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março 8, 2012
Infância reúne trabalhos de Nan Goldin, Cao Guimarães e Paula Trope por Diogo Guedes, Jornal do Commercio
Infância reúne trabalhos de Nan Goldin, Cao Guimarães e Paula Trope
Matéria de Diogo Guedes originalmente publicada no caderno de Artes Plásticas do Jornal do Commercio em 7 de março de 2012.
Com curadoria de Moacir dos Anjos, a mostra coletiva tematiza em vídeos a utopia política que pode ser a infância
De certa forma, todas as crianças enxergam o mundo a partir de um olhar utópico, idealizado, em que a vida ainda é um campo absoluto de possibilidades. Infância, exposição com curadoria de Moacir dos Anjos, é uma tentativa de procurar o poder de transformação presente na imaginação infantil. Com trabalhos da americana Nan Goldin, do mineiro Cao Guimarães e da carioca Paula Trope, a mostra tem sua abertura na quinta-feira (8/3), às 19h, na Galeria Vicente do Rego Monteiro, na Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj) do Derby. A entrada é livre.
Parte do projeto Política da Arte, da Coordenação de Arte Visuais da Fundaj, a coletiva busca mostrar que, no distante lugar que a infância parece ser para um adulto, pode existir um questionamento das formas convencionadas de se ver o mundo. A ideia de mostra, segundo Moacir, surgiu quando ele se deparou com o vídeo de Nan Goldin, Fire leap (2010, 15 minutos), um slide-show com fotos saturadas e lúdicas retratando crianças (em algumas imagens, mulheres grávidas e adolescentes) em momentos de recreação e felicidade.
Cao Guimarães, por sua vez, colabora para a mostra com dois vídeos: Peiote (2007, quatro minutos) e Da janela do meu quarto (2004, cinco minutos). São gravações acidentais, frutos da conspiração do acaso, que retratam crianças sendo crianças a partir de suas ações singulares, do prazer de estar ali fazendo algo.
Paula Trope também trouxe dois trabalhos para a exposição – um deles, bastante semelhante na forma de exibição ao de Nan Goldin. Translados (1996-1998, 10’56’’), apesar de também ser um slide-show, traz fotos de crianças brasileiras e cubanas lado a lado, evocando a infância como um conceito sem geografia, capaz de unir os diferentes. Contos de passagem (2001, 15 minutos) traz entrevistas e gravações de crianças de rua no Rio de Janeiro, em que elas mostram a natureza genuinamente afetiva e natural da criança.
Até pelo tema do projeto, é inevitável tomar os vídeos como metáforas políticas. De certa forma, eles mostram que a imaginação da criança não vê os limites que a racionalidade e a materialidade adulta impõe. “A ideia da exposição é mostrar a infância como o momento em que outros futuros são possíveis”, explica Moacir. “As crianças são exemplos que o mundo poderia ser diferente”.
Saiba mais sobre a exposição na Agenda de Eventos.
Bienal faz exigências ao MinC por Camila Molina, O Estado de S. Paulo
Bienal faz exigências ao MinC
Matéria de Camila Molina originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal O Estado de S. Paulo em 7 de março de 2012.
A Fundação Bienal de São Paulo fez ao Ministério da Cultura (MinC) uma série de exigências para aceitar que a 30.ª mostra da instituição seja realizada por um outro proponente. Uma delas está relacionada ao curador-geral da exposição, o venezuelano Luis Pérez-Oramas. "Neste diapasão da preservação artística e para que a Fundação Bienal em momento nenhum terceirize seu objeto de existência, no espírito de parceria presente nessa missiva, que o curador já contratado Luis Pérez-Oramas continue vinculado à Fundação e pago com recursos próprios da mesma", afirmou a entidade ao governo federal.
No ano passado, Oramas licenciou-se, temporariamente, do Museum of Modern Art (MoMA) de Nova York, onde é curador de arte latino-americana, para se dedicar ao desenvolvimento da 30.ª Bienal de São Paulo, marcada para ocorrer entre setembro e dezembro de 2012. Ele já havia definido o projeto da mostra, sob o título A Iminência das Poéticas, que teria entre 110 e 115 artistas participantes. Desde que a Bienal de São Paulo foi classificada inadimplente pelo MinC e teve seus recursos bloqueados, o processo da 30.ª mostra está paralisado - corre até risco de não ocorrer este ano.
As exigências da Bienal estão relacionadas a considerações apresentadas anteriormente pela Secretaria de Fomento e Incentivo à Cultura do MinC, sobre o processo de alteração de proponente da 30.ª Bienal de Artes de São Paulo como uma manobra para que a mostra ocorra. "O proponente substituto não poderá assumir posição de mero intermediário da Fundação Bienal, ou seja, todo o objeto dos Pronacs deverá ser integralmente assumido pelo novo proponente", afirmou o Ministério em documento.
Na semana passada, o MinC reuniu-se, em São Paulo, com representantes da Pinacoteca do Estado, Museu de Arte Moderna (MAM) de São Paulo e Instituto Tomie Ohtake - indicados pelo governo federal - para apresentar o projeto de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para a troca do proponente da 30.ª Bienal. O conselho da Pinacoteca resolveu retirar-se do processo. O Estado apurou que o MAM tem mais chances de criar a estrutura jurídica e administrativa necessária para a mostra e que o ministério deverá anunciar a instituição escolhida até o fim desta semana.
Informalmente, conselheiros da Fundação Bienal de São Paulo reclamam de "embaraços com o MinC, que estão inviabilizando a realização da 30.ª Bienal". Está marcada para terça-feira a reunião do conselho da instituição para decidir o futuro da exposição. O governo federal quer resolver a situação até o dia 15.
Outra demanda da diretoria da Fundação Bienal de São Paulo, presidida pelo consultor diretor da McKinsey, Heitor Martins, é a de ser correalizadora da 30.ª edição da mostra. "A Fundação Bienal participará das decisões relativas ao evento, sobretudo no que se refere a questões de natureza técnica e artística, como previsto em seu Estatuto Social e atendendo à finalidade para a qual foi instituída. Sendo assim, a Fundação será o primeiro interlocutor e porta-voz do evento. Todas as demais medidas relativas à execução do projeto, tais como convites a artistas, serão realizadas conjuntamente pelas duas instituições (Fundação Bienal e proponente)."
"É o reconhecimento do projeto da 30.ª Bienal como foi pensado. É uma questão emergencial. A realização da mostra vai ser fator de fortalecimento da Bienal", opinou o diretor da Pinacoteca do Estado sobre o processo para driblar mais uma crise da instituição (leia mais ao lado).
A Fundação Bienal de São Paulo entrou, em janeiro, na lista de inadimplentes do MinC por causa de questionamentos da Controladoria Geral da União (CGU) sobre convênios firmados pela instituição paulistana entre 1999 e 2007 (de gestões de Carlos Bratke e Manoel Pires da Costa, ambas anteriores à atual diretoria da entidade). Pelos cálculos da CGU, a irregularidade dos convênios teria acarretado rombo de cerca de R$ 75 milhões aos cofres públicos. A instituição está preparando a prestação de contas.
março 7, 2012
Atenção às evidências por Carlos Jimenez, Revista Select
Atenção às evidências
Matéria de Carlos Jimenez originalmente publicada na seção crítica / artes visuais em 5 de março de 2012.
Mostra no Reina Sofía inclui obras emblemáticas do artista
Exposição de Antoni Muntadas no Museo Reina Sofía mapeia as reflexões do artista sobre o ambiente midiático que define a atualidade
Muntadas está entre os artistas que melhor respondem aos desafios apresentados por nossa época, tão radicalmente marcada pelo propósito compartilhado entre estado e mercado de moldar ao seu gosto a vida cotidiana, a vida comum. Esta é a conclusão definitiva oferecida pela visita à grande exposição sobre sua obra, em cartaz desde novembro de 2011 e que vai até março de 2012, no Museu Reina Sofía de Madri, que mostra tanto a riqueza poliédrica de seu trabalho quanto seu obstinado interesse pelos meios e técnicas que permitem essa crucial manipulação.
Na busca de seus objetivos, Muntadas optou com frequência por uma tática que não é descobrir o que está escondido, mas chamar a atenção sobre o que é evidente. Foi assim que ele realizou, em 1980, The Limousine Project, colocando para circular em Manhattan uma imponente limusine preta com vidros escuros e monitores de vídeo nas janelas traseiras, exibindo imagens que enfatizavam os traços enigmáticos desse símbolo de poder e status social característico de Nova York. Nenhum nova-iorquino ignora a existência desses automóveis, mas é provável que poucos deles, antes da intervenção de Muntadas, tenham se dedicado a refletir sobre a ostentação de poder que o seu uso faz supor.
Essa estratégia elíptica valeu a Muntadas o questionamento eficiente de duas maneiras muito poderosas de controle da vida contemporânea: a arquitetura e as mídias. A exposição traz Architektur/Räume/Gesten, peça crucial de 1991, composta da reunião, em uma série de slides, de imagens de exteriores de edifícios imponentes com imagens de escritórios onde se tomam as decisões e os gestos corporais característicos dos que efetivamente comandam essas decisões. A arquitetura revela-se nessas imagens como um dispositivo de poder formalmente congruente com a retórica gestual daqueles que o agenciam e representam.
O mesmo assunto ocupa a instalação de 1987, The Board Room, uma grande sala de reuniões na penumbra, de cujas paredes pendem retratos de 13 personalidades religiosas, políticas e televisivas, com um pequeno monitor de vídeo em vez da boca, emitindo fragmentos de seus discursos habituais que, sobrepostos, geram um rumor ininteligível.
A grande mostra no Reina Sofía inclui ainda outra obra emblemática do artista: Stadium, que interroga tanto a história de um arquétipo arquitetônico originário do circo romano quanto os usos esportivos e políticos que ele tem em uma sociedade definitivamente entregue ao espetáculo. Cabe mencionar ainda Situación 2011, uma intervenção realizada entre os edifícios de Francesco Sabatini e Jean Nouvel, que servem de sede ao Reina Sofía. Esse trabalho analisa tanto as diferenças entre edifícios de épocas tão distintas quanto as existentes em termos de políticas expositivas e concepções museográficas que orientaram o projeto inicial do centro de arte Reina Sofía e o atual Museo Nacional Centro de Arte Reina Sofía.
Em relação à importância da televisão na obra de Muntadas, deve ser dito que ele qualifica de Media landscape (paisagem Midiática) o ambiente eletroacústico que tem na televisão seu principal meio de realização e projeção. na exposição sobram exemplos do que Muntadas fez com essa paisagem, começando pelas tentativas de democratizá-la, nos anos 70, com os projetos de televisão comunitária cadaqués canal local e Barcelona distrito uno. ou ainda de sabotá-la, como em Acción TV, que pretendia interromper as transmissões normais da televisão com um vídeo em que o artista aparece com a letras T e V tapando seus olhos.
Talvez o projeto com formato televisivo mais ambicioso do artista catalão seja o que explora o medo, sentimento que divide mais do que as fronteiras físicas. esse assunto aparece em duas versões: Fear/Miedo, realizada na fronteira entre tijuana (México) e San Diego (Eua), em 2005, e Miedo/Jauf, realizada na região do estreito de Gibraltar, entre Tarifa (Espanha) e Tanger (Marrocos), em 2007. Impressionantes.
Carlos Jimenez é critico de arte e curador independente. Professor de Estética da Univeridad Europea de Madrid e autor dos livros Extraños en el Paraiso e Los Rostros de Medusa.
Desacerte os ponteiros por Giselle Beiguelman, Revista Select
Texto de Giselle Beiguelman originalmente publicada na seção crítica / artemídia da Revista Select em 6 de março de 2012.
Anti-horário abre 2012 na Vermelho
Exposição de Gisela Motta e Leandro Lima desfaz obviedades para multiplicar sentidos
Anti-horário é o nome da exposição que a dupla Gisela Motta e Leandro Lima apresenta na Galeria Vermelho, em São Paulo de 06/03 a 05/04. Reúne um conjunto de obras recentes dos artistas, a maior parte delas inéditas.
A única já apresentada em São Paulo é Zero Hidrográfico, que esteve até bem pouco tempo no OK Center em Linz, na Áustria, e é até hoje, a única peça tridimensional criada pelos artistas.
“Apesar de ser um objeto, retoma o que sempre quisemos do vídeo: pensar o tempo em suspensão e também a repetição, o loop”, diz Leandro.
Espécie de mar de neon, de ondas remexidas por motores e dobradiças de gavetas que sobem e descem, é um híbrido de gambiolgia avançada com baixa tecnologia.
Esse tipo de estratégia, a combinação de elementos opostos em racionais exercícios de desprogramação de rotinas é um dos traços da produção de Lima e Motta.
Em várias obras, aparece na forma como os equipamentos são tomados para executar as mesmas funções para que foram projetados, porém não do modo como o fazem no cotidiano.
É o caso de Calar (2011), uma vídeo instalação duocanal feita com uma câmera termográfica.
Esse tipo de câmera mapeia, sem contato físico, os padrões térmicos da superfície de um objeto. É utilizada na indústria para teste de rigidez de partes de automóveis e até em aeroportos para investigar se os passageiros são saudáveis ou não.
Mas ao ser usada num jogo que revela a energia em forma de calor emitida pelos corpos, e que se transforma através do toque, ao mesmo tempo que sublinha exatamente o que já vinha prescrito no pacote pronto do dispositivo, o subverte de ponta a ponta.
Mas ao ser usada num jogo que revela a energia em forma de calor emitida pelos corpos, e que se transforma através do toque, ao mesmo tempo que sublinha exatamente o que já vinha prescrito no pacote pronto do dispositivo, o subverte de ponta a ponta.
Encantador, para dizer o mínimo, Anti-horário retrata a paisagem em torno das ruínas da antiga casa do faroleiro de Recife como se fosse o pano de fundo de um relógio de parede.
Nesse relógio, que é um verdadeiro poema de imagens, os adultos, o casal, são os ponteiros das horas e a criança, o dos minutos. A ruína parece andar para trás, os adultos parecem não sair do lugar e a criança, ligeira, mas sem andar retilíneo, vai, aos poucos ocupando o círculo e o centro da tela. Em torno de tudo, o movimento delicado das nuvens.
Entre as obras nunca antes expostas -- Xabori, DNA e Captcha--destaca-se a última série. Ela é feita com frases retiradas do clássico da ficção científica 2001, Uma Odisséia no Espaço de A. C. Clarke, filmado por Stanley Kubrick, que encena o célebre embate entre o supercomputador HAL 9000 e a humanidade que acaba por dominar.
São justamente as frases emblemáticas da vitória da HAL sobre o homem que aparecem na série dos artistas. Porém essas frases aparecem grafadas na tipologia do padrão captcha.
Esse padrão é utilizado por quase todos os sistemas on-line para verificar se é realmente um ser humano quem está preenchendo o cadastro e não um script malicioso. “Hoje em dia tornou-se comum você ter que provar o tempo todo para seu computador que você é humano”, comenta Leandro.
Em Captcha, as frases de HAL foram bordadas por máquinas industriais, simulando essa tipologia. Mas isso não sinaliza a vitória definitiva de HAL, até mesmo porque essa dicotomia perdeu o sentido. “O que importa é qual é a distinção entre as coisas – água, bordado, DNA -- e como isso se torna vivo”, pontua Gisela.
Hora de desacertar os ponteiros e se abrir às ambiguidades.
Saiba mais sobre a exposição na agenda de eventos.
Galeria de Barcelona mistura arte brasileira e curadoria espanhola por Cristina Tardáguila, O Globo
Galeria de Barcelona mistura arte brasileira e curadoria espanhola
Matéria de Cristina Tardáguila originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal O Globo em 7 de março de 2012.
As cariocas Cristina Salgado e Regina de Paula abrem R exposição na Paradigmas
Funciona no conceituado bairro da Gracia, em Barcelona, uma galeria que, através da arte, pretende incrementar o diálogo entre o Brasil e a Espanha. Mas o caminho escolhido pelos fundadores da Paradigmas para atingir a meta é bem mais espinhoso do que se pode supor. Focado em arte contemporânea, o espaço tem como premissa misturar produções artísticas de um país com curadoria do outro, numa tentativa quase obsessiva de trazer à tona o cruzamento de olhares enraizados em continentes diferentes.
Seguindo essa filosofia, a casa fundada pelos artistas plásticos e designers Francisco Amaral e Angélica Padovani inaugura hoje uma mostra (sua sexta, desde a inauguração) que reúne trabalhos de duas cariocas que passaram pela Escola de Artes Visuais do Parque Lage. Até o dia 5 de maio, obras das artistas plásticas Cristina Salgado e Regina de Paula, selecionadas a dedo pelos curadores espanhóis Gloria Fernandez e Victor Ramírez, ocuparão a galeria de 90 metros quadrados que se esconde por trás do mais imponente portão da Rua Francisco Gine — o único de ferro pintado de verde-bandeira-do-Brasil.
— Todos os trabalhos dessa mostra têm em comum a questão do corpo e da anatomia como suporte para a produção de significados — explica Cristina, que também é professora do Instituto de Artes da Uerj. — Quem for à Paradigmas verá que trabalho o problema das fronteiras entre interioridade e exterioridade.
Cristina apresenta na galeria catalã uma série de 15 desenhos intitulada “Tremores e permutações”. Feita com imagens de carimbos sobrepostas à exaustão em papel e até mesmo pelas paredes do espaço (sim, ela transborda qualquer fronteira), a artista dá vida a figuras que parecem em 3D e provoca o olhar.
— Ao repetir quatro imagens quase que ao infinito, um cavalo, um cavaleiro, uma moça sentada e uma musa, o resultado é uma ilusão que faz lembrar uma pintura — explica o fundador da galeria.
Além da série de carimbos, Cristina também leva a Barcelona o trabalho tridimensional “Moça nua sentada”, que consiste numa caixa retangular de 95 centímetros de altura adornada com tecido emborrachado cor de rosa por fora e com feltro vermelho por dentro. O visitante é convidado a observar seu interior através de uma única abertura oval.
Regina de Paula apresenta, por sua vez, dois vídeos feitos com base numa mistura um tanto inusitada: as páginas do livro “Le vignole de poche” (1890), considerado um tratado clássico da arquitetura, e as plantas baixas do Centro Comercial de Copacabana.
— Regina sempre trabalhou em torno de espaços não habitáveis — diz Amaral. — Desta vez, ela filmou e fotografou o shopping ao lado do qual sempre viveu e sobrepôs as imagens nas páginas desse livro do século XIX. Trata-se de uma experiência muito intrigante.
Ao longo do último ano, e com o intuito de fomentar as trocas entre Brasil e Espanha, passaram pela Paradigmas artistas como Gê Orthof, Leopoldo Wolf, Karina Dias e Ilana Lichtenstein.
março 6, 2012
30ª Bienal de Artes de SP corre o risco de não ser realizada por Camila Molina, O Estado de S. Paulo
30ª Bienal de Artes de SP corre o risco de não ser realizada
Matéria de Camila Molina originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal O Estado de S. Paulo em 6 de março de 2012.
Justiça mantém contas da instituição bloqueadas; fundação foi declarada inadimplente pelo Ministério da Cultura
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Uma decisão judicial ameaça a realização da 30.ª edição da Bienal de São Paulo, prevista para setembro deste ano. A 9.ª Vara de Seção Judiciária da Capital, da Justiça Federal, negou liminar para desbloquear as contas da instituição, congeladas desde 2 de janeiro deste ano.
A Fundação Bienal de São Paulo foi declarada inadimplente pelo Ministério da Cultura e pela Controladoria-Geral da União (CGU) por causa de questionamentos sobre 13 convênios firmados pela instituição paulistana entre 1999 e 2007 (de gestões anteriores). A Fundação Bienal de São Paulo informou que vai recorrer da decisão. "Vamos usar os mesmos argumentos", disse o diretor jurídico da instituição, Salo Kibrit.
Com as contas bloqueadas, todo o procedimento de preparação da 30.ª Bienal fica paralisado. O presidente da fundação, o empresário Heitor Martins (foto), não quis se pronunciar sobre a nova decisão judicial.
Em sua última entrevista ao Estado, em 1.º de fevereiro, ele afirmou que "por causa do passado, estão inviabilizando o presente da instituição". Martins assumiu o cargo de diretor-presidente da Bienal em maio de 2009 e foi reeleito em dezembro de 2010.
A instituição alegou que teve prazo muito reduzido para responder e analisar os questionamentos do Ministério da Cultura. Quando Martins tomou posse, em 2009, a CGU pediu informações sobre os 13 convênios irregulares, relacionados a problemas de falta de licitações e despesas fora de contratos. Um relatório da Fundação Bienal de São Paulo foi enviado na época ao órgão. Desde então, não houve mais pedidos, até que, em outubro do ano passado, a instituição foi notificada que estava no cadastro de inadimplentes.
Os pedidos de esclarecimentos ocorreram a partir de então e o último chegou à fundação em 23 de dezembro, mas a instituição teria apenas até o dia 31 para enviar os documentos.
Valores milionários. Os convênios questionados chegam a R$ 32 milhões. Referem-se a repasses usados para a realização de edições da Bienal e da organização de representações nacionais na Bienal de Veneza, reformas no prédio da instituição, no Parque do Ibirapuera, e publicações. A entidade tem em caixa R$ 12 milhões, montante congelado.
A Bienal informou também que o bloqueio de suas contas e a impossibilidade de captar recursos por meio da Lei Rouanet para a 30.ª Bienal paralisa o processo de realização da exposição, considerada a mais importante mostra de arte do País, e impede a continuidade de seu projeto educativo, em andamento desde 2011.
No requerimento enviado à 9.ª Vara, obtido pelo Estado, a instituição afirmou que a "inabilitação" é irregular. "Isso porque, nem a Instrução Normativa n.º 1, de 5 de outubro de 2010, do Ministério da Cultura, e tampouco a Lei Rouanet, preveem que a instituição eventualmente inabilitada terá, como penalidade, a paralisação dos projetos em andamento."
Em sua última nota sobre o processo, de 27 de janeiro, o Ministério da Cultura declarou que "a direção do MinC tem mantido contato aberto e estreito para que não haja prejuízos à realização do evento. Diversas alternativas de encaminhamento já foram discutidas com representantes da fundação". O órgão do governo federal não se pronunciou sobre a nova decisão judicial.
O projeto da 30.ª Bienal já estava adiantado e praticamente definido. Tendo como curador-geral o venezuelano Luis Pérez-Oramas, curador licenciado do MoMA, de Nova York, a mostra, prevista para ocorrer entre setembro e dezembro, com entrada gratuita, tem como título A Iminência das Poéticas.
A lista dos artistas participantes da mostra seria anunciada entre fevereiro e março. Seu orçamento é de cerca de R$ 20 milhões.
A Bienal precisa acontecer por Rubens Barbosa, O Estado de S. Paulo
A Bienal precisa acontecer
Artigo de Rubens Barbosa, presidente do conselho de Comércio Exterior da Fiesp, originalmente publicado no caderno de Cultura do jornal O Estado de S. Paulo em 6 de março de 2012.
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A Fundação Bienal de São Paulo deve comemorar, em 2012, a realização de sua 30.ª exposição internacional. Desde sua criação, em 1951, passou por períodos de altos e baixos. Por duas vezes deixou de organizar a exposição, reconhecida como umas das principais entre as grandes mostras internacionais de arte. Neste momento, questões administrativas e burocráticas - não de gestão - ameaçam a sua realização em setembro.
Como amplamente noticiado, em fins de 2011 o Ministério da Cultura (MinC) questionou a Fundação Bienal no tocante às prestações de contas de 13 convênios assinados no período 1999-2007. Apesar dos esclarecimentos, o MinC novamente incluiu a instituição no seu cadastro de inadimplentes no início de janeiro e bloqueou os recursos destinados à 30.ª Bienal. A fundação entrou imediatamente com ação judicial, com pedido de desbloqueio dos patrocínios captados via Lei Rouanet em 2010 e 2011. A liminar solicitada foi negada e a apelação até hoje não foi julgada.
O bloqueio das contas pegou de surpresa a atual diretoria, comandada com competência por Heitor Martins, que desde que assumiu tem procurado - com sucesso - resolver as pendências anteriores à sua gestão, devolvendo a Bienal aos seus bons tempos. Na prática, o que ocorre é que o bloqueio dos bens da fundação não permite a utilização dos recursos (R$ 12 milhões), captados recentemente via Lei Rouanet, para a realização da mostra deste ano. A imobilização desses bens, assim, torna inviável a captação de mais R$ 8 milhões já comprometidos por empresas, também via incentivo fiscal. Somente R$ 5 milhões estão livres, mas o valor é insuficiente para a realização da Bienal, orçada em pelo menos R$ 18 milhões.
A decisão do MinC de bloquear os bens da Fundação Bienal está repercutindo fortemente no meio artístico: curadores, galeristas e gestores culturais no Brasil e no exterior. Nossa Bienal, do porte da Bienal de Veneza e da Documenta de Kassel, desde sua fundação passou a fazer parte do calendário das artes internacionais. Exposições paralelas organizadas por galeristas brasileiros e museus, realizadas simultaneamente à mostra internacional, poderão ser canceladas. Se o impasse persistir, a própria existência da fundação está ameaçada, num momento justamente de maior projeção internacional do Brasil, o que poderá afetar nossas credibilidade e imagem no exterior.
O que acontece com a Bienal é mais um exemplo da falta de sensibilidade para com o interesse público e o real prejuízo que sua suspensão ou seu desaparecimento representariam para o Brasil. Não se trata de ignorar os erros do passado, mas de encontrar uma fórmula para separar o joio do trigo. É o que se tenta fazer agora para que a mostra possa tornar-se viável em setembro.
A divulgação da arte brasileira, cada vez mais conhecida e reconhecida internacionalmente, é em grande parte resultado de um trabalho eficiente dos agentes culturais e galeristas brasileiros, que vão sentir na pele as consequências de um eventual cancelamento da Bienal. Por outro lado, deveria ser de nosso interesse que a arte contemporânea se torne mais acessível ao grande público no País.
Como corretamente parece reconhecer o MinC, há interesse em que a Bienal de São Paulo seja realizada dentro do calendário previsto. Apesar dos entraves burocráticos, o MinC tem consciência de que sua realização é importante para o desenvolvimento e a projeção do Brasil lá fora, e que ela pode servir para ampliar as perspectivas de intercâmbio cultural com o exterior. Sabe ainda que a mostra tem o papel de proporcionar ao público brasileiro a possibilidade de conhecer diretamente o que de melhor está sendo produzido na arte contemporânea brasileira e internacional. Reconhece, igualmente, que o interesse do público brasileiro e estrangeiro (colecionadores, galeristas e críticos de arte) pela Bienal é crescente (cerca de 700 mil pessoas a visitaram na última edição) e que com isso o turismo cultural seria incentivado.
Com a realização no Brasil de eventos internacionais importantes, como a conferência Rio+20, pouco antes da Bienal, da Copa do Mundo e da Olimpíada, o cancelamento da mostra prejudicaria a percepção externa quanto à nossa capacidade de organizar eventos de grande porte. A repercussão no exterior do eventual cancelamento será maior ainda pela visibilidade que o Brasil hoje desfruta.
Situações excepcionais - como a que ocorre neste momento - devem justificar soluções diferenciadas, sempre respaldadas do ponto de vista legal, mas devidamente motivadas pelo claro interesse público.
Enquanto se busca uma solução definitiva para as questões financeiras pendentes, a Bienal, por meio de sua diretoria e membros de seu conselho, apresentou uma sugestão para, de imediato, solucionar o problema. Os projetos amparados pela Lei Rouanet seriam transferidos para um novo proponente, ou seja, uma nova instituição, que passaria a ser responsável pela realização do evento, como forma possível de tornar a mostra viável. A Pinacoteca do Estado, por exemplo, poderia gerenciar a execução da Bienal mediante um termo de ajustamento de conduta. Precedente existe e, segundo se sabe, o MinC estaria demonstrando boa vontade para encontrar uma fórmula que atenda a todas as partes envolvidas.
O mundo artístico e a sociedade em geral esperam que todos os interessados, Bienal, MinC, Controladoria-Geral da União, Tribunal de Contas da União, Ministério Público Federal e Estadual se empenhem para chegar a um acordo.
A Bienal tem de ser vista sob uma dimensão mais ampla, e não como questão isolada. Sua suspensão, em decorrência da falta de sensibilidade oficial, seria uma perda irreparável para São Paulo e para o Brasil.
Futuro da 30ª Bienal de SP deverá ser definido no dia 13 por Camila Molina, O Estado de S. Paulo
Futuro da 30ª Bienal de SP deverá ser definido no dia 13
Matéria de Camila Molina originalmente publicada no caderno de Cultura do jornal O Estado de S. Paulo em 6 de março de 2012.
Conselho da Fundação se reúne na próxima semana para decidir se aceita o MAM como proponente substituto da mostra
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30ª Bienal de Artes de SP corre o risco de não ser realizada por Camila Molina, O Estado de S. Paulo
Dossiê sobre a crise da Bienal de São Paulo
O futuro da 30.ª Bienal de São Paulo - que corre o risco de não acontecer - poderá ser definido dentro de uma semana. O governo federal ainda negocia parcerias e a Fundação Bienal de São Paulo marcou uma reunião de seu conselho no dia 13 para decidir o assunto.
Com contas bloqueadas, a Bienal está incapacitada de captar recursos para a 30.ª exposição, marcada para setembro. Desde janeiro, a fundação está na lista de inadimplentes do Ministério da Cultura (MinC) por questionamentos sobre 13 convênios firmados pela instituição paulistana entre 1999 e 2007 - o período se refere às gestões de Carlos Bratke e Manoel Pires da Costa na presidência da entidade.
Na semana passada, o MinC realizou uma reunião em São Paulo com dirigentes da Pinacoteca do Estado, do Museu de Arte Moderna (MAM) de São Paulo e do Instituto Tomie Ohtake para tentar uma manobra: transformar uma dessas instituições em proponente legal da 30.ª Bienal. O conselho da Pinacoteca resolveu se retirar do processo. Há indícios de que o MAM seja escolhido para a função.
"Existe a vontade de contribuir com a Bienal, mas ficou claro que as necessidades jurídicas e administrativas são inviáveis para a Pinacoteca, por ser uma organização social vinculada à Secretaria de Estado da Cultura", disse Marcelo Mattos Araujo, diretor da Pinacoteca do Estado. "Nossa associação teria de promover alterações no estatuto. Mas, nesse contexto, existe uma demanda imediata, emergencial, a situação concreta que é o risco de a 30.ª Bienal não ocorrer." O MinC afirma que a possibilidade de encontrar um proponente para a exposição está sendo avaliada e que, provavelmente, o gabinete da ministra Ana de Hollanda e a Secretaria Executiva do órgão deverão se pronunciar nos próximos dias.
Bloqueio. Por outro lado, segue ainda indefinido o pedido de liminar da Fundação Bienal de São Paulo no Tribunal Regional Federal para o desbloqueio das contas da entidade.
Dos cerca de R$ 20 milhões necessários para a realização da 30.ª Bienal, estão paralisados R$ 12 milhões que já haviam sido captados por meio da Lei Rouanet - entre eles, R$ 5 milhões referentes a dois novos convênios que poderiam ser firmados, respectivamente, entre a instituição, a Prefeitura de São Paulo e o governo do Estado.
março 5, 2012
Para onde vai a crítica de arte? por Suzana Velasco, Blog Prosa Online O Globo
Para onde vai a crítica de arte?
Texto de Suzana Velasco originalmente publicada no blog Prosa Online no O Globo Blogs em 3 de março de 2012.
Entre cifras em alta e instituições fracas, críticos debatem o lugar do pensamento sobre a produção artística nacional
A pergunta, lembra a crítica de arte Glória Ferreira, já era feita por Charles Baudelaire no século XIX: para que serve a crítica? Assim como as respostas a ela, essa é uma pergunta que não tem prazo de validade, mas parece emergir com mais força em alguns momentos. Em tempos em que a arte brasileira está nos holofotes de bienais, feiras e leilões de arte, e em que se falar em boom internacional da nossa produção artística já é senso comum, ela se faz premente mais uma vez.
Pensar o lugar da crítica neste momento em que instituições culturais buscam se adequar às demandas do mercado sem nem ter bem se consolidado foi uma das motivações do crítico de arte Sérgio Bruno Martins ao editar um número especial da revista inglesa “Third Text” dedicado à arte brasileira. Ela acaba de ser lançada na Inglaterra pela Routledge, com artigos de brasileiros, ingleses e americanos, e terá uma versão brasileira este ano, em parceria com a editora Azougue.
No primeiro número da “Third Text”, em 1987, o crítico britânico Guy Brett assinou um artigo dedicado a Lygia Clark. Vinte cinco anos depois, a obra da artista vale milhões de dólares, e Lygia se tornou símbolo da valorização da nossa arte lá fora — tanto nas cifras quanto na qualidade. São dois atributos que frequentemente se confundem, mas nem sempre se sabe por quê. Para Sérgio Bruno Martins, a crítica é o lugar para que haja essa distinção, e se pensem os porquês. É o que ele pretende com a edição da revista dedicada à arte brasileira.
— A ideia é refletir sobre como reter uma carga crítica da arte brasileira em vez de simplesmente se tornar um novo membro de um clube em que as regras já estão prontas. Há o risco de ser vítima do sucesso, de uma pressão para que as histórias da arte se conformem às narrativas mais bem estabelecidas. A revista tem uma certa intenção de mostrar a complexidade ou a irredutibilidade dessas narrativas mais fáceis — afirma Martins, que também assina um artigo na edição, sobre a teoria do não objeto.
O título da “Third Text” dedicada ao Brasil, “Bursting on the scene”, foi retirado de um artigo de Guy Brett de 1989, em que ele pensava sobre uma possibilidade de “irromper na cena” alternativa ao fenômeno do boom. Posicionar-se em relação ao mercado e a esse boom contemporâneo, no entanto, não é o tema da publicação, mas um ponto de partida para se pensar no próprio papel da crítica, uma motivação para buscar novas narrativas sobre a arte brasileira, de recortes pouco abordados a assuntos que se tornaram senso comum de tão repetidos. Sobre esse último caso, o crítico dá o exemplo de Hélio Oiticica — que, ao lado de Lygia, forma o casal mais citado da arte nacional. Foi por meio de Oiticica que Martins, mestre e doutor em história da arte pela University College de Londres, chegou à “Third Text”. Ele publicou um artigo sobre o artista na revista em 2010, sendo convidado para editar seu primeiro número dedicado ao Brasil.
— Hélio Oiticica é um artista canônico, mas paradoxalmente muito mal conhecido. Ele surge na cena internacional nos anos 1990, na mesma década da estética relacional, que em grande medida legitima sua poética. Mas existe um antagonismo na obra do Hélio que essa estética harmoniosa não tem — sustenta. — No Brasil, falta um pouco a crítica desvinculada do meio curatorial. Um texto de catálogo raramente vai dar lugar para o dissenso. Corre-se o risco de os objetos serem engolidos pela máquina crítica lá fora.
Uma ponte artística entre Ceará e Minas Gerais por Adriana Martins, Diário do Nordeste
Uma ponte artística entre Ceará e Minas Gerais
Matéria de Adriana Martins originalmente publicada no Caderno 3 do jornal Diário do Nordeste em 5 de março de 2012.
Até de abril, o Centro Cultural Banco do Nordeste exibe a mostra "Campo Branco", de artistas mineiros
Uma conexão geográfica e artística entre Ceará e Minas Gerais. A primeira, pela partilha de uma vegetação em comum, a caatinga, espalhada entre os estados do Nordeste e o norte de Minas. A segunda, pelo trabalho artístico que a paisagem árida inspirou - uma coleção de seis obras, entre pinturas, fotografias e desenhos, realizada por seis artistas mineiros.
A mostra, batizada "Campo Branco", foi montada pela primeira vez na capital cearense, no Centro Cultural Banco do Nordeste. Nada de telas com paisagens secas e retorcidas. Na exposição, a caatinga faz-se presente mais em sentido metafórico que literal. É ponto de partida para reflexões sobre o espaço de atuação do artista, o aparente "vazio" do bioma como oportunidade de criação, sobre o diálogo entre aridez e pujança, vida e esterilidade, entre outras questões.
"A princípio tudo ali parece árido, mas, na verdade, é um espaço bastante profícuo, um lugar por descobrir, passível de ação artística. Está tudo ali e, ao mesmo tempo, vazio", observa Júnia Penna, uma das integrantes do grupo.
Além dela, há ainda trabalhos de Francisco Magalhães, Isaura Pena, Pedro Motta, Ricardo Homen e Rodrigo Borges. Não se trata de um coletivo, mas de um grupo de nomes significativos no cenário mineiro da arte contemporânea, ligados por afinidades em relação a temas - entre eles o das paisagens, da espacialidade, das referências geográficas - embora desenvolvam pesquisas diversas e carreiras independentes.
Segundo Francisco Magalhães, em texto para a exposição, o termo "caatinga" é originário do tupi-guarani e significa mata branca. "´Paisagem interior´, a parte mais dentro do Brasil, sob um mesmo céu: Minas Gerais e Ceará. O termo ´campo branco´, que dá nome à exposição, alude a um lugar supostamente árido, lugar ainda por ser, suporte e território no qual esses artistas estabelecem suas criações", analisa o artista mineiro.
Afinidades
Magalhães segue ao explicar que a paisagem aparece de diferentes maneiras. Em alguns momentos, mais formalmente; em outros, mais simbólica. Os integrantes do grupo "revelam uma aproximação poética entre as obras, presente na espacialidade, na noção de vazio e no sentido construtivo, e buscam, no trabalho com a superfície, o espaço e a matéria, o símbolo, o lastro para suas ações", destaca no texto.
"Vimos desenvolvendo esse trabalho há algum tempo, ele deriva de uma outra exposição que iniciamos em 2006, chamada ´Geometria Impura´, na qual já explorávamos essa questão do vazio, da geometria como ponto forte. Depois de Belo Horizonte, levamos essa mostra para várias capitais, como Salvador, Recife e Rio", recorda Penna. "Somos mais ou menos da mesma geração, e sempre trombamos uns com os outros em ocasiões diversas, guiados pelas mesmas afinidades", complementa a artista. A ressalva é reforçada pelo colega Rodrigo Borges. "É um grupo heterogêneo, tem desde pessoas que atuam desde anos 80 até gente como eu, que passou a trabalhar mais tarde, no final dos anos 90, começo dos anos 2000", explica.
"Mas ao longo das respectivas trajetórias passamos a reconhecer nos trabalhos uns dos outros questões comuns, embora abordadas de maneiras bem diversas - entre elas está a questão da paisagem", avalia Borges.
O artista detalha aspectos de sua obra em "Campo Branco". "Trata-se de uma série chamada ´Caixa Aberta´, que venho desenvolvendo com volumes de papelão e fitas adesivas, sempre de maneira a intervir na arquitetura do local de exibição", explica. "Assim, crio situações espaciais nos espaços expositivos. É um trabalho bem pictórico, colorido. Inicialmente era tridimensional, em ´Campo Branco´ desdobrou-se em um painel bidimensional, instalado na parede, porém maleável", ressalta.
A escolha pela bidimensionalidade e a extensão do tamanho da obra está relacionada ao tema da paisagem. "É a maior versão que já fiz, tem quase quatro metros. Evoca a questão geográfica, de horizonte", explica Borges. Fortaleza é a primeira cidade a receber "Campo Branco". Daqui, os artistas ainda estão decidindo para onde levar o conjunto de trabalhos.
Mais informações sobre a exposição na
Coletivos criam performances urbanas por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Coletivos criam performances urbanas
Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 5 de março de 2012.
Grupos em São Paulo, Rio e Belo Horizonte promovem situações inusitadas para combater a "anestesia do olhar"
Artistas tentam manter autonomia em relação ao sistema financiando suas ações por meio de "vaquinha" na internet
Atento à transformação radical em curso no centro de São Paulo, este coletivo organiza festas, festivais de choro, peças de teatro ao ar livre e baladas de todo tipo no entorno do Minhocão, elevado que corta o coração da capital
No fim do ano passado, um quarteirão de Copacabana, no Rio, amanheceu interditado. Fitas demarcavam uma zona de desapropriação para a "construção de turbinas subaquáticas de geração de energia", o que causou espanto entre os moradores.
Na verdade, não existiriam turbinas nem se tratava de uma obra real, mas sim de uma ação do coletivo Brecha, que cria performances em espaços públicos com a intenção de despertar questionamentos no público.
"Exploramos mesmo essas brechas", diz Patrick Sampaio, um dos artistas do grupo. "Quando dão conta da história, a gente já terminou, desaparece e surge de novo em algum outro lugar."
Esse não é único conjunto de artistas, ativistas, hackers, atores e DJs que se juntam pelas metrópoles do país para combater o que alguns chamam de "anestesia do olhar".
"Nosso trabalho cria situações de sutileza, um olhar poético sobre o cotidiano", explica Brígida Campbell, do grupo Poro, de Belo Horizonte. "Usamos cartazes, lambe-lambes, faixas, coisas que criam uma espécie de ruptura."
ESPECULAÇÃO
No caso, uma ruptura com a ocupação tradicional de espaços muitas vezes vítimas do mau urbanismo e às voltas com a transformação desordenada causada pela especulação imobiliária e por problemas sociais.
Tentando manter certa autonomia em relação ao sistema oficial da arte no país, de editais e leis de incentivo, muitos desses grupos financiam suas ações por sites de "crowdfunding", ou seja, pedindo dinheiro a seu próprio público direto pela internet.
"Nossa lógica é fazer uma campanha, a gente não se vê sentando com um patrocinador para discutir", diz Lucas Pretti, do coletivo paulistano Baixo Centro. "Queremos uma dose de descontrole."
No caso deles, o "descontrole" é se instalar na região central de São Paulo, às voltas com a tentativa de revitalização da cracolândia.
"Não é o centro bonito, a Sé, a [avenida] Paulista", diz Pretti. "É uma coisa mais suja, feia, o eixo do Minhocão, que a gente quer ocupar com cultura, justiça, mobilidade. Queremos colocar uma coisa aberta na cidade fechada."
BLOCO, BIKE E KOMBI
Até agora, o Baixo Centro, em parceria com grupos de música, artes plásticas e teatro, já conseguiu armar um bloco de Carnaval, que desfilou pelo Minhocão, além de rodas de choro e de uma série de eventos de arte de rua.
Da mesma forma, o Nuvem, no Rio, vem criando festas ambulantes com um sistema de som acoplado a bicicletas -tudo isso também bancado com o velho esquema de vaquinhas virtuais.
"São caixas de som conectadas via rádio", diz Ícaro dos Santos, do Nuvem. "A proposta é fazer uso de um lugar que não é ocupado direito. No aterro do Flamengo, nossa festa parecia um festival na Califórnia, com 300 pessoas."
Depois de dois anos dominando espaços abandonados no centro paulistano, como o subsolo de prédios desativados ou bordéis decadentes, o coletivo Voodoohop também planeja juntar dinheiro via "crowdfunding" para pôr uma Kombi de som nas ruas.
"A ideia é ter um café, um cinema e uma balada móveis", conta Thomas Haferlach. "Vamos povoar o centro usando espaços alternativos."
Anatomia barroca por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Anatomia barroca
Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 3 de março de 2012.
Novo estudo mostra que Caravaggio fez versão anterior, com esboços preparatórios, da célebre Medusa
Do hábito de assistir a execuções públicas em Roma, Caravaggio desenvolveu sua habilidade assombrosa para retratar cabeças decepadas.
Mas uma nova decapitada tem roubado a cena desde que foi anunciada na semana passada na Itália. Aquilo que pensavam ser uma cópia da célebre Medusa que o artista pintou sobre um escudo é, na verdade, a primeira versão, também dele, da obra que hoje está em Florença.
Na Galleria degli Uffizi, na cidade que foi epicentro do Renascimento, o rosto desesperado da mulher de cabelos de serpente sempre foi um sucesso de público, estando entre as 25 obras mais importantes do palácio onde mora também a Vênus de Botticelli.
Agora, especialistas debatem o impacto da versão recém-descoberta. Enquanto o escudo do Uffizi data de 1600, dez anos antes da morte de Caravaggio, aos 38 anos, a nova Medusa é de 1596.
"Ele não largava esse escudo, dormia com isso debaixo da cama", conta Samanta Angelone, uma das pesquisadoras da primeira versão da obra. "Depois é que ele fez a cópia que foi parar no Uffizi."
Ao contrário da Medusa conhecida até hoje, a primeira versão esconde por baixo da pintura um raro desenho preparatório do artista -Caravaggio, que pertencia à escola veneziana de pintura, não costumava fazer esboços e pintava direto sobre a tela.
Nesse caso, especialistas sustentam que o mestre do barroco tenha feito esse desenho inicial pela dificuldade em trabalhar sobre a superfície convexa do escudo.
Seguindo o mito grego, Caravaggio retratou a Medusa sobre a arma porque Perseu, que derrotou o monstro, usou depois sua cabeça presa ao escudo para transformar inimigos em pedra -um dos poderes daquela mulher capaz de congelar com o olhar.
Tentando garantir a eficácia desses olhos, Caravaggio chegou a esboçar quatro versões deles no estudo, escondidas debaixo da tinta. Radiografias dessa nova Medusa também mostram três posições diferentes para o nariz e outras quatro para a boca.
"Essa Medusa é um protótipo da outra, com cerca de 20 desenhos preparatórios", conta a historiadora italiana Federica Gasparrini. "Só depois de superar as dificuldades da primeira é que ele executou a segunda versão."
Exames da Medusa já conhecida mostram que não há estudos ou esboços por baixo da tinta, o que sempre intrigou especialistas, já que o traço contínuo e sem falhas da obra parece ter sido feito sem muito esforço e na primeira tentativa do artista.
Uma extensa análise da nova Medusa agora indica que aquele desenho inicial do primeiro escudo foi transposto pelo artista para uma chapa de vidro e projetado sobre o segundo escudo com uma fonte luminosa, o que permitiu que ele pintasse direto sobre o suporte da réplica.
"Não há, na versão do Uffizi, nenhum sinal ou indício de que ele tenha feito uma cópia ali", diz Gasparrini. "Não aparecem nem mesmo as incisões na tinta que ele costumava fazer com a ponta do pincel, o que reforça a hipótese dessa cópia ter sido executada a partir das sombras."
Nisso, Caravaggio teve a ajuda provável do cardeal Francesco del Monte, seu mecenas, que se dividia entre a religião e estudos de alquimia, matemática e geometria.
Segundo estudiosos, Del Monte, que encomendou a segunda versão da Medusa para presentear o nobre florentino Ferdinando dei Medici, ensinou o artista a usar luz e sombra para fazer a cópia.
DESESPERO E DOÇURA
Mas mesmo com todo o esmero técnico, não são idênticas as duas Medusas. Caravaggio, que usou o próprio rosto como modelo para suas feições, fez mudanças e correções na expressão do monstro ao transpor a obra.
Enquanto a versão descoberta agora traz um olhar exasperado, mais austero e masculino, a Medusa do Uffizi é mais doce e feminina.
"Na primeira, ele faz uma advertência em nome da razão e da ciência, como se apontasse para as armadilhas da paixão", analisa Gasparrini. "A segunda fala da mulher como tentação, uma referência à virtude moral e militar, que não pode se render às tentações da carne."
Mas essa é uma comparação que ficará para os livros, já que o Uffizi descarta expor as duas Medusas juntas.
"Não é a primeira vez que descobrem uma cópia ou versão que seria mais bela e mais original do que a antiga", diz Antonio Natali, diretor do Uffizi. "Estudiosos têm o direito de achar o que quiserem, mas, se fôssemos expor tudo que descobrem aqui, o museu viraria uma feira."
Masp quer Medusa em exposição
Enquanto especialistas na Itália se digladiam sobre o real significado da nova Medusa, o Masp tem ampliado negociações para trazer ao país a Medusa clássica, do Uffizi de Florença. Teixeira Coelho, curador do museu paulistano, afirma que já estão confirmadas telas importantes do artista, como "Narciso na Fonte", na mostra dedicada ao mestre barroco marcada para junho deste ano. Mas Antonio Natali, diretor do Uffizi, diz que a Medusa não está autorizada a sair da Itália.
