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fevereiro 25, 2012
Abaixo-assinado: Queremos a realização da Bienal de Arte de São Paulo em 2012 e sempre!
Presidenta do Brasil: Queremos a realização da Bienal de Arte de São Paulo em 2012 e sempre!
A alarmante matéria publicada no O Globo Online ontem (24/02/2012) provocou esta petição endereçada a Presidenta Dilma.
A matéria afirma que "Se até lá (15 de março) as contas da Fundação Bienal continuarem bloqueadas por inadimplência, a instituição começará a desmobilizar a equipe convidada a realizar sua 30 edição, prevista para setembro, dispensando curadores e artistas." Mas o estrago pode ir além:
"O relatório apresentado pela CGU ao ministério aponta irregularidades em 13 prestações de contas ocorridas entre 1999 e 2006, somando quase R$ 33 milhões. A CGU pode levar de dez a 15 anos para concluir se houve ou não desvios de verba. Se a Bienal continuar a ser considerada inadimplente durante as investigações, ela será impedida de captar novos recursos ou fazer convênios com o governo."
Queremos encontrar uma maneira de evitar a interrupção da Bienal Internacional de Arte de São Paulo por longos anos, o que certamente decretaria a sua extinção, ao mesmo tempo em que prossigam as investigações sobre as possíveis irregularidades cometidas nas prestações de contas em questão.
Leia, assine e compartilhe a petição publicada no Change.Org.
Leia e comente as matérias do Dossiê sobre a crise da Bienal de São Paulo.
Dossiê sobre a crise da Bienal de São Paulo
Dossiê sobre a crise da Bienal de São Paulo
Matérias publicadas sobre a longa crise da Bienal de Arte de São Paulo entre 2006 e 2012.
Bienal de São Paulo ainda espera por uma salvação por Márcia Abos, O Globo
Nota: Conselho confirma realização da Bienal, Folha de S. Paulo
Bienal faz exigências ao MinC por Camila Molina, O Estado de S. Paulo
Abaixo-assinado Presidenta do Brasil: Queremos a realização da Bienal de Arte de São Paulo em 2012 e sempre!
Leia o documento e faça a sua adesão online no Change.Org.
A Bienal precisa acontecer por Rubens Barbosa, O Estado de S. Paulo, 06/03/2012
Condenada por inadimplência, a Bienal de Arte pode ser cancelada, O Globo Online, 24/02/2012
Justiça nega pedido de liminar da Fundação Bienal por Márcia Abos, O Globo, 08/02/2012
Ministério tenta evitar adiamento da 30ª Bienal por Fabio Cypriano, Folha de S. Paulo, 28/01/2012
Cultura ignora pedido da CGU para investigar Bienal por Alana Rizzo e Fábio Fabrini, Estado de S. Paulo, 28/01/2012
Bienal tem contas bloqueadas por inadimplência por Fabio Cypriano, Folha de S. Paulo, 27/01/2012
30ª Bienal quer relembrar esquecidos por Silas Martí, Folha de S. Paulo, 21/12/2011
Bienal levanta fundos com estrelas e jantar por Sílas Martí, Folha de S. Paulo, 20/09/2011
Bienal sob nova luz por Paula Alzugaray, Istoé, 29/09/2010
Hora da virada por Fábio Cypriano, Folha de S. Paulo, 21/09/2010
MinC investiga repasse de R$ 32 mi à Bienal por Fabio Cypriano, Folha S. Paulo, 27/06/2009
A Bienal tem salvação? por Silas Martí, Folha S. Paulo, 28/05/2009
Candidato promete "agenda positiva" para Bienal por Fabio Cypriano, Folha S. Paulo, 26/05/2009
Os rumos da Bienal em 15 páginas por Camila Molina, O Estado de S. Paulo, 10/04/2009
"Há um problema de gestão na Bienal", entrevista de Ivo Mesquista, Folha de São Paulo, 22/10/2008
Pedido de corte ameaça 28ª Bienal, por Fabio Cypriano, Folha de São Paulo, 26/09/2008
28ª Bienal de São Paulo em brasa, série de reportagens sobre a organização e a curadoria, 2007
Fundação Bienal exclui banqueiro Edemar Cid Ferreira, do Folha Online, 26/07/2006
Condenada por inadimplência, a Bienal de Arte pode ser cancelada, O Globo Online
Condenada por inadimplência, a Bienal de Arte pode ser cancelada
Matéria originalmente publicada no caderno Cultura do jornal O Globo Online, em 24 de fevereiro de 2012.
Principal mostra do país precisa fazer acordo com o governo em 20 dias
SÃO PAULO - Numa corrida contra o tempo, o destino da Bienal Internacional de Arte de São Paulo será definido em 15 de março. Se até lá as contas da Fundação Bienal continuarem bloqueadas por inadimplência, a instituição começará a desmobilizar a equipe convidada a realizar sua 30 edição, prevista para setembro, dispensando curadores e artistas. Ontem haveria uma reunião em Brasília entre a Advocacia Geral da União (AGU) e representantes da Bienal para tentar encontrar uma solução ao impasse que desde janeiro ameaça uma das mais importantes mostras de arte contemporânea do mundo, ao lado da Documenta de Kassel e da Bienal de Veneza.
— Se a Bienal não se realizar, será um atentado à imagem da arte brasileira. Como um país que vai organizar uma Copa do Mundo e as Olimpíadas não consegue sequer realizar uma Bienal? — questiona José Roberto Teixeira Coelho, crítico de arte e curador do Masp.
Após a crise institucional que resultou na "Bienal do vazio", em 2008, uma nova gestão, liderada pelo consultor Heitor Martins, assumiu a Fundação Bienal à beira da falência, com um discurso de transparência e restauração. A próxima edição, com um orçamento de R$ 30 milhões aprovado pelo MinC, começou a ser planejada há dois anos, quando o curador venezuelano Luis Pérez-Oramas foi escolhido e começou a trabalhar com sua equipe curatorial, formada por Andre Severo, Tobi Maier e Isabela Villanueva.
150 colaboradores dispensados
O bloqueio realizado pelo Ministério da Cultura em 2 de janeiro, por recomendação da Controladoria Geral da União (CGU), incide sobre R$ 12 milhões captados via lei Rouanet para a realização da mostra deste ano. Também impede que a fundação capte outros R$ 8 milhões já comprometidos por empresas, também via incentivo fiscal. Outros R$ 5 milhões captados sem lei Rouanet estão livres, mas o valor é insuficiente para a realização da Bienal, que custa no mínimo R$ 18 milhões. A equipe de 150 pessoas contratada pelo programa educativo da Bienal já foi dispensada. O grupo trabalha na formação de monitores e professores, que são capacitados a preparar estudantes antes da visita à mostra e realizar debates depois.
A decisão do MinC de acatar a recomendação da CGU de listar a Bienal como inadimplente causa polêmica entre artistas, curadores, galeristas e gestores culturais, pois ameaça não só a realização desta edição da exposição — a que comemoraria seus 60 anos — mas sua existência. O relatório apresentado pela CGU ao ministério aponta irregularidades em 13 prestações de contas ocorridas entre 1999 e 2006, somando quase R$ 33 milhões. A CGU pode levar de dez a 15 anos para concluir se houve ou não desvios de verba. Se a Bienal continuar a ser considerada inadimplente durante as investigações, ela será impedida de captar novos recursos ou fazer convênios com o governo.
— A Bienal é um jogo ganho, mas o Brasil é um país autodestrutivo. Tem a capacidade de desfazer o que já conquistou — lamenta o artista plástico Nuno Ramos. — Neste momento de restauração de uma dinâmica digna, vem essa bomba relativa a dívidas de gestões anteriores. É trágico e fere um esforço louvável.
O bloqueio das contas pegou a equipe da Bienal de surpresa. A fundação vinha apresentando à CGU documentos e esclarecimentos, conforme solicitados pela auditoria, e mantendo diálogo constante com o MinC. A instituição já havia assinado em 2011 um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) e devolveu ao ministério R$ 700 mil usados para consertar parte do teto do prédio. A obra foi considerada irregular pelo CGU, pois foi feita sem licitação.
Após ser listada como inadimplente, a Bienal entrou na Justiça contra a decisão do MinC, pedindo o desbloqueio urgente das contas para evitar o adiamento da mostra. O pedido de liminar foi negado pela Justiça Federal. Novo recurso está sendo analisado pelo Tribunal Regional Federal de São Paulo, mas é pouco provável que a fundação consiga a liberação dos recursos pela via judicial. A saída para que a mostra seja realizada na data prevista depende de uma negociação entre Bienal, MinC, CGU, Tribunal de Contas da União (TCU) e os ministérios públicos federal e estadual. Representantes de cada uma destas partes precisam chegar a um acordo e assinar um novo Termo de Ajuste de Conduta (TAC). A reunião de ontem em Brasília discutiria os termos iniciais deste documento. Caso as negociações se prolonguem, repassar os recursos já captados pela Bienal para outra instituição que esteja adimplente frente ao MinC seria uma solução temporária capaz de viabilizar sua realização.
— Tanto a realização da Bienal quanto a prestação de contas são de interesse público. Caberia ao ministério encontrar uma solução negociada, capaz de evitar o fim da Bienal e de recuperar dinheiro, se forem comprovados desvios — defende Nuno Ramos.
Procurado, o MinC não quis se pronunciar, alegando que o processo, transformado em Tomada de Contas Especial (TCE), é responsabilidade do TCU.
Num momento em que a arte brasileira ganha reconhecimento internacional, a 30 Bienal de São Paulo é um evento que está na agenda de curadores, colecionadores e galeristas de todo o mundo. Além de ser uma vitrine importante para o Brasil e para a produção latino-americana, a exposição aproxima a vanguarda das artes visuais do grande público e gera reflexões e debates que movimentam a cena contemporânea.
— Trata-se de uma instituição com um capital de realização poderoso. Poucas instituições brasileiras têm a mesma força, o mesmo espaço expositivo e a mesma marca histórica — avalia Teixeira Coelho, curador do Masp e crítico de arte.
Para o diretor artístico da galeria Vermelho, Eduardo Brandão, a importância da Bienal é o que a faz superar as crises e continuar a ser realizada.
— Esta não é a primeira Bienal que tem problemas. O cancelamento da mostra é uma hipótese muito remota, não só pela importância mas pela capacidade da gestão atual, que conseguiu sair de uma quase falência, levantou recursos e realizou uma excelente exposição em 2010 — lembra Brandão.
Não é a primeira vez que a Bienal vê sua existência ameaçada. Desde 1991, a instituição passa por altos e baixos, alternando momentos de crise institucional com o debate sobre seu papel na atualidade.
— A Bienal é um marco na arte brasileira contemporânea, que deve a ela muito de seu processo de internacionalização. Mas hoje nos perguntamos qual a diferença de uma Bienal e uma grande feira de arte — questiona a historiadora e crítica de arte Aracy Amaral.
Para o artista plástico Nuno Ramos, a importância da Bienal é indiscutível.
— A Bienal é o momento no qual as artes plásticas brasileiras se tornam públicas e artistas de ponta alcançam uma dimensão de público mais ampla. É uma dessas coisas que nos dá orgulho, que mobiliza forças culturais — acredita o artista, que em 2010 expôs na 29 Bienal a instalação "Bandeira branca", que continha dois urubus vivos que foram apreendidos, causando polêmica e atraindo a atenção do público.
Bienal adiada em 1993 e 2000
O risco de a Bienal terminar existe, acredita Ramos, discordando do diretor artístico da galeria Vermelho.
— É notável nossa incapacidade de criar ou manter algo contínuo e duradouro — afirma, lembrando que a Bienal foi adiada em 1993 e em 2000.
Críticos e curadores que sugerem que a Bienal repense seu papel acreditam que a instituição ganharia mais estabilidade ao investir na formação de artistas, oferecendo bolsas-residência. Também defendem o uso do prédio de Oscar Niemeyer com maior frequência para exposições intermediárias, como a mostra de 2011 "Em nome dos artistas", e o investimento na formação de um acervo formado pelas obras inéditas criadas por artistas convidados.
— A Bienal de Veneza existe basicamente nos mesmos moldes da de São Paulo e não vejo muitas cobranças para que ela se reinvente. Quem pede transformações à Bienal de São Paulo está, na verdade, cobrando uma redefinição de todo o sistema da arte no Brasil, que está em frangalhos. A maior parte dos museus e instituições culturais brasileiros vive à beira da falência todo mês — rebate Teixeira Coelho. — Quando um banco está à beira da falência ou sob suspeita, o poder público se mobiliza para salvá-lo. Da mesma forma, o problema da Bienal é um problema do Brasil e cabe a todos, poder público, iniciativa privada e sociedade civil, encontrar uma solução negociada para este impasse.
fevereiro 23, 2012
As Urgências da Geração 2000 por Juliana Monachesi, Revista Select
As Urgências da Geração 2000
Matéria de Juliana Monachesi originalmente publicada na seção da hora / audiovisual da Revista Select em 21 de fevereiro de 2012.
Segunda edição da trienal do New Museum, em Nova York, apresenta obras de 50 artistas e coletivos
Jonathas de Andrade e Cinthia Marcelle participam da trienal do New Museum
Sob o título The Ungovernables (Os Ingovernáveis), a segunda edição da trienal do New Museum, em Nova York, dedicada a investigar a produção de artistas emergentes, apresenta obras de 50 artistas e coletivos, sendo nove latino-americanos, entre eles Nicolás Paris, Amalia Pica, Gabriel Sierra e os brasileiros Jonathas de Andrade e Cinthia Marcelle. Uma geração que cresceu em um contexto caracterizado por instabilidade política e econômica, disseminação do capitalismo global e eclosão do fundamentalismo, os artistas selecionados pela curadora Eungie Joo “demonstram resiliência, pragmatismo, flexibilidade e esperança notáveis”, afirma ela. Até o fim de abril, visitantes do New Museum poderão conferir obras que exploram a impermanência e um engajamento com o presente e o futuro, como as esculturas monumentais do argentino Adrián Villar Rojas, que, feitas de argila crua, estão fadadas a quebrar e se desfazer, ou as performances fotografadas da finlandesa Pilvi Takala, que se infiltra em ambientes corporativos e finge trabalhar durante dias (e até semanas), até ser expulsa do local.
*Publicado originalmente na edição impressa #4.
fevereiro 22, 2012
Artistas plásticos do Rio lançam museu virtual de cartões-postais por Agência Brasil, Jornal do Commercio
Artistas plásticos do Rio lançam museu virtual de cartões-postais
Matéria da Agência Brasil originalmente publicada no caderno Cultura do Jornal do Commercio em 22 de fevereiro de 2012.
Museu de Arte Postal (MAP), lançado este mês, tem como proposta fazer a arte postal circular pela rede e difundir o colecionismo
BRASÍLIA - A iniciativa de um grupo de artistas plásticos do Rio de Janeiro revive, em plena era virtual, uma forma de difundir a arte que remete às primeiras décadas do século 20: os cartões-postais. Artistas ligados aos movimentos futurista e dadaísta foram os precursores dessa experiência estética. Mais tarde, ela foi a saída encontrada para a arte em países sob regimes ditatoriais, em que as galerias e os espaços culturais eram fechados aos artistas dissidentes.
O Museu de Arte Postal, lançado este mês na internet (www.museudeartepostal.com.br), tem como proposta básica fazer a arte circular na rede mundial de computadores, e, ao mesmo tempo, difundir o colecionismo em público que não tem poder aquisitivo para comprar obras no mercado de arte. Cada edição com quatro postais, numerados e assinados, pode ser adquirida por R$ 20.
“O preço não objetiva o lucro, apenas cobre os gastos com a impressão”, afirma o artista plástico Marco Antonio Portela, criador do projeto. “Pretendemos estimular o colecionismo, mas nosso intuito básico é fazer a arte circular, seja fisicamente, por quem adquirir as obras, ou virtualmente, na rede mundial de computadores”, acrescenta.
Para Portela, a iniciativa também representa um resgate do cartão-postal como forma de comunicação entre as pessoas, “em uma época, como a atual, em que a virtualidade acabou sufocando a correspondência tradicional, pelo correio”. Ele considera uma obra de arte impressa em cartão-postal tão válida como as produzidas em suportes tradicionais, em telas, por exemplo. “Estamos na pós-modernidade. Qualquer coisa hoje é o suporte. Não existe mais essa obrigatoriedade da tinta, da prata. Se o artista aceita sua obra impressa em gráfica sob a forma de postal e assina, isso é o que vale”, defende.
O Museu de Arte Postal está na rede com obras de quatro artistas: Rogério Reis, Carolina Valansi, Suzana Queiroga e Gustavo Speridião. A cada dois meses, o acervo virtual será enriquecido com obras de mais quatro artistas. Os próximos, em abril, serão Bob N, Vicente de Mello, Luiz Ernesto e Julia Debasse.
Grande retrospectiva mostra potência cromática de Chagall por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Grande retrospectiva mostra potência cromática de Chagall
Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 21 de fevereiro de 2012.
Com 150 obras em dois museus de Madri, mostra foca artista que não se enquadrou em nenhuma vanguarda
Judeu russo que se radicou em Paris, Chagall pintou seres fantásticos e teve pleno domínio das cores
Em intervalos curtos de tempo, na virada para a década de 1920, Marc Chagall pintou uma casa cinza e depois uma azul. Três décadas depois, mergulhou o mundo em tons azulados e, mais tarde, em vermelho sanguíneo.
Toda a potência cromática do artista russo, que morreu aos 97 anos em 1985, aparece com força na primeira retrospectiva dedicada a ele na Espanha. A mostra está dividida entre os espaços Thyssen-Bornemisza e a Fundação Caja Madrid.
Nas 150 obras espalhadas pelos dois museus, fica claro como Chagall arquitetou um universo paralelo em sua trajetória e teve pleno domínio da cor. Sobrevivente das duas grandes guerras do século 20, o judeu russo que se radicou em Paris não se enquadrou em nenhuma vanguarda e expurgou em telas oníricas os horrores do qual foi testemunha.
Já no começo da carreira, anos antes da Revolução Russa - que levou, por tabela, à renovação do pensamento plástico naquele país -, Chagall rompeu com o construtivismo de Kazimir Malevitch (1878-1935) e flertou com proposições impressionistas e expressionistas, distante da tradição judaica que não permitia a figuração.
VACAS E AMANTES
Logo suas vacas e amantes, temas constantes em sua obra, passam a flutuar em planos surreais. Vilas como Vitebsk, onde nasceu, foram reconfiguradas em cores vibrantes, rotas incertas e escala distorcida, como se as dimensões de tudo o que retratava dependessem de uma espécie de hierarquia afetiva.
Desse jeito, uma vaca enorme pode guardar um casal de amantes no flanco; a figura de um anjo, plasmada a partir das telhas vermelhas das casas de uma vila, pode se debruçar sobre uma cidade.
São seres fantásticos que desfilam por alegorias de cor intensa. Azul e vermelho dominam muitas de suas composições. Há o contraste entre o sono profundo de casais apaixonados, que parecem se perder nas nuvens, e paixões faiscantes em terra, com flores, sol de raios rubros e mulheres que aparecem cavalgando galos gigantescos.
UNIVERSO PARALELO
Chagall nunca explicou as repetições em seus quadros de galos, peixes, vacas, violinistas, poetas e amantes. Mas suas feras fantásticas habitam sem conflitos esse vasto universo paralelo, livre dos horrores da guerra e mais próximo do sonhos.
Talvez por isso tenha feito tantas composições semelhantes em tons distintos, como se reavaliasse sua visão de mundo de acordo com um filtro cromático do momento. Algo entre a paz e possíveis pesadelos.
Prova de artista por Marcio Aquiles, Folha de S. Paulo
Prova de artista
Matéria de Marcio Aquiles originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 21 de fevereiro de 2012.
Vida e obra do gravurista pernambucano Gilvan Samico, um dos principais nomes do Movimento Armorial, são registradas em livro
A vida e a obra do artista Gilvan Samico, 83, um dos gravuristas mais importantes da história da arte contemporânea brasileira, podem ser conferidas pela primeira vez em livro, em uma edição de luxo publicada pela editora Bem-Te-Vi.
Autor de peças expostas no Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA) e na Pinacoteca do Estado, em São Paulo, o pernambucano vive hoje afastado das badalações e fatuidades dos grandes centros urbanos.
Ao lado de sua mulher, Célida, a quem o livro é dedicado, mora e trabalha em um casarão do século 17, na cidade de Olinda (PE).
Samico foi o principal expoente do Movimento Armorial nas artes plásticas.
No prefácio do livro, Ariano Suassuna classifica o trabalho dele como decisivo no estabelecimento da poética do projeto, enfatizando o engrandecimento do grupo com sua presença.
A adesão à cena deu-se por meio de um convite feito por Ariano Suassuna, em 1971, ano em que Samico voltava de uma temporada de dois anos na Europa.
"Eu nem sabia que havia um movimento que tinha sido deflagrado pelo Ariano", diz o artista. "Ele [Suassuna] me disse: 'Eu inaugurei o Movimento Armorial e você faz parte dele'. Eu respondi: 'Então você me explica o que é, para eu saber do que eu faço parte'.", afirma.
IMAGÉTICA
No início da década de 1960, após ter sido aluno de grandes mestres como Lívio Abramo e Oswaldo Goeldi, Samico procurou Ariano Suassuna em busca de uma opinião sobre aspectos visuais de seu trabalho.
"Minha gravura era muito noturna, com influência do expressionismo. Mas era um expressionismo lírico, sem o pessimismo que essa escola de arte utilizava", explica.
Por sugestão de Suassuna, começou então a usar elementos do romanceiro popular nordestino. Os profetas, pássaros de fogo, dragões, serpentes e outros animais encantados oriundos do cordel e dos folhetins passaram a permear amiúde a sua obra.
"Fiz o que podia para dar uma roupagem erudita a essa linguagem popular. O mito me interessa mais do que a possível realidade de uma lenda", diz Samico.
Se certo minimalismo gráfico salta aos olhos num primeiro contato com sua obra, uma segunda contemplação mais apurada revela complexas camadas de significação.
O crítico de arte Weydson Barros Leal, autor do texto e curador do livro, destaca as sutilezas do artista.
"Samico desenvolveu uma arquitetura que extrapola a cena pictórica, por meio da criação de planos justapostos que são áreas de tempo narrativos, e não apenas divisões plásticas", afirma.
Outra referência imagética importante em seu trabalho é a trilogia "Memória do Fogo", do escritor uruguaio Eduardo Galeano, utilizada pelo artista como fonte de símbolos e personagens.
Barros Leal destaca as transformações no processo criativo do gravurista.
"A gravura dele começa goeldiana, bastante escura, e vai clareando até encontrar sua própria linguagem. O mais impressionante é que o apuro e a exatidão de seu traço permanecem intactos."
ENGENHOSIDADE
Buscando aperfeiçoar questões técnicas, Samico também desenvolveu inovadores engenhos e ferramentas, como a goiva, instrumento que não permite que o fio da madeira enrole e cubra o desenho, enquanto a superfície da placa é cortada.
"Gosto de dedicar um tempo desenvolvendo novas ferramentas e técnicas que irão servir ao meu trabalho", conta Samico.
Segundo Barros Leal, essas ferramentas são importantes para o alto grau de precisão exigido por sua arte.
"Sua inteligência prática para desenhar ferramentas é universal. Ele é um exímio desenhista industrial com qualidades 'davincianas'[em referência ao pintor Leonardo da Vinci], dono de uma genialidade múltipla singular."
SAMICO
AUTOR Weydson Barros Leal
EDITORA Editora Bem-Te-Vi
QUANTO R$ 190 (196 págs.)
Entenda o Movimento Armorial
Deflagrado pelo dramaturgo e escritor Ariano Suassuna em 1970, o Movimento Armorial tinha como principal meta desenvolver uma arte de caráter erudito, mas que fosse permeada por elementos típicos da cultura popular.
A literatura de cordel, a moda de viola e a xilogravura foram revalorizadas pelo grupo e ganharam novas abordagens.
Além de Suassuna e Samico, o projeto contou com artistas como Antonio Nóbrega, Antonio José Madureira, Capiba, Jarbas Maciel e Guerra-Peixe.
Gilvan Samico
Vida
Gilvan José Meira Lins Samico nasceu no dia 15 de junho de 1928 em Recife. Começou a desenhar na adolescência, usando artistas das revistas de cinema como modelos.
Premiações
Foi premiado no Salão de Pintura do Museu do Estado de Pernambuco em 1957, 1958 e 1960. Em 1968, foi contemplado com o prêmio de viagem ao exterior do 17º Salão de Arte Moderna do MAM do Rio.
Obra
Já participou de bienais e exposições no Carreau du Temple, em Paris, no Art Center de Dronninglund, no Museu Charlottenborg, em Copenhague, e no Konsthall de Estocolmo.
