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junho 19, 2017

O Sul é uma abstração por Cristiana Tejo, seLecT

O Sul é uma abstração

Artigo de Cristiana Tejo originalmente publicado na revista seLecT em 5 de junho de 2017.

A tímida presença numérica de artistas da América Latina e da África Subsaariana nos faz questionar a qual Sul se refere o conceito curatorial

O sociólogo Zygmunt Bauman, na abertura de seu livro Modernidade Líquida, dividia a humanidade globalizada em dois segmentos: um grupo que vive no tempo e outro que vive no espaço. A parcela da população que vive no tempo é a que se preocupa apenas com que seu voo transatlântico não atrase, para que seu compromisso de trabalho ou de lazer não seja prejudicado, já que seu trânsito pelo mundo do consumo global é autorizado e praticamente “sem fronteiras”. A outra parcela vive dolorosamente a concretude do espaço incorporado em muros, fronteiras minadas, polícias de imigração irascíveis, cujo deslocamento é cerceado e, em parte das vezes, mortífero. Essas condições em muitos casos não são imutáveis, variando em contextos históricos. Essa forma de enxergar a realidade do movimento dos corpos sociais pelo mundo, que poderia soar simplista, há dez anos parece tomar novos contornos no momento de novas incertezas geopolíticas, quando direitos de circulação são perdidos do dia para a noite, afetando populações inteiras que por algumas décadas assentaram-se como privilegiadas e “seguras”.

Essa citação de Bauman veio-me à cabeça na coletiva de imprensa da Documenta 14, ocorrida em 6/4, data que marcava o 76o aniversário da invasão nazista à Grécia. Muito foi dito e performado nas mais de duas horas de apresentação da primeira Documenta a acontecer massivamente fora da Alemanha, mas algumas colocações se sobressaíram como um contraste entre as várias colocações do time curatorial e a realidade que gritava fora do anfiteatro lotado por pessoas que muito provavelmente não tiveram sobressaltos para chegar em Atenas. Uma delas foi que o Sul é uma abstração, não uma geografia fixa.

Sob o ponto de vista conceitual, essa afirmação é compartilhada por pessoas de pensamento mais progressista, mas quase todas privilegiadas de alguma forma. A noção de Sul pode até ser relacional, ou seja, a subalternidade muitas vezes é uma questão do que ou quem está em relação ao que ou quem. Entretanto, quando a declaração parte de um agente social legitimado pelo mais alto grau institucional da arte contemporânea mundial num evento que escolheu se inserir num contexto tão complexo como a Grécia atual, numa clara relação de assimetria de poder, as boas intenções podem soar como cinismo. O choque entre as pessoas que vivem no espaço e as que vivem no tempo nunca ficou tão evidente na Documenta como nesta edição em Atenas.

Se o projeto não se apoiasse nas prerrogativas da decolonialidade e no desejo de “aprender com Atenas” e desaprender o que se sabe, talvez pudéssemos transitar com menos incômodo pela exposição que se estende por vários espaços culturais e pontos da capital grega. Entretanto, muitas perguntas nos perseguem nesse percurso. Se a desconstrução almejada pelo decolonial é estrutural, por que notamos que a via traçada pelos curadores é de mão única? A revista grega South as a State of Mind virou a publicação oficial da Documenta desde 2015, mas nenhuma revista alemã virou a publicação oficial de pensadores e críticos gregos, por exemplo. A tímida presença numérica de artistas da América Latina e da África Subsaariana nos faz questionar a qual Sul se refere o conceito curatorial. O que significa desaprender para a elite do mundo da arte? Propositalmente há poucas informações sobre os artistas nas fichas técnicas e isso obriga os visitantes a pesquisarem por si próprios o que lhes interesse: onde nasceu, se ainda está vivo, onde mora, qual o contexto da extensa pesquisa que está sendo apresentada na mostra. A ausência dessas informações que contextualizam os artistas baseia-se no interesse de tornar esse processo de construção do conhecimento ativo ou de “desinfantilizar o público”, ou ainda de potencializar “subjetividades radicais” em contraposição ao antigo mundo em que se encontrava arraigado “nos conceitos de pertencimento, identidade e enraizamento”, nas palavras do curador-geral, Adam Scwymczyk. Como muitos dos trabalhos são novos, não há como conseguir mais detalhes de alguns dos processos artísticos sem consultar o site da Documenta, tarefa possível apenas para aqueles que possuem internet em seus celulares. Além disso, a má sinalização também causa confusão na hora de saber de quem são os trabalhos. O que significa então aprender e desaprender para o público não especializado da mostra?

Apesar de ser uma edição muito menos empolgante do que a anterior, a primeira etapa da Documenta tira por vezes bom partido dos espaços existentes na cidade e cruzar ruas, adentrar em bairros e se deparar com a vida urbana acontecendo é a parte forte do projeto. Talvez o lugar expositivo mais potente seja o Conservatório de Atenas, onde estão localizadas pesquisas que costuram incríveis experimentações entre música e artes visuais em vários momentos do século 20, a exemplo dos objetos sonoros e das pinturas musicais de Guillermo Galindo, das proposições de deep listening da recém-falecida compositora Pauline Oliveros e dos móveis sonoros da artista Nevin Aladag ativados na abertura da mostra. Numa outra parte do Odeom encontra-se a comovente instalação sonora de Emeka Ogboh, em que cantos de lamentos ecoam numa espécie de anfiteatro, enquanto um painel em néon mostra em tempo real a Bolsa de NY.

No Benaki Museum, a mostra entra no espaço cubo branco e seu vigor arrefece. Justamente no local onde se poderia questionar as disciplinas e agentes que contribuíram para a máquina da colonialidade encontramos poucos trabalhos que problematizam essa engrenagem, a exemplo da instalação Biafra Time Capsule, de Olu Oguibe, em que um vasto arquivo material sobre o conflito em Biafra é disposto em vitrines. No térreo, a instalação/performance de Beau Dick, artista indígena da etnia Kwakwaka’wakw do Canadá, recém-falecido, conecta-se com uma série de fotografias feitas do antropólogo Franz Boas reencenando o ritual do Hamat’sa da mesma tribo, que se situa no primeiro andar. Aqui, objeto de estudo e sujeito contrapõem-se e dialogam numa espécie de continuum. O vídeo Tripoli Cancelled, de Naeem Mohaiemen, é um tocante e envolvente experimento cinematográfico filmado no antigo aeroporto de Atenas, desativado há mais de 15 anos. Um homem vagueia por semanas pelas ruínas do edifício abandonado, forjando um cotidiano e fazendo de casa o que de fato foi um lugar de passagem. Na Escola de Artes, encontra-se outro núcleo cativante de trabalhos, onde se destacam Bouchra Khalili, Angelo Plessas, Amar Kanwar, Alan Sekula e Anna Kay/Lawrence Halprin.

Serviço
Documenta 14
Atenas, de 8/4 até 16/7
Kassel, 10/6 até 17/9
www.documenta14.de/en

Posted by Patricia Canetti at 12:21 PM