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setembro 22, 2004

Sónar Sound São Paulo

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Spetto, Jodele Larcher e Samuel Betts; Cinema Extrapolado

João Domingues

O Sónar Sound, Festival idealizado na cidade de Barcelona com a intenção de difundir, pesquisar e debater acerca das novas possibilidades da música eletrônica, montou itinerância em São Paulo dos dias 8 a 12 de setembro, dividido em dois grandes espaços: o sonarsound noite, no Credicard Hall, palco dedicado exclusivamente às grandes atrações musicais do festival, e o sonarsound dia, abrigado no Instituto Tomie Ohtake, que recebeu, além das apresentações sonoras, instalações multimídia, mostra de cinema, ciclo de debates e feira discográfica. Tive a oportunidade de presenciar os dois derradeiros dias do sonarsound dia, mordiscando aqui e ali entre seus múltiplos atrativos.

A escolha do Tomie Ohtake não poderia ter sido mais acertada para o modelo da organização; foi a primeira oportunidade que tive de acompanhar um evento de grande porte onde a disposição espacial não acontecia como numa grande fôrma horizontalizada. O Instituto, instalado em um vistoso complexo com um enorme prédio e um centro de convenções interligados por um grande hall, possibilitou o arranjo do festival em diversos compartimentos expositivos verticais, cada qual recebendo um local específico para as atrações, todas bem separadas em seus pequenos pedaços, como que um grande armário onde podia ir-se "abrindo" e "passeando" por suas diversas gavetas, linguagem muito próxima de um hiper-texto em ambiente clicável. Auxiliado por variados modelos visuais de programação, o visitante podia escolher a atração predileta e seguir facilmente pelas escadas-rolante de acesso, facilitando a circulação das 4 mil pessoas presentes em cada dia no fim-de-semana.

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Balcão da ST2 Music, que produziu uma série de cartões com impressões em códigos de barras, junto a uma pequena tela disparada por um leitor em contato com o cartão específico de cada produto

Na mesma medida em que se opta por essa ordenação espacial, perde-se um pouco no confronto e instigação do público passante à troca de informações e impressões no contato com outras esferas da arte digital. Quando transitamos num local de experimentações por todos os cantos, soa particular demais esgotarmos os diálogos apenas com o arranjo do espaço. Evidentemente que nessa escolha pesa-se a organização (pois se trata inicialmente de um festival musical), a logística da produção (impecável, por sinal) e a visão do público consumidor (de música, em geral) sobre como se deve acontecer um evento desse predicado, mas oportunidades como essa, justamente na época efervescente da produção brasileira de arte tecnológica, devem ser mais estimuladas.

Falando assim, fica a impressão de um festival burocrático e desinteressante. Ao contrário, o sonarsound deve em pouco tempo tornar-se a maior expressão de encontro da música eletrônica alternativa e experimentações da arte digital no país. Entre muitas obras, shows, filmes e debates, ficou uma leve vontade de se querer ver muito mais. Foi um pouco desgastante acompanhar tantos acontecimentos em pouco mais de 6 horas com casa aberta, onde ficávamos perdidos sobre o que se fazer, ou o que assistir. E quando falamos há pouco nos estímulos, não podemos nos queixar quanto às atrações: excelentes shows no Hall Stage e Village Stage, ótimo espaço expositivo (sob a excelente curadoria de Lucas Bambozzi), debates com produtores e pensadores instigantes.

Nos salões do sub-solo e do mezanino, escolhidos para abrigar as instalações multimídia, destaque especial para a sala Life Goes Móbile, que desenvolvia variadas experiências artísticas que detinham como plataforma de interface o uso de telefones celulares; Turkish Bath, de Tetine, uma vídeo-instalação onde o espectador (um objeto estranho a nudez representada) era inserido num espaço como que num cubo branco, bombardeado por imagens de freqüentadores de uma sauna projetadas nas quatro paredes, onde os intérpretes dos vídeos ora brincavam e dançavam ora discutiam banalidades da vida cotidiana ou questões pertinentes história da arte.

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James Patten e Bem Retch, Audiopad

Audiopad, de James Patten e Bem Retch, um jogo interessante de produção de música digital, disposição espacial e manipulação de sons pré-gravados em tempo real;.consistia num tabuleiro com alguns búzios representando objetos sonoros pré-produzidos que, conforme eram deslocados pelo plano espacial, mudavam intensamente o projeto sonoro final em tempo real onde era possível ouvir as transformações em alguns head-phones usados pelos manipuladores; foi interessantíssimo poder dividir a produção sonora com adultos e crianças, todos seduzidos pela mecanização autêntica do projeto. Cinema Extrapolado, de Spetto, Jodele Larcher e Samuel Betts, uma instalação onde o usuário era convidado a manipular com um console alguns vídeos - dispostos segundo uma ordem espacial aleatória - de ícones da cultura alternativa nacional (Glauber Rocha, José Celso Martinez Corrêa) refletindo sobre a situação da cultura política brasileira. The House of The Floating Signs, de Eder Santos; sete imagens projetadas em chapas de raio-x de partes do corpo humano, bombardeadas por imagens ao fundo. O som das obras, disparados por sensores arranjados acima do espectador, remetia ao caos funcional quase divino de um corpo humano. Haptic Wall, de Daniela Kutschat e Rejane Cantoni, um enorme painel vibratório, disparado por microfones que captam as sonoridades dos andantes; explora possibilidades de interação dos espaços e dos corpos. Circ_lular, do trio Preguiça Febril (Giselle Bieguelman, Marcus Bastos e Rafaela Marchetti) oferece um trânsito de interações enviados por usuários em tempo real.

Fica a idéia de um festival ainda maior para os próximos anos, dando mais ênfase aos debates de uma produção mais intensa e expansão do mercado da arte tecnológica no Brasil, tentando ampliar alguns dos conceitos que emergem com vigor pelas muitas comunidades do espaço digital.

com o auxílio fundamental de Daia Leide, Faabio Carbone e Joana Regattieri

imagens: Faabio Carbone

Posted by João Domingues at 2:23 PM