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junho 14, 2005

Da lista de discussão do coletivo CORO, sobre a Ocupação do Paço das Artes:

Data: 13/06/2005
De: Daniel Manzione

"Quando eu canto
Que se cuide
Quem não é meu irmão"
Baioque - Chico Buarque

Ocupar v. t. 1. Estar ou ficar na posse de. 2. Invadir, conquistar. 3. Tomar ou encher (algum lugar no espaço). 4. Dar trabalho ou ocupação a. P. 5. Dedicar-se a; cuidar de. Ocupação sf.; ocupante adj. E s2g.

Como todos sabem, presumo, a definição das palavras oriundas do dicionário, é apenas o porto seguro de onde as palavras saem/chegam, para se perpetuarem para outras gerações.

Ou seja, as palavras só estão vivas quando as pronunciamos e nos comunicamos socialmente. Ressemantizamos as palavras, atribuímos novas significações a elas, nos apropriamos ideologicamente delas, mesmo sem nos darmos conta, e às vezes, em atitudes levianas, nem prestamos atenção aos desserviços que prestamos.

Todos esses pressupostos citados acima é um assunto incrível, pertinente e profundo a ser debatido, mas não se trata disso que estou aqui para falar. O assunto que gostaria de tocar tangencialmente e aforismaticamente é o caso "Ocupação no Paço das Artes" (se esse é o nome que se deu a esse evento).

Ocupação é uma palavra que, tal como diz em uma das definições "aureliescas" significa "invadir, conquistar" "estar ou ficar de posse". Significados corroborados hoje em dia pela prática estratégica de diversos movimentos populares, tal como o MST, MTST, Comunas Urbanas, MSTC e outros.

Práticas estratégicas e principalmente subversivas, pois tencionam o estado das coisas estabelecidas pela democracia liberal. Para dizer o português claro: A PROPRIEDADE PRIVADA.

Seus objetivos finais não estão aqui em discussão, mas somente os fatos políticos que estabelecem com o espetáculo capitalista, a mídia em geral e a opinião pública.

As ocupações partem do pressuposto de que existe alguém que domina legalmente determinado local, segundo a constituição liberal brasileira, mas que é de fundamental importância iniciar uma práxis que combata os pressupostos que legalizam a existência desses locais privados.

As ocupações legítimas são fatos fundamentais pois criam uma cultura da insubmissão anti-capitalista.

As falsas ocupações, tais como a realizada no Paço das Artes, só prestam um desserviço à prática de luta dos movimentos populares nacionais, pois reduzem o significado da palavra e a tornam socialmente inofensiva.

INOFENSIVA E PELEGA

Os Museus são instituições Públicas (de poder do Estado), Privadas (de poder do Capital) ou Mistas. Não é preciso fazer nenhum comentário sobre isso.

Museus (ainda discutível) e Galerias são Aparelhos Ideológicos do Capital.

A ação oportunista do Paço das Artes, e a adesão leviana (é o que tento acreditar) por parte dos artistas é uma conjunção de forças sociais destrutiva para a continuidade das lutas anti-capitalistas e principalmente seu poder no imaginário social.

O suposto ato de liberdade dos artistas, condensado nos trabalhos que realiza e ações que pratica, o torna um sujeito socialmente desestabilizador. A desestabilidade pode tender para um lado ou para o outro. A falta de consciência dos artistas de sua identidade classista /ideológica pode tornar o artista um sujeito perigoso. De que lado você samba?

A sociedade de Classes é uma sociedade integralmente e genuinamente ideológica. Se não tivermos consciência ideológica, numa perspectiva totalizante, dos atos que realizamos, podemos estar, como já disse anteriormente, prestando desserviços à superação do próprio sistema a que estamos submetidos.

Estamos submetidos, ou nos submetemos.

O pensamento dialético é o único pensamento possível para se pensar a vida, a política, a sociedade e a arte (ou sua definitiva destruição) hoje em dia e desde 1848.

Toda denúncia prenuncia um anúncio.

Parafraseando Godard em sua fase Revolucionária: O problema central é que as pessoas que fazem política hoje não sabem muito bem o que é a Arte e não querem entender, pois acham que isso é somente perfumaria, e as pessoas que se interessam por Arte, não sabem muito bem o que é a luta de classes e realmente o que são as lutas revolucionárias, deixando a cargo da Arte somente uma abordagem ideológico-humanista da sociedade e de sua possível transformação.

Ninguém encontrará Debord, muito menos os situacionistas (coisa na moda hoje em dia) senão reencontrarem MARX e o sentido da TOTALIDADE.

Como somente o pensamento dialético nos redime: Quem é culpado? O PAÇO das ARTES ou os ARTISTAS que estiveram por lá?

Definitivamente a palavra OCUPAÇÃO estava no local e na hora errada.

Daniel Manzione

Data: 14/06/2005
De: Flavia Vivacqua

ESTRANHA DORMÊNCIA
OCUPAÇÃO no PAÇO DAS ARTES

Depois de experiências como a do ACMSTC, em que 120 artistas se colocaram em ação, junto a Ocupação Prestes Maia, onde habitavam 2000 moradores do MSTC - Movimento Sem Teto do Centro, em novembro de 2003 e a Favela do Moinho, um ano depois... frente a vivência com os coletivos de arte, que se esforçam para manter uma produção autônoma e pública... fica difícil aceitar qualquer construção histórica cultural.

Principalmente quando um espaço público como o Paço das Artes, na USP e uma quantidade enorme de provedores culturais, utilizam-se equivocada mente e no mínimo ingenuamente das questões que envolvem uma Ocupação.

Que sentido há nessa ocupação?

Que sutil 'reality show' a cultura se coloca e com qual finalidade!?

Comemorar os 35 anos do Paço das Artes ou os R$3,00 de entrada, que os espaços públicos de cultura do Estado estão cobrando e que torna-se prática do Paço a partir desse evento?

Que estranha dormência impede os provedores de cultura, de reconhecerem e utilizarem as ferramentas que tem a mão?

Por que o Paço da Artes e todos que estão envolvidos nesse evento, com a idéia de ocupação e com o reconhecimento da precariedade existente, imprimem esforços de mobilizar e organizar tanta gente, se utilizam do acesso a mídia que o meio cultural naturalmente tem... mas não realizam a ação em sua real potência transformadora?

Por que não repensamos nossa situação e nossas ações diante dos problemas do sistema cultural de que fazemos parte?

A construção deteriorada da história, no caso a cultural, se dá nesses momentos: quando fazemos vista grossa a questões que por terem uma dimensão social, parecem não estar diretamente relacionada a nós; ou quando iniciativas privadas, com interesse particular, ocupam o espaço público com o discurso de inovação; ou ainda quando somos ludibriados com a espetacularização e nos doamos barato as suas promessas; ou ainda quando perdemos a chance de em um evento reconhecidamente histórico, de nos mobilizamos verdadeiramente frente aos problemas culturais que nos soltam aos olhos e ouvidos.

Flavia Vivacqua

Data: 14/06/2005
De: Fábio Tremonte

Por um momento me senti impulsionado a responder a carta do Daniel e o comentário da Flávia, me posicionando com alguém que participa da Ocupação do Paço, mas me deparei com um dicurso reacionário e preconceituoso, recheado de um monte de clichê, que fala, fala, e não chega a lugar nenhum...

Desculpe, mas as todas coisas têm o seu lugar e as pessoas são diferentes e têm interesses e planos e sonhos e lutam por ideais diferentes. Acho que poderemos viver em paz e em uma sociedade mais justa quando soubermos reconhecer isso, pois aí sim, as pequenas revoluções poderão acontecer.

Sem mais
Fábio Tremonte

Data: 14/06/2005
De: Ricardo Rosas

Discordo totalmente do Fábio.

Alguns pontos:

1) Por que quando um artista arrisca falar de política tem de ser classificado de reacionário ou preconceituoso, clichê? Já não é muito clichê e reacionário, por outro lado, todo o discurso "fashion", "hype", "muderno" ou "pós-moderno" de nossos bem alimentados playboys sorridentes? Quer algo mais reacionário que toda baboseira a respeito de "fim da história" e a despreocupação individualista pós-moderna? Esses discursos morreram com o onze de setembro...O terrorismo ainda está a espreita dos ricos despreocupados pós-modernos...

2) É com certeza inevitável a apropriação que o "mainstream" vai fazer das palavras de ordem da resistência contemporânea - sejam elas ativismo, coletivos, ocupação, etc. Haja visto o uso do nome "coletivo" pela TIM, entre outras coisas, não temos como refrear isso que os situacionistas chamavam de "recuperação". É o mecanismo do capitalismo e pode ter certeza que, mais que algum espião de algum serviço secreto, é algum executivo de agência de publicidade que em algum lugar estará nos investigando para transformar em tendência alguma prática subversiva que tenhamos descoberto ou criado, daí o que estão chamando por aí de marketing de guerrilha. Mas...mas...E por que, em vez de nos enclausurarmos em isolamentos, como mais tarde fizeram os situacionistas, não nos apropriamos das palavras de ordem e dinâmicas do capitalismo ou das instituições? Por que não fazemos, por exemplo, uma exposição numa ocupação de sem-teto e a chamamos de " Paço das Artes"?

3) Fábio fala de vivermos em paz. Mas já vivemos em paz! Estamos no melhor dos mundos! Você vê: não há pobreza, todas as pessoas são felizes, não descriminação entre classes ou raças, temos a Daslu onde todos podemos comprar nossas últimas tendências "fashion", só precisamos nos acomodar em nossas cadeiras, poltronas e camas e agradecer o mundo maravilhoso em que vivemos. Ninguém passa fome nesse mundo, todos tem casa e eletrodomésticos, todos podem lutar e realizar seus sonhos, não há guerra, estamos conservando a natureza e mantendo racionalmente seus recursos, pra que pedir mais? What a wonderful world!

Fico por aqui.

Abraços
Ricardo

Posted by Juliana Monachesi at 5:26 PM