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agosto 30, 2007

TV Pública Digital e Redes Colaborativas, por Ivana Bentes

TV Pública Digital e Redes Colaborativas

IVANA BENTES

Uma síntese de algumas questões relevantes que foram discutidas no Seminário da TV Pública Digital em Salvador de 23 a 25/08, com ampla participação de produtores independentes, diretores de TV, professores universitários,cineastas, Ongs, gestores, o ministro das Comunicações da Casa Civil Franklin Martins, o secretário executivo do Minc, Juca Ferreira, o secretário do audiovisual Orlando Senna, representantes das TVs universitárias, comunitárias, radialistas, jornalistas, empresários do audiovisual, enfim um grupo heterogêneo e diverso. Alguns pontos:

1) Em todas as mesas se defendeu que a TV Pública digital deve se constituir como uma rede horizontal, e uma rede colaborativa aberta, uma "rede de redes", descentralizada. O modelo de gestão foi o mais discutido, pois ainda está se configurando, mesmo que a proposta seja que a TV Pública entre no ar em dezembro. A idéia de uma rede de redes é decisiva, pois mesmo que inicialmente tenha como referência a TV Brasil (fusão da TVE com a Radiobrás) a proposta é criar as bases para uma rede "horizontal" reunindo mais de 200 emissoras de TV dos sistemas público, comunitárias, universitárias, estatais, privadas com fins público, enfim tendo como horizonte um pool dessas redes super heterogêneas, com troca de programas e abrindo para a produção independente (quem produz e não tem emissora para exibir). Tal fato é inédito no Brasil. Nunca se pensou uma rede com tal alcance e diversidade.

2) A base tecnológica será feita a princípio a partir da fusão da atual estrutura da TVE com a Radiobrás e mais uma base em SP. É essa a base material, o ponto de partida, a TV Brasil, que será seguida imediatamente pela criação de outros canais públicos, com gestão pública: os canais da cultura, da cidadania, da educação e os canais estatais (TV senado, Câmara,etc.). Ou seja, a rede pública que é uma malha enorme e diversa vai ser articulada nessa "rede de redes". A TV Brasil na nova configuração terá um novo diretor e um conselho (com participantes da sociedade civil), o que já causa especulações e polêmica, questão menor, no meu entender.

3) O melhor do seminário. Muita gente pensando a questão das redes colaborativas, da descentralização, da TV colaborativa, como a garotada que apresentou o site Fiz (tipo You Tube) que agrega conteúdos livres e a aceitação desse modelo das redes colaborativas como o horizonte natural da TV Pública digital brasileira pelos jovens gestores do governo (Minc e SAV).

4) Também a necessidade de uma Internet Pública apareceu fortemente. Essa também foi parte da minha argumentação nos debates, para combater uma Mídia-Estado (que se porta como Estado) não precisamos de um Estado nem Tv centralizadora, mas aumentar a produtividade social, ou seja fortalecer as redes existentes e incluir novas redes nos sistemas de Comunicação. Também os grupos que estão fora da TV não querem mais simplesmente ser "representados" na TV (periferias, p.ex.) querem um canal de TV, querem fazer TV, o que já é possível com a TV IP na internet e será na TV aberta, com as multi programações trazidas com o digital.

5) Também recorrente, a análise de que temos uma Mídia-Estado privada que "vende estabilidade política", sua moeda de troca para defender seus interesses. Levantou-se a questão e a importância da rede blogueira hoje na internet, como contra-discurso. Também defendi no seminário o que chamo da produção "doméstico-industrial", em que a produção "amadora" ou "não-profissional" ganha relevância e desmistifica a idéia da exclusividade da produção audiovisual e midiática feita por "profissionais". É só olhar para o You Tube, Wikipedia, redes colaborativas, etc. Falou-se o tempo todo da necessidade da TV Pública digital já entrar com um braço na Internet, convergindo TV e Internet públicas.

6) Defesa dos conteúdos abertos, sem bloqueio para gravar. O Jornal O Globo já saiu com texto na página dos Editorias, de domingo, dizendo que "Tv Digital ameaça conteúdo brasileiro", fazendo campanha para impedir que o telespectador grave os programas!!! O que é um atraso em termos de democracia e da livre produção e circulação do conhecimento.

7) Veremos a grande mídia detonar o projeto da TV Pública Digital como fez com a Ancinav e com as políticas públicas que poderiam abrir os sistemas de comunicação para uso comum, público e com horizonte de universalização desses serviços? Afinal, a mídia e os produtores de conteúdo somos nós, no pós digital e internet. O que está em jogo é um pensamento inédito do Brasil do que é Público. É a possibilidade de tirar do sucateamento as TVs públicas, estatais, comunitárias, universitárias e abrir novos espaços para produção independente, para o cinema brasileiro e para novas linguagens.

8) Aliás, essa é um dos grandes acertos do processo, presente na fala de Orlando Senna. A decisão que 80% da produção da TV Pública Digital será feita de fora (não pelas próprias emissoras). Ou seja, a TV Pública digital vai abrir Editais públicos para novos programas de TV, numa proposta de renovação inédita da programação. Provavelmente não será de imediato. Vai começar operando com um pool de programações regionais, vindo do Brasil todo e abrindo para as novas programações.

9) Inovação, experimentação, sair da "chatice", sair dos dualismo ou é cultural ou comercial, ou é "de qualidade" sem audiência ou de entretenimento, ou é política ou lúdica, essa também foi uma das questões mais discutidas. Novas mídias, games, interatividade, novas linguagens, estiveram entre as diferentes falas e alguns projetos já existentes nessa linha foram levados para debate. A questão de formar e construir audiências, aos invés de "vender audiência" como faz o sistema de TV privada que naturaliza a audiência, como se fosse um 'bolo' natural e imutável, foi também tema do pessoal que trabalha com estudos de recepção.

Enfim, um panorama animador, apesar das grandes dificuldades de se operacionalizar tudo isso.

Ivana Bentes
Diretora da Escola de Comunicação da UFRJ

Posted by João Domingues at 12:09 PM

agosto 28, 2007

6ª Bienal do Mercosul: Projeto Curatorial, Projeto Pedagógico, Projeto Diálogos

6ª Bienal do Mercosul

Projeto Curatorial

A fim de renovar o evento e consolidar conquistas de suas cinco primeiras edições, o curador-geral propõe, além de mudar o modelo de curadoria, intensificar o processo de internacionalização da mostra e pôr em prática um programa pedagógico ao longo de toda a sua realização. Baseada em representações nacionais até a 5ª edição do evento, a curadoria passou a ser formada por um grupo de curadores responsáveis por projetos específicos sob coordenação do curador-geral.

No caminho da valorização de uma geografia cultural, criada a partir da voz do artista, extrapolar limites de fronteiras geopolíticas mostrou-se um passo necessário. Por isso, o projeto curatorial da 6ª edição da Bienal do Mercosul é inspirado na metáfora A Terceira Margem do Rio, uma imagem tomada do célebre conto de Guimarães Rosa e adotada na 6ª Bienal do Mercosul. Segundo o curador-geral da mostra, Gabriel Perez-Barreiro, a terceira margem simboliza uma mudança de perspectivas. Enfatiza a possibilidade de criação de uma terceira forma de perceber a realidade, rompendo com as dualidades que a definem e delimitam - nacionalismo e globalização, direito e esquerdo, bem e mal, figuração e abstração, entre outros. A terceira margem é ainda uma metáfora da geografia regional, definida por fronteiras pluviais, e faz alusão ao antagonismo entre regionalismo fechado e globalização sem diferenças. "Nas questões políticas, quase todos os países do Mercosul estão envolvidos em algum tipo de experiência de 'terceira via' entre o socialismo e a economia de mercado. Na 6a Bienal do Mercosul, a ênfase será sobre os artistas que criaram seu próprio espaço dentro de um sistema estabelecido", explica Pérez-Barreiro. A imagem da terceira margem também aponta para um dos princípios metodológicos desta curadoria: o diálogo entre dois sujeitos com vivências diferentes que gera uma terceira realidade.

O curador-geral ressalta ainda que, ao não ter um tema definido, mas, sim, uma metáfora, esta edição da Bienal é um olhar do Mercosul para o mundo, um olhar que parte do regional para o global. "É uma Bienal feita desde aqui, do Mercosul, mas que não se encerra em si mesma", declara. A terceira margem, segundo Pérez-Barreiro, é também uma posição a ser adotada ao tratar a relação entre arte e público: "o diálogo deve ser um gerador de alternativas, fruto de constante negociação entre artista e arte, objeto e espectador e espectador e o ambiente ao seu redor". Por isso, uma equipe integrada de curadores - e não mais curadores de representações nacionais - articula a visão do Mercosul para o mundo e do mundo para o Mercosul. "Todos os curadores têm uma relação direta com países do Mercosul e, ao mesmo tempo, algum tipo de ação ou experiência internacional. Todos eles representam vozes diferentes, e esta Bienal aceita e promove a diversidade e a liberdade de expressão", argumenta o curador-geral.

Além das exposições, a 6ª edição da Bienal do Mercosul enfatiza as ações do projeto pedagógico, fundamental nesta edição. O projeto curatorial, por exemplo, foi totalmente pensado a partir das proposições pedagógicas desta edição. Para Gabriel Pérez-Barreiro, é o trabalho que está sendo proposto pelo curador pedagógico da 6ª Bienal do Mercosul, Luis Camnitzer, um dos grandes diferenciais dessa edição. No projeto pedagógico da 6ª Bienal do Mercosul, Camnitzer propõe uma inovadora reconfiguração do programa educativo, desde suas metas até sua implementação. Para ele, o espectador deve ser visto como ser criativo e não como mero receptor passivo de informação. O processo educativo foi iniciado ainda em 2006 e prevê uma série de ações ao longo de todo o ano de 2007. Essas ações contemplam o envolvimento de professores das redes pública e privada de ensino com acompanhamento até a visita dos alunos à exposição; a realização de ciclo de conferências e mesas-redondas; a inserção do projeto da 6ª Bienal do Mercosul no calendário escolar da Rede Pública de Ensino/RS; a realização de simpósios de arte-educação - como o que aconteceu em abril e reuniu mais 1400 participantes - e oficinas e cursos com professores do interior dos Estados do RS e SC; a realização de curso para formação de Mediadores; a produção e distribuição de Material Educativo para escolas das redes públicas e privada; o transporte gratuito para até 240 mil estudantes da rede pública e instituições carentes; e o projeto Diálogos - que contempla a comunidade artística local. Durante a exposição, os visitantes terão acesso a um espaço educativo, instalado no Cais do Porto, com sala para professores, biblioteca e acesso à internet, salas de oficina e salas para exposições dos trabalhos realizados dentro do projeto pedagógico. Além disso, 20 estações pedagógicas serão criadas para promover a interação entre o visitante e os artistas.


Projeto Pedagógico

O projeto pedagógico é considerado fundamental no projeto curatorial da 6ª Bienal do Mercosul. A partir de diretrizes do Conselho de Administração da Fundação Bienal do Mercosul, sua diretoria tem realizado um significativo esforço no sentido de priorizar e consolidar as ações pedagógicas da Bienal do Mercosul. Conforme Beatriz Johannpeter, diretora de educação da 6ª Bienal do Mercosul, "o projeto pedagógico se antecipa e se expande, pensando a visita à exposição como uma das etapas de um importante processo educativo iniciado em 2006 e que prevê uma série de ações ao longo de 2007". Essas ações contemplam o envolvimento de professores das redes pública e privada de ensino com acompanhamento até a visita dos alunos à exposição; a realização de ciclo de conferências e mesas-redondas; a inserção do projeto da 6ª Bienal do Mercosul no calendário escolar da Rede Pública de Ensino/RS; a realização de simpósios de arte-educação e encontros com professores do interior dos Estados do RS e SC; a realização de curso para formação de Mediadores; a produção e distribuição de Material Educativo para escolas das redes públicas e privada; o transporte gratuito para até 240 mil estudantes da rede pública e instituições carentes; e o projeto Diálogos - que contempla a comunidade artística local.

O curador responsável pelo projeto pedagógico, Luis Camnitzer, figura das mais relevantes e reconhecidas no campo da arte e da educação, propõe uma inovadora reconfiguração do programa educativo, desde suas metas até sua implementação. Para o curador, o espectador deve ser visto como ser criativo e não como mero receptor passivo de informaç.

Durante a mostra, junto aos espaços expositivos, serão construídas 20 estações pedagógicas, além de um espaço educativo multiuso, composto de sala de pesquisa, debate e atendimento para acesso do professor e de público interessado, com ateliê para uso do público escolar, e sala para exposição dos trabalhos realizados pelos alunos.


Projeto Diálogos

O projeto Diálogos promove o encontro entre artistas e curadores da 6ª Bienal com artistas locais para troca de experiências e avaliação de projetos. Promovido pela Fundação Bienal do Mercosul, o objetivo do projeto Diálogos é proporcionar aproximação entre artistas e gerar uma maior participação da comunidade artística local na Bienal do Mercosul. Até a véspera da Bienal, que acontece de 1º de setembro a 18 de novembro, serão cerca de dez encontros, em que cada artista ou curador vai conhecer três artistas locais, em conversas individuais com até 60 minutos de duração. Os artistas são selecionados por uma curadoria, que leva em conta a qualidade e a afinidade do trabalho apresentado com o artista ou curador convidado.

Os artistas residentes na região de Porto Alegre que quiserem participar dos Diálogos devem enviar e-mail para dialogos@bienalmercosul.art.br com um breve currículo de até 1000 caracteres e uma carta de intenções, além de 5 a 10 imagens dos seus trabalhos, em 300kb.

Cerca de 20 artistas locais já participaram dos encontros, que tiveram a presença dos artistas Minerva Cuevas, Maurício Corbalán, Pio Torroja e Jaime Gili. Os curadores Gabriel Pérez-Barreiro, Luis Camnitzer, Moacir do Anjos e Ticio Escobar também já participaram do projeto.

Posted by João Domingues at 10:55 AM | Comentários (1)

agosto 3, 2007

Textos críticos: Alice Shintani e Renata Tassinari na Virgilio

Textos críticos: Alice Shintani e Renata Tassinari na Virgilio

Alice Shintani - Quimera, de Guy Amado

Pinturas - Renata Tassinari, de Taísa Helena P. Palhares


Alice Shintani - Quimera

GUY AMADO

A um primeiro olhar, é difícil ou improvável pensar que a experiência de imersão promovida por Quimera no espaço expositivo da Virgílio possa ter sido gerada a partir de uma situação relativamente tensa, de um impasse que Alice Shintani experimenta em sua produção. Ou, mais especificamente, na relação com sua produção a partir das demandas - expositivas, institucionais, de mercado, etc. - a que esta começa a ter que responder. Nada muito extraordinário na trajetória de uma jovem artista, mas que o alto grau de rigor de Alice para com o próprio trabalho impõe uma série de reflexões mais cuidadas. E nesse sentido o título pode ser de certa forma emblemático - embora não explicativo - das pulsões que alimentaram essa mostra.

Realizada - quase "aplicada" - diretamente sobre o piso e paredes da galeria, a, digamos, pintura-instalação que dá nome à exposição distancia-se daquela fisionomia mais silenciosa e "agradável" característica da produção com que a artista vem ganhando visibilidade de tempos para cá. Envolvendo o ambiente num registro ambíguo, quase alegre mas amortecido pela paleta cromática áspera, a pintura ainda assim vibrante de "células-escamas" - livremente derivadas de gravuras japonesas - não induz a uma leitura clara a respeito de sua existência, embora a intensidade de tal presença pareça conter algo de afirmativo em seu bojo.

Nessa desconcertante e algo anódina padronagem de matizes orgânicos que reveste e contamina o espaço, a mencionada origem turbulenta da proposta se revela aos poucos. A natureza incerta do trabalho conduz a uma experiência de estranhamento. De que diabos se trata essa "pintura-ocupação"? Seria ela imbuída de alguma pretensão na linha da site-specificity, ou quem sabe visa aludir a certa tradição ornamental? É pintura de fato? Talvez uma pintura que não é... O estranhamento é deliberado, sem dúvida: mais que isso, apresenta-se como elemento estrutural na prática da artista, tomada que ela está de um ímpeto em investigar e repensar certos aspectos definidores do estatuto pictórico na contemporaneidade, problematizando no próprio trabalho a "verdade" canônica de algumas convenções.

Interessa a Alice desestabilizar algumas certezas e reducionismos em torno da linguagem pictórica. De como a pintura pode ser instrumentalizada por discursos e leituras esquemáticos, numa chave interpretativa que não raro compromete ou esvazia a natureza de sua própria razão de ser.

A opção por recorrer agora a uma nova solução plástica fala um bocado do processual da artista. A escala expandida inédita, a tinta aplicada diretamente sobre a arquitetura e certa "vontade ambiental" convergem para aspectos, ou anseios, já percebidos em sua pintura "convencional": o raciocínio instalativo, o modo de pensar a relação de seus quadros com o espaço, a boa e velha tinta suvinil, a convocação do público ao exame mais atento do que se passa em suas telas, para além dos "confortos da forma" que se delineiam indolente e ardilosamente em suas superfícies, bem como da suposta "vocação moderna" das mesmas - como uma apressada leitura formal pode sugerir. Está tudo ali, subjazendo àquela espécie de epiderme estranha, embora certamente em registro mais velado.

Todo esse jogo de [falsas] aparências e contrapontos ganha aqui uma nova escala, e não apenas do ponto de vista literal. Por outro lado, a proposta imersiva em curso com Quimera não pretende oferecer uma leitura fechada, objetivamente coesa e ilustrativa de tais pulsões. O projeto se apresenta mais como fruto de uma inquietação pontual, podendo ou não sinalizar novas possibilidades na práxis da artista. A conjunção de momento e local propícios só fez potencializar a empreitada. Realizado em um modus operandi não de todo dominado por Alice, como tal o trabalho se oferece mais ao risco; o que é sempre um fator estimulante, indicativo de frescor.


Pinturas - Renata Tassinari

TAÍSA HELENA P. PALHARES

Elemento fundamental de sua pintura, a cor no trabalho de Renata Tassinari sempre teve uma fisicalidade marcante. Ela tem corpo e é matéria que se revela dos modos os mais diversos: na aglutinação de diferentes materiais, na exploração de superfícies rugosas, nas pinceladas marcadas, na sobreposição de cores, na colocação lado a lado de determinados tons e, mais recentemente, pela estruturação do trabalho em módulos. Ela nunca foi enfocada apenas como acontecimento visual. Na verdade, suas pinturas se movimentam nesse espaço, tão rico para arte moderna, entre o objeto e a pintura, ou seja, evidenciam o caráter objetual desta, seu fazer enquanto coisa que em si não carrega nenhuma distinção a priori dos outros objetos do mundo. A seu modo, elas respondem a sempre problemática indagação: o que significa dizer que algo é um objeto de arte?

Nestes novos trabalhos, a regularidade e exatidão de formas e cores remetem, juntamente com uma certa padronização e repetição de estruturas básicas, ao universo dos objetos manufaturados, de eletrodomésticos a peças de design. Contribui para essa aproximação a utilização de placas de diversos padrões de mdf e molduras acrílicas que são explorados enquanto tais, ou seja, estão presentes nas pinturas lado a lado da tinta a óleo como elementos pictóricos fundamentais. As cores vêm fortes, em contraste. Determinados tons de rosa, verde, vermelho, amarelo e azul, cuja presença marcante se dá por aquilo que elas têm de ordinário e característico, unem-se às tonalidades artificiais da madeira industrializada ou são filtradas pela superfície acrílica.

Por outro lado, ao utilizar esses materiais também como elementos estruturais, as pinturas tangenciam o espaço arquitetônico. Em trabalhos como Quadrado Amarelo (2007) e Quadrado Rosa (2006) a linha formada pela moldura de acrílico branca ao mesmo tempo contém e expande o espaço, do mesmo modo que o jogo entre opacidade e reflexão da luz na superfície sugere um vai-e-vem no qual os limites físicos das pinturas são constantemente recolocados. As bordas da moldura de acrílico ora são pintadas por fora ora na parte exterior, sugerindo uma dialética sutil entre a exterioridade e a interioridade das pinturas. Na série de Fachadas, a caixa de acrílico funciona simultaneamente como um meio de contenção e ampliação, produzindo mediante o deslocamento espacial uma arritmia inesperada. Ao mesmo tempo, a transparência do material propõe uma integração da superfície da parede no jogo visual desencadeado pelo trabalho, procedimento inédito na produção da artista.

A meu ver, o interesse na fisicalidade enfática dessas pinturas, que não escondem como e do que são feitas, reside naquilo em que se apresentam como atuais, pertencentes a um espaço e tempo que é deste mundo e não de um além. Sua força vive nessa espécie de dupla instantaneidade: reconhecemos prontamente aquilo que vemos, seja pela familiaridade com os materiais que afinal fazem parte do mundo cotidiano, seja pela proximidade espacial das pinturas na medida em que estas se projetam para fora, ao encontro do espaço do espectador.

Posted by João Domingues at 12:46 PM