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Brazil: Body and Soul / Brasil: Corpo e Alma
ANO 2 N. 84 / 03 de maio de 2002




Brazil: Body and Soul / Brasil: Corpo e Alma

Solomon R. Guggenheim Museum, Nova York

ADRIANO PEDROSA

"Brasil: Corpo e Alma" está entre as mais caras e polêmicas exposições de museu da história recente, e sua origem vale a pena ser examinada. A extravagância é  um refinamento da "Mostra do Redescobrimento", que em 2000 celebrou  o aniversário dos 500 anos da chegada dos portugueses ao Brasil. Instalada em três edifícios de Oscar Niemeyer espalhados no Parque do Ibirapuera em São Paulo e acompanhada por treze catálogos, esta panorâmica enciclopédica reuniu meio milênio da cultura brasileira—de achados arqueológicos a arte contemporânea—e atraiu quase dois milhões de visitantes, o que para uma instituição obcecada por números, foi certamente uma marca de sucesso. Mas houve críticos, e muitos atacaram a emergência de uma contribuição única para o design da exposição: ‘cenários’ altamente elaborados construídos por um time de cenógrafos cuja autoridade parecia ultrapassar a dos curadores. Assim, por exemplo, na seção chamada ‘O Olhar Distante’, trabalhos de viajantes estrangeiros foram instalados numa floresta de árvores azuis artificiais e  banhadas por luz azul. Para o assombro dos detratores locais, este lamentável modelo museológico logo seria reprisado em Nova York.

De fato, os organizadores da exposição, Associação Brasil 500 Anos de Artes Visuais (uma coalisão de gente negócio que no ano passado se rebatizou de BrasilConnects, afinando-se com suas aspirações globais), tinham um plano: exportar a exposição, introduzindo o mundo aos esplendores culturais do Brasil. Seções da exposição já foram vistas em Buenos Aires, Lisboa, Londres, Paris, entre outros, e o Museu Guggenheim de Nova York é a parada mais importante e cobiçada. Claro que esta não é a primeira aliança Brasil-Guggenheim. No ano passado, o curador sênior do Guggenheim Germano Celant supervisionou a milionária representação brasileira na Bienal de Veneza (produzida pela BrasilConnects). E, depois de dois anos flertando com quatro cidades brasileiras, o Guggenheim recentemente se decidiu pelo Rio de Janeiro, onde planeja construir o seu primeiro posto no terceiro mundo, a ser projetado pelo arquiteto francês Jean Nouvel. Enquanto o diretor Thomas Krens está determinado em agir cautelosamente no que concerne a esta iniciativa, com o museu da parte do sul de Manhattan suspenso, o Brasil parece ser uma prioridade para o Guggenheim.

É neste contexto—capitalismo ‘uptown’ de arte encontra arrivismo terceiro mundista—que a exposição do Guggenheim deve ser entendida.

Os trabalhos em "Brasil: Corpo e Alma" datam do século XVII até o presente, embora todo o século XIX tenha sido inexplicavelmente excluído (uma omissão reconhecida pelo curador chefe Edward Sullivan, porém não explicada no catálogo de 600 páginas). Arte e artefatos indígenas, afro-brasileiros, modernos e contemporâneos estão todos representados, mas os objetos religiosos—santos e anjos, artigos de procissão, elementos de arquitetura e decoração, e ex-votos (eu contei 523 na lista de obras)—são várias vezes superior em número a todo o resto. A peça central da exposição é um altar do século XVIII de cinco andares, que foi desmontado de uma igreja em São Bento de Olinda, Pernambuco, e reconstruído na Quinta Avenida. Embora espetacular, o altar, tendo perdido sua função, perdeu seu careater significativo; aqui ele não é nada além do que um fetiche no meio do aparato 'exotizante' do museu. Ironicamente, o altar, como Carmen Miranda, outro ícone brasileiro, é na verdade português (atribuído a José de Santo Antônio Vilaça, um frade português que nunca pôs os pés na colônia). Problema adicional: a lógica da conservação sugere que a estadia do altar no clima controlado do Guggenheim pode comprometer a integridade de sua estrutura quando este retornar a sua quente e úmida terra nativa.

Estrelando ao longo do altar português está um outro estrangeiro—o próprio Nouvel, que recebeu carta branca para transformar o museu para a ocasião. Aqui, paredes pretas melodramáticas lembram o azul nostálgico de "O Olhar Distante". Como os cenógrafos antes dele, Nouvel exerceu uma voz considerável a respeito da apresentação da arte, o que só confirma da excessiva e epidêmica valorização da arquitetura espetacular sobre a própria arte no atual circuito artístico. E agora, com a nomeação de Nouvel como arquiteto do museu Guggenheim no Rio de Janeiro, tudo faz sentido: "Brasil: Corpo e Alma" foi uma oportunidade para o francês mergulhar seus pés na cultura brasileira.

Após subir a espiral banhada em negro com numerosas jóias, adornos plumários, objetos em madeira, ouro, e prata, finalmente encontramos evidência de nossa própria era. Uma salas brancas contém uma seleção de trabalhos de grandes artistas do meio do século como, Lygia Clark e Hélio Oiticica, bem como também de contemporâneos luminares como Tunga, Adriana Varejão, Miguel Rio Branco e Ernesto Neto.  (Notadamente ausente está Cildo Meireles, que escolheu não participar deste ou de qualquer outro projeto da BrasilConnects, em protesto a sua abordagem "simplista".) Nunca uma arte tão boa pareceu tão ruim. As instalações pobres e periféricas das obras modernas e contemporâneas levam a noção do "beijo da morte" do museu a novos extremos.  Que uma instituição fundada precisamente a exibir arte "não objetiva" desconsidere de tal maneira a abstração modernista é particularmente incompreensível no caso do Brasil, que fez contribuições substanciais ao idioma. Artistas contemporâneos brasileiros não sofrem tanto pelo fato de exporem regularmente em Nova York, não precisando valer-se do Guggenheim para exposição.

Mega mostras e sucesso de bilheteria vêm e vão, porém a imagem fragmentada e perversa do Brasil disseminada por esta exposição levará tempo para se recompor. "Brasil: Corpo e Alma" pode até favorecer ao turismo e investimento, mas o anunciado custo de produção de 8 milhões de dólares pagos pelos Amigos da BrasilConnects parece um preço alto demais, especialmente se a mostra coloca o Brasil no mapa (turístico) mais pelo prazer do que pela cultura. Ao fim, o que mais se sente falta nesta exposição é de inteligência. Mas por outro lado, esta exposição apenas prometia apresentar o corpo e a alma do Brasil—espera-se que a mente do país apareça em futuras propostas curatoriais.

Adriano Pedrosa é curador do Museu de Arte de Pampulha, em Belo Horizonte.

Este texto foi escrito originalmente para a www.artforum.com, e sua tradução aparece aqui com a autorização do autor do texto e do editor do sítio. © Artforum, March 2002, "Brazil: Body and Soul," by Adriano Pedrosa
Leia o texto no original.

'O lugar parece um bazar gigante. Todos nós queremos ver arte de outras culturas, mas por que do Brasil, por que agora, e por que desta maneira incompreensível? A não ser, é claro, que seja para adoçar a negociação com o Rio. Somando esta com a exposição Rockwell, o Guggenheim chegou ao fundo.'
Trecho do artigo 'The Guggenheim Museum Touches Bottom, Downward Spiral',  de Jerry Saltz, no The Village Voice, Week of February 13 - 19, 2002.



Solomon R. Guggenheim Museum
1071 Fifth Avenue (com a Rua 89)
Nova York NY EUA
1-212 423-3500
domingo a quarta, das 9h às 18h
sexta a sábado, das 9h às 20h
exposição de 19 de outubro de 2001 a 29 de maio de 2002

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