuda a sondagem de uma galeria para vender as "tags" em Berlim, em uma viagem prevista para outubro.

Nas conversas com a reportagem, nos pontos de encontro da pichação em Osasco (Grande SP) e no Paissandu (centro), as entrevistas precisaram ser interrompidas mais de dez vezes. Ivson era saudado por colegas a todo instante, alguns deles dispostos a servir cerveja "na faixa" para o pichador e para a Folha.

As interrupções eram seguidas de recados como "O Djan representa!", enquanto Ivson descrevia quem chegava ("Esse moleque é pichador, quer dizer, ele tem feito mais furto que 'pixo', né..." ou "O monstrão aqui tá arregaçando os prédios lá do centro, sem massagem"). Em certo momento da entrevista, quando um grupo conversava em voz alta ao lado da reportagem, Ivson interveio: "Dá pra falar mais baixo aí? A gente tá gravando!" Silêncio imediato.

"Não sou líder. O líder intelectual é o Rafael [Augustaitiz]", diz, referindo-se ao ex-bolsista de artes visuais do Centro Universitário Belas Artes que apresentou como trabalho de conclusão de curso um ataque de "pixo" à instituição de ensino, em 2008.

O ato na Belas Artes rendeu a Augustaitiz uma visita ao 36º Distrito Policial, no Paraíso, e notoriedade como "Rafael Pixobomb". O "bomb" é um meio-caminho entre a pichação e o grafite. Em vez de traços pontudos e finos, a assinatura sai em letras mais arredondadas e ilustradas.

"Abandonei o [apelido] Pixobomb", conta Rafael. Agora, ele usa a assinatura "Opus666", e risca prédios com letras de "pixo". "Eu só somo no movimento, não tenho nenhuma pretensão de liderar. Eu gosto do barato, gosto de rabiscar mesmo", diz.

No começo de sua trajetória no "pixo", frequentadores dos "points" o achavam excêntrico. "O Rafael é um gênio, um profeta dos nossos tempos. Às vezes eu preciso traduzir o que ele diz até para a mãe dele", diz Ivson.

Augustaitiz evita entrevistas presenciais o quanto pode. Prefere mandar "salves" por e-mail do pequeno apartamento onde mora numa Cohab do Jardim Maria Cristina, em Barueri. Quando a reportagem pediu para que escrevesse alguma coisa sobre sua participação na Bienal, redigiu: "O bom da Bienal 'internacional' é a concentração da nata de adorno-charlatões, arquitetada curatorialmente para assim podermos doutorar."

Foi Rafael quem propôs a ruptura entre pichação e a "street art" em geral. A avaliação dos pichadores era que o grafite estava sendo usado como antídoto do "pixo" --ou seja, ao pagar por um mural com grafites, os comerciantes afastavam os "garranchos". "A galera acha que a gente é Pokémon: nasce pichador e evolui para grafiteiro", diz Ivson.

Performances

Dessa ruptura saíram os "atravessos" à galeria Choque Cultural e ao painéis de grafiteiros (entre eles, o mais famoso da cidade, com traços d'OsGêmeos e bancado pela Associação Comercial de São Paulo no valor de R$ 200 mil). Aos poucos, as performances com cunho politizado e alvos grandiosos ganharam mais atenção do que a corriqueira disputa por espaços na cidade, até então razão de ser da pichação paulistana. Chegou-se inclusive a planejar um ataque de tinta e spray à Prefeitura de São Paulo, abortado em cima da hora por falta de quorum.

"É muito mais pacífico o cara sair com a tinta pra contestar do que pichar só por ego, só para dizer que é melhor do que o outro pichador. Isso ficou para trás", diz Ivson.

Todos os ataques e performances dos pichadores são registrados pelo convidado mais jovem do coletivo, o fotógrafo Adriano Choque. Apesar da relação estreita com o movimento, Choque pede para não ser denominado como pichador ou "fotógrafo de pichadores". Ele admite vir de "um universo oposto" ao dos rapazes que saem das periferias para se debruçar nos parapeitos da capital.

"Não gosto deste rótulo", afirma. "Não compartilho de todos os pontos de vista dos pichadores."

Choque já expôs em Miami e na Cidade do México e suas fotos estão na edição de agosto da revista "Piauí". Em 2011, planeja levar os registros para a Europa. Os colegas dizem que o fotógrafo tem um histórico de pichação pela cidade. Ele nega.

"Nunca fui pichador. Desconheço o motivo do Djan ter afirmado isto", diz. Questionado se já vendeu alguma foto de pichação, responde, sem revelar o preço: "Eu estou expondo, não estou?"

Por enquanto, seus retratos das ações são o material mais "lógico" para comercialização do "pixo" (ou de suas representações). Mas não os únicos. Há planos, por parte dos pichadores, de viabilizar também as folhinhas assinadas no mercado de arte. O preço?

"Estamos tirando uma base pelo que a gente se arrisca, é o preço do nosso seguro de vida. A gente nunca pensou nessa possibilidade de vender a assinatura e agora que tá surgindo não vamos facilitar", diz Ivson, para logo em seguida dizer que cada "tag" --folha tamanho A4 com a "assinatura" do pichador-- valeria R$ 1 milhão.

A reportagem argumenta ser um valor fora de cogitação para estreantes.

"Quer um chute menor do que R$ 1 milhão? R$ 500 mil, no mínimo. A [artista] Beatriz Milhazes vendeu um crochezinho dela por R$ 1 milhão [o nome da tela é "O Mágico"]. A gente quer um milhão também, pô! Vamos ter advogado bom, vamos até tirar nossos manos da cadeia", diz, rindo.

"Acho que o mercado de arte é capaz de absorver muitas coisas. Do mesmo jeito que absorveu o grafite e absorveu, décadas atrás, materiais da arte contemporânea", avalia o curador Moacir Dos Anjos.

Para Márcia Tiburi, o que acontece nas galerias "é mera estética", e a adesão de pichadores ao mercado traz a possibilidade de "perda da revolta". "Isto não quer dizer que a garotada, os artistas, não possam exercitar a contradição --entre a rua e a galeria", explica. De qualquer forma, prossegue, "não acho que o 'pixo' ganhe com a Bienal, acho que como ação radical ele perde; mas, se os pichadores ganharem [dinheiro], quem vai poder dizer algo?"

Anarquizando no Iguatemi

Mesmo sem participar da elaboração da exposição em si, Caroline Pivetta, 25, personagem principal da "Bienal do Vazio", teve contato com curadoria e artistas da 29ª edição do evento. Seu encontro, aliás, foi marcante e ilustra bem como se dá a relação entre os pichadores e a instituição.

No meio deste ano, os curadores Agnaldo Farias e Moacir dos Anjos promoveram um banquete de luxo para 300 pessoas no shopping Iguatemi (zona sul). Na lista de convidados estavam artistas e curadores estrangeiros, o presidente da Fundação Bienal, Heitor Martins, e os pichadores, que insistiram em levar Caroline.

A organização serviu os presentes com vinho Montes Alpha Cabernet Sauvignon e espumante Chandon, num jantar elaborado pelo banqueteiro Toninho Mariutti e descrito pelos presentes como algo entre o tenso e o desconfortável.

"Nossa presença estava incomodando na festa, isso ficou claro para nós. A gente lá, conversando com os curadores, e a Carol quebrando copo, xingando geral. No final, ela saiu bêbada, desmaiada. Anarquizou total", relata Ivson.

Questionado sobre a noite, Dos Anjos diz ser "evidente um certo desconforto". "Primeiro, por conta de toda a situação da última Bienal e, depois, porque são mesmo dois mundos à parte."

"Não lembro direito o que aconteceu, só lembro de chegar no coquetel e, depois, de o Rafael me carregar no colo na saída", relata Caroline.

É difícil achar algum artista disposto a entrar na linha de fogo de jovens da periferia com discurso agressivo, disposição declarada de "atropelar" obras alheias e que, de uma Bienal para outra, foram alçados da penitenciária à última novidade do circuito das artes.

"A maioria dos caras que estão lá dentro [da Bienal], a maioria do trabalho deles é conversa para boi dormir", dispara Ivson. Para justificar sua afirmação, cita a instalação de Nuno Ramos com urubus, "Bandeira Branca" ("Quem é ele para querer abordar o 'lado sombrio' do Brasil? Com que propriedade ele fala disso, sendo que ele é um burguês formado em faculdade?").

Procurado pela reportagem, Nuno pondera: "Prefiro quem não gosta [do meu trabalho] a quem é neutro".

Acima desse estranhamento entre artistas e pichadores, paira um medo não declarado de um novo ataque. O caso é que ninguém --nem pichadores, nem curadoria, nem artistas-- parece saber o que vai acontecer de fato na abertura desta Bienal e, se acontecer, que papel cada um deve desempenhar.

"Sinceramente? Pode ser que sim, pode ser que não. Pode ser que o pessoal cole, pode ser que ninguém vá. Tem uns caras ali do 'point' do centro que, dependendo do dia, ficam 'virado no capeta'. E tem dias que estão tudo de boa. Eu já fiz aquilo lá [ataque à Bienal], não teria muita lógica para mim", afirma Augustaitiz.

Entre os pichadores, a presença mais aguardada é a de Caroline, que está morando na região metropolitana de Porto Alegre. Mesmo depois de presa e condenada em primeira instância, ela mantém na internet uma espécie de diário da pichação (fotolog.com.br/carolsustos/), frequentado por dezenas de admiradores.

Seu advogado tem divulgado que ela não virá --o que não é confirmado pela própria. "Estamos vendo passagem para a próxima segunda-feira", diz Caroline. "Se eu não tivesse minha filha, talvez chutasse o balde novamente [na Bienal]", afirma.

Além de evitar um novo entrevero como o de 2008, a pichadora perdeu o pai de sua filha há pouco tempo. Conhecido como "Guigo", o integrante do grupo "Néticos" conheceu o preço mais alto do "pixo": aos 22 anos, despencou do oitavo andar quando tentava deixar sua marca em um prédio residencial na av. Rebouças.

Posted by Fábio Tremonte at 3:01 PM

Urubus na Bienal: bom e mau agouro na obra-prima de Niemeyer por Bernardo Carvalho, Folha de S. Paulo

Matéria de Bernardo Carvalho originalmente publicada na Ilustríssima da Folha de S. Paulo em 19 de setembro de 2010

Debaixo de um sol escaldante, do lado de fora do prédio da Bienal, onde está construindo uma estrutura de madeira pintada que lembra o altar de um templo do Vale do Amanhecer, o artista Kboco desabafa: "Isso aqui é o deserto do Saara. Essa luz aí em cima", diz, apontando para uma lâmpada no alto da fachada, "fica acesa o dia inteiro. À noite, eles apagam. E não tem ninguém pra acender". E de onde você tirou essas formas? "Do inconsciente", ele responde.

Falta uma semana para a abertura da 29ª Bienal de Arte de São Paulo e Kboco está construindo, com o arquiteto Roberto Loeb, um dos seis "espaços de convivência" idealizados pelos curadores, e nomeados "terreiros", que ficarão espalhados pela exposição.

O dele é o único do lado de fora do prédio. É reservado às "manifestações e reivindicações públicas". Mas não é contraditório delimitar um espaço para manifestações espontâneas?

"Essa é a grande polêmica. Meu foco vem dos skatistas. Mas skatista é feio e sujo. Pediram pra eu mudar o projeto inicial, porque skatista podia se acidentar. A Prefeitura está num processo de criminalização do skate. Como é que uma Bienal que quer tratar de política não quer que eu toque nessa questão? Botar skate no espaço da arte é a anarquia total. Os caras aqui ainda estão no Hélio Oiticica. Skate é contemporâneo."

E vão cercar o espaço? "Não sei. Também não sei se essa porta vai ficar aberta. Ninguém falou comigo. Os curadores estão fugindo de mim. Contestei tudo. Mas na Bienal não pode contestar. Vou defender a instituição? Eu não. Defendo o povo. Cada um defende o seu", diz.

RECONSTRUÇÃO Kboco pode não estar entendendo um monte de coisas, mas pelo menos uma ele já compreendeu: a Bienal da "arte e política" (tema da mostra deste ano) é, no fundo, a da reconstrução da instituição.

"As instituições foram destruídas pela Lei Rouanet. Sobraram as instituições que a lei criou: o CCBB, o Santander, a Caixa Cultural. Essas vão muito bem. Mas não têm acervo, não têm história, a maioria não tem prédio", diz Nuno Ramos, cuja obra "Bandeira Branca" ocupa o centro desta Bienal. "Devo muito a elas, mas é uma pena que instituições como o Masp e a Bienal tenham ficado à míngua. Estão um pouco melhor agora. O único modo de as obras aparecerem é tornando fortes as instituições. No Brasil, você prova que o Sarney é corrupto e ele sai ileso. Há um descolamento entre a consciência pública e a realidade institucional, que é nova. Talvez a política mais rica hoje seja mesmo a reconstituição das instituições."

Quem entrar no prédio da Bienal no próximo sábado, quando a mostra será aberta ao público, vai deparar com uma imensa estrutura cenográfica que, em sua monumentalidade, é capaz de ofuscar tudo em volta: três enormes esculturas negras -a maior com oito metros de altura-, terminando em capitéis sobre os quais estarão pousados três urubus -se não estiverem voando pelo vão central, cercado ao longo dos três andares por uma tela de proteção preta.

As formas das esculturas têm a ver com a arquitetura de Oscar Niemeyer, que desenhou o prédio, só que pretas, como gigantescos mausoléus cobertos de areia queimada e, no alto, lápides de mármore. "Acho que a gente está vivendo um tipo de desenvolvimentismo. Todo mundo eufórico, mas todo mundo muito cego. Quis romper isso com uma espécie de mau agouro que os urubus vão dar para o vão central, que é uma das coisas mais bonitas que o Niemeyer já fez", diz Ramos.

MOTE ESVAZIADO A referência a um novo desenvolvimentismo define essa edição da Bienal. Muito mais do que o mote multifuncional -e por isso mesmo esvaziado- de "arte e política". Uma crise administrativa, para dizer o mínimo, deixou a Bienal à morte nos últimos anos. As duas últimas edições -essas, sim, "políticas", no sentido de questionar (como Kboco entende que deve ser) o papel da instituição (a 27ª, ao decretar a obsolescência da autoria artística individual; a 28ª, ao propor uma autorreflexão no lugar das obras)- de certo modo reforçaram a ideia da crise. A despeito das boas intenções, foram bienais "negativas", de confronto. E uma instituição negativa é uma contradição em termos.

Ao insistir que a arte diz o que não pode ser dito de outra forma, o curador Moacir dos Anjos marca um corte definitivo em relação às duas bienais anteriores. E, ao trazer o foco de volta para a arte (o maior mérito e a verdadeira ação política desta Bienal), tenta recuperar o papel tradicional da instituição, mostrando as obras. É o que garante a volta do financiamento (cerca de R$ 30 milhões, pela Lei Rouanet).

Dos Anjos chegou a citar em entrevistas a frase seminal de Jean-Luc Godard, um dos artistas convidados, para justificar sua ideia de "arte e política": "A cultura é a regra; a arte é a exceção". Mas, enquanto forem eixos fundamentais da cultura, as instituições terão de ser necessariamente regra.

O que justifica a instituição é a noção de bem público, não a de fissura. Política mesmo seria uma Bienal cujo mote fosse "arte e mercado" (que é hoje a questão de fundo das artes -e sua maior contradição), mas dessa, provavelmente, nenhum artista ia querer participar. O poder contestatório da política é "negativo".

REFRÃO CONSENSUAL O guarda-chuva da "arte e política", embora contraditório e retórico, serve como refrão consensual, reconciliador (quem não quer ser identificado a arte e política hoje? -política bem entendida como exceção à regra) e "positivo" para a reconstrução da instituição num momento em que o país sonha com um novo lugar no mundo, como potência alternativa, já com um mercado desenvolvido, que clama pelas garantias de estabilidade de instituições igualmente sólidas para continuar a se expandir.

A ambiguidade do trabalho de Nuno Ramos permite sintetizar essa vocação e essa vontade ao exaltar, ainda que pelo aparente "negativo", uma brasilidade mais complexa, uma nova identidade nacional, mais séria e de peso -o que também ocorre na reapropriação da obra de Hélio Oiticica.

Nuno Ramos é um artista de exceção, em torno do qual vem se construindo um consenso nacional. É um artista que se reapropria positivamente de ícones da identidade popular do país (o futebol, o samba), não mais pela óptica da naturalidade tropical, mas no resgate da seriedade de uma tradição crítica.

"Ele fala de um sentimento que a gente deixa de lado quando fala de Brasil. Um lado mais sombrio, mais Goeldi", diz Dos Anjos, que o convidou a ocupar o vão central da exposição.

NÃO PENETRÁVEL Ao lado dos urubus, no alto das imensas estruturas negras, três caixas de som, feitas de vidro, emitem os acordes de canções populares brasileiras: "Carcará", "Bandeira Branca" e "Boi da Cara Preta". O urubu é, ainda que ironicamente, a ave nacional. É a natureza (embora Ramos insista em se referir ao bicho como uma citação de Goeldi) convertida em identidade cultural.

"Nas minhas obras, cultura e natureza viram um sabão", diz o artista. "A areia que cobre as peças é natureza queimada. A natureza está preta. É um não penetrável. O penetrável é a tradição forte que veio do Hélio. O meu é o avesso. O público não entra. Tem uma coisa de litania, um incômodo, uma coisa de sono, de luto."

Há, porém, mais de uma maneira de ler a obra. A grandiosidade parece mais vocacionada à reconstrução da nação do que à sua desconstrução crítica, trágica ou fúnebre. Mausoléu não é ruína. E urubu é uma ave que "limpa" o terreno da morte. "Acredito na nação. A informação do país é muito forte. É importante você saber que o Pollock ou o Warhol eram americanos. O que a gente precisa é singularizar. O nacional, nesse sentido, é uma arma", diz Ramos.

O discurso do artista mostra uma reviravolta no pensamento da arte no país, que a 29ª Bienal quer encampar. Não é à toa que o curador tenha declarado à imprensa o desejo de reavaliar a arte brasileira. A questão principal dessa edição é a refundação da arte nacional (e com ela, da instituição) sobre uma imagem da qual o novo Brasil possa se servir na sua projeção internacional como potência alternativa. Tampouco é à toa que Nuno Ramos mencione Pollock e Warhol. E que seu trabalho seja o coração desta Bienal.

Posted by Fábio Tremonte at 2:55 PM

Pichador ataca obra com urubus na Bienal por Silas Martí, Folha de S. Paulo

Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 25 de setembro de 2010

Frase "libertem os urubu" foi pichada em obra do artista Nuno Ramos

Houve pancadaria entre seguranças e visitantes que apoiavam o pichador, que foi detido e levado a delegacia

Um pichador invadiu o viveiro de urubus montado no pavilhão da Bienal ontem à noite e pichou a frase "libertem os urubu" (sic) numa das estruturas de areia socada que sustentam as aves.

Aberta ontem para o público, a 29ª Bienal traz a instalação do artista Nuno Ramos, com três urubus vivos. Os animais não foram afetados.

O tumulto ontem no pavilhão começou por volta das 18h, quando uma dezena de ativistas da ONG Animais da Aldeia começou a circular pelo prédio gritando palavras como: "Bienal, cadê você? Os urubu vão morrer!".

O autor da ação, Djan Ivson, foi detido e levado à 36ª DP, na Vila Mariana. Com a invasão, houve pancadaria entre seguranças e visitantes que apoiavam o pichador. A Polícia Militar entrou no prédio numa ação com dez homens e uma viatura.

Visitantes reclamaram da truculência dos seguranças. Uma garota diz ter levado um tapa no rosto. "Quase me mataram e me enforcaram, e depois me jogaram para fora [da Bienal]", disse Ivson.

"Não vi nada disso", disse o produtor executivo da mostra, Emilio Kalil. "Houve um ato de vandalismo e estamos tomando as providências."

"Não vou prestar queixa. Quero esse cara solto", disse o artista Nuno Ramos após o incidente. "O mundo da cultura é o do diálogo, não estou revoltado, estou triste."

A Bienal diz que não fará mudanças na segurança. Ivson não passou pelo detector de metais, já que tem crachá de artista -ele faz parte do grupo Pixação SP, convidado pela própria Bienal.

"Não me arrependo de jeito nenhum de ter convidado eles", disse o curador Agnaldo Farias. Há dois anos, um grupo pichou as paredes do andar que havia sido deixado vazio pela curadoria.

Posted by Fábio Tremonte at 2:41 PM

Surto político por Silas Martí, Folha de S. Paulo

Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 25 de setembro de 2010

Caso de censura de obra a favor do PT e acusação da OAB de apologia ao terrorismo turbinam início, hoje, da 29ª Bienal

Quando armar uma fogueira com barras de gelo no gramado do Ibirapuera hoje de manhã, o artista Paulo Bruscky vai resumir de forma sutil um debate que incendeia esta Bienal de São Paulo, aberta agora ao público.

São labaredas congeladas que desaparecem com o tempo, marcando sem gritos a forte tensão entre estética e suas dimensões políticas.

Em situação mais nervosa, a 29ª Bienal, que discute a natureza política da arte, teve uma obra censurada após um alerta da Justiça Eleitoral e um pedido da Ordem dos Advogados do Brasil para a remoção de outra peça.

Roberto Jacoby, artista argentino que fez em pleno pavilhão uma espécie de campanha por Dilma Rousseff, candidata petista à Presidência, teve o trabalho tapado.

Segundo a Procuradoria Regional Eleitoral, é proibido fazer campanha em prédios públicos e em eventos que recebem dinheiro do governo, caso da Bienal de São Paulo.

"Não se pode fazer política na Bienal de política", disse Jacoby no dia em que cobriram seu trabalho. "Talvez a Bienal devesse falar de decoração, seria mais sincero."

Outro artista, Gil Vicente, mostra uma série de autorretratos em que aparece assassinando líderes políticos e religiosos, entre eles o presidente Lula e George Bush.

"Minha questão era muito direta, era expurgar a raiva que tinha", diz Vicente. "Não entendo de arte e também não leio nada sobre arte."

No caso, a OAB de São Paulo acusou o artista de fazer apologia ao terrorismo.

É uma discussão que ronda até agora só a casca polêmica dessas obras, mas turbinou o debate sobre o que significa arte política hoje.

Passada essa barreira do óbvio, outros artistas, que por enquanto chamaram menos a atenção, mostram que política se traduz em estética de outros modos.

"É óbvio para qualquer débil mental que um desenho numa Bienal não incita o terrorismo", diz Nuno Ramos, artista que montou um viveiro de urubus no vão central do pavilhão de Niemeyer.

"Mas há obras políticas explícitas que preservam a ambiguidade", afirma. "A questão é um pouco o quanto a obra consegue e quanto uma obra deve ser ambígua."

Seus urubus enjaulados, que voam ao som de "Bandeira Branca" e "Carcará", não apontam armas nem enfiam a faca na garganta do presidente, mas parecem fazer críticas numa frequência um tanto mais discreta.

Posted by Fábio Tremonte at 2:35 PM

"Uma grande obra é política em si" por Silas Martí, Folha de S. Paulo

Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 25 de setembro de 2010

Na Bienal, Cildo Meireles, Nuno Ramos, Paulo Bruscky, Joseph Kosuth e Zé Celso defendem obras mais sutis

Obras desses artistas não ignoram críticas a figuras e estruturas de poder, mas trilham rotas mais simbólicas

É impossível ver a distância, mas a paisagem idílica num cilindro gigantesco, obra de Cildo Meireles na Bienal, gira movida por homens de verdade num engenho às avessas debaixo dela.

Meireles passa longe da campanha política para revelar e ao mesmo tempo esconder as engrenagens do poder e da construção da imagem.

Não é território estranho para quem já circulou mensagens contra a ditadura em cédulas de dinheiro e garrafas de Coca-Cola nos anos 60.

"Arte política não pode ser imediatista, o trabalho tem que estar inserido na história da arte", resume Meireles. "Não adianta fazer denúncia de pernas curtas, que não sobrevive às circunstâncias."

Pernas curtas, no caso, teriam a pseudocampanha de Roberto Jacoby a favor de Dilma Rousseff, ou mesmo os assassinatos do papa, Lula e George Bush por Gil Vicente.

Sem violência, Paulo Bruscky parou o trânsito numa ponte em Recife durante a ditadura, amarrando uma fita vermelha de ponta e ponta. Está na Bienal um filme das pessoas que param, olham e decidem passar por baixo ou por cima da linha.

"Eram obras que expunham o clima de uma época", lembra Bruscky. "Trabalhei até com termômetros, mostrando o clima político como poesia e como tensão."

Nessa tensão, o artista foi preso duas vezes nos anos 70 e diz ter sido ameaçado de morte pelo regime militar. "Passei seis meses com medo de ser morto", conta. "Diziam que eu seria assassinado, ou melhor, acidentado."

MÍSSIL DO DISCURSO
Nos Estados Unidos, o artista Joseph Kosuth enfrentou ameaças de outra ordem. Pioneiro da arte conceitual, ele está na Bienal com quatro painéis que reproduzem as definições de "norte", "sul", "leste" e "oeste", pontos cardeais de uma ação estética e ao mesmo tempo política.

Quando decidiu ser mais explícito, fez, nas eleições de 1992, uma obra a favor de Bill Clinton e contra George Bush. Foi seu primeiro e último trabalho panfletário. Chegou a ser ameaçado de censura pelo museu, que era público, mas a instalação ficou lá até a vitória de Clinton.

"É perigoso afirmar uma mensagem, uma ordem", diz Kosuth à Folha. "O problema da arte política é que ela tem o mesmo conservadorismo que a publicidade, reduz tudo a um momento, e arte é importante demais para ser só o míssil de um discurso."

Fugindo desse míssil, Kosuth depois seguiu um caminho também explícito, mas do ponto de vista semântico.

Amplia as definições de palavras do dicionário ou prega citações de filósofos ou líderes totalitários ao lado de obras de outros artistas em museu. Está lá um discurso seu e ao mesmo tempo anônimo, que deixa as associações a cargo do espectador.

"Política está ligada ao poder humano de interferência nas estruturas", resume José Celso Martinez Corrêa, que encena amanhã, na Bienal, a peça "Bailado do Deus Morto", de Flávio de Carvalho.

"Uma grande obra de arte é política em si", afirma. "A rampa da Bienal é política."

Posted by Fábio Tremonte at 2:27 PM

Mais realistas do que o rei, curadores decidem censurar instalação "eleitoral" por Marcos Augusto Gonçalves, Folha de São Paulo

Matéria de Marcos Augusto Gonçalves originalmente publicada no caderno Opinião da Folha de S. Paulo em 25 de setembro de 2010

Depois de anunciar que a 29ª Bienal valorizaria as relações entre arte e política (o que se tornou um clichê no circuito das grandes exposições), a curadoria da mostra revelou-se perfeitamente pusilânime nessa matéria ao reagir ao incômodo causado pelo trabalho do argentino Roberto Jacoby.

O artista montou em seu espaço uma espécie de oficina eleitoral, na qual um grupo de pessoas produzia peças que propagandeavam a candidata Dilma Rousseff.

Aviso logo: não pretendo votar na postulante petista; gosto de arte, gosto até certo ponto de política, mas muito raramente gosto dos dois juntos. Considero a proposta de Jacoby um equívoco entre outros do gênero "político" presentes nessa Bienal.

Posto isso, é chocante que os responsáveis pela mostra tenham censurado a obra escudando-se num parecer preliminar de um tribunal secundário, que manifestava a possibilidade, a meu ver estapafúrdia, de se enquadrar o trabalho de Jacoby na legislação eleitoral.

O mínimo que se poderia esperar é que os curadores assumissem a defesa radical do espaço artístico como território de ampla liberdade. Nesse contexto, o intencional caráter político-partidário da intervenção do artista tem que ser avaliado por critérios culturais e estéticos, jamais por dispositivos de uma lei eleitoral -em muitos aspectos, aliás, discutível.

Mas não. A curadoria, talvez atendendo a pressões típicas desses períodos, apressou-se em ser mais realista do que o rei. Depois de fazer uma consulta ao Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo decidiu se antecipar a uma decisão que talvez a obrigasse a suprimir a obra por infringir a lei eleitoral.

PERPLEXIDADE
Que política é essa que a Bienal e os curadores Agnaldo Farias e Moacir dos Anjos estão propondo? Alguém com um pouco mais de espinha sustentaria até as últimas consequências o direito do artista de prosseguir com seu trabalho.

A Justiça que se pronunciasse e a polícia que fosse fazer o serviço que os curadores decidiram diligentemente prestar ao obscurantismo. Alegaram que poderiam ser presos... Ora, que enfrentassem a investida, que defendessem uma causa, que criassem um fato verdadeiramente político!

Para piorar a situação, querem culpar a vítima. Voltam-se contra o artista. Seja na petição que fizeram ao TRE, seja nas declarações à imprensa, acusam Jacoby de tê-los ludibriado. A dupla Anjos e Farias (que convidou Jacoby) adotou o famoso bordão "eu não sabia" ao referir-se ao conteúdo da instalação -o que, na hipótese mais benévola, é um atestado de incompetência.

Farias declarou à Folha que os curadores ficaram "perplexos" diante da instalação do argentino. Estranho. De minha parte, fiquei perplexo diante de tanta frouxidão de princípios.

Posted by Fábio Tremonte at 2:21 PM

setembro 22, 2010

Justiça vai retirar obra de Bienal com imagens de Serra e Dilma, diz curador por Silas Martí, Folha.com

Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Folha.com em 21 de setembro de 2010

Segundo um dos curadores da 29ª Bienal de SP, a Justiça Eleitoral pediu a retirada da obra "El Alma Nunca Piensa Sin Imagen" (a alma nunca pensa sem imagem) da mostra, que abriu ontem para convidados (e abre neste sábado para o público).

Agnaldo Farias, curador ao lado de Moacir dos Anjos, diz que a diretoria da Fundação recebeu notificação considerando a obra ilegal.

"A justiça considerou o trabalho uma propaganda eleitoral. Não pode ter imagem de candidato em lugares públicos. A gente não pode contestar a decisão, porque corremos o risco até de ser presos", disse Farias

A obra do artista argentino Roberto Jacoby simula uma campanha eleitoral usando imagens dos candidatos Dilma Rouseff (PT) e José Serra (PSDB). Os artistas, trajando camisetas vermelhas com o nome "Dilma" e a estrela do PT, fazem uma espécie de campanha para a candidata.

Segundo Farias, a obra chegou pronta da Argentina e foi instalada pela equipe do artista. "Se soubéssemos que se tratava da Dilma, sabíamos que haveria problemas e teríamos avisado o artista."

A instalação será censurada a partir de hoje. A Bienal não decidiu se vai retirar o trabalho ou se vai cobri-lo com um pano. Procurada pela reportagem, a assessoria de imprensa do TRE-SP disse não conhecer o caso.

Posted by Fábio Tremonte at 2:52 PM

Quinta Paralela reúne obras de 82 artistas por Silas Martí, Folha de S. Paulo

Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 22 de setembro de 2010

Diálogo entre os trabalhos é prejudicado por excesso de nomes e amarras da mostra

Na entrada da Paralela, um letreiro em néon reproduz uma frase de cinema. "Nada de mau se perdeu, nada de bom foi em vão." Regina Parra, conhecida por suas pinturas, troca de terreno e busca em "Stalker", de Andrei Tarkovski, um mote para sua instalação. É uma rara sensação de frescor nessa que é a mais tradicional mostra do circuito off-Bienal.

Talvez ofuscada pela edição anabolizada e pós-crise da exposição no Ibirapuera, essa Paralela atesta a verdade da frase na entrada. Nenhum dos maus vícios dos 82 artistas reunidos ali se perdeu, nem tudo que fazem de bom é em vão. São quase todas obras fortes alinhavadas num circuito pelo curador Paulo Reis, mas é inevitável uma sensação de déjà-vu.

Bancada por galerias paulistanas, que reformaram há dois anos o Liceu de Artes e Ofícios, onde acontece a mostra, a Paralela impõe ao curador escolher artistas de todas as casas envolvidas.

Por mais amplo que seja o projeto, a mostra acaba repetindo e misturando obras que pouco conversam, num diálogo muitas vezes truncado.

Está contraposta a nova pintura, de artistas como Tiago Tebet, Mariana Palma, Rafael Carneiro e Rodolpho Parigi, à secura dos cerebrais Felipe Cohen, Iran do Espírito Santo e João Loureiro. Num dos galpões, instalações de Sandra Cinto, Laura Vinci e Thiago Rocha Pitta desencadeiam um pensamento sobre a paisagem. São obras que refutam ou fabricam atmosferas paralelas com ondas, vapores e horizontes movediços de sal.

Esse discurso sustentaria toda a mostra, mas logo se embaralha noutros pontos, como a coerção dos ambientes urbanos, a violência das metrópoles e a fatura da cor.

André Komatsu, com uma pilha de tijolos, Lucas Bambozzi e seu puxadinho, Cao Guimarães com um vídeo do casamento de uma operária parecem entrar nesse segundo discurso, mas a leitura sofre quando entre eles existe uma avalanche de coisas.

Talvez fosse melhor abolir de todo o conceito e mostrar só um salão com todos os bons artistas da cidade. No letreiro lá fora, a frase continua assim: "Uma luz inunda tudo, mas deve haver mais".

Posted by Fábio Tremonte at 2:44 PM

Pedido da OAB-SP é ato assustador de censura por Alexandre Vidal Porto, Folha de S. Paulo

Matéria de Alexandre Vidal Porto originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 21 de setembro de 2010

Nota autoritária fere integridade da curadoria e subestima o público

Tem notícia que assusta. A seção paulista da Ordem dos Advogados do Brasil pedir por nota pública a exclusão de obras da próxima Bienal de São Paulo é uma delas.

O ato é assustador por várias razões. Primeiro, pelo caráter autoritário que revela.
Segundo, pelo entendimento equivocado que o motiva.

Por fim, porque, supostamente, é cometido em nome da defesa do Estado de Direito e das instituições democráticas. O presidente da seccional de São Paulo, Luiz Flávio Borges D'Urso, que assina a nota, perdeu uma boa oportunidade de omitir-se.

As obras que a OAB-SP sugere ocultar fazem parte da série "Inimigos", de Gil Vicente. São desenhos grandes (2 m por 1,5 m) feitos com carvão, nos quais o artista se retrata assassinando autoridades e figuras públicas. Entre as "vítimas", estão o presidente Lula, dois governadores de Pernambuco, a rainha da Inglaterra e o papa.

Segundo a OAB-SP, as obras demonstram "desprezo pelo poder instituído, incitando ao crime e à violência".

D'Urso argumenta que "uma obra de arte, embora livremente e sem limites expresse a criatividade do seu autor, deve ter determinados limites para sua exposição pública. Um deles é não fazer apologia ao crime, como estabelece a vedação inscrita no Código Penal Brasileiro".

Pela lógica de seu argumento, o presidente da OAB-SP considera que representar artisticamente um crime equivale a recomendar sua execução. No entanto, retratar um assassinato não significa fazer apologia ao crime.

É o espectador quem dará significado aos desenhos de Vicente. A obra de arte é apenas uma representação que adquire valor subjetivo para quem a observa.

DIREITO DE DESPREZAR
A despeito do que critica a nota, é legítimo e legal que uma obra de arte represente o desprezo do autor pelo poder instituído. Em um Estado democrático, todos têm o direito de sentir desprezo por qualquer pessoa ou instituição. Desprezar não é crime e, mais importante, todos temos o direito de expressar o desprezo artisticamente.

A prevalecer a linha de raciocínio da nota, talvez se devesse proximamente proibir a exibição de artistas como Hélio Oiticica, que recomendava ao público: "Seja marginal, seja herói".

Mais valioso para o Estado de Direito do que uma cláusula do Código Penal -no meu entender, mal interpretada pelo presidente da OAB-SP- é o espírito da Constituição Federal. Mais importantes são as liberdades e os direitos individuais, que servem de base e fundamento para o Estado de Direito e as instituições democráticas que a OAB-SP pretende defender. A tentativa de controle social por meio da supressão de obras artísticas chama censura. Simples assim.

Caso os organizadores não desistam de exibir os trabalhos, a OAB-SP promete recorrer ao Ministério Público Estadual para pedir a retirada das obras e o indiciamento dos responsáveis por apologia ao crime. A pena prevista é de três a seis meses de detenção ou o pagamento de multa. É ao que se arriscarão os curadores e o presidente da Bienal se quiserem resguardar a integridade do trabalho de concepção e organização da mostra. A nota é autoritária e condescendente. Subestima a capacidade de discernimento do brasileiro. É legítimo perguntar até que ponto representa o entendimento jurídico e a sensibilidade política dos advogados paulistas.

Em qualquer hipótese, até o momento, o que parece atentar contra o Estado de Direito e as instituições democráticas não é a exibição das obras de Gil Vicente na Bienal, mas, sim, o teor da nota pública assinada por D'Urso. A OAB-SP errou e precisa admitir seu equívoco.

Posted by Fábio Tremonte at 2:26 PM | Comentários (3)

Mundo em ascensão por Fábio Cypriano, Folha de S. Paulo

Matéria de Fábio Cypriano originalmente publicada no caderno Especial da Folha de S. Paulo em 21 de setembro de 2010

Escolhas de apostas estrangeiras refletem geopolítica da arte emergente no circuito global

De certa forma, as apostas internacionais feitas pelos curadores consultados pela Folha atestam as diferenças geopolíticas na arte.

Quando a dupla Allora & Calzadilla foi indicada como uma das apostas de Solange Farkas, ainda não tinha sido anunciada como representante dos Estados Unidos na Bienal de Veneza do próximo ano. "Eles possuem um trabalho político e com uma poética muito particular, que mescla humor, leveza e denúncia", justificou a curadora.

Na Bienal de São Paulo, vão fazer uma pequena orquestra circular por paredes falsas no pavilhão, tornando-os invisíveis, e só o som do "Bolero" de Ravel, que o grupo irá tocar, será perceptível neste trabalho. Jovens artistas, Allora & Calzadilla já conseguem visibilidade internacional em duas grandes mostras.

Já uma das indicações do colombiano Jose Roca, seu conterrâneo Miguel Angel Rojas, 63, é uma forma de compensar "a ausência de mecanismos fortes para a promoção de artistas, mesmo os consolidados". Segundo Roca, a obra do artista "estabelece uma ponte entre a geração moderna e propostas contemporâneas, mas, apesar de sua importância, ele não alcança o reconhecimento internacional que sua obra mereceria".

O polonês Artur Zmijewski, de 44 anos, também de um país periférico no circuito artístico, foi outra indicação de Farkas: "Ele é craque em provocar situações incômodas, envolvendo personagens incomuns, em temas como a vulnerabilidade humana".

Finalmente, uma das mais jovens apostas é o português Carlos Bunga, indicado por Luis Camillo Osório, que participa com imensas intervenções arquitetônicas na rampa do térreo da Bienal. O curador se impressionou com "a liberdade com que se desloca de um suporte para outro, mantendo sempre uma força plástica surpreendente".

Posted by Fábio Tremonte at 2:17 PM

Força nacional, Folha de S. Paulo

Matéria originalmente publicada no caderno Especial da Folha de S. Paulo em 21 de setembro de 2010

Entre os brasileiros, curadores apostam nos jovens Alice Miceli, Jonathas de Andrade e Tatiana Blass

Entre 159 artistas, a 29ª Bienal de São Paulo apresenta 51 brasileiros, ou seja, 32% da mostra, o que representa um dos mais altos índices da história do evento. Cinco curadores foram consultados pela Folha para indicar, dentre os 159, quais seriam suas apostas, sendo que cada um poderia apresentar três indicações.

Participaram da enquete o colombiano Jose Roca, que foi co-curador da 27ª Bienal e é o curador da 8ª Bienal do Mercosul, a porto-riquenha Julieta Gonzalez, curadora associada de arte latinoamericana da Tate Modern, e os brasileiros Lisette Lagnado, curadora da 27ª Bienal, Luis Camillo Osório, diretor do Museu de Arte Moderna do Rio, e Solange Farkas, diretora do Museu de Arte Moderna da Bahia.

Dos 15 indicados, seis artistas brasileiros, em sua maioria jovens, na casa dos 30 anos, foram apontados pelos curadores. As exceções foram Milton Machado, 63, e Tamar Guimarães, 42.

"Se a aposta consiste em demonstrar que artistas podem participar de várias bienais de São Paulo sem, contudo, merecer a devida atenção, Milton Machado envereda em mais um desafio depois de ter participado da "Bienal do Kiefer", em 1987", justifica Lagnado. "Quem sabe dessa vez haverá maior cuidado para entender um artista fundamental desde o início dos anos 1970 no Brasil", diz ainda.

Já Guimarães, indicada por Gonzalez, é praticamente uma desconhecida no Brasil, já que vive na Dinamarca, onde desenvolveu sua carreira. Ela teve uma obra exposta em São Paulo, no Panorama da Arte Brasileira, do ano passado, e no Capacete, no Rio, locais onde a curadora conheceu sua obra.

"Fiquei muito interessada na crítica das instâncias de poder através do inconsciente e estou com grande expectativa por o que ela vai mostrar em São Paulo", afirma Gonzalez.

A curadora da Tate também indicou o alagoano Jonathas de Andrade, 27, o mais jovem do grupo, que foi selecionado por abordar "processos de modernização e o posterior fracasso de alguns projetos modernos na América Latina".Os demais artistas indicados foram Tatiana Blass, Alice Miceli e Marilá Dardot, que organiza um dos seis terreiros da Bienal com Fabio Morais.

Posted by Fábio Tremonte at 2:12 PM

Tensão visual por Silas Martí, Folha de S. Paulo

Matéria de Silas Martí originalmente publicada no caderno Especial da Folha de S. Paulo em 21 de setembro de 2010

Obras de Nan Goldin, Steve McQueen e Harun Farocki exploram suas lembranças pessoais e coletivas em reflexões sobre o papel da imagem

Tanto a memória pessoal, das festas a mil por hora, orgasmos e rompantes lascivos, quanto a herança coletiva de anos de opressão, guerras e a sombra do terrorismo parecem estar diante das lentes dos artistas desta Bienal.

Nan Goldin retrata o submundo de prostitutas e drogados em Nova York e Berlim nos anos 70 e 80. São fotografias projetadas em sequência, como uma espécie de cinema no ritmo da memória.

Também em Nova York, Steve McQueen disseca o maior símbolo da América. Dá voltas em torno da estátua da Liberdade. Imóvel, ela desafia o movimento do filme, que funde dois tempos, o vazio atual e o cartão de visitas aos imigrantes do passado.

É a mesma desaceleração anônima proposta por Chantal Akerman. Filha de judeus sobreviventes do Holocausto, ela volta ao Leste Europeu num "road movie" escandido, de longos planos em que retrata desconhecidos como se fossem parentes, tentativa de apreender o passado.

Apichatpong Weerasethakul, tailandês vencedor da Palma de Ouro, faz um percurso semelhante ao nordeste de seu país, terra arrasada pelo terrorismo em que jovens fazem tudo para esquecer as marcas da violência.

Na obra de Harun Farocki, fica a tensão entre lembrar e esquecer. Usando simulações preparadas pelo Exército, ele mostra um videogame da guerra no Iraque que serve tanto para treinar soldados antes do combate quanto como dado visual em sessões de terapia na volta para casa.

Jean-Luc Godard lembra outras guerras num vídeo curtíssimo. Espécie de poema visual, "Je Vous Salue Sarajevo" é declamado como manifesto pelo cineasta.

"Cultura é a regra, arte é a exceção", diz o texto. "Todos falam a regra, ninguém fala a exceção, ou ela é vivida, é arte de viver: Srebrenica, Mostar, Sarajevo."

Posted by Fábio Tremonte at 2:02 PM | Comentários (1)

Plástica política por Silas Martí, Folha de S. Paulo

Matéria de Silas Martí originalmente publicada no caderno Especial da Folha de S. Paulo em 21 de setembro de 2010

Obras dos consagrados Ai Weiwei, Flávio de Carvalho, Lygia Pape e Hélio Oiticica propõem conceito elástico para uma estética engajada e mostram que mandos, desmandos e injustiças sustentam a beleza

No começo do século passado, Flávio de Carvalho desafiou uma procissão de Corpus Christi, de boné na cabeça e flertando com moças no meio do ato religioso. Quase foi linchado pela rebeldia.

Três décadas mais tarde, em plena ditadura, Lygia Pape convocou uma multidão para vestir um imenso pano branco nos jardins do Museu de Arte Moderna do Rio, peça que cortava de forma simbólica as cabeças dos participantes, o chamado "Divisor" de corpos e de uma época.

Era 1968, o ano em que aprovaram o AI-5, recrudescimento da censura e da repressão no país. Dois anos antes, Hélio Oiticica homenageou o bandido Cara de Cavalo, morto pela polícia, ao fundir uma apologia ao marginal a novas noções sobre o papel social do artista.

Juntos nesta Bienal, são autores que trilharam um caminho político por meio da estética. Deitam as bases para a reflexão sobre tempos tumultuosos e ainda hoje são referência visual num país de transformações agressivas.

Enquanto reverberam o clima político em seus trabalhos, também atualizaram a produção estética no país. Carvalho como pioneiro da performance, Pape e Oiticica como propagadores de uma arte que só funcionava com a participação do público.

É esse conceito elástico de política e estética que serve de lastro também para a obra de nomes contemporâneos da arte no país. Nuno Ramos e seu viveiro de urubus são uma espécie de luto vivo por um país que se esconde atrás de uma pretensa alegria.

Cildo Meireles cria imagens utópicas em grandes cilindros movidos por tração humana noutro trabalho que joga luz sobre a beleza sustentada pelo que fica escondido por baixo do pano.

Na mesma cartografia emergente, Francis Alys, belga radicado no México, e o chinês Ai Weiwei também tentam fixar em suas obras os mandos e desmandos da política e da economia.

Posted by Fábio Tremonte at 1:51 PM

Com a cara do Brasil por Fábio Cypriano, Folha de S. Paulo

Matéria de Fabio Cypriano originalmente publicada no caderno Especial da Folha de S. Paulo em 21 de setembro de 2010

Curadoras criam labirintos para público percorrer e ver obras que exploram contradições do país

O grande espaço central que o arquiteto Oscar Niemeyer projetou no centro do pavilhão da Bienal costuma ser, pela visibilidade, o local onde curadores instalam obras que condensam a temática da mostra.

Nesta 29ª edição, com o tema "Há Sempre um Copo de Mar para o Homem Navegar", os curadores Moacir dos Anjos e Agnaldo Farias optaram por exibir um só trabalho: "Bandeira Branca", de Nuno Ramos. Com três urubus, animais que simbolizam a morte, a curadoria parece ironizar o movimento ufanista que o Brasil agora atravessa.

Folha - Por que um trabalho tão aparentemente pessimista, como "Bandeira Branca", no centro da Bienal?

Agnaldo Farias - Não acho pessimista, mas um princípio de realidade desse lado soturno, melancólico e triste, que é constitutivo de nossa cultura. Há hoje no Brasil uma alegria histérica, cultivada nos programas de TV. Todo mundo quer banir a tristeza e o lado crítico, até mesmo nas universidades.

Nossa genealogia, na Bienal, recua até Flávio de Carvalho, que é um homem corajoso que ousa o fluxo com o chapéu. Esse é o papel do cientista, do artista, do intelectual: contrariar, não seguir pela norma, mas pela exceção. E, por isso, é importante também trazer um artista como Oswaldo Goeldi, com quem Nuno dialoga, que também representa outro lado deste país, que não é só o da alegria.

Moacir dos Anjos - Os novos dados de indicadores sociais mostram que, ao lado do desenvolvimento, ainda se tem índices alarmantes no Brasil, como a grande maioria da população não ter acesso a saneamento básico e um imenso analfabetismo. O Brasil é isso, essa contradição. Um país que lida com questões ultracomplexas e se tornou um líder no exterior, enquanto internamente não consegue resolver questões básicas, como segurança, saneamento e analfabetismo. Faz parte de nossa história lidar com essas contradições. A Bienal reflete isso.

Folha - Mas a mostra tem também um caráter internacional.

Dos Anjos - É uma exposição internacional como sempre foi. Acho que não houve nenhuma ambição ou preocupação de nossa parte em ter um determinado número de países representados e, até hoje, não fiz essa conta. Mas nos interessa ser uma exposição em que fique claro o tempo e, principalmente, o lugar onde ela é montada. Ela é feita a partir do Brasil, com questões que interessam ao Brasil. Há alguns pares de artistas que tensionam a arte brasileira com a internacional, que nada mais é do que uma arte que se faz hegemônica pelo poder dos meios onde é realizada. É o caso da proximidade de Nan Goldin com Miguel Rio Branco, entre outros.

Folha - O início do percurso da Bienal tem um espaço bastante generoso, que vai sendo reduzido ao longo da mostra, se transformando num labirinto nos pisos superiores. Por que essa arquitetura tão forte?

Farias - A ideia de Marta Bogéa, nossa arquiteta, foi fazer uma Bienal que tivesse surpresas, que tivesse praças, vielas, becos e da qual você escapa sempre que vai para os vidros, rompendo com os ângulos retos e também com o projeto moderno do prédio. As paredes são de vidro porque é uma ordem que pretende se expandir ao redor. Com isso, criamos uma instabilidade, uma tensão e rompemos certa visão de Brasil.

Folha - Romper uma ordem linear da exposição é fazer um discurso político?

Dos Anjos - Sim. Essa arquitetura tem tudo a ver com nossa ideia de arte e política, pois ela pede que o visitante tome decisões. Ele vai estar diante de muitas encruzilhadas e, com isso, corre o risco de se perder. Essa arquitetura solicita uma atitude ativa.

Farias - Os terreiros também foram pensados dentro dessa ótica, criando intervalos, suspensões, parênteses, com espaços de convivências e onde, frequentemente, estarão ocorrendo ações variadas. Isso também é um dado político, pois não teria sentido fazer uma exposição de arte e política só com obras contemplativas.

Posted by Fábio Tremonte at 1:41 PM

Hora da virada por Fábio Cypriano, Folha de S. Paulo

Matéria de Fabio Cypriano originalmente publicada no caderno Especial da Folha de S. Paulo em 21 de setembro de 2010

Fundação paga contas, troca de sistema de gestão e arrecada quase o triplo da edição anterior da mostra

Nicholas Serota, diretor da Tate (Londres), e Carolyn Christov-Bakargiev, diretora da 13ª Documenta de Kassel (Alemanha), são os principais nomes de uma constelação de curadores, galeristas, críticos, colecionadores e artistas que hoje participam da inauguração para convidados da 29ª Bienal de São Paulo, que é aberta ao público no próximo sábado.

Após uma década de crises, a fundação recupera a imagem da Bienal e seu prestígio nacional e internacional. "Realmente passamos por uma retomada, e em vários sentidos. Da parte dos conselheiros, é a retomada do engajamento e da vontade de participar", diz Elizabeth Machado, presidente do conselho da instituição.

A ideia de retomada ganha sentido quando se tem em mente a edição passada, de 2008, apelidada de Bienal do Vazio, que semanas antes de abrir sofreu um corte no orçamento. Na época, o curador Ivo Mesquita afirmava que isso era comum, pois nas oito Bienais em que havia trabalhado havia um problema de "fluxo de caixa".

"Não temos problema de fluxo, a exposição está garantida", disse Emilio Kalil, diretor de produção da 29ª Bienal, orçada em R$ 30 milhões.

O responsável por essa transformação é o empresário Heitor Martins, eleito presidente no auge da crise que perdurava havia dez anos.

"Heitor reflete a mudança dos tempos e faz parte de um perfil de pessoas que usam seu nome para projetar a Bienal, e não o contrário", diz Andrea Matarazzo, atual secretário da Cultura do Estado e sobrinho-neto do fundador da Bienal, Ciccillo Matarazzo (1898-1977). Ele chegou a analisar as contas da Bienal, mas desistiu de se candidatar, "porque nas circunstâncias do momento era muito complicado".

Empossado em agosto do ano passado, em um mês Martins conseguiu R$ 4 milhões do Ministério da Cultura para reformar o prédio. As dívidas da Bienal anterior, estimadas em cerca de R$ 4 milhões, também foram saldadas. Em seis meses, o empresário reuniu R$ 26 milhões. A Prefeitura de São Paulo também cumpriu sua parte e, em dois anos, repassou R$ 4 milhões.

"A situação da Bienal era tão precária que, mesmo quando o MinC queria ajudar, não era possível, pois havia uma inviabilidade institucional de manter convênios. Mas essa crise estava relacionada a um modelo de empreendimento centralizado e, quando Edemar Cid Ferreira [do Banco Santos] faliu, a Bienal foi junto", diz Afonso Luz, assessor do Ministério da Cultura.

De fato, uma das razões do sucesso da gestão de Martins foi reforçar a instituição do ponto de vista operacional. "Percebemos que a Bienal estava esvaziada. Quase todos os serviços eram terceirizados. Então revertemos esse quadro", conta Martins.

Para o empresário, a Bienal do Vazio também ajudou na mudança: "Havia uma frustração muito grande, porque a sociedade não achava que a Bienal podia acabar. Quando chegamos com uma agenda positiva, houve um reconhecimento imediato".

Graças a esse processo, nos bastidores já se comenta que, independentemente da qualidade da mostra, esta edição já é ótima. Ou, como resume o artista Tunga: "Trata-se de um movimento das elites em tomar a rédea do que estava sem rédeas".

Posted by Fábio Tremonte at 1:22 PM

Serota crê em força da Bienal de SP por Fabio Cypriano, Folha de S. Paulo

Matéria por Fabio Cypriano originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 21 de setembro de 2010.

Diretor da Tate fala da importância do evento fora do eixo EUA-Europa e da aquisição de obras de brasileiros

Curador britânico estreitou os laços da instituição com o Brasil por meio de mostra na Oca, realizada em 2003

A seguir, Serota segue o balanço dos dez anos da Tate, mas fala também da importância da Bienal de São Paulo.

A relação do diretor inglês tem sido intensa com o Brasil nos últimos dez anos. Em 2003, ele organizou a grande mostra do acervo da Tate, na Oca, em São Paulo, um dos fatores que ajudou o Brasil a ser o país que mais acessou o site da Tate no início do século 21, após o Reino Unido.

Já nos últimos anos, foi a vez de a Tate apresentar a arte brasileira, com grandes exposições de Hélio Oiticica e Cildo Meireles, ambos com obras adquiridas pela instituição graças ao comitê latino-americano. A Tate possui agora oito obras de Oiticica, entre elas a histórica "Tropicália". (FABIO CYPRIANO)

Folha - Qual a sua expectativa para a Bienal de São Paulo?

Nicholas Serota - Por muitos anos, a Bienal de São Paulo foi a mais importante exposição para sinalizar o desenvolvimento da arte contemporânea fora da Europa e Estados Unidos.

Sabemos também que houve momentos de dificuldade, mas eu tenho esperanças de que, em 2010, a exposição será muito forte. E a Bienal está sob uma nova direção, que tem maior independência e espero que, por isso, 2012 e 2014 sejam anos que sigam esse novo modelo.

Obras importantes de brasileiros como Hélio Oiticica foram recentemente adquiridas pela Tate por meio do comitê latino-americano. Ele foi criado por você?

Sim, esse é um grupo de apoiadores. Eles são cerca de 40 e a coordenadora é Tiqui Atencio Demirdjian, venezuelana que vive em Londres. Todos eles contribuem financeiramente para adquirirmos latino-americanos.

E, em sua maioria, compramos obras de artistas vivos, apenas ocasionalmente compramos trabalhos de meados do século 20, como fizemos com "Tropicália", de Hélio Oiticica.

Como a instituição lida com as novas mídias e redes sociais?

A internet vem se tornando algo muito importante para nós. Alcançamos grandes audiências que não conseguem vir ao prédio fisicamente, é intrigante que, após o ano 2000, nossa maior audiência fora do Reino Unido veio do Brasil.

Não tenho certeza se ainda é assim, mas com certeza é uma parcela significativa.

A Tate consegue hoje no setor privado cerca de 60% de seu orçamento. A que se deve esse sucesso?

O sucesso do programa atrai o interesse de patrocinadores, que procuram apoiar eventos que alcançam muita gente. Somos ambiciosos na filiação, temos bastante sucesso na livraria, na loja e no restaurante.

E você acredita que a Tate Modern mudou também a forma como os políticos observam as artes visuais?

Sim, acho que eles foram afetados também, percebendo que cultura não é algo para uma pequena elite, mas que alcança audiências muito mais amplas.

Posted by Cecília Bedê at 1:08 PM

Museu de grandes novidades por Fabio Cypriano, Folha de S. Paulo

Matéria de Fabio Cypriano originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 21 de setembro de 2010.

Nicholas Serota, diretor da Tate Modern, comenta o sucesso da instituição, a mais visitada do mundo, e anuncia ampliação até 2012

Em maio passado, a Tate Modern, de Londres, comemorou seus dez anos com um fato inédito: transformou-se na instituição de arte com maior número de visitantes por ano, em comparação a outras com o mesmo tipo de acervo.

Ela tem, anualmente, 5 milhões de visitantes, contra o Centro Pompidou, em Paris (3,5 milhões), e o MoMA, de Nova York (2,8 milhões).

Parte desse sucesso se deve a seu diretor, Sir Nicholas Serota, 64, que conseguiu viabilizar a nova sede com um programa arrojado, alavancado pelas grandes instalações no Turbine Hall.

Há 22 anos diretor da instituição, ele agora prepara a ampliação da Tate Modern, novamente com a dupla de arquitetos Herzog & de Meuron, planejada para ter sua primeira parte inaugurada em 2012, por ocasião das Olimpíadas.

Hoje, Serota está em São Paulo, por conta da 29ª Bienal de São Paulo, que abre suas portas ao público no próximo sábado. Há duas semanas, ele fez um balanço à Folha, em seu escritório, na Tate Britain, do sucesso do museu:

Folha - A Tate Modern completou dez anos. Qual o impacto do museu na cidade?

Nicholas Serota - O principal impacto foi mudar o lugar das artes visuais na cultura da Inglaterra. Por anos, costumávamos dizer que tínhamos bons artistas, mas eles não faziam parte do discurso cultural. Éramos vistos como um país forte em literatura, teatro e música, mas, tirando Turner, Constable e, talvez, Henry Moore, as artes visuais não eram aparentes. A criação da Tate Modern decididamente alterou isso.

Agora, quando se conversa com jovens, as artes visuais estão em suas mentes. Nós temos cerca de 5 milhões de visitantes por ano e conosco aconteceu algo raro: é comum visitações massivas logo quando um museu é aberto, mas depois seus números caem, como se viu em museus franceses e alemães.
Nós mantemos os números e isso ocorre porque temos uma leitura internacional da arte e não apenas centrada na Europa e EUA.

Folha - A existência de um espaço como o Turbine Hall ajudou a transformar a Tate num lugar de encontros?

Os museus são conhecidos, através de gerações, como um bom lugar para se encontrar pessoas, são espaços sociais. E a Tate Modern criou um espaço, que é também um lugar seguro, na cidade. Ele se transformou num local de congregação, numa praça. Vejo isso pelos meus próprios filhos. Minha filha, que estava acostumada a frequentar o museu, se surpreendeu quando seus amigos passaram a sugerir para se encontrar na Tate Modern, o que ela nunca faria.

Posted by Cecília Bedê at 1:00 PM

setembro 21, 2010

Degustação e escambo no Pátio, Folha de Pernambuco

Matéria originalmente publicada na Folha de Pernambuco em 21 de Setembro de 2010.
 
A “Casa de Pão”, do Grupo SYA, foi oferecida ao público para ser comida 

O Pátio de São Pedro, local que já se tornou uma espécie de QG do SPA das Artes, recebeu uma concentração de eventos na sexta à noite. Junto à música das bandas que faziam uma passagem de som no palco montado para uma das ações do festival Coquetel Molotov, havia a gravação de um locutor popular chamando a população para as ações do evento.

Às 19h, abertura da exposição do projeto “Territórios Recombinantes (TR)”, chamada de “finissagem”. O nome veio de uma brincadeira e, ao mesmo tempo, uma alusão ao término do processo de residência artística da mostra, chamado de Estúdio Aberto. A “Casa de Pão”, feita pelo Grupo SYA (Artur Cordeiro, Yuri Firmeza e Sólon Ribeiro) ocupou o centro do Mamam no Pátio, com “tijolos” feitos de pão de forma. No fim do projeto, a casa foi oferecida ao público para ser comida. Nas paredes, ficaram amostras da série “Papel Sensível”, no qual Cristiano Lenhardt realizou dobraduras com papel fotográfico ainda virgem e, em seguida, exposto à luz. Os outros dois trabalhos que completaram o TR foram “Exposição In­ternacional deTecnologia e Ar­te, Porra! - EITA, Porra!”, de Jeraman e “Híbrido ao Pul­­so“, de Ricardo Brazileiro.

 Às 18h30, o artista plástico Marcos Vinícius (ES) realizou, no Centro de Formação em Artes Visuais, a performance “Ninguém”, no qual recortou partes de revistas e colou em seu próprio rosto, até formar uma máscara pela qual ele não poderia ser reconhecido e, a partir daí, ter sua individualidade anulada. Essa iniciativa, que não estava incluída na programação da Semana de Artes Visuais, foi o fechamento da oficina “Cartografia do Sensível: Poéticas de Corpos em Ação”.

 No centro do Pátio, ficou a bicicleta incrementada do coletivo carioca Opavivará, com a performance itinerante “Moitará”, palavra do tupi-guarani que significa troca, escambo. Os integrantes do grupo pediram que vários transeuntes das ruas trocassem “moitarás”, moedas de cerâmica, por algo de sua preferência. Tanto objetos co­mo ações imateriais, incluindo poesias ou cantorias, foram aceitos pelos artistas. O saldo, no Recife, foram 460 moedas trocadas.

Posted by Paula Dalgalarrondo at 5:22 PM

setembro 20, 2010

Masp reúne pintura alemã feita desde queda do Muro de Berlim por Silas Martí, Folha de S. Paulo

Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 20 de Setembro de 2010.

Neo Rauch, Richter e Martin Kippenberger estão na exposição

Quando veio abaixo o Muro de Berlim, em 1989, também se dissolveram distinções entre Ocidente e
Oriente no contexto da arte alemã. Na pintura, uma mistura de ícones, estilos e situações tomou a dianteira e forjou nos últimos 20 anos uma onda marcada pelo ecletismo.

Mas não foi uma transição sem traumas. Na mostra que o Masp abre hoje, pintores alemães deixam ver nas telas resquícios do que foi crescer numa terra partida ao meio.

Neo Rauch cria um mundo fantástico. Alia figuração forte, de cores densas e raízes na arte pop dos Estados Unidos, a um universo insólito.

Num dos quadros, mostra pescadores arrastando polvos gigantes para fora de um lago. Um deles tem na mão uma enxada que é, na verdade, uma seta apontada para baixo. Destrincha, no fim, uma melancolia frondosa.

Martin Kippenberger, um egresso da era punk, mistura lembranças sexuais e escatológicas ao tédio violento do momento, numa nação cindida entre o trauma da guerra e a pujança industrial.

É a mesma tensão que aparece nos quadros de Daniel Richter, que esconde sob o hedonismo da cor e da abstração uma agonia dolorosa, personagens intoxicados por uma realidade em formação.

Franz Ackermann e David Schnell, embora mais sutis, vão na mesma rota. Mergulham na estridência da cor, mas tentam dar ordem ao caos com elementos geométricos dispersos na massa cromática como estruturas resistentes ao rolo compressor da história e do tempo.

Num ato calculado de transgressão, Tatjana Doll refaz à sua maneira tosca o clássico "Guernica", de Picasso, que chama de "Nada de Novo no Ocidente".

Ela denuncia a mesma decepção latente das telas de Tim Eitel, que mostra figuras solitárias em andanças por museus e galerias. Na maior de suas telas, uma garota olha para fora do museu.

Avista uma paisagem urbana em busca do que a arte não consegue representar.

Posted by Paula Dalgalarrondo at 5:26 PM

Artista Francis Alys encontra paz no olho do furacão por Silas Martí, Folha de S. Paulo

Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 20 de Setembro de 2010.

O belga radicado no México mostra na Bienal de São Paulo um filme com oito anos de caça às tempestades

Ele compara a violência dos redemoinhos às convulsões políticas do país e lança livro com os bastidores de sua obra

No olho de um furacão, Francis Alys encontrou a graça e a paz de uma igreja. "Entrar não é difícil", conta o artista, que passou os últimos oito anos indo atrás de redemoinhos de pó. "Tem uma corrente de vento e areia muito agressiva em volta, mas, lá no meio, é calmo, monocromático, até sublime."
Ele trocou a Bélgica natal pelo México e a arquitetura pela arte. Do outro lado do oceano, empurrou um bloco de gelo pelas ruas ardentes da capital mexicana, fez um Fusca decrépito subir uma montanha e filmou umas 30 horas de furacões em rodopio pela paisagem agreste.
De certa forma, sua obra balança entre sensações de otimismo e derrota, esforços inúteis em busca de incertezas muito ou pouco plásticas.

Silêncio Sublime

"Não sei se procuro beleza, graça ou redenção", afirma Alys, que mostra seu filme dos furacões na Bienal de São Paulo. "Só acredito que, nesse caso, houve uma busca por um silêncio sublime, por ordem e paz num lugar estranho, como se experimentasse o que é estar à beira da ruína, de um colapso interno."

Na edição da Bienal que começa no próximo sábado, com a intenção de mostrar arte surgida à luz da política, Alys parece estar mais uma vez no centro de um furacão.

Não é panfletária sua obra, nem denuncia algo com clareza, mas trata desse estado latente, de uma ordem primeva sob uma grossa camada de caos na superfície.

Qualquer semelhança com a história de uma região que atravessou ditaduras, moratórias e outros terremotos não é coincidência nesse seu desfile de tempestades.

"Foram oito anos de trabalho e, nesse tempo, a situação política mudou muito, acabou distorcendo o filme", afirma Alys.

"Alguns viram isso como experimento cinematográfico, mas sei que é uma resposta ao lugar onde vivo."
Nesse lugar, um partido que passou mais de 70 anos no poder foi substituído por outro, não sem traumas, no início desta década. Há quatro anos, o vencedor das eleições teve a vitória contestada pela oposição, instaurando uma situação de incerteza que ainda causa seus abalos.

"Foi um momento caótico na história do país [o México], e eu estava viciado em caçar furacões", lembra Alys. "Via a emergência da ordem numa situação de desordem, o colapso do Estado está presente, você sente isso quando está no olho de um furacão", afirma.

Preconceito

Sente, mas não vê. Do lado de dentro, Alys explora uma paisagem homogênea, um denso monocromo marrom dotado de paz enganosa. "É tudo dessa cor", diz apontando para uma fotografia do furacão. "É como estar dentro de uma grande escultura."

Mas Alys, que diz "iludir o espectador para desmentir seus preconceitos", buscando um equilíbrio entre poesia e militância, também quis mostrar o que estava por trás das formas desse furacão.

No livro "Numa Dada Situação", que lança hoje em São Paulo, pela Cosac Naify, mostra os desenhos, estudos e recortes de jornal que fez nas noites depois de editar o filme que está na Bienal, como uma espécie de estrutura secreta do trabalho.

"Editar a obra foi uma sensação visceral, não havia plano", lembra o artista. "Precisava de coisas que me ajudassem a pensar, palavras e conceitos que não explicam a obra, mas traduzem os bastidores de todo esse processo."

Equilíbrio Frágil

Nas páginas do livro, desenhos abstratos contrastam ideias de "governo" e "desgoverno", mapeiam áreas chamadas "caos", "controle", "abandono", "tumulto".

Isso porque foi ali que encontrou paz na urgência de dizer as coisas. "Tudo parece ser um pequeno milagre, é um milagre que o trânsito flua, que um regime fique no poder", diz. "É um equilíbrio muito frágil que funciona."

Posted by Paula Dalgalarrondo at 1:17 PM

setembro 19, 2010

Artista que "matou" Lula e FHC em obras na Bienal diz que sua "lista é muito maior" por Juliana Vaz, Folha de S. Paulo

Inimigos_GilVicente_CampinaGrande.jpg
Inimigos, intervenção pública de Gil Vicente em Campina Grande em 2007, publicado originalmente no e-nforme Ano 7 N. 19, em 2 de março de 2007.


Artista que "matou" Lula e FHC em obras na Bienal diz que sua "lista é muito maior"

Matéria de Juliana Vaz originalmente publicada na Folha Online em 18 de setembro de 2010.

O artista pernambucano Gil Vicente, 52, que está no centro de uma polêmica com a obra "Inimigos", em que ele aparece cortando a garganta do presidente Lula e atirando contra personalidades como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, diz que tem "uma lista muito maior" de personagens para a série.

"Eu não queria desenhar ninguém matando, eu queria desenhar a mim mesmo matando", afirmou. "Não pouparia ninguém desses assassinatos, de jeito nenhum. Pelo contrário, eu tenho uma lista muito maior, representando vários tipos de poder, em vários lugares do mundo."

A série "Inimigos" será exposta na 29ª Bienal de São Paulo, que abre ao público no próximo dia 25. A polêmica em torno dela foi desencadeada pelo pedido feito nesta semana pela OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil) para que os trabalhos sejam removidos, por fazerem "apologia à violência e ao crime".

Além de cortar a garganta de Lula e atirar contra FHC, Gil Vicente também alveja em seus desenhos o Papa Bento 16, a rainha Elizabeth e o presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad e o ex-presidente dos Estados Unidos George W. Bush.

O atual governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), e o ex-premiê de Israel Ariel Sharon são outras de suas vítimas.

A Fundação Bienal classificou como tentativa de censura a manifestação da OAB-SP e reafirmou a exibição da obra.

Gil Vicente diz ter achado "curioso" que a reação contrária à sua obra tenha acontecido apenas em São Paulo. "Expus em 2005 em Recife, e depois em Natal, em Campina Grande, em Porto Alegre, e em canto nenhum houve esse tipo de reação", afirmou.

Quanto à acusação de que sua obra incite à violência, ele diz: "apologia ao crime é o que o nosso governo faz o tempo todo, é o que os políticos fazem, como roubar dinheiro público".

Curador da 29ª Bienal, Agnaldo Farias assinalou que a Bienal não excluirá a obra. Os desenhos vão continuar expostos e com localização estratégica, aos olhos do visitante que sobe a rampa para o segundo andar do pavilhão de Oscar Niemeyer.

O artista diz que sua intenção com a obra foi "descarregar o inconsciente".

Além de "Inimigos", Gil Vicente expõe na Bienal uma série de desenhos pornográficos feitas em páginas de livro.

Posted by Patricia Canetti at 12:01 PM | Comentários (5)

OAB-SP pede retirada de obra polêmica da Bienal, Estado de S. Paulo

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Auto retrato matando George Bush, Gil Vicente, mostrado na Galeria Mariana Moura em 2005-6, publicado originalmente no e-nforme Ano 5 N. 137, em 5 de dezembro de 2005.


OAB-SP pede retirada de obra polêmica da Bienal

Matéria publicada originalmente no Estadão Online em 18 de setembro de 2010.

Um homem magro de óculos e barba branca aponta uma arma para a cabeça do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Ao lado, o mesmo homem segura uma faca, pronto para cortar o pescoço do sucessor, Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Ambos os desenhos fazem parte da Bienal de São Paulo, mas a seção paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP) quer impedir a exposição, alegando apologia ao crime.

As obras fazem parte da série Inimigos, de autoria do artista pernambucano Gil Vicente, e foram publicadas na capa do jornal O Estado de S.Estado ontem. O trabalho reúne vários desenhos em que o próprio artista é representado assassinando líderes e políticos - além de FHC e Lula, são mortos a rainha Elizabeth II, o papa Bento XVI, o ex-presidente americano George W. Bush e dois candidatos ao governo de Pernambuco, Jarbas Vasconcelos (PSDB) e Eduardo Campos (PSB).

O presidente da Fundação Bienal de São Paulo, Heitor Martins, confirmou que a instituição recebeu a notificação da OAB-SP, mas assegurou que as obras não serão retiradas da mostra. "Um dos pilares da Bienal, que vai completar 60 anos, é a independência curatorial e a liberdade de expressão dos artistas. Não vamos exercer nenhum tipo de censura", afirmou.

Caso a posição da curadoria da Bienal não mude, a OAB-SP promete recorrer ao Ministério Público Estadual para pedir a retirada das obras e o indiciamento dos responsáveis por apologia ao crime. A pena prevista por lei é de 3 a 6 meses de detenção ou o pagamento de multa. As informações são do jornal O Estado de S.Paulo.

Posted by Patricia Canetti at 11:57 AM

OAB pede para Bienal de SP retirar obra polêmica por Gustavo Fioratti, Folha de S. Paulo

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Inimigos, intervenção pública de Gil Vicente - cartaz de rua no Recife, publicado originalmente no e-nforme Ano 6 N. 5, em 18 de janeiroo de 2006.


OAB pede para Bienal de SP retirar obra polêmica

Matéria de Gustavo Fioratti originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 18 de setembro de 2010.

Série "Inimigos" retrata artista atentando contra a vida de figuras públicas

Ordem dos Advogados ameaça processar instituição caso quadros de Gil Vicente sejam mantidos

A Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo divulgou ontem nota pública pedindo para que os trabalhos do artista pernambucano Gil Vicente sejam excluídos da Bienal de São Paulo, que abre no próximo dia 25.

Os dez desenhos da série "Inimigos" retratam o próprio artista atentando contra a vida de figuras públicas. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o papa Bento 16 e o presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, por exemplo, aparecem sob a mira de uma pistola. O presidente Lula, por sua vez, com uma faca na garganta.

"Essas obras fazem apologia à violência e ao crime, revelam o desprezo do autor pelas figuras humanas e demonstram um desrespeito contra as instituições públicas", diz o presidente da OAB/SP, Luiz Flávio Borges D'Urso. "Se elas não forem retiradas, a curadoria da Bienal corre o risco de estar cometendo crime."

Risco de processo

Segundo D'Urso, o pedido ainda não é judicial. Mas, caso a curadoria da Bienal decida manter as obras, a OAB deve encaminhar solicitação de abertura de processo pelo Ministério Público.
Agnaldo Farias, um dos curadores desta edição da mostra, diz que as obras não serão retiradas. Segundo ele, a OAB-SP está incentivando um ato de censura.

"Esse trabalho é uma ficção, ela vem do imaginário. Na dramaturgia, também há inúmeros casos de representação de atentados contra instituições públicas. A OAB de São Paulo vai pedir para que esses autores não sejam mais exibidos também?", questiona Farias.

Opinião tacanha

"A representação artística deve ter limites. Se as figuras retratadas não fossem reconhecíveis, aí sim poderíamos tratá-las na esfera da ficção", rebate D'Urso.

O criminalista Alberto Zacharias Toron considera "tacanha" a opinião do presidente da OAB. "Falar em incitação ao crime é de uma grande incompreensão sobre o papel da arte", argumenta o advogado, doutor em direito penal pela USP, ex-diretor do conselho federal da própria OAB.

Segundo Toron, a liberdade de expressão do artista é garantida pela constituição do país.

Segundo o autor das obras, que tem 2 m por 1,5 m e são feitas com carvão, elas não foram pensadas para incitar a violência.

"Eu não mataria ninguém, nem quero que outras pessoas façam isso. A violência que eu retrato parte do próprio mundo político contra um país inteiro", explica Vicente.

O trabalho, reitera o artista, fala diretamente sobre uma insatisfação. "Nada muda na mão de políticos. O país continua cheio de miseráveis. A morte que eu apoio dessas pessoas é simbólica."

Gil Vicente diz que não comparece às urnas desde que iniciou a criação da série "Inimigos", em 2005. "Eu tenho consciência de que ter esperança nessas figuras é bobagem. Não vou mais cair nessa", afirma.

Frases

Não sou contra a criação de trabalhos como este. Sou contra a exibição deles. Isso não é censura. Crianças e jovens em formação vão passar por ali. Se elas não forem retiradas, a curadoria corre o risco de estar cometendo crime.
Luiz Flávio Borges D'Urso, presidente da OAB/SP

Eu não mataria ninguém, nem quero que outras pessoas façam isso (...) Nada muda na mão de políticos. O país continua cheio de miseráveis. A morte que eu apoio dessas pessoas é simbólica.
Gil Vicente, artista

Esse trabalho é uma ficção, ela vem do imaginário. Na dramaturgia, também há inúmeros casos de representação de atentados contra instituições públicas.
Agnaldo Farias, um dos curadores da Bienal

Eu assisti ao filme "Rambo", e até agora não matei ninguém.
Leda Catunda, artista plástica

Posted by Patricia Canetti at 11:42 AM

Bienal diz que manterá desenhos de Gil Vicente, apesar de pedido da OAB, Estado de S. Paulo

Matéria publicada originalmente no Estadão Online em 17 de setembro de 2010.

Série do artista o retrata a ponto de assassinar personalidades; para OAB, ela é 'apologia ao crime'

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) pediu nesta sexta-feira, 17, que uma série de desenhos de um artista brasileiro que o retratam assassinando personalidades como o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o papa Bento XVI seja retirada da Bienal. As informações são da agência de notícias AFP.

Segundo a entidade afirmou em um comunicado, a exibição da série "Inimigos", do artista Gil Vicente, pode ser considerada uma "apologia ao crime".

"Ainda que uma obra de arte expresse a criatividade de seu autor livremente e sem limites, deve haver determinados limites para a sua exposição pública", acrescenta o texto.

Em resposta, os organizadores da Bienal declararam em uma nota de imprensa que "um valor fundamental da instituição é a independência curatorial e a liberdade de expressão". Segundo os responsáveis, "as obras expostas não refletem a opinião dos curadores nem da Fundação Bienal" (à frente da mostra).

Segundo a Bienal, os desenhos "traduzem um incômodo do artista diante dos modos de representação política vigentes" e uma "desilusão profunda" sobre possíveis mudanças que às vezes levam a um enfrentamento violento.

"Inimigos" é uma série de nove desenhos de carbono sobre papel do tipo autoretrato realizados entre 2005 e 2006.

A compilação mostra o artista em atitudes violentas atentando contra personalidades do Brasil e do mundo.

Gil Vicente aparece degolando Lula, disparando uma arma contra a cabeça do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2003), e apontando uma pistola contra o papa Bento XVI.

O artista também mira com uma arma o presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, a rainha da Inglaterra, Elizabeth II, e o ex-primeiro ministro de Israel, Ariel Sharon, que aparece caído no chão.

Posted by Patricia Canetti at 11:34 AM

Obra que estará na Bienal causa polêmica por "matar" FHC e Lula, Folha de S. Paulo

Matéria originalmente publicada na Folha Online em 17 de setembro de 2010.

A "Série Inimigos", de Gil Vicente, está causando polêmica antes mesmo de ser exposta na Bienal de São Paulo, que será inaugurada na próxima terça-feira. Nela, o artista retrata a si mesmo matando personagens famosos como Fernando Henrique Cardoso e Lula.

Nesta sexta-feira, a OAB-SP (Ordem dos Advogados de São Paulo) divulgou uma nota em que se coloca contra a exposição da série, "por fazer apologia ao crime".

"Uma obra de arte, embora livremente e sem limites expresse a criatividade do seu autor, deve ter determinados limites para sua exposição pública. Um deles é não fazer apologia ao crime como estabelece a vedação inscrita no Código Penal Brasileiro.

A série de quadros denominada "Inimigos", do artista plástico Gil Vicente, é composta por obras as quais retratam, dentre outras, o autor atirando contra a cabeça do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, noutra mostra o mesmo autor, de posse de uma faca, degolando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Essas obras, mais do que revelar o desprezo do autor pelas figuras humanas que retrata como suas vítimas, demonstra um desrespeito pelas instituições que tais pessoas representam, como também o desprezo pelo poder instituído, incitando ao crime e à violência.

Certamente não se pode impedir que uma obra seja criada, mas se deve impedir que seja exposta à sociedade em espaço público se tal obra afronta a paz social, o estado de direito e a democracia, principalmente quando pela obra, em tese, se faz apologia de crime.

Por esse motivo é que a OAB/SP está oficiando os curadores da Bienal de São Paulo, para que essas obras de Gil Vicente, da série "Inimigos" não sejam expostas naquela importante mostra."

Posted by Patricia Canetti at 11:26 AM

setembro 17, 2010

Bienal terá Glauber Rocha e José Celso por Fabio Cypriano, Folha de S. Paulo

Matéria de Fábio Cyprianooriginalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 17 de setembro de 2010.

Programação dos primeiros quinze dias de exposição incluirá cinema e performances, além de ciclo de debates

Obra de Lygia Pape e encenação de "Bailado do Deus Morto" pelo grupo Teatro Oficina são destaques do evento

Glauber Rocha, José Celso Martinez Corrêa, Agnés Varda e Maurício Ianês são alguns dos nomes que passam a integrar a seleção de artistas da 29ª Bienal de SP.

Eles fazem parte da programação dos terreiros da mostra, que a Folha obteve.

Anteontem, foi definido o programa de eventos dos 15 primeiros dias da mostra, que irá se desenvolver basicamente em três terreiros, espaços de convivência organizados pela curadoria: "A Pele do Invisível", dedicado à exibição de filmes, "O Outro, o Mesmo", para performances, e "Eu Sou a Rua", para práticas discursivas.

"Em cada um desses espaços buscamos ultrapassar as divisões tradicionais, tanto faz se o filme é mais próximo do cinema ou das artes plásticas, ou se é dança ou performance", diz Pedro França, coordenador do programa dos terreiros.

OFICINA
No primeiro fim de semana, o destaque fica por conta da reencenação de "Divisor", de Lygia Pape (1927-2004), embaixo da marquise do Ibirapuera, da palestra com Joseph Kosuth, um dos pioneiros da arte conceitual, no terreiro "Eu Sou a Rua", ambas no sábado, e a encenação do "Bailado do Deus Morto", de Flávio de Carvalho (1899-1973), com o Teatro Oficina e direção de José Celso Martinez Corrêa, no domingo.

No terreiro "A Pele do Invisível", serão exibidos dez programas de filmes que irão se revezar, um por dia, até 12 de dezembro.

Entre eles, estão desde produções históricas como "Pátio" (1959), primeiro filme de Glauber Rocha (1939-1981), até recentes sucessos no exterior, como "Uma Carta para Tio Boonmee" (2009), do cineasta tailandês Apichatpong Weerasethakul.

A filósofa Marilena Chauí irá coordenar um ciclo de debates e a cada sábado abordará uma obra da Bienal.
Já Maurício Ianês, que causou sensação na Bienal passada, ao entrar nu no pavilhão e lá permanecer 13 dias, dessa vez ficará ouvindo histórias por 20 dias para, numa data a ser anunciada, organizar uma leitura simultânea com cem deles no prédio.

Ao longo da mostra, a programação de eventos será atualizada.

Posted by Cecília Bedê at 3:28 PM

setembro 15, 2010

Primeira exposição de Fred Sandback no Brasil contém desafios à arquitetura por Fabio Cypriano, Folha de S. Paulo

Matéria de Fabio Cypriano originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 15 de setembro de 2010.

O artista norte-americano Fred Sandback (1943-2003), um dos grandes nomes do pensamento conceitual em situações tridimensionais, ganha, finalmente, sua primeira exposição no Brasil. Ela ocorre em dois locais em São Paulo, e um no Rio.

Com curadoria da brasileira Lilian Tone, do Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA), a seção paulista vai além da obra mais conhecida de Sandback -as construções com fios de lã acrílica- e apresenta ainda trabalhos em papel, incluindo duas Construções Conceituais.

"Existe uma escultura que consiste em toda luz refletida pela existência desta afirmação, e de nada mais" é o que está datilografado numa folha de papel e faz parte de uma das 33 obras no Instituto Moreira Salles.
Essa Construção Conceitual, de 1969, aponta para como, em Sandback, o pensamento escultórico livrou-se da matéria para propor uma reflexão sobre o espaço.

A partir daí, fica mais simples compreender a obra do artista com os fios de lã, tão próximos dos trabalhos do brasileiro Waltercio Caldas, que começou a produzir suas obras na mesma época. Linhas coloridas soltas no espaço constroem limites, demarcando territórios na obra do artista norte-americano. Nos cantos, esses mesmos fios desafiam a arquitetura, com a criação de novos ângulos.

SEM RÓTULOS

Sandback cria por meio do desenho no espaço uma nova forma de percepção, o que o leva para além do minimalismo, onde costuma estar rotulado pela crítica. Na mostra de São Paulo, as obras de maior porte estão no Centro Universitário Maria Antonia, em um novo espaço, junto ao Instituto de Arte Contemporânea (IAC). Enquanto uma trabalha com a gravidade, com os fios coloridos que pendem do teto, a outra cria volumes por linhas diagonais pretas. Em todas, Sandback desafia a arquitetura.

FRED SANDBACK: O ESPAÇO NAS ENTRELINHAS
ONDE Instituto Moreira Salles (r. Piauí, 844, Higienópolis, tel. 0/ xx/11/3825-2560)
QUANDO ter. a sex., das 13h às 19h; sáb. e dom., das 13h às 18h. Até 24/10.
QUANTO entrada franca

ONDE Centro Universitário Maria Antonia - USP (r. Maria Antônia, 256, Centro, tel. 0/xx/11/3255-7182)
QUANDO ter. a sex., das 10h às 21h, sáb. e dom., das 10h às 18h. Até 24/10
QUANTO entrada franca
AVALIAÇÃO ótimo

Posted by Cecília Bedê at 12:30 PM

Ponte entre livros e imagens, Diário de Pernambuco

Matéria originalmente publicada no jornal Diário de Pernambuco em 14 de setembro de 2010.

SPA Das Artes // Clássicos da literatura inspiraram a mostra fotográfica que Eduardo Simões inaugura hoje na cidade

Em sua primeira exposição no Recife, o fotojornalista autodidata Eduardo Simões mostra uma série inédita. Ideogramas, que pode ser vista no térreo da Arte Plural Galeria, no Bairro do Recife, a partir de hoje, parte da árida paisagem da caatinga do Sertão de Canudos, na Bahia, e da Paraíba, para lançar novas interpretações sobre cactos e gravetos secos, retorcidos. A inspiração para as imagens em preto e branco - feitas em negativo Tri-X Pan 6 por 6 e impressas com apoio do Instituto Moreira Salles - veio da obra de escritores como Ariano Suassuna, Euclides da Cunha e Rachel de Queiroz. "É uma revisão de meu trabalho, onde a caatinga, único bioma exclusivamente brasileiro, deixa o lado mítico, de espelho da miséria do país, para ser algo fascinante, com um lado escultórico", pontua Edu Simões.

A outra série exposta na Arte Plural, no primeiro andar da galeria, é Vestígios: o Rio de Machado de Assis, quando o fotógrafo partiu do universo machadiano para capturar no Rio do século 21 resquícios da cidade do século 19. "A exposição é Paisagem sem memória porque as fotos estão descoladas do lado documental, são quase ficcionais, uma invenção do que acho que acontecia naquele tempo", detalha Edu Simões, que clicou desde uma escadaria no Parque Lage, até o bondinho, com a catedral do Rio ao fundo (no contraste entre o passado e uma construção moderna), além de uma esquina de Santa Tereza ao cair da tarde, com os trilhos de bonde cortando o chão de pedra, entre outros cenários.

Nos dois casos, ao fotografar o Sertão e o Rio de Janeiro, o resultado é poético e delicado, propondo novos ângulos para paisagens conhecidas, que deixam de ser elas mesmas para adquirir novas significações. A ideia de ligar literatura e fotografia surgiu quando Eduardo Simões foi convidado pelo Instituto Moreira Salles para participar dos Cadernos de Literatura. O primeiro, sobre a obra de João Cabral de Melo Neto, foi clicado no Recife, 15 anos atrás. "O que importa é o espectador criar seu jogo com a imagem construída, como objeto de arte. Nossa preocupação é estarmos antenados com a contemporaneidade", explica Simonetta Persichetti, crítica de arte e curadora de fotografia da Arte Plural. A mostra integra a programação do SPA das Artes. (Tatiana Meira)

Posted by Cecília Bedê at 12:22 PM

SPA das Artes: Público interage com artista e ganha desenho por Dulce Reis, diariodepernambuco.com.br

Matéria de Dulce Reis originalmente publicada no caderno Viver do diariodepernambuco.com.br em 14 de setembro de 2010.

“Troque este vale por um desenho”. Esta frase está escrita em 150 folhas desenhadas de um talão que foram distribuídas aleatoriamente entre os moradores do bairro de Peixinhos, no Recife, ontem. A ação Vale desenho – Encontro Simbólico faz parte do SPA das Artes 2010, promovida pelo artista João Lin. Hoje, várias pessoas foram até a Biblioteca do Nascedouro para pegar o seu desenho. Mas, para isto, o interessado tinha que conversar com o artista. Da troca de ideias, surge um novo desenho, diferente do que estava no papel do talão, mas mais parecido com a vida que o presenteado leva.

A comerciante Luciene Maria, 50 anos, confirmou isto. Ela recebeu um papel com vários olhos desenhados. “Achei perfeito com o momento em que estou passando na minha vida”, disse. A moradora do bairro de Peixinhos disse estar se recuperando de uma cirurgia em um dos olhos. E a conversa que ela teve com o artista foi refletida na ilustração que recebeu.

Já a estudante Nathalia Regina, 24 anos, filha de Luciene, resolveu acompanhar a mãe e acabou ficando com uma obra do artista. “Dei o nome da minha de ‘Um peixe de cauda longa submergindo de um mar turbulento”, conta. Sobre a ação do SPA das Artes, a estudante ainda disse ter ficado satisfeita por ter conhecido o local. “Eu não conhecia esta funcionalidade do Nascedouro. Uma coisa levou a outra”, disse.

“A brincadeira é a pessoa não saber o que é o desenho. Assim, ela vai querer saber o que é. Eu acho que o importante é o diálogo”, conta Lin. “Às vezes o trabalho sai da proposta de fazer o desenho a partir do que tem no talão. Teve um rapaz que queria um Exu. E ele recebeu. O mais importante é a interação e que a pessoas fiquem satisfeitas, que se sintam bem”, resume o artista.

E esta possibilidade de interação com o público foi um dos motivos para o artista escolher o bairro de Peixinhos para desenvolver a ação. “Não tem lugar melhor para esta brincadeira com símbolos do que uma biblioteca”, disse.

Além disso, Lin afirmou que este trabalho é também uma forma de aplicar o dinheiro público com a arte fora dos centros que geralmente consomem e contam com mais oferta de trabalhos artísticos. “É uma questão de responsabilidade com o dinheiro público”, resumiu o artista.

Vale desenho – Encontro Simbólico é desenvolvida pelo artista João Lin por conta da Bolsa Prêmio Exposições Descentralizadas, promovida pelo SPA das Artes 2010. Na próxima sexta-feira, às 19h, o público ainda poderá conferir um vídeo realizando durante o processo artístico. O encontro acontecerá na Praça da Caixa D’Água, também no bairro de Peixinhos, no Recife.

Posted by Cecília Bedê at 12:10 PM

“Dois Pontos” abre o Amplificadores, Folha de Pernambuco digital

Matéria originalmente publicada na Folha de Pernambuco digital em 15 de setembro de 2010.

Projeto é iniciativa anual do Murillo La Greca e tem curadoria de Fernanda Albuquerque

Desdobrar um conceito em várias vertentes é o objetivo da exposição coletiva “Dois Pon­tos”, que inicia o ciclo de expo­sições do Projeto Amplificado­res, iniciativa anual do Museu Mu­rillo La Greca. Nesse caso, a ideia é ilustrada pela curadora Fer­nanda Albuquerque com ar­tistas de vários Estados: Carla Zaccagnin, Enrico Rocha, Fabio Morais, Guilherme Teixeira, Hélio Fervenza, Lucas Levitan, Marina Camargo, Regina Melim e Vitor César. No entanto, a quantidade de artistas não significa uma ocupação intensiva do espaço. “A intenção é exibir trabalhos que lidem muito mais com a sugestão de imagens para o espectador”, explica a idealizadora da mostra.

Isso significa que as obras encontradas no La Greca, produzidas entre 2003 e 2010, trabalham muito mais com a reação do público aos trabalhos. Um deles é “Três Pinturas”, de Levitan; na verdade um facho de luz na parede, acompanhado por uma descrição minuciosa de uma pintura de paisagem. O mesmo caminho é seguido por Fábio Morais em “O Performer”, com uma narrativa no lugar do registro de uma ação do artista. O objetivo seria fazer com que as pessoas completassem a obra imaginando a cena pensada por ele. Vítor César traz “Destinatário”, com reprodução de etiqueta usada na identificação de presentes, com os campos “De” e “Para”.

Já Enrico Rocha faz um montinho com 100 mil peças de que­bra-cabeça no chão do museu, no qual o espectador pode tanto começar a montar como apenas observar. O objeto mais lúdi­co da mostra é “Rolê”, de Guilherme Teixeira, um skate circular com capacidade entre 2 a 10 pessoas. Zacagnini, por sua vez, foi até a Suécia filmar o sol da meia-noite, em que a câmera fotográfica é posta em cima de uma vitrola e fica girando, levando à tontura.

A mostra também tem uma parte dedicada a publicações: Regina Melin traz uma espécie de coletânea de trabalhos de outros artistas, que dão instruções para demandar a participação de quem lê. Marina Camargo transporta as esculturas de Constantin Brancusi para um folheto que mostra como o espectador poderia fazê-la apenas com as mãos. Hélio Fervenza traz a público sua experiência como natural de Santana do Livramento, cidade na fronteira entre o Brasil e o Uruguai. Ele pediu para que professores de geografia dos dois países dessem uma aula sobre o deserto, cada um em seu idioma, ao mesmo tempo e na mes­ma turma, e descreve o processo no livreto “Transposições do Deserto”.

Posted by Cecília Bedê at 12:03 PM

Murillo La Greca inaugura Dois Pontos, site da Prefeitura do Recife

Matéria originalmente publicada no site da Prefeitura do Recife em 13 de setembro de 2010.

Exposição selecionada pelo Projeto Amplificadores abre dentro da programação do SPA das Artes

De 14 de setembro a 16 de outubro, o Museu Murillo La Greca apresenta a exposição Dois Pontos, selecionada pelo Projeto Amplificadores 2010. Sob a curadoria de Fernanda Albuquerque, a mostra reúne trabalhos de nove artistas oriundos de diferentes localidades do país: São Paulo, Fortaleza, Florianópolis e Porto Alegre. São eles: Carla Zaccagnini, Enrico Rocha, Fabio Morais, Guilherme Teixeira, Hélio Fervenza, Lucas Levitan, Marina Camargo, Regina Melim e Vitor César. Dentre as obras, instalações, publicações, um trabalho em vídeo e uma escultura a ser utilizada pelo público como uma espécie de skate circular em que as pessoas podem “brincar” rodando e de mãos dadas.

DOIS PONTOS - Sinal de pontuação que anuncia a complementação ou desdobramento de uma ideia, abre espaço para a fala de outro interlocutor – apresenta produções que trazem em comum imagens e experiências não realizadas, inacabadas ou em aberto, que de alguma maneira acontecem mais na imaginação do espectador do que são, de fato, dadas a ver. “É o que ocorre, por exemplo, nas pinturas faladas de Lucas Levitan (Três pinturas, 2003), em que o visitante vê apenas um spot de luz na parede, enquanto ouve a descrição minuciosa de uma pintura de paisagem.” – ilustra a curadora, Fernanda Albuquerque. Do mesmo modo, as performances de Fabio Morais (O performer, 2005) não se apresentam como ação, mas como texto, narração, oferecendo ao observador a possibilidade de imaginá-las: do ambiente em que acontecem aos gestos, sons, cheiros, objetos, expressões e pessoas envolvidas.

O texto e a sugestão também estão presentes em pf (por fazer) (2006), exposição portátil organizada por Regina Melim. Trata-se de uma publicação que reúne não um conjunto de obras prontas, fechadas, mas projetos em aberto, colocados à disposição do público para a sua realização. Fruto de uma reflexão sobre a performance nas artes visuais, pf propõe a noção de “espaço de performação” como chave de leitura da mostra.

A ideia também nos fala dos trabalhos de Enrico Rocha (Continuo tentando compreender, 2003), Marina Camargo (Brancusi no ar, 2010) e Guilherme Teixeira (Rolê, 2010). Abertos à participação do público, os três apontam para imagens e experiências improváveis, ainda que não impossíveis: completar um quebra-cabeça em branco gigante, refazer no ar e com as mãos as esculturas do romeno Constantin Brancusi e andar num skate circular com dez pessoas.

Já as produções de Hélio Fervenza (Transposições do deserto, 2003) e Carla Zaccagnini (E pur si muove / E no entanto se move, 2007), embora plenamente realizadas, guardam consigo a potência imaginativa das histórias que as constituem – quase como se pudessem existir apenas como imagem narrada. Realizada na fronteira do Brasil com o Uruguai, nas cidades de Sant'Ana do Livramento e Rivera, Transposições consistiu na troca de professores de geografia entre uma escola brasileira e uma uruguaia. Durante um mesmo período e simultaneamente, duas educadoras ministraram uma aula sobre deserto em suas respectivas línguas para uma turma situada do outro lado da linha divisória. Fruto de um esforço igualmente épico e singelo, E pur si muove envolveu a viagem da artista até o monte Nuolja, na Suécia, onde passou uma noite sozinha a filmar o sol da meia noite na companhia da música de Jan Johanson. Enquanto Transposições é apresentada por meio de um relato que toma a forma de livreto, abrindo espaço à dúvida quanto à sua concretização, a obra de Carla constata-se à medida que se apresenta, ao documentar o fenômeno (e o feito) que é ao mesmo tempo ponto de partida e de chegada do trabalho.

Por fim, Destinatário (2009), de Vitor César, funciona como uma espécie de metáfora da exposição. Trata-se de um cartaz que reproduz a clássica etiqueta utilizada na identificação de presentes, num exercício de endereçamento em que o enunciado, o presente, é deixado em aberto, existe apenas como alusão.

Serviço:
Projeto Amplificadores 2010|Exposição Dois Pontos
Abertura: 14 de setembro de 2010|19h
Visitação: de 15 de setembro até 16 de outubro de 2010
De terça à sexta | das 9h às 12h e das 14h às 17h
Sábados das 14h às 17h

Posted by Cecília Bedê at 11:58 AM

Nuno Ramos equaliza o sublime eo grotesco por Silas Martí, Folha de S. Paulo

Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 15 de setembro de 2010.

Artista tem individual com árvores e aviões no MAM-Rio e está na Bienal

Ele compara seu viveiro de urubus a "velório e canção de ninar" e diz que sua obra no Rio está no "limite do cafona"

Numa pausa na montagem, Nuno Ramos mostra as queimaduras de soda cáustica nas mãos e no rosto.

Homens que ajudam o artista a revestir de sabão árvores e dois monomotores sobem e descem as rampas do Museu de Arte Moderna do Rio, os braços cobertos de plástico.

"Esse é o trabalho mais difícil que já fiz", conta o artista, no caixa do posto de gasolina ao lado do museu. Ele compra chá gelado e batatas Ruffles para enganar a fome diante da obra monumental que faz numa sala com vista para o aterro do Flamengo.

Dois aviões parecem ter se embrenhado na copa de flamboyants ressecados. No andar de cima, enormes esferas de terra cospem para fora imagens de um diálogo estranho seguidas da projeção de um filme pornográfico, em que as falas são nomes de choros -"Brasileirinho", "Vibrações" e "Corta-Jaca".

São 20 toneladas de areia socada, sabão e fuselagem. Pelo menos 30 homens, um deles engenheiro calculista, trabalharam para terminar em tempo da abertura, hoje.

Enquanto isso, em São Paulo, um enorme viveiro de urubus é montado no vão central do pavilhão feito por Oscar Niemeyer, trabalho de Ramos na edição da Bienal que começa em dez dias.

Numa obra que costuma transitar entre a austeridade e a euforia, estruturas superlativas não escondem a delicadeza estranha do artista.

Entre berros, ordens e ajustes finais da exposição, Ramos falou à Folha nos jardins do MAM. Leia a seguir trechos dessa conversa.

Folha - Como a obra que você mostra agora no MAM se relaciona com o trabalho da Bienal de São Paulo? Há uma dimensão política nas duas?

Nuno Ramos
- Passei esse ano pensando na Bienal e aqui. Quis fazer uma peça de algum modo política, entender a capacidade imagética de carimbar uma época, alegorizar um tempo. Me lembrei dos urubus e dessa litania que o trabalho é, um trabalho de luto muito calado.

Tinha um repouso, não era a violência em ato, era uma coisa calma, aquelas canções, os bichos voando, uma espécie de desaceleração. A obra inteira tem algo entre velório e canção de ninar.

"Fruto Estranho" [trabalho com os aviões nas árvores no MAM] está no limite do cafona. Na Bienal é austero, esse é mais histérico. É outra fusão entre o vivo e o morto.

Acredita que isso tem a ver com o momento político e econômico atual do país?

É um momento de grande aceleração sem direção, um segundo desenvolvimentismo. Também há uma cegueira e falta de capacidade de projetar. É uma espécie de agora dilatado que o Brasil sempre vive. Somos o "nunca antes neste país" eterno.

Sinto que esse ufanismo só vai ter algum sentido quando enraizar. O Brasil não superou ainda essa vertigem superficial, o modo de operar a vida como se fosse acabar amanhã. É um pouco eufórico, não tenho tesão nisso.

E com o momento da Bienal?

Essa Bienal vem com uma força guardada. A "Bienal do Vazio" foi das coisas mais idiotas que o Brasil já fez. Essa vem suceder uma cagada monstruosa. Ainda assim, esse museu está caindo aos pedaços. O mundo institucional não é o que já foi, embora haja novas forças.

Sua obra parece bem menos abstrata agora, marcada por contrastes mais aguçados.

É o novo e o velho, a soda e a banha, o cachorro e o asfalto. Essa passagem entre matéria e sentido é o que parece estar acontecendo. A matéria foi criando raiz semântica, buscando uma linguagem.

Ponho tudo em fusão, cópula. Eu sou romântico, acredito na verdade que resulta disso. Quero que o choro e o pau duro transfiram de um para o outro alguma coisa em comum. Gostaria de equalizar o sublime da música e o grotesco de uma boceta.

RAIO-X NUNO RAMOS

VIDA E OBRA
Nasceu em São Paulo, em 1960. Sua obra é pautada pelos contrastes e pesquisa de materiais, empregando areia, vidro, vaselina, sabão, água, feltro, mármore, entre outros

CARREIRA

Esteve na 18ª Bienal de São Paulo, em 1985, na 2ª Bienal de Havana, em 1986, e na 5ª Bienal do Mercosul, em 2005

MOSTRAS ATUAIS
Abre hoje ao público individual no MAM do Rio, com obras inéditas, e está na próxima Bienal de SP, que abre ao público no dia 25

Posted by Cecília Bedê at 11:24 AM

O multiartista Nuno Ramos testa os limites do excesso na exposição ‘Fruto estranho’ no MAM por Suzana Velasco, O Globo

Matéria de Suzana Velasco originalmente publicada no caderno Cultura do jornal O Globo em 14 de setembro de 2010.

O multiartista Nuno Ramos testa os limites do excesso na exposição ‘Fruto estranho’, que abre hoje no MAM unindo natureza e tecnologia, vida e morte, sujeira e pureza

“VERME”: duas esferas de areia socada que projetam nas paredes vídeos de atores lendo um texto do artista

No alto de um andaime, o artista plástico Nuno Ramos se misturava aos cerca de 20 trabalhadores que inseriam sabão no molde de uma estrutura de seis metros de altura e mais de dez toneladas. Eram dez da manhã da última quarta-feira, e Nuno já estava na quinta operação de preenchimento de sabão. Seriam 33 até o fim do dia, todas exigindo total concentração da equipe, porque o líquido penetrava até nos parafusos dos dois aviões monomotores que o artista levou para o salão monumental do Museu de Arte Moderna (MAM). Cada um deles está embrenhado num tronco de árvore sem folhas, um como se fosse cair de vez, o outro como se ainda tentasse levantar voo. No fim de semana, já com o sabão endurecido, os moldes começaram a ser retirados para que a obra “Fruto estranho” seja revelada na exposição de mesmo nome, com curadoria de Vanda Klabin, que será inaugurada hoje, às 19h.

Após a quinta inserção de sabão, Nuno desceu e retirou a máscara cirúrgica e o plástico que envolvia seus braços, já cheios de queimaduras causadas pela soda cáustica, material corrosivo que dá origem a ao líquido que é símbolo de limpeza. Com as calças imundas, o “operário” deu lugar ao artista reflexivo, cujas obras têm origem em referências da literatura, da música — campos em que também atua com maestria —, do cinema e da própria arte. Ainda assim, o embate com a matéria é fundamental em seu trabalho, como se vê ainda nas duas outras obras da mostra. A também inédita “Verme” é formada por duas esferas de areia socada das quais são projetados nas paredes dois vídeos em que dois atores se intercalam na leitura do texto “Verme”, escrito pelo artista. Já em “Monólogo para um cachorro morto”, um texto é gravado na face interna de cinco pares de lápides de mármore. Numa delas, há um vídeo de um cachorro morto e o som do monólogo escrito por Nuno.

— Num primeiro momento da minha obra, os materiais se misturaram. Depois, eles se transformaram em códigos culturais, viraram literatura, poemas. Há uma cópula entre a matéria e o sentido — explica o artista plástico e premiado escritor.

Nuno cria diversas cópulas na mostra, até chegar à mais explícita, num vídeo pornô que finaliza as projeções de “Verme”. Em “Fruto estranho”, o artista une as ideias de natureza e tecnologia, vida e morte, sujeira e pureza. Soda cáustica pinga de duas ampolas acopladas às asas de cada um dos aviões, caindo em dois contrabaixos abertos e repletos de banha, que permanecerá sempre quente. A ideia surgiu depois que Nuno leu um poema de Pushkin sobre uma árvore que pinga veneno.

— A imagem de uma árvore coberta numa gordura é meio mística, e o avião é o oposto, algo muito do século XX. Os materiais também copulam quimicamente no sabão, que é feito de um líquido muito violento. Quando faço sabão, a sensação é que há uma reação de alergia que une os elementos — diz ele, atestando o caráter trágico da escultura. — Para mim, o lance não é a morte, mas a reconfiguração que a morte faz. Não é o desastre, mas a transformação.

Para reconfigurar seu desastre, o artista precisou de um engenheiro calculista, que garantiu que o MAM ficaria no lugar depois que se distribuíssem as cerca de 35 toneladas das obras pelos três mil metros quadrados do museu. Nuno conseguiu os troncos de flamboyant na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, em Piracicaba. Comprou um dos aviões perto do aeroporto de Viracopos, em Campinas, e o outro em São Paulo. Os dois terão alguns pedaços aparecendo em meio à cobertura de sabão.

— Sobra uma energia do fato de os aviões serem de verdade — diz ele, admitindo ter tido receio durante a criação. — Fiquei com uma certa vergonha, pensando se seria muito excessivo. Tenho um problema com o limite. A falta de limite do Orson Welles, por exemplo, fazia com que ele não executasse os projetos. No meu caso, eu saio do limite e fico me matando para voltar para ele. Vou ficando culpado e penso: onde estou me enfiando?

A obra “Fruto estranho” é composta ainda de uma cena do filme “A fonte da donzela” (1959), de Ingmar Bergman, em que o personagem de Max Von Sidow balança uma árvore até derrubá-la. O som será a voz de Billie Holiday cantando “Strange fruit” (“Fruto estranho”), composta por Abel Meeropol após um linchamento de negros em Indiana, em 1936.

No salão monumental, os visitantes também poderão ouvir ecos dos sons vindos do mezanino, com as vozes dos dois atores “anunciando a visão do verme”, como diz Nuno. O espectador nunca conseguirá ver os vídeos ao mesmo tempo.

— É como se eles tentassem saber se são um ou dois, se foram cortados ao meio. Buscam uma unidade que não volta — diz Nuno, que se inspirou em textos de William Blake sobre anjos e vermes.

Posted by Cecília Bedê at 10:56 AM

setembro 14, 2010

Mercado da arte vive boom pré-Bienal por Mariana Barbosa, Folha de S. Paulo

Matéria de Mariana Barbosa originalmente publicada no caderno Mercado da Folha de S. Paulo em 12 de setembro de 2010.

Arte gera R$ 200 mi por ano e artistas brasileiros multiplicam valorização; centenas de estrangeiros vêm a evento

Bienal que começa na semana que vem pode render R$ 250 mi a SP, maior renda turística depois da Fórmula 1

Centenas de colecionadores estrangeiros e diretores de instituições internacionais de prestígio, do MoMa à Tate, chegam ao país na semana que vem para a abertura da 29ª Bienal de São Paulo.

As dezenas de jantares e de visitas guiadas a galerias que os esperam são apenas parte de um momento oportuno para a arte brasileira, que já movimenta estimados R$ 200 milhões por ano.

Desde o início da década, o mercado tem crescido a um ritmo de 50% ao ano. Diversas obras se valorizam a 30% ao ano, deixando para trás outras aplicações de risco. A força econômica do setor não passa despercebida.

"O Brasil está na moda e as pessoas percebem que ter arte em casa é um luxo", diz a galerista Luisa Strina, dona da mais antiga galeria de arte contemporânea de São Paulo. "Primeiro, as pessoas têm de ter casa, carro; depois, um carro melhor. A arte é o último luxo. Um luxo necessário, que te faz pensar."

Luisa afirma que, há menos de dez anos, vendeu um trabalho da série Metaesquema, de Hélio Oiticica, por US$ 5.000. Na última edição da SP Arte, feira que reúne galeristas de todo o país, um Metaesquema similar estava à venda por US$ 250 mil.

"A arte se tornou um ativo muito interessante. Tem muita gente querendo comprar e pouca gente querendo vender", avalia Jones Bergamin, da Bolsa de Arte.

Nem mesmo a crise internacional, que levou a uma retração do mercado de arte europeu e americano da ordem de 30% no ano passado, fez os preços dos artistas brasileiros caírem. "O mercado continuou crescendo, mas o ritmo de alta foi reduzido", diz Bergamin. Ele estima que o mercado deva crescer entre 10% e 20% neste ano.

VALORIZAÇÃO
Depois que a tela "O Mágico" (2001), de Beatriz Milhazes, alcançou a marca de US$ 1 milhão em um leilão da Sotheby"s, em 2008, o mercado de artes passou a atrair investidores interessados puramente no potencial de valorização das obras.

A Plural Capital, butique de investimentos formada por ex-sócios do Pactual, está estruturando um fundo de investimentos de R$ 50 milhões para artes plásticas -o Brazil Golden Art. Com prazo de cinco anos, o fundo pretende passar os três primeiros anos adquirindo obras de artistas contemporâneos, e os dois últimos vendendo.

Heitor Reis, um dos sócios do fundo, diz que já captou 80% do total. "Se analisarmos os últimos dez anos, os investimentos em arte tiveram uma valorização muito superior à da Bolsa." De 1999 a 2009, o Ibovespa subiu, em média, 26,03% ao ano. O BGA não foi às compras, mas Reis já pensa no lançamento de um segundo fundo.

No mundo das galerias, já começam a surgir histórias de especuladores, que compram na galeria e logo em seguida colocam a obra à venda em leilão.

Mas nem só de especuladores e investidores profissionais vive o mercado. Se há 20 anos dava para contar nos dedos o número de colecionadores sérios, hoje eles passam de mil.

Novas galerias surgem a todo instante -eram 50 no eixo Rio-SP no início da década. Hoje são 90. A arte está na abertura da novela da Globo ["Passione"], com trabalho de Vik Muniz.

A Bienal tenta aproveitar esse bom momento, depois de cancelar seu evento dedicado à arquitetura e sofrer o vazio na edição de 2008.

Sob comando de Heitor Martins, sócio diretor da consultoria McKinsey, a fundação arrecadou R$ 45 milhões.

O evento deverá movimentar a economia da cidade de São Paulo em mais de R$ 250 milhões em gastos de turistas -o segundo evento mais importante da cidade, atrás apenas do GP de Fórmula 1, que gira R$ 260 milhões.

Posted by Cecília Bedê at 4:14 PM

Além do Pavilhão, Bienal ocupará o parque do Ibirapuera, O Estado de S. Paulo

Matéria originalmente publicada no jornal O Estado de S. Paulo em 14 de setembro de 2010.

Entre as novidades da 29ª Bienal Internacional de São Paulo, que será aberta ao público no dia 25, estão os chamados terreiros, espaços de convívio que serão usados para atividades como performances, leituras e projeções. Dos seis terreiros criados por artistas e arquitetos convidados, um deles será colocado no lado externo do Pavilhão Ciccillo Matarazzo, no Parque do Ibirapuera. Assinado pelo arquiteto Roberto Loeb e pelo artista plástico e grafiteiro Kboco, o espaço "Dito, Não Dito, Interdito" tem como tema a linguagem e será dedicado a debates e conversas.

"Dentro da nossa concepção, ele é um espaço de encontro, que será ativado pelos visitantes, no caso o próprio público do parque", explica Agnaldo Farias, curador-chefe da 29ª Bienal, ao lado de Moacir dos Anjos. "Nele ocorrerão algumas apresentações, ele funcionará como uma espécie de tribuna livre", afirma.

Ainda no entorno do Pavilhão da Bienal, 70 bandeiras de diferentes países serão hasteadas em mastros. Não se trata de uma forma de reforçar o caráter internacional do evento e, sim, da obra "Apolítico", do cubano Wilfredo Prieto. O estranhamento aparece ao se perceber que todas as flâmulas têm apenas duas cores - preto e branco -, o que anula parte importante dos elementos visuais que ajudam em sua identificação. A obra é composta originalmente por mais de 300 bandeiras, de todas as partes do mundo, mas o número apresentado varia de acordo com o espaço disponível em cada local onde é mostrada. A que nunca fica de fora é a bandeira do país anfitrião. Desde que foi criada, em 2001, "Apolítico" já foi apresentada em dez diferentes lugares ao redor do mundo. Entre eles está o Museu do Louvre, em Paris (2006), e o MoMA, em Nova York (2008).

No espaço da Marquise projetada por Oscar Niemeyer, a escocesa Susan Phillipsz vai exibir uma de suas instalações sonoras em que usa a própria voz. "Eu gravei três versões de uma canção e vou tocá-las a partir de três alto-falantes separados, que estarão a cerca de cem metros de distância da Marquise", conta. "O trabalho é organizado em um ''círculo'', no qual uma voz segue a outra, em uma polifonia de sons." A canção escolhida foi a singela "Hey Ho! To the Greenwood", escrita no início do século 17 pelo compositor inglês Thomas Ravenscroft.

Para completar a lista de obras externas, a 29.ª Bienal terá ainda a escultura "Fogueira de Gelo", do pernambucano Paulo Bruscky, que será exibida no dia 25/9, a partir das 11h. Com 3 m de altura, a peça é formada por barras de gelo entrelaçadas que derretem ao longo das horas até desaparecerem totalmente. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Posted by Cecília Bedê at 3:16 PM

Morre artista Wesley Duke Lee, aos 78 anos, em SP, O Estado de S. Paulo

Matéria originalmente publicada no caderno Cultura do jornal O Estado de S. Paulo em 14 de setembro de 2010.

O "realista mágico à sua disposição", é como o artista paulistano Wesley Duke Lee brincava ao se apresentar para as pessoas. Criador provocativo e inquieto, ele morreu na madrugada de ontem, no Hospital Beneficência Portuguesa, em São Paulo, aos 78 anos. Diagnosticado, há cerca de 3 anos, com o mal de Alzheimer, sua morte ocorreu por broncoaspiração e parada cardíaca em decorrência de sua doença, como afirma a sobrinha do artista, Patricia Lee. Segundo ela, não será realizado velório, mas cerimônia hoje, às 16 horas, no crematório Horto da Paz, em Itapecerica da Serra. "Colocaremos na ocasião uma frase que ele sempre dizia, ''A verdade não pode ser dita, só revelada''", diz Patricia.

Desenhista, gravador, pintor e professor, Wesley Duke Lee nasceu em 21 de dezembro de 1931. A década de 1960 foi especial para o artista, um dos introdutores da Nova Figuração no Brasil. Na época, ele promoveu ações polêmicas que se tornaram emblemáticas de sua carreira, como a realização do happening O Grande Espetáculo das Artes, em outubro de 1963, no João Sebastião Bar, na Rua Major Sertório, em São Paulo - apresentou para uma multidão desenhos eróticos de sua famosa Série das Ligas vistos com lanternas em meio a um strip-tease -; a criação, em 1966, da Rex Gallery com os artistas Geraldo de Barros, Nelson Leirner, José Resende, Carlos Fajardo e Frederico Nasser; ou ainda de trabalhos/ambientes que são considerados as primeiras experimentações do que hoje conhecemos por instalação, como Trapézio (1966) e Helicóptero (1969).

Neste momento, duas iniciativas felizes homenageiam o artista. Em julho, o marchand Max Perlingeiro, diretor da Pinakotheke Cultural, inaugurou a mostra Wesley Duke Lee na sede da instituição, no Rio, com 65 desenhos, pinturas, "obras ambientais" e objetos realizados pelo criador entre 1952 e 1999 - acompanhando a exposição, foi lançado amplo livro. A mostra, que fica em cartaz no Rio até 2 de outubro, virá para o espaço da Pinakotheke em São Paulo, ficando em cartaz entre 23 de outubro (coincidentemente, a mesma data em que Wesley realizou O Grande Espetáculo das Artes, em 63) e 5 de dezembro.

Curioso ainda é que Perlingeiro emprestou uma das obras da exposição, o tríptico O Nome do Cadeado É: As Circunstâncias e Seus Guardiães, de 1966, para a sala com curadoria de Fernanda Lopes que a 29.ª Bienal de São Paulo vai dedicar ao Grupo Rex. A Rex Gallery movimentou a cena de São Paulo entre junho de 1966 e maio de 1967 com happenings, mostras e evocações de uma maneira alternativa de se fazer mercado. A última retrospectiva do artista ocorreu em 1992, no Masp e no Centro Cultural Banco do Brasil do Rio. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Posted by Cecília Bedê at 3:13 PM

Arte pública, a nova cara do Parque do Ibirapuera por Marina Vaz, O Estado de S. Paulo

Matéria Marina Vaz originalmente publicada no caderno Cultura do jornal O Estado de S. Paulo em 14 de setembro de 2010.

Nos últimos meses, surgiram diversos murais e agora o parque receberá uma nova escultura

Para Oscar Niemeyer, a arquitetura deve estar integrada às artes plásticas. Hoje, 56 anos depois da inauguração de seu projeto do Parque do Ibirapuera, essa integração pode ser vista na prática: o local conta com quatro museus (MAM, MAC, Museu Afro Brasil e Pavilhão das Culturas Brasileiras), além da Oca e do Pavilhão da Bienal. A vocação artística do Ibirapuera ganhou reforço, nos últimos meses, com a instalação de novas obras em espaços abertos do parque, incluindo murais de Tony de Marco, Carla Barth, Osgemeos e Chivitz.

Enquanto alguns artistas preparam suas criações que serão expostas ao ar livre na 29.ª Bienal Internacional de São Paulo, o artista Stephan Doitschinoff finaliza a escultura A Mão, o que reforçará ainda mais os números de arte pública no parque. A peça, de 1,80 m, será instalada perto da entrada do Museu Afro Brasil e tem inauguração prevista para outubro, em data ainda a ser definida.

A obra, que ali ficará exposta durante um ano, segue a linha de murais, telas e instalações do artista, sempre ligados ao sincretismo religioso.

Para compor a peça, Doitschinoff se inspirou no livro A Mão Afro Brasileira, de 1988, organizado por Emanoel Araujo, hoje diretor do Museu Afro Brasil. "O livro levanta de que maneira uma ‘mão negra’ contribuiu para a cultura brasileira", diz ele.

Paulista conhecido como Calma, Doitschinoff nasceu em 1977. Em 2005, mudou-se para Lençóis (BA) e pintou casas e muros da cidade. Em 2006, ganhou o prêmio Jabuti pelas ilustrações do livro Palavra Cigana (Ed. Cosac Naify). Em 2009, expôs no Masp e foi eleito artista revelação pela APCA. Doitschinoff fala ao Estado sobre o novo trabalho.

A figura da mão está sempre presente em sua produção. Como ela surgiu?

Tudo começou por causa da quiromancia. Sempre admirei muito adivinhação, de ver o futuro em borra de café, de jogar búzios, ler a mão. A base de tudo isso é ter fé em uma ação que é totalmente nonsense. Comecei a trabalhar com a imagem da mão, a dividi-la em linhas e a desenhar nelas. Isso foi na mesma época em que me mudei para a Bahia e comecei a estudar a cultura afro, o sincretismo, e como isso influenciou a cultura brasileira. Pouco depois, conheci a obra do Emanoel Araujo, A Mão Afro Brasileira. E aí juntei tudo.

Você sempre trabalha com muitas simbologias. Quais são as desta obra?

Há uma ampulheta com asas e duas tochas cruzadas e viradas para baixo. A ampulheta quer dizer "a vida é curta"; as asas, "o tempo voa"; e as tochas, "a morte é certa" - é um mantra que os monges pronunciavam, contemplando uma caveira. E as letras dos dedos são as iniciais de uma expressão em latim que significa "não procure do lado de fora, a verdade se encontra dentro do homem".

Você incorporou à peça símbolos da cultura afro?

Não há nenhum símbolo do candomblé, por exemplo. O meu estudo engloba o sincretismo, mas não uso esses símbolos porque, para usar um símbolo de poder, de fé, você tem de conhecê-lo de verdade. Estudo o cristianismo desde criança, então me sinto livre para usá-lo.

É a primeira vez que você trabalha com cerâmica. Por que a escolha desse material?

Quis fazer uma ligação com o popular, com a ancestralidade e também com a África em si. Acho que a cor da terra simboliza muito bem a África.

O prêmio que você ganhou por edital do Ministério da Cultura e que viabilizou a escultura A Mão também incluía um mural.

Ele foi feito em julho. O mural fez parte de um projeto com duas instituições de Osasco, uma de reabilitação de usuários de álcool e drogas e outra de inclusão social de pessoas em situação de rua. Eles acompanharam a confecção da minha escultura, fizemos visitas ao Museu Afro Brasil, eu falei sobre meu trabalho e eles falaram sobre o trabalho de artesanato deles. Pelo projeto, eles fariam um mural inspirado no meu trabalho em um local decidido por eles. E eles escolheram as próprias sedes das instituições que frequentam.

Na hora de criar a escultura, teve algum cuidado pensado especialmente para a interação com o público?

Geralmente, minhas peças são muito delicadas, mas nesta, de cerâmica, as pessoas podem interagir, tocar. Isso é importante porque fazer obras para dentro do museu é lindo e as possibilidades são maiores. Mas há uma coisa muito especial na obra pública, que é atingir o público de uma maneira até subliminar, porque as pessoas estão lá, jogando bola, passeando, namorando, e vão interagir com a obra.

Sua experiência em Lençóis (BA), onde viveu durante três anos e pintou casas, pode ser considerada um bom exemplo de arte pública. Em que ela influenciou seu jeito de fazer arte?

Lá, foi a primeira vez em que eu pensei nas pessoas que veriam aquela obra. Quando eu pintava em São Paulo, fazia coisas muito mais agressivas. Como a cidade é muito gigante, dificilmente quem faz uma obra pública vai conhecer quem mora ali. Em Lençóis, convivendo com as famílias e influenciado por suas crenças, comecei a levar isso em consideração. Aliás, muitas vezes, essa era a primeira coisa que eu levava em conta.

Posted by Cecília Bedê at 3:06 PM

Morre, aos 78, Wesley Duke Lee, iconoclasta da arte brasileira por Fabio Cypriano, Folha de S. Paulo

Matéria de Fabio Cypriano originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 14 de setembro de 2010.

Artista enfrentava o mal de Alzheimer há três anos e sofreu uma parada cardíaca anteontem

Morreu anteontem à noite, em São Paulo, o artista plástico Wesley Duke Lee. Ele tinha 78 anos e sofreu uma broncoaspiração seguida de parada cardíaca no hospital Beneficência Portuguesa. Lee também sofria do mal de Alzheimer há três anos.

Está marcado para a tarde de hoje uma cerimônia de despedida aberta ao público no crematório Horto da Paz, em Itapecerica da Serra (SP).

Wesley Duke Lee foi um pioneiro da linguagem contemporânea nas artes plásticas no Brasil, ao realizar pinturas com colagens, "happenings" e criar ambientes instalativos, já nos anos 1960.

Sua ação "O Grande Espetáculo das Artes", no paulistano João Sebastião Bar, em 1963, costuma ser apontada como o primeiro "happening" no Brasil. A performance foi motivada pela dificuldade em expor gravuras da série "Ligas", consideradas muito eróticas, e foi um manifesto contra a crítica.

Na 29ª Bienal de São Paulo, que será aberta ao público no próximo dia 25, Duke Lee estará representado como integrante do Grupo Rex, que fundou junto com os artistas Nelson Leirner e Geraldo de Barros (1923-1998).

Apesar da curta duração, junho de 1966 a maio de 1967, o grupo foi um grande inovador da cena paulista, ironizando o sistema da arte, seus museus e galerias.

O grupo, que criou a Rex Gallery & Sons e editou o jornal "Rex Time", recuperou o espírito contestatório e anarquista dos dadaístas, além de criar performances afinadas com ações do grupo Fluxus, de George Maciunas e Yoko Ono, entre outros.

ATITUDE ICONOCLASTA
Um bom exemplo dessa atitude é uma das obras selecionadas de Duke Lee para a 29ª Bienal: "O Tríptico: o Guardião, A Guarda, As Circunstâncias", de 1996.

Esse trabalho foi realizado a partir de "O Nome do Cadeado É: As Circunstâncias", que havia sido censurado pela própria Bienal, alguns anos antes, pois era composto por placas móveis fechadas por cadeados, que podiam ser removidos, e uma delas continha um desenho de púbis com pelos reais.
Como crítica à Bienal, o artista criou o tríptico, que agora será exposto, composto por três pessoas: uma mulher com uma tarja preta nos olhos ladeada por guardiões.

Os censores seriam o fundador da Bienal, Ciccillo Matarazzo, que tem o rosto coberto por uma pintura de Almeida Júnior, e a secretária da fundação, Diná Coelho.

Publicitário no início de sua carreira, usando cores fortes e a imagem feminina, Duke Lee também costuma ser vinculado ao movimento pop, mas sua obra de fato está mais próxima da obra de Robert Rauschenberg (1925-2008), que o artista conheceu quando estudou em Nova York, nos anos 1950.
Duke Lee foi ainda professor de uma geração posterior, que inclui Carlos Fajardo, José Resende e Luiz Paulo Baravelli que, em 1970, fundaram a Escola Brasil. Apesar de sua obra vir ganhando visibilidade, não foram ainda dados os créditos à complexidade de sua produção.

RAIO-X
WESLEY DUKE LEE

VIDA E FORMAÇÃO
Nasceu em São Paulo, em 1931. Estudou desenho livre no Masp e depois cursou a Parson's School for Design, em Nova York. Foi aluno do pintor italiano Karl Plattner. Também trabalhou como ilustrador e publicitário

HAPPENING

Fez em 1963 no João Sebastião Bar, em São Paulo, o primeiro "happening" da história da arte brasileira, em que apresentou desenhos eróticos da série das "Ligas"

GRUPO REX
Fundou em 1966 o iconoclasta grupo Rex, do qual participaram Geraldo de Barros, Nelson Leiner, Carlos Fajardo, Frederico Nasser e José Resende. Por meio da publicação de jornais e exposições, questionava a lógica do mercado de arte. Teve sua obra recusada seis vezes pela Bienal de São Paulo

Posted by Cecília Bedê at 2:51 PM

setembro 13, 2010

Artistas circulam pela cidade, Diario de Pernambuco

Matéria originalmente publicada no caderno Viver do jornal Diário de Pernambuco em 12 de setembro de 2010.

Em exposições e performances, público tem a chance de se aproximar da arte contemporânea

Quer acompanhar o que está sendo produzido em termos de artes visuais? Prepare-se para a maratona. O Spa das Artes 2010 está com uma agenda repleta de exposições, performances, oficinas, intervenções. O Mamam no Pátio, por exemplo, a partir de hoje e até o dia 17, sempre das 10h às 18h, recebe a terceira edição do Territórios recombinantes. O projeto, que ocorre a cada dois anos, veio ao Recife graças a uma parceria do Spa com o instituto paulista Sergio Motta.

Foram selecionados os artistas Ricardo Brazileiro (que vai expor Híbrido ao pulso - Organismos e desequilíbrios), Jeraman (Exposição Internacional de Tecnologia e Arte, Porra! - Eita, porra!), Christiano Lenhardt (Papel sensível) e Grupo SYA (Casa de pão com acompanhamento). Com a curadoria de Daniela Castro e o acompanhamento de Mário Ramiro e Ricardo Carioba, os projetos serão desenvolvidos no local de exposição. Ricardo Carioba, aliás, faz uma performance, intitulada Doce luz obscura, no Pátio de São Pedro, às 18h30.

Também hoje começa um projeto de residência artística de Renato Valle. A residência, que será realizada no horário das 9h às 17h, no Sítio da Trindade, resultará no trabalho Conversa a muitos, um desenho em grande escala, grafite sobre lona crua, que será elaborado com a participação de alunos da rede pública.

Já quem passar pelo Bairro do Recife não pode daixar de olhar para os cartazes colados nos muros. Eles podem ter virado arte. É o projeto Lambe-lambe curativo, do Coletivo Una. O grupo explora os muros como galeria, num processo de curadoria coletiva, através da colagem de molduras impressas em papel, instigando o transeunte a um outro recorte no olhar. No Alto José do Pinho, na Zona Norte, das 9h às 17h, o foco também é arte urbana, com o grupo Acidum, do Ceará. Com desenhos, gravuras, grafite e impressos, eles vão promover ressignificações ao que já vemos nas ruas em cartazes, telas, placas. Se você é artista, não deixe de passar no Sesc do Cais de Santa Rita, das 9h às 19h, até o dia 17. O projeto de Murilo Maia é chamado Biblioteca de artista - Um espaço de catalogação de livros de artistas ou livros-objetos. Já estarão expostos trabalhos de artistas do Ceará e também da Argentina, mas os pernambucanos estão convidadíssimos a participar.

Para completar a programação neste início de semana, uma boa pedida é conferir a apresentação do projeto Coleções, do grupo Intrépida Trupe, nos jardins do Murillo La Greca, em Parnamirim, às 19h30. Só para ter a certeza que podemos nos aproximar das artes plásticas de várias formas. A entrada para a apresentação é gratuita.

Posted by Cecília Bedê at 1:53 PM

Rio traduz língua de Lenora de Barros por Silas Martí, Folha de S. Paulo

Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 13 de setembro de 2010.

Artista revisita poesia concreta e linguagem pop em conjunto de vídeos dos últimos 25 anos em retrospectiva

Performances gravadas serviram de suporte para experimentos com carga visual extrema de herdeira dos concretos

Lenora de Barros lambe e mastiga o tempo e as palavras. Digere presença visual e dimensão sonora dos vocábulos com fome concreta.

Desde que bateu com a língua um poema numa máquina de escrever, no final dos anos 1970, a artista não perdeu a vontade de destrinchar no espaço e no tempo a reverberação de letras e versos.

"Meu conceito de antropofagia foi ter essa postura em relação a questões nossas, à poesia concreta", diz a artista à Folha no café do Oi Futuro, no Rio, onde abre hoje uma retrospectiva. "Era tentar esticar o tempo em palavras."

Nos fotogramas do vídeo, sequência por sequência, ela encontrou uma nova métrica para essa espécie de língua expandida. Essa parte de sua produção, ao longo dos últimos 25 anos, aparece revista agora em mostra no Rio.

"Nunca fui poeta concreta, nem poderia ser", conta. "Mas, a partir do momento em que comecei a trabalhar com palavras, a questão era levar para o espaço os aspectos sonoros e visuais delas."
Mas ela nunca faz tudo ao mesmo tempo. Barros articula um jogo de idas e vindas entre a sonoridade mínima e uma carga visual extrema.

Numa sala escura, uma gravação da voz da artista recita um texto em que alinhava palavras que encerram o termo "ver". É um vácuo visual cheio de som operando como alicerce da imagem.

Do lado de fora da sala, num espaço iluminado, as oito letras da palavra "silêncio" aparecem fotografadas sobre a língua da artista. Um vídeo mostra cada uma sendo pregada com toda a fúria de dentro para fora da boca.

"Essa questão da língua está na origem e dentro do meu trabalho, é a língua como símbolo de linguagem", resume a artista. "Queria fazer um poema em que a língua fecunda a linguagem, quase uma relação sexual."

PRESENÇA FÍSICA
Nesse ponto, ela precisa do corpo. Da boca e dos olhos à planta dos pés, a obra de Barros não se desassocia da presença física da artista.

Em seu primeiro vídeo, ela repete uma performance fotográfica em que escovava os dentes até a espuma da boca cobrir todo seu rosto. Fundia a análise da vida pautada pelos artistas conceituais a um imaginário pop que tinha no corpo um suporte plástico atraente para a época.
Mais tarde, faz quatro vídeos em que cobre o rosto com um gorro de tricô que vai desfiando ao som de um discurso. São falas que oscilam entre dizer e não dizer, o que ela chama de "tentativa de perseguir tempos absurdos".

Até que ela morde a língua. Numa fotografia que depois virou vídeo, ela mastiga a língua, expressando essa fome prensada entre os dentes. Mostra então que seu corpo não é presença carnal, mas uma espécie de pele da imagem desse discurso.
E, no fim, fica só a dúvida. No último vídeo da mostra, ela tira da boca um papel que diz: "Eu não disse nada".

Posted by Cecília Bedê at 1:42 PM

Traços de Cipis estabelecem harmonia entre as artes plásticas e a ilustração por Fábio Marra, Folha de São Paulo

Matéria de Fábio Marra originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 11 de setembro de 2010.

O universo das artes plásticas e visuais sempre teve camuflada e incômoda relação com a presença das ilustrações. Há quem defenda que a arte contemporânea e a ilustração não serão parte integrada jamais. Não para Marcelo Cipis. Aos 51 anos, o artista plástico e ilustrador desafia os contornos desse pensamento com traços que remetem à reflexão da harmonia possível, sim, entre as duas.

Sem querer o risco da fixação de outra tese, então "subjetivamente", podemos nos guiar pelos traços à sintonia entre o trabalho do ilustrador e a essência da arte contemporânea.

"Some Contemporary Art Themes" (alguns temas da arte contemporânea) é mais do que a síntese desse pensamento. Retrata a combinação de forma, cores, estética e plasticidade resultante do conflito permanente entre o ilustrador e o artista plástico.

A beleza tão relacionada às pessoas e à funcionalidade, tão diretamente associadas aos objetos, configura o eixo da narrativa, que, ao dispensar palavras e optar pela totalidade na linguagem visual, revela signos e imagens apresentados em cores quentes e tons pastéis.

Sacudido pela necessidade que a maioria dos artistas tem de se expressar sobre os problemas do mundo, Marcelo Cipis debate de maneira sutil, bem-humorada e por vezes irônica a beleza vista como não fundamental e a percepção de cada olhar sobre a arte.

Impressa em "off set" e com tiragem limitada, a revista traz desde a capa a dualidade entre arte e ilustração. A numeração, gravada manualmente, personaliza o comprador. "Some Contemporary Art Themes" pode ser encontrado nas livrarias Martins Fontes.

Cipis é autor de outros 14 livros livros, entre eles: "De Passagem", "A Interessante Ilha Dukontra" e "O Nosso Querido Amigo Kuki", todos editados pela Companhia das Letras.

Outros estão a caminho, segundo o autor. São eles: "Sinto Tudo" (título provisório, ed. Peirópolis, 2010), "O Pequeno Livro" (ed. Peirópolis, 2010), "O Livro Chic do Futebol (ed. Cosac Naify, 2010), "Super Zeróis" (ed. Cosac Naify, 2010) e "Move Tudo" (ed. Companhia das Letras, 2011).

Posted by Cecília Bedê at 1:30 PM | Comentários (1)

setembro 10, 2010

Dias mostra arte, política e ironia na Pinacoteca por Marcos Augusto Gonçalves, Folha de S. Paulo

Matéria de Marcos Augusto Gonçalves originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 10 de setembro de 2010

Exposição reúne meia centena de trabalhos das décadas de 1960 e 70

Artista participou da exposição "Opinião 65", no MAM do Rio, antes de mudar-se para Europa, onde fez sua carreira

Um dos mais sólidos artistas contemporâneos brasileiros, Antonio Dias mostra a partir de amanhã, na Pinacoteca do Estado, em São Paulo, meia centena de obras realizadas nas décadas de 1960 e 1970.

São desenhos, pinturas, vídeos e instalações de um período em que arte e política caminharam de braços dados. "É uma oportunidade para ter uma visão mais ampla de trabalhos que raramente são exibidos em conjunto, mesmo porque há poucos deles em museus brasileiros", diz o artista.

A idéia de reuni-los veio de Hans-Michael Herzog, curador da coleção Daros, fundação suíça que possui uma seção de obras latino-americanas, com sede no Rio.

Juntamente com a curadora Katrin Steffen, Herzog organizou a exposição, inaugurada em Zurich, em setembro do ano passado, com o título "Anywhere Is My Land" -o mesmo de uma pintura do artista realizada em 1968.

Nascido em Campina Grande, Paraíba, em 1944, Dias participou das experimentações estéticas da década de 60. Foi um dos artistas presentes na lendária "Opinião 65", mostra realizada no Museu de Arte Moderna do Rio, que marcou uma data na arte contemporânea do país.

Organizada pelo galerista Jean Boghici e pela jornalista e marchand Ceres Franco, a exposição reuniu brasileiros e europeus -e terminou uma referência da versão nacional da "nova figuração", com nomes como Carlos Vergara, Rubens Gerchman e Roberto Magalhães.

Dois trabalhos que participaram da "Opinião 65" poderão ser vistos na Pinacoteca -"Acidente no Jogo" (1964) e "Nota Sobre a Morte Imprevista" (1965).

Para Dias, as obras daquele período preservam uma certa "naievety" -"uma inocência de quem ainda não sabia dos jogos de mercado e coisas assim".

São trabalhos marcadamente gráficos, que refletem situações pessoais, eróticas, críticas -e discutem temas artísticos da época, como a idéia de "sair do quadro".

Um ano depois da mostra do MAM carioca, Dias trocou o Brasil por Paris, ponto inicial de uma trajetória que se desenvolveu, desde então, em países europeus, notadamente Itália e Alemanha.

A mudança de lugar refletiu-se na obra. Ao visitante da Pinacoteca não escapará a passagem. As cores fortes e as figuras desaparecem, dando lugar à palavra, com influência da poesia visual e concreta, e a um novo tipo de padrão gráfico.

"Houve naquele momento a perda da ingenuidade e do romantismo", avalia Dias, que vê nas suas criações da década de 70, das quais fazem parte a série "The Illustration of Art", uma atitude mais cética e irônica.

E é com uma ponta de ironia que ele se refere à "arte política" que se anuncia como um dos traços da próxima Bienal Internacional de São Paulo: "Se tiver um pouco de arte já será muito bom; e se não tiver política, não vai fazer falta nenhuma".

Posted by Fábio Tremonte at 5:07 PM

Exposição paralela em 2012 selecionará artistas emergentes por Fábio Cypriano, Folha de S. Paulo

Matéria de Fábio Cypriano originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 10 de setembro de 2010

A 30ª Bienal de São Paulo, que deve ocorrer em 2012, ainda não tem curador definido, mas já se sabe que uma de suas mostras paralelas vai alcançar uma imensa repercussão.

Organizada pelo museu Astrup Fearnley e a galeria Serpentine, de Londres, uma exposição com curadoria de Hans-Ulrich Obrist, da instituição inglesa, e Gunnar Kvaran, pela Noruega, além de Julia Peyton-Jones e Paulo Herkenhoff, irá mapear cerca de 50 artistas brasileiros emergentes.

Depois de São Paulo, a mostra segue para Inglaterra, Noruega e França.

Kvaran e Obrist, considerado pela revista Artreview, em 2009, como a personalidade mais poderosa do mundo da arte contemporânea, já realizaram outras três mostras do mesmo tipo.

A primeira, "Uncertain States of America" (2005), organizada junto com Daniel Birnbaum, mapeou a jovem produção norte-americana. Seguiram-se "China Power Station" (2007) e "Indian Highway" (2008), todas no mesmo modelo.

CURADOR LOCAL
"No Brasil, por sua complexidade, pela primeira vez estamos incluindo um curador local, que é o Herkenhoff", conta Kvaran, que espera apoio da Fundação Bienal para a execução da mostra no país.

"Por enquanto é um projeto, mas estamos discutindo a coprodução dessa mostra; como a Bienal tem um caráter internacional, acredito que essa outra exposição não seja uma concorrência à Bienal", disse Heitor Martins, cujo mandato se encerra após a 29ª Bienal.

Em Oslo, a mostra de arte brasileira será exibida já na nova sede do Astrup Fearnley, projetada pelo italiano Renzo Piano e prevista para ser inaugurada em 2012.

"Tivemos que convencer alguns diretores de museu para que suas instituições apresentassem a arte da Índia ou da China. Agora, em se tratando do Brasil, já temos mais de dez instituições interessadas no tema", conta ainda Kvaran.

Posted by Fábio Tremonte at 5:04 PM

Aniversário da Bienal terá astros do mercado por Fábio Cypriano, Folha de S. Paulo

Matéria de Fábio Cypriano originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 10 de setembro de 2010

Fundação trará de Oslo acervo que inclui Damien Hirst e Jeff Koons

Presidente da mostra de Arquitetura, que não poderá usar o pavilhão, diz que evento ainda assim vai acontecer

A festa dos 60 anos da Bienal de São Paulo, em 2011, irá contar com alguns dos artistas estelares da produção contemporânea, como o inglês Damien Hirst e os norte-americanos Jeff Koons e Matthew Barney.
Obras de relevância dos dois artistas virão alocadas entre 800 caixas em cerca de 30 contêineres, que irão se dispersar em 13 mil m2 de exposição no pavilhão da Bienal, a partir do acervo do museu Astrup Fearnley, de Oslo, na Noruega.

A mostra irá ocorrer entre outubro e dezembro de 2011, período que seria ocupado pela 9ª Bienal de Arquitetura. A exposição foi aprovada pelo Conselho da Fundação há duas semanas.

"Buscamos um museu que tivesse uma ótima coleção de arte contemporânea pois a vocação da Bienal é apresentar o que acontece hoje. Essa é uma das melhores do mundo", afirmou Heitor Martins, presidente da Fundação Bienal, em Oslo.

"Há três meses estamos tentando falar com Heitor, mas fomos informados apenas por carta de que perdemos o espaço. Acho um desrespeito, mas vamos fazer a Bienal mesmo assim", diz Rosana Ferrari, presidente da seção paulista do Instituto de Arquitetos do Brasil.

A instituição é a responsável pela realização dessa bienal, que tem como curador de sua 9ª edição Valter Caldana, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo do Mackenzie.

"É preciso que a Bienal de São Paulo não seja um evento isolado, mas que sempre ocorra algo no pavilhão, mantendo o educativo e outros setores ativos. A comemoração dos 60 anos já entra nesse espírito", diz Elizabeth Machado, presidente do Conselho da Bienal.

VACA E BEZERRO
Entre as obras já selecionadas para São Paulo, que terá curadoria do islandês Gunnar B. Kvaran, também diretor do Astrup Fearnley, um dos destaques é "Mother and Child Devided", de Hirst. Nela, uma vaca e um bezerro reais divididos ao meio são dispostos em vitrines com formol.

"Nós não colecionamos movimentos artísticos, colecionamos artistas, por isso temos muitas obras de cada um e assim poderemos mostrar pequenas retrospectivas dentro da exposição", conta Kvaran.

A coleção tem ainda conjuntos expressivos de Jeff Koons (17 obras), Matthew Barney (50), Cindy Sherman (15) e Richard Prince (17).

"Esses artistas nunca foram vistos de maneira ampla na Bienal e essa é outra razão pela escolha dessa coleção", explica Martins.

O acervo do Astrup Fearnley contém cerca de 500 obras do empresário norueguês Hans Rasmus Astrup, o oitavo colecionador mais importante de qualquer gênero, entre os 200 listados pela revista "Artreview".

Foi ele quem levou Koons a alcançar um recorde histórico como o artista vivo com a obra mais cara vendida em leilão, em 2001. Ele pagou US$ 5,6 milhões (cerca de R$ 9,6 milhões) por "Michael Jackson and Bubbles", que estava cotada no catálogo por US$ 250 mil (R$ 430 mil).

Nos 60 anos da Bienal, o grande destaque serão os astros do mercado.

Posted by Fábio Tremonte at 4:58 PM

setembro 8, 2010

Diálogos póstumos por Paula Alzugaray, Istoé

Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada na Istoé em 08 de setembro de 2010

Exposição em Porto Alegre faz estudo comparativo entre artistas abstratos brasileiros e venezuelanos atuantes entre os anos 60 e 90

A partir do acervo de uma das maiores coleções de arte contemporânea da América Latina, a Coleção Patricia Phelps de Cisneros, em parceria com a Fundação Iberê Camargo, de Porto Alegre, a exposição “Desenhar o Espaço” coloca em diálogo a arte abstrata produzida no Brasil e na Venezuela desde os anos 1960. Nas 88 obras expostas estão sugeridas comparações entre artistas como Jesús Soto, Lygia Clark, Carlos Cruz-Diez, Willys de Castro, Alejandro Otero, Mira Schendel, Gego e outros. “O diálogo entre movimentos, que nem sempre se
deu historicamente, é mostrado nesta exposição quando comparamos as enormes diferenças entre as estratégias neoconcretas de Willys de Castro e Hélio Oiticica e os artistas venezuelanos Carlos Cruz-Diez e Alejandro Otero”, diz Ariel Jiménez, curador-chefe da Coleção Cisneros.

Se as diferentes estratégias criativas são perceptíveis no percurso da exposição, o tempo funciona como um fio condutor para alinhavar as semelhanças. Como em um jogo especular em que os opostos se atraem, são notáveis as similaridades entre os trabalhos embrionários de Lygia Clark e do venezuelano Jesús Soto. Os dois artistas iniciaram sua produção com uma pintura figurativa, de tratamento geométrico. Posteriormente, desenvolveriam uma arte que exige a interatividade entre público e obra, favorecendo diferentes perspectivas do uso do corpo. Tanto quanto as obras cinéticas de Soto, Lygia envolve o público com seus bichos manuseáveis. Se a brasileira provoca o movimento corporal do espectador que manipula sua escultura, as peças de Soto requerem a movimentação espacial do observador, para a visualização do cinetismo de suas formas e cores. Ambos viriam logo a modificar a linguagem concretista, expandindo suas criações para fora do quadro e inaugurando uma nova postura em relação ao objeto artístico. Talvez, não por coincidência, são hoje dois dos artistas latino-americanos em maior ascensão no mercado das artes.

Posted by Fábio Tremonte at 4:40 PM

Quadros poéticos por Nina Gazire, Istoé

Matéria de Nina Gazire originalmente publicada na Istoé em 08 de setembro de 2010

No poema “Horizonte”, Fernando Pessoa aponta que “o sonho é ver as formas invisíveis da distância imprecisa e, com sensíveis movimentos da esperança e da vontade, buscar na linha fria do horizonte a árvore, a praia, a flor, a ave, a fonte”. Inspirado por este preceito poético, o pernambucano Bruno Vieira repensa a função do quadro – e do enquadramento – nas leituras estéticas da realidade. Em sua série de objetos “Vista Inevitável”, o artista ironiza a equivalência estabelecida, desde o Renascimento, entre o quadro e a janela, transformando a paisagem em objeto artístico. A janela então se transforma em cortina, de forma a desvelar uma realidade que nunca é certa. Para esse efeito, são usadas persianas, que têm em suas lâminas impressões fotográficas, transformadas em metáforas de paisagens. “Pensei na relação de obrigação que temos com o horizonte. No caso, a persiana destrói essa falsa obrigação que temos”, afirma Vieira.

Nas persianas, vislumbram-se paisagens “pré-fabricadas” que, manipuladas pelo artista, são, como o poeta afirmou, sonhadas.

Mas, mais que imaginar e sonhar, Vieira reafirma o caráter ilusório da perspectiva. Principalmente em relação ao recurso do ponto de fuga como estratégia de composição das paisagens pictóricas e ao fato de esse modo de representação permanecer instaurado na arte ocidental até hoje. Vieira apresenta atualmente outros trabalhos da série “Vista Inevitável” em outras duas exposições coletivas: uma em Phoenix, nos Estados Unidos, e a outra no Museu Murilo La Greca, no Recife.

Posted by Fábio Tremonte at 4:32 PM

Rédeas do cinismo por Nina Gazire, Istoé

Matéria de Nina Gazire originalmente publicada na Istoé em 08 de setembro de 2010

A inauguração da Rex Gallery & Sons, em junho de 1966, e seu encerramento, em maio de 1967, foram dois grandes happenings que chacoalharam a até então pacata vida cultural paulistana. Uma abertura com direito a cordões carnavalescos e a distribuição gratuita de trabalhos no fechamento são os dois marcos da breve, porém intensa, existência do Grupo Rex, que será lembrado em uma sala da 29ª Bienal de São Paulo. Seu mentor intelectual, Wesley Duke Lee, ganha também uma retrospectiva de sua obra no Rio de Janeiro.

A exposição na Pinakotheke Cultural dedica quatro salas para a exibição de 60 obras realizadas entre os anos 50 e 90. A mostra é uma oportunidade para visualizar uma trajetória que parte do desenho e da pintura, passa pela publicidade, pela performance e chega em obras
que podem ser definidas como pintura-instalação. Entre os destaques da mostra, algumas aquarelas da “Série das Ligas”, de 1960, feitas em homenagem a Lydia Chamis, seu primeiro grande amor, e a instalação “A Zona: Considerações. Retrato de Assis Chateaubriand” (1968) (foto). Seu pioneirismo no campo da performance está representado em uma obra rara e inédita: um making of fotográfico de performance realizada pelo artista pelas ruas do centro de São Paulo, filmada por Otto Stupakoff. O filme desapareceu, mas a sequência fotográfica foi transformada em uma apresentação audiovisual para a mostra.

Já a personalidade performática e controvertida do artista é lembrada em texto de Nelson Leirner, publicado no livro que acompanha a mostra. “Vejo Wesley como um visionário. Ele atuava como uma espécie de comandante”, escreve o parceiro do Grupo Rex. “Foi o Wesley quem escreveu praticamente todos os dez mandamentos do Grupo Rex. Era ele quem tomava as rédeas do cinismo”, aponta Leirner.

Posted by Fábio Tremonte at 4:28 PM

Luzes da cidade por Paula Alzugaray, Istoé

Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada na Istoé em 08 de setembro de 2010

Carmela Gross instala seus letreiros luminosos no bairro da Luz, em São Paulo, e revitaliza antigas polêmicas com novos matizes

Carmela Gross é uma artista que inaugurou sua atuação pressionando limites e colocando à prova os materiais e as linguagens que utilizou. No campo da gravura, começou trabalhando com o método tradicional da litografia, mas, paralelamente, investiu em novos meios de reprodução técnica, como carimbos, heliografia, gravura em offset, xerox e vídeo. Em pintura não foi diferente e inventou uma “pintura/objeto”.

A verve experimental de Carmela nasce junto com sua carreira, iniciada em exposição na Galeria Rex & Sons, em São Paulo, em 1967 (ler Roteiros na página ao lado). A partir do sábado 5, na Estação Pinacoteca, em São Paulo, um conjunto de 16 obras procura expor os caminhos conceituais que regem o trabalho da artista paulistana.

A seleção inclui obras realizadas entre 1965 e 2010. Há desde “Nuvens” (1965) – imagens esquemáticas em madeira que aludem a histórias em quadrinhos e testam os limites entre o desenho, a escultura e o objeto – até a instalação “Iluminuras – 2010”, que consiste na colocação de luzes de emergência (giroflex) na fachada do edifício localizado no bairro da Luz. Como diversas obras anteriores realizadas com néon e lâmpadas fluorescentes – “Hotel”, (2002), “Eu Sou Dolores” (2002), “Aurora” (2003), “Luzia” (2004), “Carne” (2006) e “Se Vende” (2008) –, “Iluminuras – 2010” é um “site-specific”, que reflete diretamente sobre o contexto em que está instalada. No caso, as imediações das avenidas Duque de Caxias e Ipiranga, região conhecida como Cracolândia. À luz da obra de Carmela, ganha novos matizes a discussão em torno de um bairro submetido recentemente a dura intervenção policial para desativação de um circuito de venda e consumo de crack.

Posted by Fábio Tremonte at 4:22 PM

Para desestabilizar, site da Fundação Iberê Camargo

Matéria originalmente publicada na seção Entrevistas do site da Fundação Iberê Camargo

Importante nome entre os jovens artistas contemporâneos do Brasil, Yuri Firmeza é mais conhecido por ser o homem por trás de Souzousareta Geijutsuka, o artista fictício que enganou a imprensa nacional em uma polêmica ação realizada em 2006 no Museu de Arte Contemporânea do Ceará, em Fortaleza. Mas sua trajetória vai bem mais além: foi selecionado pelo programa Rumos Itaú Cultural de 2005/2006, foi artista residente da Bolsa Pampulha em 2008 e recebeu, no ano passado, o prêmio CNI SESI Marcantônio Vilaça de Artes Plásticas. Publicou os livros Relações (2005), Souzousareta Geijutsuka (2007) e Ecdise (2008), e tem em seu currículo exposições no Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo, no Centro Cultural Banco do Nordeste, em Fortaleza, no 7° Festival de Performance de Cali, na Colômbia, e na Fundación Centro de Estudos Brasileiros, em Buenos Aires.

Tensionando os limites entre ficcional, possível e real, Firmeza trabalha com fotografia, vídeo e performance. Na conversa a seguir, ele fala sobre sua trajetória e a condição de artista “fora do eixo”.

Como artista de Fortaleza, o que você acredita que significa, hoje, estar fora do eixo artístico de Rio de Janeiro e São Paulo? Que implicações esta condição tem (ou não) sobre a produção e circulação de trabalhos de arte?

Eu acredito que esta situação tem vários fatores negativos. Acho que nós estamos cada vez mais dependentes, infelizmente, de uma existência, por mínima que seja, de um mercado, de uma formação de crítica, de educadores – de todo um contexto que seja propício para que, de fato, se discuta e se pense a arte e suas relações com o campo social. E, infelizmente, em Fortaleza não existem galerias, há apenas um museu, que ainda funciona de forma muito embrionária, e as políticas públicas da cidade são, como em praticamente todo o Brasil, sempre muito interrompidas e fragmentadas. Não existe, também, um pensamento já na academia. Na universidade federal, não há formação em artes visuais. Ela existe apenas em um curso no CEFET, que é uma escola técnica, e em uma universidade particular, mas ambos com muitos problemas e muito incipientes. E o curso de artes da faculdade em que estudei [Faculdade Grande Fortaleza], onde estudaram também vários artistas como Waléria Américo, Milena Travassos, Euzébio Zloccowich, Murilo Maia, entre outros, foi desmontado.

Por outro lado, a inexistência de um mercado estruturado eu vejo como um aspecto positivo, porque os artistas começam a criar circuitos alternativos de circulação de trabalhos – como é o caso, por exemplo, do Alpendre, que foi um espaço muito forte nos anos 1990, sobretudo, como o Torreão foi em Porto Alegre. Ou seja, os artistas criam outras dinâmicas de circulação da obra e do pensamento que não necessariamente passam pelas instituições (que praticamente não existem) nem pelas galerias (que, de fato, não existem).

E há outro fator, que acho que é o “estar em trânsito”. Trânsito não só no sentido físico, mas também no sentido de transitar tanto nas instituições que existem, mas também fora delas. Pensar o circuito de forma plural, como circuitos, e entender o trabalho do artista não apenas como a produção de uma obra de arte, mas também a produção deste circuito, de um campo, que seja propício para o pensamento correr em rede.

Falando em circuitos alternativos, uma iniciativa diferenciada como a criação do artista fictício Souzousareta Geijutsuka, que você fez em 2006, ajuda a burlar a lógica habitual do sistema “mais estabelecido” das artes?

O Souzousareta foi um trabalho que aconteceu dentro de um museu de arte contemporânea, que na época era dirigido pelo Ricardo Resende. Mas acho que tem, sim, um pouco a ver com o que eu falei anteriormente, de transitar dentro e fora das instituições e deste circuito oficializado e “oficializante” da arte. É uma forma de tentar se inserir não com uma ideia de transgressão, mas muito de forma a causar curtos-circuitos, de forma discursivamente resistente. E há esta resistência discursiva no trabalho do japonês, que é justamente a infiltração dele não somente na instituição museu, mas também em todos os aspectos de legitimação de um artista enquanto tal: na mídia, com seu poder de sedução e de expansão daquilo que tem ocorrido; no museu, como espaço de consagração simbólica; com a curadoria e a crítica... Ou seja, o trabalho lida com uma série de agentes desse sistema de forma crítica, mas também sem ser ingênuo – no sentido de ir contra o sistema, ou de estabelecer um embate frontal com ele. O trabalho apostava muito mais na resistência discursiva.

Como surgiu a proposta para esta ação? Você foi convidado pelo Dragão do Mar para realizar este trabalho específico, ou ele foi pensado depois?

O Dragão do Mar tinha um projeto chamado Artista Invasor, no qual eram convidados artistas para ocupar uma sala do museu paralela à “exposição oficial”. Quando recebi este convite do Ricardo Resende, fiz uma contraproposta, já que não me interessava ocupar uma sala, mas sim realizar performances em todo o local, sem horário prévio, tendo o território do museu como um espaço livre. Isto aconteceu em 2005, acho que no mês de agosto, e a exposição foi só em janeiro de 2006. Então, tivemos seis meses de conversa, de discussão... O Ricardo teve um papel de parceiro mesmo no trabalho, inclusive pensando junto algumas estratégias.

Neste sentido, como você mencionou antes, esta foi uma ação que questionou bastante o papel legitimador da mídia e dos espaços institucionais sobre a prática artística. Atualmente, que papel você acredita que está sendo desempenhado por essas instituições?

Acho que isto é muito particular. Acredito muito na atuação de um diretor de museu como alguém que, de fato, se coloca em relação estreita com o que o artista está produzindo, que tenta refletir junto e dar condições mínimas para que o artista pense seu trabalho sem muitos limites burocráticos, institucionais. Por outro lado (estou falando mais das coisas que vivi, é claro), tive uma experiência com curadores em projetos a longo prazo que pensam o museu estritamente como um lugar de conservação e de consagração simbólica da obra, um lugar quase como um sarcófago – que é justamente no que eu não acredito. Penso no museu como um processo mesmo, de construção de pensamento, de formação de público. Acho que o papel social do museu é muito mais ativo do que servir simplesmente como receptáculo de coisas mortas, de obras já consagradas.

Sua reflexão crítica sobre o sistema das artes é muito presente, e você já afirmou em outras entrevistas que considera sua produção de textos um elemento muito importante de seu trabalho. Por quê? Quais são as ligações diretas entre texto e obra – no seu caso e na arte contemporânea em geral?

Existem trabalhos que não necessitam de texto, que dão conta da proposta, que têm uma certa autonomia. No meu caso, gosto de pensar o texto não como uma muleta da obra, mas como um trabalho em si, que é atravessado pela obra, que emerge junto com a obra, que tem relação com a obra. Não vejo o texto como algo feito posteriormente ao trabalho, sobre o trabalho, nem que sirva de ferramenta intelectual para, depois, ser simplesmente ilustrado pelo trabalho. Acho que texto e obra vêm juntos. É um conjunto de elementos, e o trabalho se faz justamente com isso. No fim, ele acaba não sendo uma coisa centrada: torna-se um trabalho que “escorre”.

É o caso, por exemplo, de um trabalho meu que se chama Ecdise – quando os répteis trocam de pele –, um livro que eu entendo como intervenção urbana. Ele é resultado da minha participação na Bolsa Pampulha, em que, durante 13 meses, um grupo de artistas tinha que morar em Belo Horizonte e, depois, apresentar um trabalho de intervenção na cidade. Eu, mensalmente, publicava um texto numa página do caderno Pensar, do jornal Estado de Minas, e considerava minha intervenção urbana como sendo esta intervenção no campo discursivo. Então, neste caso, o texto era quase como uma escultura mesmo – dentro da ideia de que “pensar é esculpir”, de Joseph Beuys.

Depois da Bolsa Pampulha, você foi um dos selecionados, em 2009, pelo Prêmio Marcantônio Vilaça, e isso permitiu que você trabalhasse junto com o curador e crítico de arte Paulo Herkenhoff. Como foi esta experiência e de que forma ela influenciou seu trabalho?

Foi um privilégio atuar ao lado do Paulo Herkenhoff durante praticamente um ano. Foram importantíssimas as conversas que tivemos. Já tínhamos trabalhado juntos antes: nós havíamos nos conhecido em outra ocasião, quando escrevi um texto para uma exposição que ele organizou, e ele também já havia me convidado para uma mostra no Tomie Ohtake. Então, é uma pessoa que já vinha acompanhando meu trabalho. Foi legal, porque foi algo com continuidade, já mais próximo.

E foi como pensar junto, no mesmo sentido que falei que aconteceu antes com Ricardo Resende: eu chegava com o trabalho, com o pensamento, com os textos que vinha fazendo – nessa época, estava terminando minha dissertação de mestrado – e então nós conversávamos também sobre coisas da escrita, que estão diretamente atreladas à minha produção de obras. Paulo me sugeriu várias leituras, me apontou diversos outros artistas que dialogavam com o que eu vinha fazendo. Poder discutir com ele uma série de questões – que muitas vezes nem passavam diretamente pela construção dos trabalhos que estavam na exposição [do Prêmio Marcantônio Vilaça], mas que eram mais abrangentes – foi importantíssimo. Ele é extremamente crítico, sempre fala muito de erosões, de procurar desestabilizar. Acho bonito ouvir isto e pensar junto, porque são questões que me interessam.

Posted by Fábio Tremonte at 3:48 PM

setembro 3, 2010

Arte para tocar e brincar por Carolina Santos, Diario de Pernambuco

Matéria por Carolina Santos originalmente publicada no Viver do Diario de Pernambuco em 01 de setembro de 2010

Continuum // Instalações de arte e tecnologia do festival são um convite à interação. Exposições ficam abertas até o dia 12


Parece um brinquedo de um parque de diversões futurista, mas é um instrumento musical. Olhando os vídeos do YouTube, vistos por mais de 4 milhões de pessoas, parece mesmo que o Reactable não pertence a esse mundo. Está mais para um objeto dos Jetsons ou de um filme de ficção científica. Desenvolvido na Universidade Pompeu Fabra, em Barcelona, o Reactable é composto por uma superfície em forma de mesa e uma meia dúzia de peças móveis. Ao mudá-las de local, ou colocá-las de cabeça para baixo, um som único é produzido. O instrumento já foi usado pela banda da cantora Björk e está a partir de hoje pela primeira vez em exibição no Nordeste, dentro da programação do II Festival Continuum. A obra ficará no Centro Cultural dos Correios, no Recife Antigo, até o dia 12 de setembro, das 9h às 18h.

O Reactable é a mais badalada dentre as instalações do Continuum, mas há várias obras interessantes no festival. Uma boa dica é ir conferir os trabalhos expostos no primeiro andar da Torre Malakoff. Lá, o público pode se entreter, interagir com as obras ou somente observar - e pensar "para onde essa arte vai?". Parece que vai longe. As propostas de grande parte dos trabalhos vislumbram um futuro sem fronteiras. Sozinha, a instalação Marvim Gainsbug já vale a visita. É apenas uma tela de plasma e um microfone. Na tela, um personagem virtual dá algumas palavras e pede para você escolher três delas, falando no microfone. Com as palavras, ele faz uma pesquisa no Twitter e monta uma música. Marvim Gainsbug foi criado pelos pernambucanos Jeraman e Filipe Calegario, mas apenas fala e entende em inglês.

Na sala ao lado, uma instalação mais afetiva. Postcards, do paulista Lucas Bambozzi mostra viagens que o artista fez pelo mundo, fotogrando e fazendo vídeos. Na instalação, os postais estão do avesso e as imagens em vídeo são projetadas neles. A obra que oferece mais interação com o público é a interesante Vitalino, do pernambucano Jarbas Jácome. Mestre em Ciência da Computação, ele criou uma espécie de escultura virtual, que o visitantepode ir moldando ao seu gosto, mexendo as mãos no espaço vazio que compreende dois sensores de movimento. Esses sensores enviam a informação para um software que vai moldando, na tela, o que as mãos fazem no ar.

O projeto Habitat, de Mary Gatis e Mica Braga. É uma intervenção na arquitetura da Torre Malakoff. A projeção numa das portas cria a impressão de um vitral colorido. "É um trabalho plástico e visual. Uma composição: não deixa de ser um desenho, mas é virtual", explica Gatis. Os trabalhos do Continuum são quase todos não só para olhar e pensar, mas tocar e brincar.

Posted by Marília Sales at 11:13 AM

setembro 2, 2010

Miguel Rio Branco abre mostra sobre metrópoles no MIS, www.estadao.com.br

Matéria originalmente publicada no caderno Cultura em 30 de agosto de 2010

A exposição "Maldicidades - Marco Zero", que Miguel Rio Branco inaugura amanhã no Museu da Imagem e do Som (MIS), é apenas o primeiro de uma série de eventos em torno do artista, colocando-o em posição de destaque no circuito paralelo e oficial da 29.ª Bienal de São Paulo. Com fotografias, vídeos e instalação, a mostra do MIS se debruça sobre as cidades, revelando um olhar plural, ao mesmo tempo poético e crítico. Rio Branco, que vê as metrópoles "como casos terminais", registrou-as de forma tão intensa e distinta ao longo de décadas que planeja transformar todo esse material em livro, a ser editado em breve pela Cosac Naify.

"É uma forma de me libertar dessa temática, de colocar um ponto final nessa produção toda, criando algo que faça sentido", afirma. Também por isso o artista - que há anos mudou-se para a região serrana do Rio de Janeiro -, considera que a abertura de um pavilhão dedicado à sua obra em Inhotim, Minas Gerais, previsto para acontecer em 23 de setembro, seja de longe o fato mais importante de sua trajetória recente.

A possibilidade de exibir um conjunto amplo e denso de trabalhos, de forma orquestrada e num centro de excelência que se encontra afastado dos eixos metropolitanos é para ele motivo de contentamento. "Desde os anos 70 que sonho com coisas feitas fora das grandes metrópoles caindo aos pedaços", afirma. No pavilhão serão expostos diversos trabalhos inéditos ou raramente vistos, como "Diálogos com Amaú" (mostrado na Bienal de 1983); "Entre os Olhos o Deserto" e "Tubarões de Seda" (este último exibido apenas na Holanda). Algumas peças serão permanentes e outras trocadas de tempos em tempos. "Gostaria muito que fosse uma coisa viva", afirma Rio Branco sobre Inhotim.

Quanto à sua participação na Bienal, com a exibição do filme "Nada Levarei quando Morrer, Aqueles que me Devem, Cobrarei no Inferno" - que também estará em Inhotim -, pode-se afirmar que ela é pontual porém bastante simbólica, levando em consideração a ênfase dada pelo evento à relação entre arte e política. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Posted by Marília Sales at 3:02 PM

setembro 1, 2010

Veneza abre espaço para novos nomes por Ana Paula Sousa, Folha de S. Paulo

Matéria por Ana Paula Sousa originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de São Paulo em 01 de setembro de 2010

Festival de cinema, que começa hoje sua 67ª edição, traz poucos artistas consagrados e aposta em iniciantes

Número de trabalhos inscritos dobrou em relação a 2009; júri do evento será presidido por Quentin Tarantino

Oscilando entre o sol claro e a brisa fria, Veneza abre hoje a 67ª edição da Mostra Internacional de Cinema.

Também temperado promete ser o clima nos Palazzos Del Cinema e Del Casinò, onde se dará, até o próximo dia 11, a projeção de 83 longas-metragens.

A exemplo do que aconteceu na última edição do Festival de Cannes, em maio, Veneza estenderá seu tapete, sobretudo, para figuras novas ou levemente marginais do cinema. São poucos os grandes nomes. São muitos os estilos e nacionalidades.

Só as próximas edições desses grandes eventos dirão se esses recortes são só coincidência ou se as grifes mais rentáveis simplesmente deixaram de ver os festivais como uma plataforma importante de lançamento nesta era digital.

A noite mais estrelada será a de hoje, quando o cineasta Darren Aronofsky, ganhador do Leão de Ouro em 2008, com "O Lutador", apresentará "Black Swan" (Cisne Negro) e fará desfilar, às margens do mar Adriático, os atores Natalie Portman e Vincent Cassel.

Ao lado de Aronofsky, outros 21 cineastas competem pelo Leão de Ouro, a ser concedido pelo júri presidido por Quentin Tarantino.

Há, na lista, nomes significativos da produção que se situa no meio percurso entre o gigantismo de Hollywood e o cinema tipicamente autoral, de penosa visibilidade.

Entre os concorrentes estão os norte-americanos Sofia Coppola, Julian Schnabel e Vicent Gallo, os franceses François Ozon e Abdellatif Kechiche e o alemão Tom Tykwer.

Os brasileiros ficaram de fora da competição. Mas Andrucha Waddington, de "Eu, Tu, Eles" exibirá seu longa "Lope", coprodução entre Brasil e Espanha.

O filme está programado para sexta-feira, dia 10, na sessão Horizonte, que traz também os novos trabalhos de Marco Bellocchio, John Turturro e um documentário de Martin Scorsese sobre o cineasta Elia Kazan.

OLHOS PUXADOS
Curiosamente, porém, enquanto as estrelas escasseiam, o número de filmes explode.

Em 2009, foram inscritos, na Mostra, 2.208 filmes de 74 países. Neste ano, de acordo com a organização, chegaram 4.251 longas-metragens de 102 países.

E o poderio asiático neste início de século, que se reflete na arte como um espelho ainda difuso para o Ocidente, volta a fazer-se presente.

Nesta edição, China, Hong Kong, Coreia do Sul e Tailândia têm, juntos, praticamente o mesmo número de filmes que França, Alemanha e Espanha somados.

Posted by Marília Sales at 2:44 PM

"Violência já não inspira", diz Rio Branco Bernardo Carvalho, Folha de S. Paulo

Matéria por Bernardo Carvalho originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de São Paulo em 01 de setembro de 2010

Sem fotografar desde 2008 e se dizendo em fase mais espiritual, artista ganha mostra que enfoca mal urbano

Além da exposição no MIS, fotógrafo também apresentará vídeo na Bienal de São Paulo e em Inhotim (MG)

Miguel Rio Branco está construindo um labirinto na casa onde mora há dois anos e meio, em Araras (RJ). "É um labirinto de árvores", esclarece o artista e fotógrafo, conhecido pelo universo urbano, sujo e visceral de suas imagens.

"Não fotografo natureza, não sou um paisagista, estou experimentando, plantando um labirinto", diz, entre as mais de 40 imagens que, captadas desde 1970, retratam detritos urbanos, periferias, prostitutas e marginalizados e constituem, com mais dois vídeos e uma instalação, a exposição "Maldicidades -Marco Zero", aberta ao público a partir de hoje no Museu da Imagem e do Som.

Numa das fotografias, um homem numa favela de Lima, no Peru, segura um jornal em que se lê a manchete: "Murió el Cuerpo" (o corpo morreu). O trabalho de Rio Branco sempre privilegiou a carne, o sangue e as vísceras como o lugar da verdade, fosse entre prostitutas, boxeadores ou mendigos, a ponto de a própria câmera dar a impressão de ser feita da mesma matéria viscosa do mundo observado pela membrana orgânica da lente. "Há seguramente alguma coisa de verdade no corpo, se não a gente não estaria aqui conversando", diz. A foto foi feita para uma reportagem sobre economia informal para a revista alemã "Stern". "Fiz pouco fotojornalismo. Estava sempre do outro lado, onde não acontecia nada." Quando viveu em Paris, de 82 a 83, como membro da agência Magnum, diziam que ele devia fotografar Beirute. "Tinha um francês que vivia em Ruanda. Nunca entendi por que fotografava tanto cadáver. Depois, expôs as fotos, como arte."

MATÉRIA EMPOBRECIDA
A manchete do jornal peruano poderia servir também de marca simbólica para um novo ciclo na obra do artista, em que a verdade do corpo passa a ser projetada na natureza. Rio Branco não fotografa desde 2008, quando fez uma exposição em Tóquio.

"Eu me identificava mais com a marginalidade. Tudo ficou violento demais. Passei de uma fase mais ligada à carne para uma coisa talvez mais espiritual. Tem a ver com o que eu vejo. Há um empobrecimento da matéria.

E uma questão ligada só ao dinheiro. Um excesso, um consumo desenfreado, o último grito do capitalismo." Não é por acaso que o vídeo "Nada Levarei Quando Morrer Aqueles que Mim Deve Cobrarei no Inferno", realizado em 1979 com as prostitutas do Pelourinho, em Salvador, tenha sido selecionado para a 29ª Bienal de São Paulo, que abre neste mês com o tema arte e política.

"Não sei se isso que está aí não vai abrir para outra coisa, porque essa porcaria vai toda para o espaço. Ninguém vai conseguir consumir continuamente, sem ter noção de por que está consumindo. As pessoas estão sendo forçadas a consumir, é uma situação fascista. A partir do momento em que a arte vira produto, ela tem que ser chamada de outra coisa, já não pode ser chamada arte", diz. Nesse sentido, o tema põe a própria Bienal em questão. Resta saber até onde.

FERRARIS
Na primeira noite de sua visita a São Paulo (onde, em 1980, ele perdeu quase todo o seu arquivo fotográfico num incêndio) para a montagem da exposição no MIS, Rio Branco entrou em pânico com o barulho das ferraris na madrugada diante do hotel.

"A ideia da exposição vem da atração do mal nesse espaço urbano gigantesco, mas a violência já não me inspira. Prefiro trabalhar com a natureza. Sempre tive vontade de fazer um trabalho duro sobre São Paulo, mas acabo querendo sair fora antes." Nascido em 1946, filho de diplomata, bisneto do barão do Rio Branco e neto do caricaturista J. Carlos, o fotógrafo teve uma formação errática.

"A essência da fotografia veio de revistas que eu via na casa dos meus pais, tipo "Elle" ou "Playboy". Houve também um livro que me marcou muito, com as primeiras fotos que os aliados fizeram dos campos de concentração. Havia essa dualidade entre vida e morte. Sempre houve essa ambiguidade entre o bem e o mal no meu trabalho. As mulheres do Pelourinho estão lá cheias de cicatrizes, posando como se fossem modelos."

Além da Bienal, o vídeo do Pelourinho integra também o pavilhão dedicado ao artista, a ser inaugurado no Centro Inhotim de Arte Contemporânea (MG). O próprio colecionador e idealizador do centro, Bernardo Paes, deu a ideia do labirinto ao fotógrafo. Em Araras, Rio Branco estava tentando esconder o vizinho atrás de uma cerca viva. "Foi me dando uma certa experiência. Acabei fazendo um projeto de labirinto de dois andares. Mas não vai a Inhotim, não. Um labirinto por encomenda não é mais um labirinto."

Posted by Marília Sales at 2:34 PM

MAC vai "conviver" com novo espaço por Silas Martí, Folha de S. Paulo

Matéria por Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de São Paulo em 31 de agosto de 2010

Diretor Tadeu Chiarelli diz que museu precisará se adaptar a um edifício com "peculiaridades de sua época"

Pé-direito baixo demais nos espaços expositivos obrigará MAC a expor grandes instalações em anexo atrás do prédio

Num galpão aos pés do antigo Detran, Tadeu Chiarelli observa os operários que trabalham para transformar a repartição pública numa nova casa para o Museu de Arte Contemporânea da USP.

Desde que assumiu a direção do MAC, em abril, ele vai toda semana ao canteiro de obras para estudar o espaço.

"É um edifício que tem características peculiares da época em que foi feito, e o museu precisa saber conviver com elas", diz Chiarelli. "Mas essa é uma obra do Niemeyer em sua melhor fase."

Melhor ou não, o antigo Palácio da Agricultura, erguido a poucas quadras do pavilhão da Bienal, nunca foi pensado para ser um museu.

Seus andares com pé-direito de três metros e meio, as tais "características peculiares", não são o ideal para um museu de arte contemporânea, que exige espaços flexíveis para obras que podem extrapolar essas dimensões.

Quando soube da mudança do MAC para lá, Niemeyer sugeriu alterações no prédio.

Ele queria cobrir a fachada de vidro para controlar a luminosidade nos espaços expositivos e fazer uma rampa externa para melhorar a circulação entre as galerias. Pavimentos seriam demolidos, dando lugar a dois novos andares com pé-direito duplo.

Croquis do arquiteto, que estendiam a linguagem já usada no vizinho Auditório Ibirapuera, chegaram a circular com alarde há dois anos, quando foi anunciada a saída do museu da USP.

Isso até que o Conpresp, órgão de defesa do patrimônio, vetou as ideias, preservando o Niemeyer de 1951 em detrimento do atual -diferença que, no orçamento, significou uma economia de R$ 66 milhões à Secretaria de Estado da Cultura, responsável pela mudança do MAC.

MUDANÇA COSMÉTICA

Planos do arquiteto foram descartados e em dezembro deste ano, 18 meses depois do previsto, o MAC vai para o antigo Detran, que passou por reforma de ordem mais cosmética que estrutural.

Nada muda do lado de fora, a não ser a instalação de duas escadas de emergência atrás do prédio. Dentro, paredes foram removidas, criando andares idênticos divididos entre uma grande sala expositiva e outra menor.

Uma mostra permanente do acervo nas salas maiores vai ilustrar um percurso histórico, das obras mais antigas às mais recentes. Nas salas menores, artistas mais bem representados na coleção, como Di Cavalcanti e León Ferrari, terão recortes individuais de suas obras.

Dois andares ficarão reservados para exposições temporárias de artistas contemporâneos, formando um diálogo com o acervo permanente. Na mostra inaugural do espaço, estarão obras da fotógrafa Sofia Borges e do coletivo Pino, entre outros.

"De alguma maneira, a presença de artistas jovens no MAC foi menos intensa", admite Chiarelli. "Gostaria de ver mais artistas ali, tem coisas a serem absorvidas."

ANEXO
Mas nem tudo cabe no prédio principal. Obras maiores vão para o anexo do museu, um galpão que ficava atrás do Detran, única parte do espaço com pé-direito duplo.

Na abertura do MAC, uma grande instalação de Carlito Carvalhosa, com cerca de 60 postes de luz atravessados pela galeria, vai ocupar o anexo. Fotografias de Mauro Restiffe, que documentou toda a reforma do espaço, ficarão no mezanino.

Posted by Marília Sales at 2:23 PM

Dicionário de museus imaginários por Silas Martí, Folha de S. Paulo

Matéria por Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de São Paulo em 31 de agosto de 2010

Novo MAC-USP no antigo prédio do Detran adaptado repete histórico do museu que até hoje teve mais de dez projetos° arquitetônicos que não saíram do papel


Quando abrir sua nova sede perto do Ibirapuera, no antigo prédio do Detran em dezembro, o Museu de Arte Contemporânea da USP vai escrever mais um capítulo numa história de projetos arquitetônicos que poderiam ter sido e que nunca foram.

Desde que surgiu em 1963, tendo como ponto de partida a doação da coleção de Ciccillo Matarazzo para a universidade, o MAC nunca teve um prédio construído para abrigar suas mostras e coleções.

Mas não faltaram projetos. Pelo menos dez propostas nas últimas cinco décadas já emprestaram forma -imaginária- ao museu com a maior coleção de arte moderna da América Latina, hoje com cerca de 10 mil obras.

Franz Heep, arquiteto que desenhou o edifício Itália, pensou numa sede para o MAC-USP que seria construída no coração da Cidade Universitária, nos anos 60.

Na mesma época, Oswaldo Bratke também imaginou um complexo museológico no que configurava o segundo maior conjunto de construções modernistas em São Paulo depois do Ibirapuera.

Não chegaram a sair do papel. Entre os motivos, falta de verbas e "circunstâncias desfavoráveis", nas palavras do ex-diretor Walter Zanini, da época do regime militar -o redator do AI-5 ocupou o posto de reitor da universidade.

De um projeto de Paulo Mendes da Rocha, entregue em 1974, ficaram só parte das fundações até hoje no campus, espécie de pegadas de um museu que viveu só do nome por quase 30 anos.
Foi só em 1992 que a antiga coleção de Ciccillo Matarazzo deixou o espaço no último andar do pavilhão da Bienal para se instalar num prédio da Cidade Universitária, que adaptou uma residência estudantil para receber o MAC.

MUDANÇA

E, de lá, ele não saiu até agora. Teixeira Coelho, hoje curador do Masp, tentou fazer a mudança quando dirigiu o MAC há dez anos.

Organizou um concurso internacional e recebeu propostas do japonês Arata Isozaki, dos brasileiros Mendes da Rocha e Eduardo de Almeida e do suíço Bernard Tschumi, eleito o vencedor.
Não fosse engavetado pela gestão seguinte, Tschumi teria feito um museu vertical num lote da prefeitura perto do parque da Água Branca.

Passada mais uma década, é para outro parque -e para outro prédio adaptado- que vai agora o MAC.
Oscar Niemeyer tentou mudar seu próprio projeto, o Palácio da Agricultura, de 1951, para receber o museu, mas também essa ideia acabou arquivada por um veto da defesa do patrimônio.

Posted by Marília Sales at 2:14 PM