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julho 6, 2009
Um manifesto em defesa da exibição de obras públicas por Camila Molina, O Estado S. Paulo
Matéria de Camila Molina originalmente publicada no Caderno 2 no jornal O Estado S. Paulo, em 4 de julho de 2009.
Pensadores levantam discussão sobre falta de limites de preços cobrados por herdeiros de artistas pela imagem de trabalhos
"Não vai mais haver história da arte no Brasil, porque os artistas vão ficar invisíveis", diz, enfaticamente, o crítico e curador Luiz Camillo Osorio, que com o também crítico Rodrigo Naves e com os arquitetos Otávio Leonídio e Ana Luiza Nobre redigiu o "Manifesto em Defesa da Exibição Pública das Obras de Arte Brasileiras", lançado a debate público esta semana. O problema sobre a falta de limites com que herdeiros de artistas tratam a questão dos direitos de autor e de imagem das obras de seus parentes ocorre há tempos, mas foi um fato recente, o de o advogado da família do pintor Alfredo Volpi (1896-1988) ter pedido R$ 100 mil para reprodução de obras do artista no catálogo da mostra Volpi: As Dimensões da Cor, no Instituto Moreira Salles do Rio, que desencadeou a manifestação pública de críticos, curadores e outros profissionais do meio para se discutir o tema. "A ideia não era fazer uma petição para enviar ao Ministério da Cultura, mas colocar a questão e repercuti-la", afirma Osorio.
Há cerca de 15 dias Leonídio e Ana Luiza fizeram o esboço do manifesto, depois ainda elaborado por Naves e Osorio. Desde então, o texto recebeu as assinaturas de Abílio Guerra, Agnaldo Farias, Ana Luiza Nobre, Carlos Zílio, Cecília Cotrim, Fernando Cocchiarale, Ferreira Gullar, Glória Ferreira, Guilherme Wisnik, João Masao Kamita, Ligia Canongia, Luiz Camillo Osorio, Otavio Leonídio, Paulo Sergio Duarte, Paulo Venâncio Filho, Renato Anelli, Roberto Conduru, Rodrigo Naves, Ronaldo Brito, Sophia Telles, Suely Rolnik, Tadeu Chiarelli.
"A ideia de que o legítimo direito de remuneração pode preceder o dever da exibição e divulgação pública da obra de arte é inadmissível. O empenho por parte de alguns herdeiros, motivado por demanda comercial desmedida ou impertinente, em obstruir a exibição pública de obra de arte de artista desaparecido não é apenas absurdo, é imoral", diz a última parte do texto. Pela Lei dos Direitos Autorais (n.º 9.610, de 19 de fevereiro de 1998), os herdeiros dos artistas têm o direito de autorizar ou não a exibição pública das obras e também o de cobrar por essa exibição. O problema é que as decisões sobre os valores são arbitrárias.
"Em que medida a obra artística fica sujeita à ganância? E se a obra fica sem visibilidade, depois de um tempo, também, ela vai perdendo sua força no mercado e até nesse sentido esse pensamento comercial é uma burrice", afirma Osorio. São diversos os casos em que o alto valor pedido por herdeiros dificultam a divulgação de obras de artistas nos mais diferentes tipos de publicações.
Uma ferramenta
Apesar de existir a Lei dos Direitos Autorais, falta política para a área, um órgão regulador, como dizem a produtora cultural Ana Helena Curti e a advogada Cristiane Olivieri, criadoras de um veículo profissional para comercialização do uso de imagem, a empresa InArts, que fornece seu atendimento por meio do site www.inarts.com. "Uma relação abstrata com o mercado é o que dificulta", diz Ana Helena, reforçando que muitas vezes, por não se chegar a um acordo ou conclusão sobre preços para a reprodução, os herdeiros - cobrando valores abusivos ou não - acabam optando pela não-autorização e prejudicando a divulgação de uma obra.
Sendo assim, a InArts faz a intermediação na negociação e autorização do uso de uma obra entre o artista/herdeiro e as instituições culturais, agências e editoras, usando tabela de preços feita a partir de órgãos de mercado da Espanha, França e EUA. "É uma contribuição para a formalização e sistematização da área da cultura", diz Cristiane, lembrando que esse segmento rende cifras bilionárias de dólares em todo o mundo.
No site, os interessados fazem a consulta sobre as obras dos artistas que já integram o "catálogo" da empresa, como Antonio Dias, Carlito Carvalhosa, Edith Derdyk, Peticov, Ester Grinspum, Marina Saleme e Antonio Henrique Amaral - o único morto é Rubens Gerchman - e os arquitetos Paulo e Pedro Mendes da Rocha.
