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junho 25, 2015

A Reinvenção da Pintura: trechos do catálogo por Felipe Scovino

Trechos do texto assinado pelo curador Felipe Scovino publicado no catálogo da exposição A Reinvenção da Pintura.

Palatnik construiu a sua carreira como um autodidata. Com 4 anos, sai de Natal, em 1932, e segue com a família para a Palestina. Realiza seus estudos escolares e a seguir estudos de mecânica e física, especializando-se em motores de explosão. Frequenta um ateliê livre de arte e passa a ter aulas de pintura e modelo-vivo. Pinta principalmente paisagens, naturezas-mortas, retratos dos seus colegas, professores e familiares. Seus primeiros desenhos são feitos a carvão e impressionam pelo traço consistente e lírico. Nos seus primeiros anos dedicados à arte, a obra é figurativa. A reviravolta na sua obra acontece em dois momentos temporalmente próximos. Quando volta ao Brasil, em 1948, um dos seus tios cede o que seria o quarto do chofer da família para o artista. Esse cômodo, situado no bairro de Botafogo, no Rio de Janeiro, transforma--se no seu ateliê. Provavelmente por conta de seus estudos envolvendo mecânica e física, assim como das aulas de arte e da sua inquietação natural, qualidade típica do inventor, e surpreendido pela falta de luz em seu ateliê, episódio que relata na entrevista publicada neste catálogo, Palatnik começa a produzir uma das obras mais importantes da arte cinética em dimensão mundial: o Aparelho cinecromático.

O segundo momento, que sem dúvida alguma tem uma relação intrínseca com essa obra, no sentido de iniciar e prolongar a sua pesquisa com o cinetismo, é o convite que recebe, ainda como pintor figurativo, de Almir Mavignier para visitar o Hospital Psiquiátrico Pedro II, sob a coordenação da dra. Nise da Silveira: “Mavignier disse que iria me mostrar o trabalho de uns colegas, e eu fui”. Os colegas, na verdade, eram os pacientes esquizofrênicos da dra. Nise, pioneira no uso da pintura e do desenho no tratamento psiquiátrico. Palatnik não entendeu como aquelas pessoas, especialmente Raphael Domingues e Emygdio de Barros, produziam imagens tão densas sem jamais ter passado por uma escola de artes: “Pensava que eu era um artista formado. Resolvi começar de novo. A disciplina escolar, de ateliê, não servia para mais nada”. Foi o momento de abandonar temporariamente os pincéis — porque o artista voltará ao uso da tinta no final dos anos 1950, ao realizar obras com tinta sintética sobre vidro —, mas isso não significou o abandono da pintura, como ressalta Mário Pedrosa: “A pintura de luz de Palatnik continua a mostrar seus encantos, a criar relações cromáticas sui generis”.

O fascínio pelo movimento do jogo de luzes, a relação simbólica com a estrutura do caleidoscópio — que o próprio artista ressaltou em texto — e por que não com o cinema, e o aspecto lúdico que o Aparelho cinecromático possui não podem mascarar uma importância que é singular nessa obra: não apenas marca o pioneirismo da arte cinética no mundo, mas essa invenção dialoga intensamente com a produção cinética na Europa e na América do Sul, particularmente na Argentina e na Venezuela, assim como amplia o conceito de pintura. Se a pintura atravessava novos procedimentos para a sua apreensão e comunicação ao estabelecer diálogos intensos com a performance nos anos 1950 e 60, como foram os casos do dripping de Pollock, as antropometrias (1960) de Yves Klein ou as ações performáticas-pictóricas de Niki de Saint Phalle, a ampliação do termo “pintura” em Palatnik se deu de forma delicada e silenciosa, mas nem por isso menos intensa e importante que a vivenciada por esses artistas. Não podemos esquecer a relação formal dos Cinecromáticos e dos Objetos cinéticos (produzidos a partir de 1964) com o campo escultórico.

Como relata o crítico Romero Brest nos anos 1950, “há quase cinquenta anos os artistas plásticos vêm fazendo esforços para adequar os meios materiais estáticos — pintura e escultura — a uma concepção vital e, portanto, espiritual que exige o espaço e o movimento como veículos de exteriorização emotiva”. O encontro com Mário Pedrosa acaba por lhe mostrar que a arte não tratava mais da representação, no sentido de intermediação entre o mundo figurativo e a realidade externa a essa realidade. A tese de Pedrosa sobre a natureza afetiva da forma na obra de arte narra que “não é a subjetividade que vai explicar a imagem mas é a imagem que vai nos dar acesso àquela subjetividade”, como acentuou Marcio Doctors. Quando passa a frequentar a casa de Pedrosa, participando (de poucas) das reuniões que incluíam o núcleo embrionário dos artistas que fundariam o Grupo Frente em 1954, do qual também fez parte um ano depois, dois acontecimentos marcam a trajetória artística de Palatnik. O primeiro é o conhecimento da Gestalt por meio do livro de Norbert Wiener emprestado por Pedrosa e das conversas que mantinha com esse crítico, e o segundo é o contato com Almir Mavignier e Ivan Serpa, parceiros de vida e cujos trabalhos, dentro daquele grupo, eram os que mais se aproximavam dos seus.

A pesquisa de Mavignier sobre arte concreta converteu-se numa intensa produção de cartazes, desenhos e telas, e, assim como sua proximidade com o design, criou um vínculo intenso com a pesquisa de Palatnik. Serpa era outro artista que tinha muito interesse na pesquisa sobre a Gestalt e em sua relação com a produção de arte concreta. Suas telas executadas durante o período do Grupo Frente e a sua produção ao longo do chamado neoconcretismo — apesar de não ter participado das exposições nem assinado o Manifesto — conduziam para um diálogo com Palatnik. Tanto Mavignier quanto Serpa foram pioneiros na pesquisa sobre op art no Brasil — no fim dos anos 1960, Serpa desenvolveria a série Op-erótica —, daí a singularidade dessas produções e da aproximação com o estudo sobre cinetismo feito por Palatnik. Uma maior falta de interlocução de Palatnik decorre tanto do âmbito tão particular da pesquisa que realiza quanto do desejo pessoal de se manter afastado de discussões teóricas sobre a arte. Ainda sobre o aspecto lúdico de sua obra, Luiz Camillo Osorio em importante ensaio sobre o artista associa o trabalho de Palatnik com o de Calder, cujas obras “nascem de gestos simples, de pequenos achados onde sobram graça e encantamento”. Esse ponto de contato se realiza porque a obra de Palatnik também é regida por uma economia de gestos e métodos e porque o mesmo pensamento pictórico habita sua obra, assim como a noção de magia ou ludismo que dela emana.

É importante destacar que Calder esteve no Brasil, seja expondo ou participando ativamente da vida social e artística nos anos de 1940 e 1950, e Pedrosa foi um dos críticos que mais escreveu sobre ele, enaltecendo portanto sua ligação com o Brasil. Osorio ainda acentua uma ligação desses artistas com o trabalho de Miró. Uma característica importante na constituição dessa ideia de ludismo — que aqui pretendo separar do riso fácil ou de uma interpretação rasa que pode ser dada pelo espectador — é o caráter de transgressão e coerência na obra desses artistas e a relação plástica que estabelecem entre geometria, paisagem e novas percepções para a pintura: estabelecem diálogos com pesquisas tão distintas quanto Cézanne, Picasso ou Tatlin. No caso de Palatnik há uma característica de revelar o artista como artesão, no sentido de que todos os elementos constituintes de suas obras são produzidos por ele, não há assistentes envolvidos. O ateliê mais parece uma oficina do que aquilo que imaginávamos ser o ateliê de um artista. Tanto em Calder quanto em Palatnik, seus ateliês cheiram a óleo lubrificante ao invés de tinta, apesar de ela também existir. O pincel é a luz (em Palatnik), a moldura é o ar (em Calder), e em ambos a paleta é uma gaveta recheada de porcas, parafusos, arames e metal.

As pesquisas artísticas envolvendo o cinetismo no Brasil eram quase inexistentes no final dos anos 1940 e no início dos 50. Além de Palatnik, outra artista de destaque nessa pesquisa era Mary Vieira, mas esse reduzido núcleo sofreu duplamente. Primeiro, porque os artistas moravam em regiões díspares e não está claro se naquele momento conheciam a pesquisa um do outro, e segundo porque o conservadorismo imperava de modo radical no campo das artes visuais. Mário Pedrosa sem dúvida era uma saudável exceção. Um exemplo desse conservadorismo, e ao mesmo tempo contrassenso, foi a recusa da 1ª Bienal de São Paulo em aceitar a obra do artista porque o primeiro Aparelho cinecromático (1951) não se encaixava em nenhuma das categorias regimentais da mostra. Palatnik acabou sendo convidado a participar porque houve a desistência da delegação japonesa, e ao final ele recebeu menção honrosa.

No final da década de 1940 há a criação dos primeiros núcleos de artistas abstratos no Rio de Janeiro e em São Paulo, o que provoca reações diversas de setores da produção artística brasileira. Di Cavalcanti alertava: O que acho, porém vital é fugir do abstracionismo. A obra de arte dos abstracionistas tipo Kandinsky, Klee, Mondrian, Arp, Calder é uma especialização estéril. Esses artistas constroem um mundozinho ampliado, perdido em cada fragmento das coisas reais: são visões monstruosas de resíduos amebianos ou atômicos revelados por microscópios de cérebros doentios. O abstracionismo nascente devia ser imediatamente rechaçado. É nesse ambiente hostil que começam a se formar as primeiras produções artísticas de ordem construtiva no Brasil. Em 1948, Mary Vieira realiza sua primeira escultura eletromecânica, Formas elétrico-rotatórias, espirálicas com perfuração virtual. Os Polivolumes são torres vazadas, feitas em alumínio anodizado, formadas por semicírculos móveis em que o espectador, agora transformado em participante, escolhe a posição destes. Essas estruturas são móveis apenas no sentido horizontal. Aparelho cinecromático e Polivolumes acabam por antecipar, por exemplo, as questões participativas que estarão presentes, guardadas as suas devidas especificidades estéticas, políticas e artísticas, em um primeiro momento nos balés neoconcretos de Lygia Pape e posteriormente nas experiências pós-neoconcretistas de Hélio Oiticica e Lygia Clark. Se nos Aparelhos cinecromáticos e nos Objetos cinéticos o movimento e a participação se dão de forma autônoma em relação ao espectador — o que não acontecerá nas suas pinturas de matriz construtiva, já que a mobilidade do espectador frente a elas causa uma redimensão da ideia de movimento, dinâmica, e confronta a suposta rigidez que uma pintura teria —, os Polivolumes anteciparam de certa forma questões encontradas nos Bichos (1959-1964) de Clark.

Nesses dois últimos exemplos, a obra é o molde para a nossa vontade. A questão da decisão sobre a forma do objeto passa a ser do participante. Na obra de Palatnik percebemos a influência (leia-se a chegada tardia) da modernidade no Brasil, e em particular do construtivismo. Ao mesmo tempo, sua obra nos revela os pontos de fuga (e aqui em confronto mais direto com a rigidez do Manifesto Realista) e a contribuição que a arte brasileira ofereceu para o mundo no seu mais alto grau de invenção.

Posted by Patricia Canetti at 11:49 AM