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julho 10, 2012
Na barra da cultura por Fábio Marques, Diário do Nordeste
Na barra da cultura
Matéria de Fábio Marques originalmente publicada no caderno 3 do jornal Diário do Nordeste em 10 de julho de 2012.
Articuladores do "MAR - Movimento Arte e Resistência" reclamam mudanças na política cultural do Governo
Nenhum deles quer ser secretário, não têm nomes a indicar para o posto, nem pleiteiam cargos junto à Secretaria da Cultura (Secult). Quem garante é a coreógrafa Sílvia Moura e o articulador cultural Leandro Guimarães em relação aos participantes do "MAR - Movimento Arte e Resistência", que há 14 dias vêm mobilizando artistas cearenses em protestos (na rua e na internet) e na elaboração de uma pauta de sugestões, em meio à insatisfação declarada com a política cultural do Governo do Estado. A afirmação sobre o caráter não eleitoral e apartidário dos manifestantes vem em resposta à entrevista com o secretário da Cultura, Francisco Pinheiro, publicada com exclusividade na última sexta-feira, dia 6, pelo Caderno 3, onde o secretário alerta para o uso escuso da mobilização.
"O que o movimento questiona é a questão estrutural da Secult. Ser ou não o Pinheiro o secretário da Cultura não é fundamental. Porque pode mudar o gestor e continuar com a mesma estrutura", reitera Leandro, acompanhado por Silvia, que reclama que há bastante tempo as diversas linguagens artísticas vinham insatisfeitas com a política cultural da gestão Cid Gomes e com a atual estrutura de funcionamento da Secult.
"As linguagens já vinham conversando de maneiras diferentes com a secretaria. E já vinham insatisfeitas. Aliás, a gente já vinha insatisfeito desde a gestão anterior, do professor Auto Filho. Nós fomos procurados várias vezes, conversamos várias vezes, mas a gente não sente que há uma resposta concreta às nossas reivindicações", reitera.
As manifestações eclodiram após uma sequência de decisões por parte do Governo que resultaram na segunda saída de Francisco Pinheiro do cargo de secretário em um ano e meio de gestão, seguida pela posse do deputado estadual Antônio Carlos, que também deixou o cargo, dia 12 de junho, apenas seis dias depois de assumir. "Ele (Pinheiro) voltou pela terceira vez sem nos apresentar uma proposta concreta de governo. Isso gerou uma insatisfação muito grande pela falta de compromisso. Então, o compromisso dele é mais político do que o com a pasta que ele está ocupando", questionou Silvia Moura, lembrando ainda que pesou o fato de, nesse entremeio, Antônio Carlos ter assumido a pasta e se desligado via mensagem SMS, como divulgou à imprensa.
Críticas
As demandas do movimento foram organizadas em um abaixoassinado que circula entre os artistas recolhendo assinaturas e que deve ser encaminhado ao governador. Na próxima quarta-feira, às 16 horas, haverá um ato-show na Praça do Ferreira, em frente a sede da Secult, explica Sílvia, para cobrar ações concretas por parte do Governo. Na quinta-feira, dia 12, às 17 horas, está agendada ainda uma reunião com as categorias no Theatro José de Alencar para a organização de uma lista de demandas específicas que serão entregues à Casa Civil em anexo ao abaixoassinado. Hoje, também no TJA, de 14h às 17 horas, representantes da música se reúnem.
"A gente sabe que as soluções vão vir da pasta, mas a gente quer dizer para o governador o que a gente já disse na secretaria", reforça.
Os artistas questionam o fato do próprio governador, Cid Gomes, ter assumido "erros e omissões" em relação à pasta e anunciado, na ocasião da última posse de Pinheiro, uma "virada da cultura", que, no entendimento dos manifestantes, implicaria em grandes mudanças na política desenvolvida no Estado.
Em contraponto à fala do governador, reclamam os articuladores do MAR que, na entrevista publicada com Pinheiro na última sexta-feira, embora o secretário tenha assumido que há deficiências quanto ao trabalho da secretaria, ele sustentava a perspectiva "de continuar normalmente como estávamos anteriormente". "Como tem tanta gente dizendo que não está bem, que as coisas não têm andado como deveria e você está à frente disso e não ouve? Como vai continuar do jeito que está? Apresente uma proposta concreta para a categoria", questiona Sílvia.
Entre as críticas feitas à Secult, estão a falta de uma política cultural clara para o Estado capaz de dar conta das demandas, com ações que vão além da política de editais; a falta de uma equipe técnica especializada capaz de cumprir prazos e procedimentos burocráticos específicos da pasta; mais autonomia de gestão da secretaria, para que o conselho gestor do Fundo Estadual da Cultura possa de fato gerir os recursos e projetos a serem apoiados (decisão hoje atrelada ao gabinete do governador); interlocução especializada entre os profissionais da cultura e a secretaria e investimentos em formação nas diversas linguagens artísticas. Sílvia rebate ainda a reclamação de Pinheiro de que as áreas que mais protestam junto a secretaria - o teatro e a dança - seriam também as que são mais contempladas pelos incentivos da Secult. "Não é questão de orçamento. Embora a gente não esteja satisfeito com o incentivo que existe, a questão não é essa. Isso nem está no documento que a gente está levando para o governador", pontua.
Respostas
Em relação à entrevista dada por Pinheiro ao Caderno 3, Silvia destaca ainda que a necessidade de ações de formação nas diferentes linguagens não é suprida pela recente criação de cursos universitários voltados para linguagens como o audiovisual, a música e o teatro. O secretário havia ponderado que a criação de cursos é uma preocupação de sua gestão, mas que seria avaliada a demanda real de cada linguagem artística.
"Os projetos de formação que a gente solicita nada tem a ver com formação universitária. Embora a gente tenha aumentado o número de cursos de teatro e dança, isso não responde a uma demanda de formação básica. Nós só temos um curso acontecendo com o apoio do governo na dança (Cursos Técnico em Dança) e um do teatro (Curso de Princípios Básicos). Para um estado inteiro", diz.
E continua. "Depois de toda essa manifestação, a gente esperava que o secretário chamasse os artistas, não para uma conversa, que a gente já teve, mas para uma discussão mais ampla. Chamasse o estado para mostrar quais são as mudanças concretas para a secretaria nos próximos dois anos. Porque já foi perdido muito tempo. Manter os editais? A gente não está satisfeito com o edital. O edital é uma ferramenta, uma parte de uma política pública, não deve ser o todo de uma política pública", e encerra, "a gente esperava depois dessa mobilização toda uma reação de ´vamos lá gente, tá complicado? Vamos trabalhar´".