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janeiro 9, 2018

William Kentridge: “As pessoas não veem a fotografia, veem a si mesmas” por Anatxu Zabalbeascoa, El País

William Kentridge: “As pessoas não veem a fotografia, veem a si mesmas”

Entrevista de Anatxu Zabalbeascoa originalmente publicada no jornal El País em 1 de janeiro de 2018.

Artista sul-africano premiado pelo Princesa de Astúrias das Artes expõe sua obra em Madri. Na entrevista, ele fala sobre sua arte e o apartheid

Este sul-africano, último prêmio Princesa de Astúrias das Artes, é um desenhista que filma suas telas. “Desenhos animados da idade da pedra”, ele assim os chama. Constrói cenografias e atua. Estudou Ciências Políticas em seu país durante o apartheid. Formou-se dramaturgo em Paris e começou a ganhar a vida como artista com 34 anos e dois filhos. O Rainha Sofia expõe sua obra teatral.

Tenho de ver velhos amigos no Prado”, informa William Kentridge. Foi ver Goya, um dos poucos artistas pelos quais sempre se interessou. Toda sua família (sua mulher, que é reumatologista, os três filhos — para os quais cozinhou durante toda a infância enquanto ela trabalhava no hospital — e até seu pai, um célebre advogado nonagenário, defensor de Nelson Mandela e Desmond Tutu) o acompanhou na cerimônia para receber o prêmio Princesa de Astúrias das Artes. No Museu Rainha Sofia, de Madri, onde a exposição Basta y Sobra (até 19 de março) repassa sua produção cênica, Kentridge (Johanesburgo, 1955) começa falando de outros sul-africanos ilustres: Coetzee (Escreveu os melhores livros sobre a África do Sul) e Nadine Gordimer (“Fui à escola com seu filho. Sempre dizia a minha mãe que tomara que ela fosse como a de Hugo, porque sempre estava em casa. ‘O que faz essa senhora?’, quis saber ela, que era advogada. ‘É datilógrafa’, respondi. Deduzi isso porque estava todos os dias teclando. Depois se tornaram amigas”).

Em 1977, criticou o alemão Joseph Beuys porque, para o senhor, espalhar mel no edifício principal da Documenta de Kassell não era arte política. Em sua concepção, a arte política implicava “arriscar-se a ser preso ou a receber choque elétrico nos testículos”. Isso lhe aconteceu?

Fui preso, mas não torturado. Disse isso quando estudava porque na África do Sul a política tinha a ver com prisões e perseguição. Isso torna incompreensível uma visão abstrata da arte política.

Sempre deve implicar risco para o artista?

Não. Há um tipo de arte política que tem a ver com a representação das certezas, mas eu me interesso mais pela ambiguidade e a incerteza. Normalmente o político exige um significado inequívoco a favor ou contra. Acho que a contradição e o paradoxo são mais certeiros que aquilo que não deixa lugar a dúvidas.

O que faz com que uma obra seja percebida como verdadeira?

Se você dá a mesma fotografia a duas pessoas, cada uma dirá coisas diferentes. Isso significa que só podem estar falando de si mesmas. Não veem a fotografia, veem a si mesmas. Por isso uma das funções do artista é lembrar o espectador que quando olha uma obra não está vendo uma verdade, mas uma projeção.

Qual é o papel de um artista no século XXI?

Ainda estamos tentando entender o que aconteceu há cem anos com os dadaístas. Devemos a eles poder trabalhar com sons, textos, poesia, silêncio e com todo o tipo de imagens.

Duchamp questionou o que podia ser arte expondo o urinol na Sociedade de Artistas Independentes de Nova York. Mas isso não interessa ao senhor.

Porque optou por se transformar em um artista enigmático jogando xadrez durante 20 anos. Para mim isso irradia uma atitude muito europeia de cansaço e falta de interesse pelo mundo, até mesmo de cinismo, que também faz parte do legado europeu. Tenho uma relação de amor-ódio com Duchamp e outros artistas, como Bruce Nauman, porque trabalhavam com a segurança de estar no centro do mundo. A América nos oitenta, Paris nos vinte. Isso mudou. Agora é possível trabalhar na periferia e mostrar seu trabalho em Paris no Rainha Sofia, algo impensável há 20 anos.

Sua periferia, Johanesburgo, não é hoje como esses antigos centros: o lugar de maior interesse?

A periferia é um lugar com interesse filosófico, geográfico e econômico. Da distância pode-se ver erros na Europa que foram cruciais na nossa vida.

Que erros?

Parece como se a Europa tivesse acreditado ter o direito de morrer tranquilamente na cama e a destruição das Torres Gêmeas tivesse despertado o Ocidente. Na África as pessoas sabem que não há certezas nem seguranças. Estão acostumados à sobrevivência.

Aqui temos vivido com um senso infundado de segurança?

Essa fantasia se rompeu com o trauma do 11 de Setembro. Na África do Sul sempre soubemos que a vida é risco.

O senhor fez seu nome como artista com o fim do apartheid. A mensagem mais que o meio é o que deve ser contemporâneo na arte atual?

Essa pergunta implica que a pessoa sabe de cara o que faz, e isso não me interessa. Parto de não saber o que estou fazendo, de não controlar isso por completo. Não planejo. Entendo o que faço quando faço.

Mas começa com uma ideia.

Claro, e depois aparecem os problemas, e o tangencial chega para salvar o projeto. Fundei a incubadora The Centre for the Less Good Idea para potencializar uma maneira de criar mais aberta entre músicos, bailarinos e artistas. É fundamental ter flexibilidade para evitar apriorismos e reconhecer o que você está fazendo acima do que você pensava fazer.

Encontra mais temas indagando em si mesmo ou no mundo?

Um artista indaga sempre em seus medos e desejos.

Pertence a uma família de advogados. E estudou Ciências Políticas antes de fazer teatro em Paris.

Eram advogados capazes de imaginar uma vida diferente para seus filhos. Minha mãe sempre me apoiou. Meu pai era mais cético. Está orgulhoso, mas não consegue entender por que as pessoas se interessam pelo que faço. Às vezes me pergunta por que faço as coisas, se realmente acredito que são necessárias.

O que lhe responde?

Que justamente são essenciais porque não são necessárias.

Nasceu em Johanesburgo e viveu em uma minoria dentro da minoria branca: a dos que se opunham ao apartheid. Sua família defendia os direitos dos negros. Como foi a sua infância?

Privilegiada, branca, suburbana. Tínhamos babás e criados. Fui a uma escola em que só podiam entrar crianças brancas. E me parecia que isso era o normal. Se tivesse visto isso desde fora, teria me dado conta de que era doentio, mas dentro tudo se vive como se fosse normal. É preciso ter uma certa idade para se perguntar por que há ônibus para brancos e outros para negros, por que as melhores praias são para os brancos e as perigosas para os negros. É o absurdo endiabrado, mas se vive nele.

Com quantos anos viu esse absurdo?

Com cinco vi no escritório do meu pai fotos de negros assassinados. E ele me explicou que as opções eram abandonar a África do Sul para não enfrentar o problema, como fizeram muitos brancos, ou enfrentá-lo de dentro. Mas fazer isso te deixava em uma posição pouco limpa. Para se opor ao apartheid vivendo nele, era preciso aprender a conviver com a contradição. Minha família escolheu essa opção convencida de que, apesar de tudo, havia coisas que podia fazer.

Sua mãe defendia gratuitamente os negros em julgamentos. Seu pai defendeu Mandela e o bispo pacifista Desmond Tutu...

E eu tive uma vida de branco. Em nossa casa entravam os negros que minha mãe representava ou os amigos de meus pais, mas eram poucos. Lembro que um homem veio em casa e foi até a cozinha cumprimentar os criados. Eles ficaram atordoados porque era o chefe do Congresso Nacional Africano, o antecessor de Mandela.

Sua mulher [Anne Stanwix] é australiana. Chegou com 16 anos, se conheceram na escola e desde então permanecem juntos. Nada mal para um homem que se descreve como instalado na dúvida perpétua.

Faz parte das minhas contradições. Pouco antes de conhecê-la, com 13 anos, decidi que tinha nascido no país errado e com cinco anos de atraso. Se estivesse com 18 em Paris, Berlim ou Berkeley teria feito parte da revolta estudantil em vez de estar enredado na África do Sul, onde não acontecia nada.

Mas aconteceu. Em meados dos anos setenta, o bairro de Soweto se rebelou.

Sim, e tive meu Maio de 68. Mas me lembro de ler no jornal o que acontecia fora e pensado: “Droga, a vida passou por mim”.

Sua avó materna foi a primeira advogada sul-africana.

Sim. Todos os meus avós eram advogados, eles e elas. Suas famílias chegaram da Lituânia e da Alemanha.

Todos eram judeus. O senhor é religioso?

Não. Não fui educado assim. Meu avô tentou, mas minha mãe não tinha nenhum interesse. Depois minha mulher, que é católica, queria que eu recuperasse minha religiosidade. Mesmo que fosse a judaica...

A liturgia?

Sim, as formas: jejum, celebração... Espiritualidade quero considerar que já tenho. Dou-lhe atenção para que ela fique contente.

Em 1990, o presidente Frederik de Klerk começou a eliminar leis discriminatórias e libertou Nelson Mandela depois de 27 anos encarcerado. Lembra-se do fim do apartheid?

As pessoas como nós, estudantes ou profissionais liberais, estava havia tempo esperando isso. Quando o Parlamento anunciou que seria libertado e que os partidos deixariam de ser proibidos faltavam quatro anos para as primeiras eleições, mas abrimos champanhe. Sabíamos que o país seria outro. Embora nem todo mundo quisesse. A maioria dos brancos teria preferido manter seus privilégios.

Como mudou sua vida?

As organizações que eram proibidas de falar passaram a fazer isso sem medo. Houve quatro anos de negociações e tentativas de evitar as eleições, mas a África do Sul não se tornou um país de fundamentalistas, e sim de gente disposta a pactuar. Pactuar é um sinal de maturidade, você não consegue tudo o que quer, mas é a única maneira de conseguir algo.

Estudou política para se graduar?

Eu tinha interesse pelos livros proibidos. Se você estudava política, podia ir à biblioteca e pegar livros de Marx. Se não, se te pegassem com esses livros era um crime. Semanalmente, uma revista governamental lembrava ou ampliava a lista de títulos censurados. O político e o pornográfico compartilhavam a mesma categoria: a do proibido.

Por tudo isso foi um artista tardio?

Sempre desenhei, depois na França fiz teatro. E duvidei. Tinha 34 anos, dois filhos e ainda duvidava.

Era sua mulher que o mantinha?

Me deu de presente tempo para duvidar.

Em sua primeira obra abordou o apartheid em pôsteres para os sindicatos.

Sim, mas com uma linguagem de arte de protesto. Demorei para entender que estava tratando as pessoas com condescendência. E isso me encheu de dúvidas. Eu me dei conta de que com o que fazia estava dizendo às pessoas o que tinham de pensar, que é uma forma de lhes dizer que estão menos preparadas e são menos inteligentes e sensíveis do que você. Isso me pôs em meu lugar: não queria me dedicar a dizer às pessoas o que tinham que pensar. Decidi que se algo me interessava, talvez pudesse interessar a mais pessoas. E decidi fazer as coisas para mim, para entender, sem uma ambição específica. O curioso é que ao trabalhar assim ficou mais fácil para mim abordar temas políticos. Chegaram com naturalidade.

Em 25 anos, como o seu país evoluiu?

Muita gente esperava uma mudança radical de vida. E o que se passou é que há uma classe média branca e outra negra que, numericamente, já são iguais (quatro milhões cada raça). Mas para a classe trabalhadora a vida não mudou. Sua situação, embora não tão ruim, é de grande pobreza e desespero.

O que aconteceu com os privilegiados?

Muitos mantiveram os privilégios. Os grandes beneficiários dos últimos 25 anos foram os homens de negócios brancos.

O senhor está dizendo que a liberdade não muda as coisas?

Muda. Mas isso não implica em igualdade econômica. Os mineiros continuam sendo negros; os faxineiros também.

Em 1996, o Comitê da Verdade e Reconciliação demonstrou não ter muita verdade nem muita reconciliação.

Essa foi uma ideia muito cristã defendida por Desmond Tutu. As pessoas iriam perdoar. Iriam esquecer os abusos sofridos. A verdade lhes daria coragem para fazê-lo. Essa esperança sempre me pareceu muito otimista. Acreditava que as pessoas não seriam tão generosas quanto Mandela ou Tutu, que não perdoariam e esqueceriam tão facilmente. Mas a primeira parte, a comissão da verdade, foi surpreendente. Em quase todos os países, a amnésia nacional vem depois dos grandes problemas e das grandes injustiças. Aconteceu na Espanha depois da Guerra Civil. Só recentemente se falou com objetividade sobre Franco. Na França aconteceu o mesmo com os colaboradores. Não foi possível falar do apoio aos nazistas durante 30 anos. Por isso na África do Sul foi tão chocante que desde o início tenha sido criada uma comissão para investigar a violação sistemática dos direitos humanos. Seu mecanismo era conceder imunidade e anistia se confessassem o que tinham feito. Sacrificaram a justiça pela verdade, pela memória. Então, se você aceitasse que as pessoas que haviam feito coisas terríveis não tinham de pagar por isso, você poderia saber o que aconteceu. Essa ética contábil foi um pacto com o diabo: para além do terrível que tinham feito, não precisavam pagar por isso caso confessassem.

Como a Igreja Católica, o perdão depois do arrependimento e da confissão.

Mas uma coisa é saber a verdade e outra é perdoá-la. Muitas pessoas relacionam perdoar com deixar de pensar, com esquecer. Eu acredito que só se pode perdoar quando você conseguiu não sentir dor. O que alegaram é que, se fossem julgados, não diriam a verdade e não haveria verdade nem justiça. Eles ganharam.

Seu pai decidiu sair antes do fim do apartheid.

Sim, e minha mãe e meus irmãos. Eles estavam fartos da corrupção nos tribunais. Da minha família, só minha esposa e meus três filhos ficaram. Nos encontramos em Londres. Meu pai continuou como advogado lá e minha mãe continuou trabalhando na organização que havia fundado na África do Sul, The Legal Resource Center, que oferecia assessoria jurídica gratuita.

Um dos seus irmãos é escritor. Como há tantos artistas em uma família de advogados?

Meus antepassados vieram da Lituânia, eram muito pobres. Um era professor de hebraico, outro era ferreiro. A geração seguinte pôde ir à universidade, todos conseguiram uma profissão mais bem remunerada, mas sofreram pressão familiar para se tornar profissionais. Quando nós chegamos, essa pressão havia desaparecido. É curioso observar a psicodinâmica do que somos: hoje a incerteza igualou o mundo. Antes, se formar na universidade era garantir um emprego. Hoje, não mais.

Agora não há certezas. Hoje o senhor poderia ter se permitido duvidar tanto?

Eu me pergunto muitas vezes como pude viver tão tranquilo todos esses anos que me dediquei a decidir o que queria ser. Mesmo assim, me aconselharam que, pouco importando o que fizesse, deveria me especializar. Se fosse desenhar, que desenhasse. Se preferisse o cinema, que filmasse... Caso contrário, me tornaria um amateur. Levei um tempo para aprender que a única maneira de me tornar artista passava por não me especializar e misturar o que sabia. Às vezes é necessário construir um absurdo para demonstrar os limites do sentido.

O senhor é rico?

Tenho mais dinheiro do que necessito. Mas não tenho grandes necessidades.

Por que o senhor apaga e refaz continuamente seus trabalhos?

Suponho que por causa da insegurança. Preciso permanecer no provisório. Às vezes filmo os desenhos e eles se tornam desenhos animados da idade da pedra. Outras, com músicos ou atores, meu trabalho se transforma em uma ópera. Mas a parte estratégica se baseia no desenho.

O absurdo é fundamental em suas obras. Como brincar em situações trágicas?

O absurdo não é estúpido nem idiota. Refere-se sempre a uma lógica que foi rompida. A ideia de que um nariz pode abandonar um rosto levanta uma lógica falsa, que nos serve para falar sobre o medo das hierarquias ou sobre a divisão de alguém em várias pessoas. Se você quiser falar sobre o apartheid na África do Sul, esses recursos servem. O absurdo rompe a lógica racional e se apoia na irracional. É preciso levar o absurdo a sério.

Posted by Patricia Canetti at 11:34 AM